Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Equívocos da política energética do governo federal. Inconveniências das usinas hidroelétricas.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA.:
  • Equívocos da política energética do governo federal. Inconveniências das usinas hidroelétricas.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/2002 - Página 7506
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, BARRAGEM, RETIRADA, HABITAÇÃO, POPULAÇÃO, CRESCIMENTO, POBREZA, POSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, INVESTIMENTO, RECUPERAÇÃO, LINHA DE TRANSMISSÃO, AMPLIAÇÃO, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA.
  • CRITICA, TENTATIVA, INSTALAÇÃO, USINA HIDROELETRICA, CONSTRUÇÃO, BARRAGEM DE ITAOCARA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), IRREGULARIDADE, RELATORIO, IMPACTO AMBIENTAL, AUSENCIA, CONSULTA, POPULAÇÃO, COMENTARIO, VANTAGENS, IMPLANTAÇÃO, USINA TERMOELETRICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Tentarei ser rápido; senão pedirei que meu discurso seja considerado lido.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, neste final de sessão abordarei uma questão bastante problemática do Rio de Janeiro, meu Estado. O País sofreu no ano passado uma crise energética, pela qual a Nação brasileira pagou caro. Recentemente, um projeto foi aprovado no Congresso para aumentar a tarifa de energia e criar um fundo que chamamos de o Proer da energia. O Governo brasileiro, tentando se precaver para que não voltem a ocorrer outras crises energéticas, está com um projeto de construir várias usinas hidrelétricas e termelétricas no Brasil.

O Estado do Rio de Janeiro tem um alto potencial para construir usinas termelétricas a gás, por exemplo, porque são menos poluentes e não agridem o meio ambiente como as usinas hidrelétricas, que, além de afetarem os rios, como conseqüência da obra, as barragens sempre atingem, dependendo do local, milhares de famílias que são obrigadas a se deslocar do seu local de origem para outros lugares, e nem sempre são atendidas as necessidades das populações atingidas pela construção da barragem.

O Movimento dos Atingidos por Barragens, o MAB, tem lutado contra esse tipo de obras sobretudo pela forma como as pessoas têm sido marginalizadas em função da produção de energia hidroelétrica.

A crise energética ainda está presente em nossa memória. Venho aqui para denunciar mais um contra-senso do Governo Federal. A falta de planejamento na área energética salta aos olhos, até mesmo quando se tentam construir novas barragens para a produção de energia elétrica.

Mas o que fica evidente nos processos de construção é a desconsideração das populações atingidas por barragens. Calcula-se que mais de um milhão de pessoas tenham sido desalojadas por barragens nos últimos 30 anos. Em sua maioria agricultores que tiveram suas terras inundadas sem que uma alternativa econômica efetiva fosse criada. Esses trabalhadores foram para a periferia dos centros regionais, aumentando o número de sem-terras e desempregados.

Segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica, encontram-se em construção no Brasil hoje 19 barragens, e mais 39 estão em fase de outorga. Até 2015, 494 barragens estão sendo planejadas, e calcula-se que um milhão de pessoas sejam desalojadas.

            Sr. Presidente, diversos movimentos têm se oposto aos projetos de novas barragens. Não que o Brasil não precise de novas fontes de energia, mas o governo precisa urgentemente dar ouvidos aos argumentos desses movimentos sociais.

O Movimento Internacional Contra Barragens, a Coalizão Rios Vivos e principalmente o Movimento dos Atingidos por Barragens, todos têm muito a contribuir para o debate e aprimoramento do modelo energético nacional.

E digo isso ressaltando que é principalmente no que diz respeito aos elevados custos sociais da construção de barragens que os movimentos sociais podem contribuir com novos conceitos capazes de fazer justiça aos desalojados, quando as barragens realmente se fizerem necessárias.

Atualmente, o processo decisório sobre a implantação de uma barragem é pouco democrático. As populações atingidas ficam sabendo que serão retiradas de suas casas depois que as decisões já foram tomadas. Em geral, ignoram-se impactos sobre a herança cultural das populações locais e seu direito ao uso tradicional dos recursos naturais.

No mundo todo, o consenso sobre a instalação de novas barragens é de que as populações afetadas devam ser consultadas. Uma das recomendações da Comissão Mundial de Barragens, da qual participam inclusive o Banco Mundial e a Eletrobrás, é o referendo popular como condição para a construção de barragens de qualquer natureza. Uma Instituição tão conservadora quanto o Banco Mundial toma hoje posições mais avançadas que o Governo Brasileiro.

Se a construção for realmente do interesse público e atender aos critérios técnicos e sociais mínimos, as populações e movimentos sociais têm de ser ouvidos para criticar os projetos e propor saídas alternativas, sempre que elas existirem.

