Discurso durante a 82ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à utilização de produtos agrícolas transgênicos no Brasil.

Autor
Carlos Patrocínio (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Comentários à utilização de produtos agrícolas transgênicos no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/2002 - Página 11360
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • ANALISE, UTILIZAÇÃO, ALTERAÇÃO, GENETICA, PRODUTO TRANSGENICO, PRODUÇÃO AGRICOLA, BRASIL, DEFESA, AUMENTO, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO (MAPA), MINISTERIO DA SAUDE (MS), MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), FISCALIZAÇÃO, INGRESSO, PRODUTO, NECESSIDADE, INCENTIVO, PESQUISA, ESTUDO, EFEITO.

  SENADO FEDERAL SF -

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SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PTB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde os mais remotos tempos, cada vez que uma novidade surge diante da comunidade humana, esta se divide entre céticos e entusiastas, entre críticos e defensores, entre os que a rejeitam liminarmente e os que a abraçam incondicionalmente. Assim tem sido desde os tempos imemoriais, quando o homem primitivo apenas se defrontava com as descobertas dos fenômenos naturais, até nossos dias, quando os achados da ciência e da tecnologia têm afetado de modo avassalador a nossa sociedade, em lapsos de tempo cada vez menores.

Daí compreendem-se os temores, às vezes irracionais, de uns, e os entusiasmos de outros, também esses muitas vezes desprovidos de racionalidade. Se, em nossas vidas pessoais, defrontar-se com mudanças importantes nos causa insegurança e receios, o que dizer quando tais alterações nos vêm da sociedade, por meios que não controlamos pessoalmente?

Quando tais transformações afetam ou parecem afetar o que consideramos nossa sobrevivência, nosso questionamento se torna mais acerbo e maior o nosso receio diante do que se afigura obscuro ou duvidoso.

Assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tem sido colocada a questão do uso generalizado dos produtos chamados transgênicos. Trata-se de algo novo para a maior parte da humanidade e fruto de tecnologia relativamente recente para a nossa História.

O que fazer diante dessa nova e importante questão que o avanço do conhecimento nos apresenta nos dias de hoje?

Muito se tem discutido e muita controvérsia tem surgido. Vemos publicações de todos os matizes descrevendo maravilhas ou cataclismos, dependendo de que lado se está nessa discussão. Que tarefa nos cabe como homens públicos responsáveis por regular as relações da sociedade em nosso papel de legisladores? Que posição adotar quanto ao uso que se deva permitir para os transgênicos no Brasil?

Esse é o tema a respeito do qual eu gostaria de discorrer neste meu pronunciamento e vê-lo enriquecido pelos Srs. Senadores.

O primeiro ponto que merece ser levantado é que, de fato, a biotecnologia não é algo recente. Ao contrário, desde tempos antigos, o homem a utiliza para produzir alguns de seus mais desejados produtos, como o vinho, os queijos e o pão. Assim, não se pode, liminarmente, recusar o uso da biotecnologia como algo prejudicial, se bem que a transgenia não é tão antiga, pois trabalha a miscigenação de genes de espécies distintas para a obtenção de novos atributos a partir dessa mistura.

O que mudou tanto, então, nessa questão para provocar reações contrárias tão acentuadas? Creio que podemos afirmar que é a produção em larga escala de produtos geneticamente modificados, como resultado de experimentos laboratoriais ou de campo, em espaço de tempo curto para a escala da história humana. Às gerações que estão tendo que se defrontar com tal transformação estão faltando condições de se adaptarem tranqüilamente, superando temores e receios fundados ou não. 

Defrontamo-nos, mais uma vez, com a insegurança das mudanças rápidas, não devidamente introjetadas. O que fazer, então? O que propor como modo de superar temores infundados, de abortar perigos previsíveis e minimizar riscos possíveis? Não devemos nos esquecer de que esses fatores estão embutidos em todos os empreendimentos inovadores da humanidade.

De fato, não dispomos mais dos tempos e dos espaços que nossos antepassados tiveram para superar seus erros de avaliação. Em tempos de outrora, se uma comunidade causava um estrago muito grande em algum lugar ou em si mesma, bastava, em boa parte das vezes, mudar-se para outro local e esperar que as mazelas de sua imprudência ou ignorância fossem superadas pelo passar do tempo. Assim se consertaram os resultados de guerras, de pestes, de exploração predatória de terras e águas. Assim não mais se pode fazer hoje em dia, porque não há como deslocar populações, nem como evitar que ações produzidas em uma região afetem dezenas ou centenas de milhares de quilômetros além, atingindo terras e pessoas de outros continentes.

