Pronunciamento de José Fogaça em 03/06/2002
Discurso durante a 75ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Reflexão sobre os critérios para a escolha dos candidatos à presidência da República.
- Autor
- José Fogaça (PPS - CIDADANIA/RS)
- Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
ELEIÇÕES.:
- Reflexão sobre os critérios para a escolha dos candidatos à presidência da República.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/06/2002 - Página 10237
- Assunto
- Outros > ELEIÇÕES.
- Indexação
-
- ELOGIO, DISCURSO, AUTORIA, ARTUR DA TAVOLA, SENADOR, LIDER, GOVERNO, ANALISE, ATUAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, POPULAÇÃO, AVALIAÇÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
- APRESENTAÇÃO, CRITERIOS, ESCOLHA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NECESSIDADE, CANDIDATO, DEMONSTRAÇÃO, LIBERDADE, IDEOLOGIA, ATUAÇÃO, OBJETIVO, CRESCIMENTO ECONOMICO, MODERNIZAÇÃO, EFICIENCIA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, MELHORIA, POLITICA SOCIAL, CONHECIMENTO, JUROS, MOEDA, TAXA DE CAMBIO, MAIORIA, CONGRESSO NACIONAL, BENEFICIO, IMPLANTAÇÃO, PLANO DE GOVERNO.
- APOIO, CIRO GOMES, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ATENDIMENTO, EXIGENCIA, GOVERNANTE.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. JOSÉ FOGAÇA (Bloco/PPS - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O discurso que acaba de proferir da tribuna o Senador Artur da Távola, Líder do Governo, apesar de ter sido longo, sem dúvida alguma nos trouxe muitas informações e elementos para reflexão. Também trago, neste dia, alguns elementos de reflexão sobre a atualidade política, o momento de transição, de mudanças, o interregno que estamos vivendo entre um Governo que termina e um novo que vai chegar a partir de 1º de janeiro de 2003. É uma nova realidade que está sendo construída, um processo político que está amadurecendo e uma decisão que cada cidadão eleitor terá que tomar no dia 06 de outubro e, depois, quem sabe, em segundo turno, no dia 27 de outubro.
Sem dúvida alguma, essa reflexão deve conter fundamentos sólidos, deve basear-se em alguns elementos visíveis, concretos, palpáveis, que possam ser mensurados, avaliados, medidos e até comparados. Daí por que o pronunciamento do Líder do Governo é uma notável contribuição para o enriquecimento dessas avaliações, para alimentar esse processo de discussão.
Sr. Presidente, talvez não com a mesma concretitude e exatidão de números e estatísticas, trago uma reflexão sobre os elementos políticos que estão em jogo na próxima eleição do dia 06 de outubro.
O País se prepara para escolher um novo Presidente da República. Na semana que passou, recebi de alguns estudantes um pedido que dizia respeito exatamente a que critérios eles deveriam adotar, abstraindo os nomes que estão fazendo parte da guerra político-eleitoral, que critérios que eu lhes recomendaria, como um Senador experiente, com uma vivência adquirida na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, na Câmara dos Deputados e aqui no Senado Federal, ao longo dessas quase duas décadas e meia, para a grave decisão de eleitor no dia 06 de outubro?
Procurei ser sintético, objetivo e didático para a compreensão das minhas proposições. E disse a esses estudantes que, em primeiro lugar, partiria de uma clivagem de um dilema político muito simples. Ou seja, qual a situação, qual a inserção política do candidato? Qual o seu status como Presidente da República? Qual o nível de liberdade de ação? Qual o domínio e soberania que terá sobre o cargo, sobre si mesmo e sobre a Presidência da República?
