Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 60 ANOS DE CRIAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE - CVRD.

Autor
Emília Fernandes (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 60 ANOS DE CRIAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE - CVRD.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2002 - Página 10322
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), IMPORTANCIA, TRABALHO, MINERAÇÃO, EXPORTAÇÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs. Senadoras e Srs. Senadores, ilustres convidados, desde aquele já remoto 1º de junho de 1942, quando o Presidente Getúlio Vargas, valendo-se da conjuntura favorável propiciada pelo desenrolar da Segunda Grande Guerra, assinou o Decreto-lei nº 4.352, criando a Companhia Vale do Rio Doce, a Nação passou a contar com um instrumento de grande valia para potencializar seu progresso econômico e social.

Hoje, decorridos 60 anos, a constatação irretorquível é que, de lá para cá, essa notável ferramenta do desenvolvimento brasileiro - que é a Companhia Vale do Rio Doce - só fez agigantar-se em porte e relevância, demonstrando uma extraordinária capacidade de superar os sempre crescentes desafios com que se tem defrontado ao longo de sua vitoriosa trajetória. São motivos mais que suficientes para a justíssima homenagem que o Senado Federal presta a essa empresa - genuinamente brasileira - na tarde de hoje.

Com efeito, a Vale já nasceu com a vocação da grandeza, na medida em que foi criada para nacionalizar a exploração da vasta jazida de minério de ferro abrigada no subsolo do Estado de Minas Gerais, no quadrilátero formado pelas cidades de Conselheiro Lafaiete, Mariana, Sabará e Itabira.

Estimada em três bilhões de toneladas, essa jazida fora detectada na virada do século XX e, desde logo, fez com que a cobiça de grandes mineradoras da Inglaterra, dos Estados Unidos, da Bélgica e da França se manifestasse. São empresas que lograram comprar, a preços irrisórios, boa parte desse patrimônio do País. Isso foi possível porque, à luz da primeira Constituição Republicana, de 1891, as reservas minerais pertenciam aos proprietários das terras onde se localizavam e podiam ser exploradas por empresas estrangeiras.

Desse modo, as minas de Itabira foram adquiridas pela Itabira Iron Ore Company, fundada por engenheiros ingleses. A mesma empresa assumiu, ainda, o controle acionário da Estrada de Ferro Vitória a Minas - EFVM, uma então incipiente ferrovia que, desde 1903, escoava a produção agrícola do Vale do Rio Doce. Mais tarde, em 1919, a Itabira Iron foi comprada pelo empresário norte-americano Percival Farquhar, que objetivava conseguir o monopólio da produção e exportação do minério de ferro da região.

A vitória da revolução de 30, contudo, começou a delinear a mudança nesse estado de coisas. Como se sabe, fazia parte do ideário dos revolucionários a nacionalização das reservas minerais do País. Assim, em março de 1942, o Governo Vargas conseguiu obter dos governos inglês e norte-americano a assinatura dos Acordos de Washington, que determinavam a transferência ao Governo brasileiro das minas de Itabira e da Estrada de Ferro Vitória a Minas.

Era o início da edificação de um gigante que, desde seus primeiros passos, evidenciava sua vocação para o sucesso embasado na dicotomia competência empresarial e respeito às riquezas nacionais.

A trajetória de sucesso da empresa pode ser avaliada nos seguintes fatos:

-     Apenas sete anos após sua criação e pouco depois do final da Guerra, em 1949, a Companhia Vale do Rio Doce já respondia por nada menos que 80% das exportações brasileiras de minério de ferro;

-     Em 1958, passava a atuar também no setor portuário, com o início da operação de seu cais no porto de Vitória, no Espírito Santo;

-      Em 1962, estende suas atividades para o transporte aquático, com a criação da Vale do Rio Doce Navegação S.A - Docenave; e

-      Em 1967, ao completar um quarto de século de existência, já aparece como uma das seis maiores empresas exportadoras do mundo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos mesmo frente a uma extraordinária jornada de ousadia empresarial, mas cumpre destacar, uma ousadia estatal, pública. É a história de uma empresa que nunca teve medo de crescer, de ir mais além, de investir pesadamente na busca de seus objetivos, sempre coincidentes com os interesses maiores do desenvolvimento nacional.

Em 1971, a Vale cria a Rio Doce Geologia e Mineração - Docegeo, que, com investimentos da ordem de nada menos que US$82 milhões, promoveu, ao longo de sete anos, a maior pesquisa geológica já realizada no Brasil em toda a sua história. Graças a essas pesquisas, a Companhia Vale do Rio Doce acrescentou 35 novos depósitos minerais às suas reservas, envolvendo 11 diferentes tipos de minerais, em 13 Unidades da Federação.

