Pronunciamento de Emília Fernandes em 16/05/2002
Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Homenagens ao patrono Manuel Luís Osório, o General Osório, pela comemoração do Dia da Cavalaria.
- Autor
- Emília Fernandes (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
- Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Homenagens ao patrono Manuel Luís Osório, o General Osório, pela comemoração do Dia da Cavalaria.
- Publicação
- Publicação no DSF de 17/05/2002 - Página 8218
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
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- SAUDAÇÃO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, ESTUDANTE, PRESENÇA, GALERIA, SENADO.
- REGISTRO, COMEMORAÇÃO, DIA, CAVALARIA, OPORTUNIDADE, HOMENAGEM, MANUEL LUIS OSORIO, GENERAL DE EXERCITO, VULTO HISTORICO, BRAVURA, DEFESA, BRASIL, LIBERDADE.
A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quebro o protocolo dando as boas-vindas às crianças e aos adolescentes, estudantes que hoje nos honram com suas presenças nas galerias da Casa.
O dia 10 de maio marca as comemorações do Dia da Cavalaria. Não se trata de uma celebração restrita apenas à classe castrense: recordar feitos e datas notáveis da História Pátria é um imperativo de toda a nacionalidade.
Com justa razão, o hino do meu Estado, meu querido Rio Grande do Sul, conclama: “sirvam nossas façanhas de modelo a toda a Terra”. Façanhas são atos heróicos, como bem registra o festejado Dicionário Aurélio.
O Dia da Cavalaria evoca o aniversário de nascimento de um defensor da Pátria, um gaúcho de fibra, filho de família humilde, que galgou os postos mais elevados da carreira militar no Império. Refiro-me, Srªs e Srs. Senadores, a Manoel Luís Osório, o General Osório, cujo nome batiza, em justa homenagem, cidades e milhares de ruas e praças pelos municípios do Brasil.
Nascido em 10 de maio de 1808, na vila de Nossa Senhora da Conceição do Arroio, hoje chamada Osório, no Rio Grande do Sul, era um dos irmãos mais velhos de uma família numerosa e de poucos recursos.
Por tal razão, não pôde seguir estudando na escola convencional e, muito cedo, antes de completar quinze anos, sentou praça como voluntário na legião que se deslocava para Montevidéu, a combater tropas portuguesas, que, ali aquarteladas, recusavam-se a reconhecer a Independência do Brasil.
Nessa primeira missão, teve por batismo de fogo a batalha do Arroio Miguelete. Ali retornaria, alguns anos mais tarde, durante a Guerra de Independência do Uruguai, para pelear com sua habitual bravura: por sua destacada atuação em Sarandi e em Passo do Rosário, veio a receber distinções militares.
Quando eclodiu o Movimento Farroupilha, no Rio Grande do Sul, em 1835, Manoel Luís Osório, aos vinte e sete anos de idade, era tenente num regimento em Bagé, cidade gaúcha da região da fronteira, comandado pelo Capitão Mazzaredo, que entregou a praça aos revolucionários.
Após escoltar aquele oficial até a fronteira, Osório reportou-se ao comando do tão bravo quanto polêmico Coronel Bento Manuel Ribeiro, nomeado Comandante das Armas dos Rebeldes Farroupilhas pelo Deputado federalista Bento Gonçalves da Silva, líder maior da Revolta.
Depois da chegada do novo Presidente da Província do Rio Grande, Araújo Ribeiro, designado pelo Governo Central, Osório seguiu Bento Manoel Ribeiro na decisão de se reintegrar ao Exército do Império.
Não foi uma decisão fácil: em carta enviada a seu amigo, Capitão Domingos Crescêncio de Carvalho, que também havia aderido à Revolução Farroupilha, Osório, explicou o quanto lhe angustiava, republicano que era, retornar ao serviço do Império.
Justificava, contudo, que resolvia apoiar o novo Presidente Provincial por considerar que a Revolta já havia cumprido seu objetivo, e, mais, porque temia que os esquentados ânimos pudessem levar a Pátria à anarquia e ao derramamento de sangue entre irmãos.