Diria que o primeiro critério, a primeira disjuntiva para uma escolha seria o ideologismo. Disse aos estudantes que, como cidadão, recomendaria a eles, jovens, que considerassem se o futuro Presidente da República ou se o candidato que se apresenta como um pretendente à Presidência da República está ou não preso a um cárcere ideológico; se ele será ou não prisioneiro de uma verdadeira camisa-de-força partidária; se ele está ou não submetido a um conjunto de dogmas invencíveis. Se o candidato está preso ao ideologismo, se ele está submetido a essa camisa-de-força, evidentemente não tem liberdade de fazer, não tem liberdade de escolha, não tem liberdade de decidir, não tem liberdade para inovar, não tem liberdade para avançar, não tem liberdade para pensar, refletir e se autodeterminar. Portanto, esta é a primeira e mais básica disjuntiva: de um lado, a prisão do ideologismo; do outro lado, a liberdade de fazer. Eu disse a eles que escolheria o candidato que, no meu entendimento, estivesse mais apto e mais habilitado a ser livre, a ter a liberdade de fazer.
A segunda disjuntiva, a segunda clivagem, o segundo critério de escolha, disse-lhes eu, baseia-se no dinamismo social do Estado; ou seja, em que perspectiva o candidato se coloca, que papel ele pretende assumir quanto a esse dinamismo social e econômico do Estado moderno, do Estado hoje como nós o conhecemos a partir da realidade dos últimos anos. De um lado, se o candidato está disposto a um processo de reformas estruturais concretas, consistentes, reais, produtivas; se ele está disposto a dar continuidade a um conjunto de reformas do Estado brasileiro no sentido da sua modernização. Ou se ele, por oposição a tudo o que ocorreu nos últimos anos, está disposto a uma paralisia, a uma estagnação, a uma preservação das coisas tal como estão para não caracterizar, para não cristalizar nenhuma possibilidade de mudança, de reforma, de alteração desse estado de coisas. Portanto, é uma das questões que, parece-me, não podem ser abandonadas e não podem ser desconsideradas ao tomar essa decisão. “Que candidato eu devo escolher?” Eu disse a esses jovens que eu escolheria o candidato que estivesse disposto a aprofundar a reforma do Estado brasileiro porque ainda há coisas absolutamente pendentes, não resolvidas e não inteiramente realizadas como a reforma do sistema tributário brasileiro principalmente. A reforma tributária ainda é uma dívida política do Congresso brasileiro e do Governo Federal. É uma dívida que, evidentemente, será resgatada ou não pelo candidato que se comprometer com essa visão inovadora, transformadora e reformista. Portanto, esta é a segunda clivagem: o papel que o candidato está disposto a cumprir perante o dinamismo social do Estado brasileiro.
O terceiro aspecto que me parece importante não é apenas e tão-somente o da promessa dos gastos que o candidato é capaz de fazer porque, evidentemente, se fosse uma corrida de promessas, um concurso de ilusões ou uma disputa de quem diz a maior e mais convincente mentira, teríamos aí um verdadeiro festival de promessas e mentiras, da prática da prestidigitação política mais condenável e mais execrável possível. Não, não se trata disso. Trata-se de uma demonstração de seriedade, de austeridade e de consciência fiscal de modo a dar eficiência à Administração Pública para que ela possa, a partir da sua estabilidade, operacionalidade e funcionalidade, permitir, aí sim, a realização dos gastos públicos no limite máximo das suas possibilidades. Porque, o presidente da República, o administrador que desmonta, que desestrutura, que malbarata os recursos públicos, é evidente, está totalmente incapacitado para fazer investimentos sociais para a melhora das condições de vida dos mais pobres e daqueles que mais precisam. Portanto, não há nada mais socialmente injusto, não há nada mais socialmente perverso, disse eu a esses estudantes, do que a desordem administrativa, a incúria, a incompetência e a incapacidade de bem administrar os recursos públicos. A disciplina fiscal é um contraponto com a desordem e com o descontrole das finanças públicas. Evidentemente, eu disse a eles, nessa disjuntiva, nessa escolha, nessa clivagem, eu escolheria sempre o candidato que se comprometesse com a harmonia, a disciplina fiscal e o controle das finanças públicas correto e equilibrado para habilitar-se então a investimentos sociais realmente eficazes, produtivos e geradores de generosas conseqüências para os mais necessitados.