Diversos outros marcos relevantes da trajetória da Vale não podem deixar de ser mencionados neste momento, alguns até repetidos, diante do que já foi dito pelos Parlamentares que me antecederam:

-     No ano de 1975, a Companhia Vale do Rio Doce ascendia à condição de maior exportadora de minério de ferro do mundo, detendo uma impressionante parcela de 16% do mercado transoceânico do produto;

-     Já em 1976, ao faturar US$717 milhões com a exportação de seus produtos, a Vale torna-se a maior geradora de divisas do País; e

-     Em 1993, alcança a posição de maior produtora de ouro de toda a América Latina, com produção de 12 toneladas por ano.

Pelo conjunto de suas realizações no ano de 1996, a Companhia Vale do Rio Doce recebe, no ano seguinte, o título de “Empresa do Ano do Setor Mineral”, concedido pela revista Brasil Mineral. Foi a terceira vez em que a Companhia Vale do Rio Doce recebeu esse prêmio, criado em 1985. Nessa oportunidade, entre os vários aspectos considerados para a atribuição da honraria estiveram: o volume de investimentos realizados; as descobertas de novas jazidas; e o comportamento exemplar da empresa na administração dos conflitos com os garimpeiros em Serra Leste, no Estado do Pará.

No entanto, Srªs e Srs. Senadores, o evento que marcou profundamente a vida da Vale, naquele ano de 1997, não foi a conquista do prêmio recém-mencionado. Mil novecentos e noventa e sete foi o ano em que a Companhia Vale do Rio Doce deixou de ser uma sociedade de economia mista, com controle acionário do Governo Federal, e passou às mãos da iniciativa privada.

Em leilão realizado na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, o Consórcio Brasil, liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, sagrou-se vencedor na disputa relativa à privatização da Companhia Vale do Rio Doce. O grupo arrematou, naquela oportunidade, quase 42% das ações ordinárias do Governo Federal, pagando a quantia de US$3,338 bilhões, o que correspondeu a um ágio de 20% sobre o preço mínimo arbitrado. O Consórcio Brasil é integrado, além da CSN, pelos fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras (Petros), da Cesp (Fundação Cesp) e da Caixa Econômica Federal (Funcef), bem como pelos Bancos Opportunity e Nations Bank.

Nós, que não compartilhamos do rígido receituário neoliberal do chamado Estado Mínimo, estivemos firmemente contrários à privatização da Vale, embora não defendamos um dogmatismo estatizante que não tenha por objetivo o bem comum da sociedade. Sempre tivemos a convicção de que careciam de consistência técnica, econômica e social os argumentos esgrimidos pelo Governo Fernando Henrique Cardoso em favor da privatização da empresa.

Na verdade, ou esses argumentos representavam manifestações abstratas do mais puro fundamentalismo ideológico do tipo “é preciso concluir o processo de reforma do Estado” e “a presença do Estado em atividades empresariais é coisa do passado”, ou constituíam falsificações grosseiras da realidade, como “abater o estoque da dívida pública” e, ainda, “diminuir o déficit fiscal” e outros disparates do mesmo quilate, que foram utilizados pelo Governo Federal quando da privatização da Vale.

Por representar um dos poucos sistemas “globais” que o País possui, com capacidade autônoma de atrair investimentos e financiamentos externos, de realizar parcerias estratégicas e de manter uma inserção competitiva num mercado internacional altamente oligopolizado, a Companhia Vale do Rio Doce, na minha avaliação, não deveria jamais ter sido privatizada.

A dimensão econômica da Vale, sua capacidade de inserção competitiva no mercado global e sua importância como vetor de dinamização econômica e integração produtiva nacional tornam-na uma ferramenta fundamental para o planejamento estratégico do desenvolvimento brasileiro, uma autêntica “agência de desenvolvimento” capaz de induzir a constituição de uma verdadeira política tecnológico-industrial para o Brasil, ratificando nossa posição de que o controle da Vale deveria ter sido preservado em mãos do Governo Federal.