Domingos Crescêncio, homem com mais de cinqüenta e cinco anos, veterano de guerras do Reino e do Primeiro Império do Brasil, não acatou o aconselhamento do jovem Tenente Osório e permaneceu nas fileiras farroupilhas de seu amigo Bento Gonçalves da Silva, vindo a morrer em combate.
Manoel Luís Osório, homem valente, embora alegre e generoso, ao garantir proteção ao Capitão Mazzaredo e ao manter a amizade e estima que continuou nutrindo pelo Capitão Domingos Crescêncio, acima de qualquer divergência política, demonstrou equilíbrio e serenidade em ambos os episódios.
É que Osório possuía verdadeiro horror à guerra civil: anos mais tarde, ao passar por Ponche Verde, localidade no município de Dom Pedrito, Rio Grande do Sul, minha terra natal, onde foi assinado o tratado de paz da Revolução Farroupilha, Osório declarou a seu filho e biógrafo que aquele local lhe trazia à memória, a um só tempo, a tristeza de um combate sangrento e a alegria da pacificação.
Dizia Osório que os republicanos ali pelearam com valor, mas souberam transigir com dignidade, assim como os imperiais que os perseguiram com pertinácia souberam aceitá-los com fraternal amor, após assinado o pacto de paz.
Senhoras e senhores, no Exército do Império, Manoel Luís Osório fez brilhante carreira na Força, tomando parte nas diversas guerras, inclusive na então conturbadíssima região do Prata.
Lutou contra Oribe e Rosa, tenho comandado, como coronel, a divisão que assegurou a decisiva vitória de Monte Caseros.
Mais tarde, quando a guerra do Paraguai começou, já ostentava a patente de Marechal-de-Campo e era o militar de maior prestígio entre os quatro países da região, por seu serviço durante 42 de conflitos sucessivos.
O comando geral das operações somente não lhe foi entregue por causa de certos dispositivos dos acordos da Tríplice Aliança, que o obrigavam a aceitar o comando do argentino Bartolomeu Mitre.
Foi na Guerra do Paraguai que Osório realizou sua maior façanha, em maio de 1866, quando, ao romper o cerco do Tuiuti, obrigou que as forças de Solano Lopes recuassem, possibilitando, deste modo, o avanço dos aliados.
Ferido em batalha, só retornou aos campos de combate em 1867, sob o comando de Caxias, quando participou, em dezembro de 1868, das batalhas de Itororó e Avaí e dirigiu a decisiva marcha de Tuiuti a Tuiu-Cuê. Na batalha de Avaí, foi atingido no maxilar, o que o obrigou a se retirar da linha de combate.
Agraciado pelo Imperador Pedro II com o título de Marquês do Herval, em 1869, Osório, contumaz trocista, gracejou que até Sua Majestade já sabia de seu gosto pela erva-mate. Daí receber o título de Marquês do Herval.
Foi eleito Senador pela província do Rio Grande do Sul em 1877 e chamado, no ano seguinte, para o cargo de Ministro da Guerra, no exercício do qual viria a falecer, em 4 de outubro de 1879, no Rio de Janeiro.
Seus restos mortais permaneceram, por muitos anos, no pedestal da bela estátua eqüestre na Praça XV de Novembro, no Rio de Janeiro, confeccionada pelo escultor Rodolfo Bernardelli com metal obtido de canhões tomados ao Paraguai durante a guerra.
A popularidade de Osório pode ser medida pelo fato de que esse monumento foi custeado com o dinheiro obtido em uma subscrição pública para isso convocada.
Osório, homem espirituoso, era emérito contador de causos. Sua liderança, seu espírito de organização e sua capacidade de despertar potencialidades, enxergando nas pessoas suas virtudes antes que seus defeitos, ficou patente ao preparar nosso Exército para a Guerra da Tríplice Aliança. Cuidou de aprimorar a instrução militar do pessoal, superou epidemias de tifo e de varíola, utilizou da melhor forma possível os parcos recursos materiais de que dispunha.
