Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Explicações sobre a necessidade das mudanças nos cálculos de remuneração dos fundos de investimento.

Autor
José Fogaça (PPS - CIDADANIA/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. ELEIÇÕES.:
  • Explicações sobre a necessidade das mudanças nos cálculos de remuneração dos fundos de investimento.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/2002 - Página 11903
Assunto
Outros > BANCOS. ELEIÇÕES.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, IDONEIDADE, ATUAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), DETERMINAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, BANCO DE INVESTIMENTO, INFORMAÇÃO, VALOR, CONTABILIDADE, FUNDOS, FIXAÇÃO, RENDA.
  • SUGESTÃO, PARTIDO POLITICO, DETERMINAÇÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ELABORAÇÃO, DOCUMENTO, EXATIDÃO, TRATAMENTO, DIVIDA INTERNA, BENEFICIO, EXTINÇÃO, INFLUENCIA, COMENTARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ECONOMIA NACIONAL.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. JOSÉ FOGAÇA (Bloco/PPS - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto realmente é dos mais prementes e dos mais importantes, conforme atestam notoriamente as manchetes de imprensa.

Na Folha de S.Paulo de ontem, li que os chamados Fundos de Depósito Interfinanceiro, os Fundos DI, ainda estão registrando pesados saques desde o dia 29 de maio. Diz aquele jornal, através de matéria da jornalista Sandra Balbi:

Os fundos DI e renda fixa continuaram registrando pesados saques até a última quinta-feira, totalizando uma saída de recursos de R$6,8 bilhões desde o dia 29, quando entrou em vigor a nova regra de contabilidade dessas aplicações.

O Senador Eduardo Suplicy acaba de vir à tribuna para também fazer um alerta sobre questões relativas à imagem do País, o chamado risco-país Brasileiro, a confiança externa, alta do dólar, enfim, este momento de crise que está vivendo o País. Em meio a tudo isso, fica um pouco nebuloso, e talvez incompreensível, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que aconteceu na operação do Banco Central junto aos Fundos de Renda Fixa.

Ontem, pela Internet, ouvia uma rádio da minha cidade, Porto Alegre. Dizia o comentarista - não era um comentarista econômico, especializado, mas alguém com autoridade de jornalista e de comentarista e que fala em uma das mais importantes emissoras do meu Estado - que o Governo fez os investidores perderem recentemente algo em torno de 3% ou 4%, em alguns casos até mais de 5%, das suas aplicações em renda fixa. Também alegava que esse mau resultado seria um ato intencional do Banco Central, premeditado e deliberadamente buscado, desejado pelo Banco Central nas operações e nas medidas que implantou.

Parece-me, Sr. Presidente, que há um pouco de má-fé nas interpretações, mas há também muita desinformação. Não creio que a imprensa tenha traduzido com inteira clareza o que realmente fez o Banco Central.

O Banco Central agiu como aquele médico que pede que o seu paciente se comporte de acordo com o grau de febre que tem, de acordo com a realidade estabelecida pelo termômetro, e não crie uma falsa imagem de si mesmo. Se o paciente produz uma imagem fabricada, falsa, ilusória, em desacordo com os fatos, não me parece que isso seja culpa do médico, que simplesmente está pedindo que o paciente tome conhecimento e aja claramente de acordo com a pura e simples realidade dos fatos.

O que acontecia, Senador Casildo Maldaner, era uma situação bastante equívoca, mas simples de entender. Grande parte dos bancos estabelecia o valor das suas cotas nos fundos de renda fixa, contabilizando os títulos públicos que compõem essas carteiras pelo seu valor de face, pelo seu valor de resgate, pelo seu valor final.

Todos sabemos que esses títulos públicos, as chamadas LFTs, ou Letras Financeiras do Tesouro, têm um prazo para serem resgatadas, de seis meses, um mês ou de um ano. Há diferentes prazos para o resgate dessas Letras e, evidentemente, a maior ou menor distância para a época de resgate acaba por estabelecer um valor maior ou menor de mercado para a troca desses títulos ou dessas Letras.

Portanto, no mercado, esses títulos têm valores diferentes daquele final, de resgate, de face, daquele declarado por escrito na face do título. O Banco Central fez uma operação pura e simples de transparência. O que o Banco Central fez foi determinar aos bancos que não mais iludissem os seus clientes, que não mais criassem valores falsos na contabilidade dos seus fundos de renda fixa, não produzissem números enganosos para a aferição e avaliação dos seus clientes aplicadores e investidores.

O Banco Central determinou que as carteiras desses bancos, que dão lastro aos fundos de investimento, de renda fixa, simplesmente atualizassem pelo valor de mercado. Ou seja, a cada dia ou a cada fase, os títulos têm que ser contabilizados para o fundo pelo valor que têm de venda no mercado financeiro. Com isso, evidentemente, muitos dos fundos foram obrigados a reduzir o valor da sua rentabilidade, uma vez que, até então, usavam valores que não eram verdadeiros.

Qual é a acusação que posso fazer ao Banco Central neste caso? A de que este Banco determinou transparência? Determinou que se estabelecesse a verdade dos fatos? O Banco Central, ao exigir que os bancos não enganassem os seus clientes, praticou algum dano ao País? Não. O que este Banco fez foi exigir lisura, transparência, clareza, visibilidade inquestionável dos fundos. Foi isso o que o Banco Central determinou.