Ao privatizar a Vale, o Governo Fernando Henrique abriu mão de um instrumento essencial para compatibilizar um processo de inserção internacional competitiva, com a integração produtiva nacional, dentro de um planejamento estratégico que contemplasse uma visão sistêmica e holística de desenvolvimento sustentado. E, ao fazê-lo, desconsiderou o fato de ser o valor recebido com a privatização um montante - vejam bem, Srªs e Srs Senadores - que corresponde a menos de dois meses dos gastos federais com os juros da dívida interna, cuja explosão - é bom que se lembre - é conseqüência direta do modelo econômico da atual administração.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a verdade é que a decisão de privatizar a Vale - como já afirmei - obedeceu ao mais cego dogmatismo ideológico neoliberal. Alienou-se um gigantesco patrimônio da Nação, construído ao longo de mais de cinco décadas, e que não custava um centavo sequer ao Tesouro Nacional. Ao contrário, a Vale foi sempre uma empresa lucrativa.

Hoje, decorridos cinco anos de sua privatização, a Vale continua sua trajetória vitoriosa, consolidando sua posição como maior companhia de mineração diversificada das Américas e maior grupo exportador do País. A Vale é, porém, muito mais do que uma empresa mineradora. Sua malha ferroviária é a mais extensa do Brasil, contando com 15 mil quilômetros de linhas, e suas vultosas inversões na geração de energia elétrica já a fazem um dos maiores investidores do País nesse setor.

De outra parte, as perspectivas para o futuro da empresa são as mais alvissareiras possíveis. No setor de transportes, a Vale avança para consolidar sua posição não apenas como uma grande prestadora desse serviço, mas também como gestora de serviços de transportes e extensões relacionadas e provedora de soluções logísticas.

Enquanto mineradora, a Vale busca fortalecer sua posição de fornecedora de diversas matérias-primas e insumos para a indústria siderúrgica mundial e, assim, a empresa deslancha projetos aptos a alçá-la à posição de uma das maiores produtoras mundiais de cobre. Encaminha-se, ainda, para ser uma das três maiores produtoras mundiais de bauxita, alumina e alumínio.

Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, a despeito de todos os elogios que a empresa de fato merece e que aqui registramos, eu, particularmente, não me posso furtar, neste momento, de lembrar graves denúncias relacionadas ao processo de privatização da Vale do Rio Doce, em que o ex-Diretor do Banco do Brasil e ex-caixa de campanha do Senador Serra, Ricardo Sérgio, é acusado de ter pedido propina de R$15 milhões ao empresário Benjamin Steinbruch para viabilizar a participação da Previ na compra daquela empresa de mineração. Até hoje, o País não tem uma resposta clara se a referida propina foi ou não paga, conforme os meios de comunicação divulgam.

A sociedade merece uma resposta, e vamos cobrá-la até que se esclareçam todos os fatos relacionados ao caso. O Sr. Ricardo Sérgio, ao ser convidado a prestar depoimento à Comissão de Fiscalização e Controle, respondeu, por orientação de seus advogados, que iria “tudo esclarecer, num clima de serenidade, de forma discreta, evitando-se assim repercussões políticas neste período pré-eleitoral”. Todavia, sua disposição de fazer tal esclarecimento era “perante o Departamento de Polícia Federal” e pediu “escusas por declinar do honroso convite” feito pelo Senado Federal, onde não compareceu.

Sem demérito da Polícia Federal, é o Senado fórum menos adequado para ouvi-lo? Esse desrespeito ao Senado Federal é fruto da certeza de impunidade que esse tipo de gente adquiriu ao longo dos anos. Mas tenho certeza de que isso vai mudar. Esse caso precisa ser investigado até as últimas conseqüências, punindo-se todos os culpados.

Srªs e Srs. Senadores, neste momento em que homenageamos a trajetória da Companhia Vale do Rio Doce e a sua extraordinária contribuição ao progresso do Brasil, por ocasião do transcurso dos 60 anos de sua criação pelo saudoso Presidente Getúlio Dorneles Vargas, não podemos deixar de consignar nossa inconformidade com a não-preservação desse magnífico patrimônio em mãos do povo brasileiro.

Com sua história intimamente vinculada ao processo de desenvolvimento do País ao longo da segunda metade do século XX, e a certeza de que estamos diante de um verdadeiro instrumento de progresso técnico e, portanto, um núcleo gerador e dinamizador de importantes inovações tecnológicas para o século que se inicia, a Vale é depositária do afeto e do respeito de todo o povo brasileiro.

Assim, Sr. Presidente, neste momento em que o Senado faz esta justa homenagem, não poderíamos deixar de nos associar à tão significativa data dos 60 anos da fundação da nossa Companhia Vale do Rio Doce.

À Administração, aos funcionários e às funcionárias da Vale do Rio Doce, nossos cumprimentos.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2002 - Página 10322