O quarto ponto que serviria de fundamento para uma escolha é o que diz respeito a um simples contraponto entre excelência ou qualidade de um lado, e, de outro lado, o desleixo, a displicência ou, o que é pior, o voluntarismo incompetente, ou seja, a arrogância, a determinação de dizer que faz sem ter meios para fazer; a pretensão de garantir que realiza aquilo que não tem condições nem instrumentos para realizar.
O presidente da República lida com elementos da economia que nem sempre são passíveis de um controle preciso e exato. Não são rédeas como aquelas com que se doma ou com que se pode montar um cavalo ou se pode dirigir uma aranha ou uma charrete ou uma carruagem ou uma carroça. Não. A economia depende de variáveis que oscilam, depende de vontade subjetiva dos agentes econômicos que estão localizados fora do Governo; depende de reações que as pessoas adotam diante dos fatos, diante das notícias, diante da informação. Portanto, as variáveis que dizem respeito à moeda, taxa de juros e taxa de câmbio, são variáveis que não são passíveis de controle perfeito, exato, absoluto, total. É preciso que haja competência, qualidade de administração e sobretudo excelência no monitoramento, na condução correta, inteligente, adequada destas variáveis, destes índices que dizem respeito à política monetária principalmente: juros, moeda e taxa de câmbio.
Não dá para dizer que quem se mostrou por exemplo um excelente empresário esteja preparado para presidir o País. Por quê? Porque o empresário não lida, do ponto de vista da condição de agente público, com taxa de câmbio, com moeda e com taxa de juros. Ele lida, isto sim, com o orçamento e o faturamento da sua empresa, com seus produtos e a qualidade deles, mas não lida com esse jogo de variáveis, de oscilações, com essas idas e vindas e com os diferentes comportamentos dos agentes econômicos no mundo da produção. E esse tipo de gerenciamento, ou de monitoramento, não é da experiência de ninguém que já não o tenha experimentado, que já não o tenha vivido, que já não tenha passado pelo cargo.
Como nenhum dos quatro candidatos foi Presidente da República, não dá para dizer que qualquer um deles esteja preparado para isso. Em princípio, nenhum dos quatro exerceu esse comando central da política monetária e, portanto, é uma questão absolutamente igualitária; ou seja, reduz todos ao mesmo patamar, a um nível de igualdade e todos se assemelham. Nenhum deles foi Presidente da República. Então, como diferenciá-los? Eu os diferenciaria por um critério, por uma disjuntiva única: aquele que é capaz de demonstrar uma atitude coerente, organicamente concertada, no sentido de não afirmar, de maneira gratuita, que baixará a taxa de juros, mas que garantirá, enquanto baixá-la, que não haverá aumento da inflação. É preciso que tenha elementos para demonstrar que o cobertor não é curto ou, ainda, fabricar um novo cobertor para a economia com o qual se possa tapar os pés e a cabeça, ou seja, diminuir a taxa de juros e, ao mesmo tempo, manter a inflação baixa.
O sistema de política monetária vigente hoje no País, baseado na inflação alvo - Inflation Target -, usa, evidentemente, a taxa de juros como elemento de monitoramento, de controle. Enquanto há ameaça de crescimento inflacionário, a taxa de juros não pode baixar. Somente quando forem desmontados todos os elementos causadores do descontrole inflacionário, a taxa de juros poderá cair lenta e gradualmente.
Esse é um grande e decisivo critério de escolha. Que nível de senso de responsabilidade e de consciência qualificada tem o candidato em relação a essas questões?