Pois bem, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, dentre as novas usinas hidrelétricas que estão em estudo, uma se localizará em meu Estado, Rio de Janeiro. A Barragem de Itaocara deve atingir oito municípios na divisa entre o norte Fluminense e Minas Gerais.

A polêmica usina de Itaocara poderá gerar 195 megawats de energia e será construída na fronteira com o Município vizinho de Aperibé, também no Rio de Janeiro. As obras, que deverão começar no final de 2002, estão previstas para terminar em 36 meses, com previsão de investimento da Light da ordem de R$288 milhões.

Uma área de 7.641 hectares será inundada, incluindo três distritos rurais, desalojando cerca de 2.200 pessoas. Contra o projeto pesam as acusações de que alternativas energéticas não foram consideradas, e de que os impactos ambientais e sociais não foram devidamente estudados.

Do ponto de vista das alternativas, destaca-se a melhor utilização do potencial energético já existente. A ANEEL e demais órgãos fiscalizadores devem projetar que forma de recursos para novas usinas podem ser convertidos em investimento para reformulação de empreendimentos antigos, sanando erros técnicos de planejamento e falta de melhorias ao longo do tempo.

Outra medida que pode sanar deficiências energéticas, principalmente em áreas onde já existe a geração de energia, é a conservação de eletricidade durante a transmissão. Calcula-se que existe uma perda de 35 a 40% na transmissão de energia, o que acontece devido ao sucateamento do sistema. Ou seja, os recursos que seriam investidos em novas barragens podem ser conduzidos para essas medidas.

Sr. Presidente, vou encerrar em função do tempo. Agradeço a V. Exª pela oportunidade.

Encaminho à Mesa o meu pronunciamento e solicito seja transcrito, na íntegra, nos Anais do Senado Federal. Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE CONCLUSÃO DO DISCURSO DO SR. SENADOR GERALDO CÂNDIDO.

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O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como sabem os Srs. Senadores, as barragens fazem parte de um processo faraônico de construção de obras, lavagem de dinheiro, corrupção e favorecimento de empresas nacionais e internacionais. É difícil propor alternativas quando o que está em jogo são interesses econômicos, e não sociais, mas esse é o nosso papel como parlamentares.

Pior que desconsiderar essas alternativas e não ouvir as populações locais, foi o agente da construção tentar mascarar o Relatório de Impacto Ambiental para apressar a aprovação do projeto.

O Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio de Janeiro realizou uma análise crítica do Relatório de Impacto Ambiental, e constatou enormes discrepâncias, irregularidades e a clara intenção de esconder fatos da população.

Foram utilizados dados demográficos defasados sobre as populações dos oito municípios afetados pela barragem, o que mostra a imprecisão dos cálculos já de início.

O relatório chega a dizer que a usina terá um baixo custo de implantação, desconsiderando medidas socioculturais que possam reparar o deslocamento da população desalojada.

Num determinado momento, o relatório chega a dizer que o impacto ambiental será baixo, uma vez que a área se encontra em estado de degradação do ponto de vista ambiental. É preciso ressaltar, Srs. Senadores, que estas áreas realmente não apresentam mais grandes áreas de matas e campos nativos, mas somente estão neste estado porque são áreas agricultáveis, e que estão em plena produção.

E os problemas não param por aí. Não houve estudos sobre espécies animais e vegetais que só existem naquele trecho do rio Paraíba do Sul, nem sobre o impacto da futura barragem como vetor para doenças como a esquistossomose e a malária.

Por fim, há o sério risco de diminuição na oferta de água, porque o represamento para movimentar as turbinas da usina pode reduzir ainda mais o volume de água no rio Paraíba do Sul em sua foz, em São João da Barra. O rio já teve seu nível reduzido em 45% devido a barragem de Santa Cecília.

Por isso devemos exigir um estudo claro das alternativas de energia para a região. A realização dos estudos aprofundados dos impactos ambientais, sociais, de saúde e infra-estrutura. Além das medidas sociais, culturais e econômicas cabíveis para minimizar o impacto do deslocamento sobre as populações desalojadas.

Do ponto de vista das alternativas viáveis, devo destacar o imenso potencial termelétrico a gás de baixo impacto ambiental do Rio de Janeiro. Em outras áreas do país, o gás natural tem de ser importado, principalmente da Bolívia, mas a Bacia de Campos produz um excedente de gás que poderia ser revertido em produção de energia.

Do ponto de vista social, não há dúvidas de que a termelétrica seria superior, uma vez que não há desalojados. E se tecnologias de ponta forem utilizadas no processo de conversão de energia, o impacto ambiental de uma usina desse porte seria menor que o da hidrelétrica de Itaocara. Mas esta alternativa não foi sequer considerada.

O projeto encontra-se agora no Ibama, último órgão que deve ser ouvido antes da implementação das obras. É preciso que acompanhemos o processo, tendo em visa as críticas feitas ao processo.

            Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/2002 - Página 7506