Por isso, a dificuldade de fazer os Estados Unidos assinar o Protocolo de Kyoto. Eles sabem que o que fazem dentro do seu próprio país afeta, e muito, os demais do mundo inteiro. Mas não estão dispostos a renunciar a benefícios, supostos ou reais, de curto ou longo prazos, para beneficiarem outras comunidades que não a deles. Raciocínio típico do homem imediatista, mas uma realidade em toda a nossa história. As grandes potências raramente se preocuparam com as conseqüências de suas atividades predatórias, sejam para o próprio ser humano, sejam para o meio ambiente.

Mas o que fazer no caso dos transgênicos? São eles lobos em pele de cordeiro? Aparentes benefícios da evolução do saber humano, mas verdadeiras bombas biológicas, cuja detonação não sabemos quando nem como será? Sinceramente, não creio que estejamos nem às portas do paraíso anunciado pelas multinacionais do setor, nem à beira do precipício alardeado pelos que são contra.

Alguns fatos podem ser alinhados. As culturas geneticamente modificadas apresentam, de fato, alguns resultados positivos: resistência a pragas e a doenças. A pesquisa tem mostrado que se pode melhorar a qualidade e a durabilidade desses alimentos. Contudo, no que diz respeito ao rendimento e à produtividade, não há resultados ainda que comprovem ganhos reais. No caso específico do Brasil, faltam até dados consistentes que permitam qualquer análise objetiva.

O que então amedronta tanta gente? São os riscos das conseqüências das modificações genéticas operadas em seres vivos sobre o ecossistema global. O que pode acontecer se uma planta modificada interagir com espécies nativas? Teremos novas espécies saudáveis ou estaremos criando monstros, ainda mais problemáticos do que aqueles que quisemos eliminar ou corrigir?

Infelizmente, essas são questões que só o tempo, a observação e a pesquisa em escala real poderão responder. E sempre com a imprecisão de todo fenômeno que lida com seres vivos: suas respostas não serão necessariamente previsíveis com 100% de certeza.

Como devemos, então, agir diante da polêmica e da certeza de não ter certeza? Creio que só com a cautela dos prudentes e dos sábios. Dar passos pequenos e tão seguros quanto possível; autorizar o uso sob estrito controle do Poder Público e da sociedade organizada; incentivar a pesquisa no Brasil, para que saibamos o que acontece com os produtos geneticamente modificados, quando produzidos e utilizados em terras brasileiras por população brasileira.

Haverá riscos? Sempre ocorrerão! Não há como inovar sem arriscar. Estaríamos ainda nas cavernas se nossos antepassados não tivessem tido a coragem de enfrentar seus temores diante do desconhecido. Assim devemos proceder. Paralisar diante do novo não é positivo; mergulhar de cabeça, sem prudência, é temeridade.

Agir e buscar novas fronteiras do conhecimento e da técnica a serviço do homem é cuidar do nosso futuro. Estamos diante de grandes desafios, sobretudo face à crescente demanda por bens agrícolas e por conservação do meio ambiente. Não podemos parar o progresso, mas devemos agir com precaução.

A CNTBio - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - é um órgão de Governo responsável pela regulação do uso dos transgênicos no Brasil. Que ele seja bem aparelhado e exerça seu papel, como representação de Governo e da sociedade! Que, em seu corpo, haja técnicos em número e em qualificação capazes de fiscalizar a gradativa entrada no mercado produtivo e consumidor brasileiro dos produtos cuja margem de segurança seja compatível com a proteção de nossos cidadãos!

Necessário se faz, também, fortalecer o papel e a capacidade de atuação dos Ministérios em que há responsabilidade no trato da questão da biotecnologia e dos transgênicos e suas implicações na vida dos brasileiros, especificamente os Ministérios da Saúde, do Meio Ambiente e da Agricultura e Abastecimento, além das ações que podem ser desenvolvidas na esfera do Ministério da Ciência e Tecnologia, ao qual a CTNBio é vinculada.

Não podemos negar a nós mesmos a possibilidade de transformar a natureza em nosso próprio benefício. Devemos apenas fazê-lo com segurança. Aos governos e às organizações sociais, cabe o papel de vigiar, para que a ganância e a irresponsabilidade de uns não ponham em risco a segurança de muitos.

Esse é o alerta que faço, Sr. Presidente, a respeito da introdução generalizada de produtos transgênicos em nosso País, ao mesmo tempo em que o Senado Federal realiza um seminário que trata da clonagem humana, reprodutiva ou para fins terapêuticos. Todos os Srs. Senadores deveriam assistir a esse seminário, pois ele aborda uma questão aberta à discussão em todo o mundo, e, certamente, o Brasil terá de elaborar uma lei calcada nos aspectos jurídicos, sociais e, sobretudo, religiosos e éticos da questão.

Sr. Presidente, mais uma vez, faço um alerta para que avancemos em termos de prospecção dos benefícios e desastres ou prejuízos que, eventualmente, possam provocar os alimentos transgênicos. Avancemos com o pé no chão, com cautela, porque devemos tomar os cuidados necessários para a implantação de alimentos geneticamente modificados em nosso País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/2002 - Página 11360