Osório falava aos comandados com a simplicidade de sua alma campeira: embora jamais houvesse freqüentado qualquer curso acadêmico, desenvolvia com engenho e arte o seu ofício, esteado no seu conhecimento adquirido nas lides diárias e na escola da vida.
Srªs e Srs. Senadores, a Cavalaria tem em seus quadros brilhantes oficiais, muitos dos quais se destacam em primeiríssimo lugar na Academia Militar e nos vários cursos de aperfeiçoamento do Exército Nacional, inclusive no Instituto Militar de Engenharia, uma das mais importantes Escolas de Engenharia das Américas.
Pois bem, Srªs e Srs. Senadores, essa moderna Arma, celeiro de brilhantes técnicos e cientistas, cultua, com orgulho, seu Patrono, o Legendário Osório, cujo caráter foi forjado no calor das batalhas e nos embates da vida prática.
Digo estas coisas porque a Cavalaria e o Rio Grande do Sul são umbilicalmente irmanados, sendo difícil imaginar que um pudesse existir sem o outro. As lanças da Cavalaria estão presentes no brasão de minha querida Sant’Ana do Livramento, minha terra de origem, no Rio Grande do Sul. As lanças da Cavalaria estão presentes nas fotografias de meus familiares e antepassados. Os toques dos clarins da Cavalaria ainda emocionam meu querido pai, aos 83 anos, Cavalariano que sempre foi, e meus sobrinhos que hoje servem à Arma de Andrade Neves e de Osório, o Legendário. Sempre haverá uma Cavalaria, sempre haverá um Rio Grande, sempre haverá um Brasil.
Portanto, Srªs e Srs. Senadores, as lanças de Osório jamais poderão verter sangue de patrícios; as lanças de Osório jamais poderão servir para dividir os brasileiros; as lanças de Osório jamais poderão se prestar a desservir o Estado Democrático de Direito, pois, na democracia - e só na democracia -, é possível a vida com dignidade e liberdade.
Nesse sentido, mister recordar o bravo e otimista Manoel Luís Osório, que cunhou, após o heróico combate travado em abril de 1866, na localidade denominada Passo da Pátria, no Paraguai, a lapidar oração:
Tenho presenciado a vossa serenidade no meio das privações, a vossa constância nos sofrimentos. Temos dado o mais belo exemplo de dedicação à Pátria, soldados! É fácil a missão de comandar homens livres: basta mostrar-lhes o caminho do dever.
Nestes dias de horizontes nebulosos, é de se evocar a estrela-guia de que fala o hino da Arma Ligeira, para que não nos detenhamos ante os caudais profundos ou as adversidades dos montes a serem transpostos, para que tenhamos na lembrança que, do meio de nosso povo sofrido, emergem líderes, homens e mulheres, a quem Deus dotou de inteligência, força de comando e amor à Pátria.
Portanto, Srªs e Srs. Senadoras, cada vez que os clarins de nossos regimentos ressoarem o toque “Aí vem Manoel Luís”, nós, patriotas de todos os rincões, de todas as cores, renovaremos a inabalável fé em nossa gente, fé em nossa Pátria, fé no futuro, esteada nas glórias do passado e nos desafios do presente.
Esta professora de História que, modestamente, ensinou o amor à Pátria a tantas crianças e adolescentes, por ser brasileira e gaúcha, não poderia furtar-se de homenagear um dos pilares da nacionalidade, um defensor do Brasil e da liberdade: o Patrono da Cavalaria.
Manoel Luís Osório, o Legendário, certamente teria assinado embaixo a estrofe final do hino do nosso Rio Grande do Sul:
Mas não basta para ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo
Povo que não tem virtude
Acaba por ser escravo
Ao reverenciar Osório, homenageio a grandiosidade e a bravura de nossa Cavalaria e do Exército Nacional. A História é para ser construída, vivida, exaltada e transmitida às novas gerações.
Obrigada, Srª Presidente.