Como esse fundos não estavam atualizados, não apresentavam números realísticos, compatíveis com as tendências de mercado, ocorreu que muitos deles tiveram de reduzir as suas margens de contabilidade em 3%, 4% e, é claro, os seus clientes passaram a ter perdas a partir daí. Mas essas perdas resultaram do quê? Da iniciativa do Banco Central de exigir transparência ou da permanente, tradicional e usual manipulação de dados e de contabilidade desses fundos, que valorizavam as cotas pelos chamados valores de face e não pelos valores de mercado? Parece-me que essa é a questão que tem que ser levantada.

Ao invés de assestar as baterias contra o Banco Central, deveríamos questionar alguns bancos estatais, já que na lista apresentada pela Folha de S.Paulo 90% são bancos estatais - tanto dos Estados, quanto do Governo Federal. Esse bancos estatais lidam com fundos de renda fixa que foram os maiores perdedores, pois tinham em suas carteiras um volume maior de títulos públicos. Além disso, criaram valores para traduzir a rentabilidade dos fundos em total desacordo com a realidade.

Sr. Presidente, esses fatos precisam ser esclarecidos.

No entanto, não pode calar uma pergunta: é verdade que alguns bancos tiveram informação privilegiada e, antes dessa medida ter sido implantada, buscaram proteção naquilo que se chama o hedge em dólar? Compraram dólar no mercado, buscando proteção para as suas perdas em relação aos fundos?

Se os bancos tiveram informação privilegiada, se contaram com esse elemento de insight information, de informação interna, então estamos diante de um favorecimento escandaloso aos principais bancos brasileiros e, evidentemente, condenável.

E não fazemos este registro apenas porque entendemos que esta é uma hora em que a clareza das informações, a explicitude dos fatos, a visibilidade das finanças públicas são garantias de confiança. Nosso País só terá a confiança dos investidores externos e internos, se tivermos perfeita clareza dos dados e dos elementos de informação.

Um mercado financeiro sem essa clareza, sem essa visibilidade, sem essa transparência pode acabar dando margem ao surgimento dessas fraudes, dessas práticas indecorosas de informações privilegiadas que levam a lucros exorbitantes.

No momento em que os bancos, movidos pelo afã, pelo desejo de rapidamente corrigirem suas perdas, buscaram o dólar para se proteger provocaram uma alta contundente e inegável do dólar.

Há também um componente político a gerar essa desconfiança, essa atitude de fuga daqueles que detêm o capital em real para se proteger no dólar? Essa pergunta deve ser objeto de uma séria reflexão.

Se os investidores externos ou internos estão desconfiando de procedimentos do Governo que haverá de se instalar no dia 1º de janeiro, eleito no dia 6 ou 27 de outubro, devemos nos perguntar se os candidatos à Presidência da República estão sendo suficientemente claros, inequívocos, induvidosos nas suas colocações quanto ao tratamento que darão ao problema da dívida interna, da dívida mobiliária, da dívida em títulos públicos do Governo brasileiro. Essa é uma questão importante.

Muito mais do que discutirmos se a culpa por essa situação cabe ao Lula, ao atual Governo, a ações do Banco Central ou a uma possível vitória eleitoral do candidato que está postado na posição mais à esquerda do espectro político, que é o candidato do PT, devemos - esta é a nossa responsabilidade - exigir, recomendar, intensificar por todos os meios, no interior dos partidos políticos, o debate em torno dessa clareza, dessa explicitação indiscutível: o que irão fazer os eventuais futuros Presidentes da República? Como os candidatos tratarão a dívida brasileira, a dívida interna, principalmente? Porque ela também supõe segurança para os investidores.

É preciso que os quatro candidatos, não só aquele que está na melhor posição das pesquisas, façam documentos definitivos de compromisso público, de compromisso formal e aberto perante a Nação sobre qual será o tratamento que darão à questão da dívida pública.

De um lado, essa medida tem o mérito e o efeito de tranqüilizar os investidores e, por outro lado, dá clareza aos eleitores na sua escolha, nas opções que vierem a fazer. Se os candidatos tratarem com meias palavras, com escamoteamento, com uma simples sugestão ou uma espécie de contorno verbal em torno daquilo que de fato e efetivamente pretendem; se fizerem apenas o jogo de cena e de aparências e forem absolutamente avaros no fornecimento de informações claras sobre o que pretendem fazer, com certeza, a desconfiança aumentará, o risco-país Brasileiro aumentará e, evidentemente, a situação de insegurança também. Com isso, subirá o dólar, haverá uma corrida contra as reservas cambiais brasileiras, com grave prejuízo às finanças públicas brasileiras e, naturalmente, com grave prejuízo a todo o povo brasileiro.

Sr. Presidente, proponho aos partidos políticos que se estabeleça esta exigência de os quatro candidatos elaborarem documentos cabais, indiscutíveis, claríssimos, sem nenhuma ponta de dubiedade, expondo ipsis litteris, verbo ad verbum, exatamente aquilo que pretendem fazer no campo do tratamento da dívida interna brasileira. Penso que seria um ato patriótico, em favor do País, se o candidato do Governo e os candidatos da Oposição assim procedessem, Sr. Presidente, porque isso daria garantias e estabilidade ao processo e permitiria que vencesse o melhor, independentemente do julgamento, das ameaças ou sequer das aferições que venham a fazer agentes estrangeiros.

Obrigado a V. Exª.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/2002 - Página 11903