O quinto elemento de escolha - a quinta disjuntiva, a quinta clivagem - diz respeito à governabilidade. Disse eu aos estudantes que, em quinto lugar - não pela ordem, apenas por uma questão de seqüência, pois nenhuma dessas ponderações é mais importante do que a outra -, para fundamentar uma decisão, está a governabilidade. O regime presidencialista caracteriza-se pela necessidade de sólido apoio parlamentar. Sem ele, ou seja, sem um núcleo duro e resistente, capaz de expandir-se de maneira qualificada, de suporte no Congresso Nacional, o Presidente da República não pode governar.
Houve dois casos de Presidentes da República que não tiveram maioria parlamentar. Aliás, ambos foram eleitos pelo voto direto e popular, portanto, democraticamente legitimados pelo povo brasileiro. O primeiro deles, Sr. Jânio Quadros, em 1961 foi eleito por esmagadora maioria de votos, tendo vencido o General Lott, sem ter obtido, entretanto, maioria parlamentar. Lembrei também a esses jovens que o referido Presidente da República permaneceu apenas sete meses no Governo. O segundo Presidente que não teve maioria parlamentar chamava-se Fernando Collor, não tinha um núcleo consistente capaz de lhe dar a maioria. Elegeu-se por um partido inventado, recém-criado, sem nenhuma tradição e que fora fundado por ele mesmo poucos meses antes da eleição. De modo que esforçou-se muito para construir sólida maioria parlamentar e não conseguiu. Todos sabem o que aconteceu com o Presidente Fernando Collor.
O Presidente Fernando Henrique não só conseguiu governar durante oito anos - vai completar o seu oitavo ano de mandato -, mas também no meio do mandato obteve a reeleição e conseguiu dar exeqüibilidade, tornar executáveis todas as suas iniciativas de governo por uma razão: ter maioria parlamentar. Portanto, é preciso verificar se o candidato está trabalhando na direção séria e decidida de formar sólida e concreta maioria parlamentar. Nesse sentido, creio que à medida que os candidatos buscam ampliar as suas bases de apoio e as coligações, estão seriamente pensando na governabilidade, na essência da exeqüibilidade do Governo, que tem de ser viável, sustentável e precisa chegar ao fim. E aí é evidente que, na análise de cada candidato, de cada nome e de cada proposta, pode-se ver quem está caminhando nesse sentido e quem não está.
Nessas observações que fiz aos estudantes, eu disse que o meu candidato, Dr. Ciro Gomes, do PPS, não fez outra coisa nos últimos meses senão dedicar-se à árdua, penosa, difícil, complicada, mas ingente tarefa de construir uma frente de apoio político-partidário, uma frente que pudesse dar-lhe agora uma base mínima de apoio parlamentar e que, no exercício do governo, fosse ampliada por meio das diversas parcerias e formas de associação política que, evidentemente, o Presidente pode construir.
Portanto, dei-lhes o testemunho do enorme esforço e da enorme consciência de um candidato que tenho acompanhado de perto, que é o Dr. Ciro Gomes. E não faço aqui nenhuma referência negativa ou restritiva aos demais candidatos. Apenas faço um registro em função de uma experiência imediata e direta que conheço.
Após a intervenção do ilustre Líder do Governo, não me pareceu descabido, Sr. Presidente, trazer também essas reflexões à tribuna. Se as pessoas vão avaliar o que o Governo fez ou deixou de fazer, se as cidadãs e os cidadãos eleitores avaliarão o que é ou não possível realizar, que projetos são viáveis, executáveis ou não, eu não tenho nenhuma dúvida de que esses cinco elementos são definitivos e definidores da seriedade e da validade da proposta desse candidato. Claro que são formas, que cada um tem e expressa, de analisar e interpretar a política, e eu fui suficientemente honesto em também dizer aos estudantes que essa era uma forma pessoal, que buscava construir elementos objetivos a partir da minha subjetividade, a partir da minha percepção pessoal, e com isso, evidentemente, colaborar para que, no dia da eleição, cada eleitor possa fazer a sua escolha na medida exata da sua consciência.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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