Discurso durante a 92ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Satisfação com o entendimento entre o Partido Liberal e o Partido dos Trabalhadores, que possibilitou a definição do nome do Senador José Alencar como candidato a vice-presidente da República na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. ELEIÇÕES. POLITICA EXTERNA.:
  • Satisfação com o entendimento entre o Partido Liberal e o Partido dos Trabalhadores, que possibilitou a definição do nome do Senador José Alencar como candidato a vice-presidente da República na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva.
Aparteantes
José Alencar, José Fogaça, Roberto Saturnino, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/2002 - Página 12774
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. ELEIÇÕES. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ELOGIO, ENTENDIMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO LIBERAL (PL), PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), INDICAÇÃO, JOSE ALENCAR, SENADOR, CANDIDATURA, VICE PRESIDENCIA, COMPOSIÇÃO, CHAPA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, UNIÃO, JOSE ALENCAR, SENADOR, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, REPRESENTAÇÃO, EMPRESARIO, TRABALHADOR.
  • COMENTARIO, DISCURSO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), COMBATE, IMIGRAÇÃO, MANUTENÇÃO, MURO, SEPARAÇÃO, TERRITORIO, PREJUIZO, NEGOCIAÇÃO, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA).
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, DESTINAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL, DESNECESSIDADE, CONSTRUÇÃO, MURO, CONTENÇÃO, TERRORISMO, SEPARAÇÃO, TERRITORIO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Ronaldo Cunha Lima, Sras e Srs. Senadores, uso da palavra, em primeiro lugar, para saudar o Senador José Alencar, do Partido Liberal, pelo entendimento concluído ontem, depois de enormes esforços, entre o Partido Liberal e o Partido dos Trabalhadores. Inclusive avisei o Senador José Alencar que faria este pronunciamento hoje, em nome da Liderança do Partido dos Trabalhadores. Sou Líder do Bloco da Oposição, de que fazem parte o PPS e o PT, mas falo hoje em nome do Partido dos Trabalhadores, respeitando o PPS, que nesta Casa represento também, mas que tem em Ciro Gomes o seu candidato à Presidência.

Senador José Alencar, considero muito importante para os destinos do Brasil o entendimento que o PT acaba de concluir com o PL. Desejo ser o mais sincero possível porque, quando em diversas ocasiões perguntado, afirmei não que considerasse essencial para a vitória de Lula que houvesse esse entendimento, mas pude compreender o extraordinário esforço realizado por Lula, o nosso Presidente de honra, para chegar a esse entendimento. Respeitei e compreendi que o Lula acabou tendo uma interação e uma afinidade muito produtiva com V. Exª.

À medida que ambos se conheceram, V. Exª pôde trocar idéias com o Lula e, mais do que isso, relatar a ele a sua experiência como empresário não apenas em Montes Claros, mas na Paraíba, no Rio Grande do Norte e no Paraná, onde fez questão de mostrar as suas empresas e o seu relacionamento com 16 mil trabalhadores empregados nas empresas em que V. Exª é o principal acionista. V. Exª relatou também os diversos esforços que empreendeu ao longo de sua vida, desde o início, quando ainda tinha uma origem modesta e um empreendimento comercial que foi pouco a pouco crescendo.

Foi muito importante que pudesse V. Exª ter esse diálogo com um dos principais líderes da história do movimento sindical do Brasil e que nos anos 60 e 70 desenvolveu a idéia da necessidade de os trabalhadores se organizarem para discutir com os empresários a melhoria de seus salários, de suas condições de vida no ambiente de trabalho. Assim, nos anos 70, início dos anos 80, os trabalhadores foram à frente, com muito acerto, reivindicar melhores salários, principalmente porque naquele momento a economia crescia e havia ganhos em produtividade muito aquém do aumento salarial. Então, observado o distanciamento entre o enriquecimento de empresários e o progresso dos trabalhadores, perceberam os processos injustos, se organizaram e realizaram greves.

Naquele momento, Lula obteve extraordinária experiência no diálogo com os empresários. Lembro-me bem, porque acompanhei de perto, quando Lula disse aos representantes da Fiesp, na época Luís Eulálio Bueno Vidigal, que era necessário conversar não só com o Diretor de Relações Industriais, mas, e sobretudo, com os principais dirigentes, com o presidente da empresa, com o Presidente da Fiesp. Foi então que ele se sentou com o Presidente da Fiesp.

Nessa ocasião, os empresários avaliaram que seria interessante utilizar instrumentos do Estado, tanto do Ministério do Trabalho, do Ministério da Justiça quanto da Justiça trabalhista, para cercear os direitos dos trabalhadores. Então, houve o episódio da intervenção nos sindicatos, a prisão dos líderes dos trabalhadores, inclusive de Lula e de 13 líderes dos trabalhadores, por 40 dias aproximadamente. Durante esse processo, os sindicatos tomaram consciência da necessidade de não só lutar por melhores condições de vida e de salários, mas também se interessar pela questão do poder. Afinal, quem definia as diretrizes de política econômica? Quem definia se um sindicato iria ou não sofrer intervenção? O Executivo? O Ministro do Trabalho? No Poder Judiciário, quem dialogava, se eles estavam sofrendo intervenção, se estavam sendo presos?

No final dos anos 70, Lula e seus companheiros chegaram à conclusão que deviam formar um partido dos trabalhadores. Já em 1976, em diálogo público que mantive com Lula, no calçadão da Barão de Itapetininga, ele manifestou a importância de os trabalhadores se organizarem em um partido, um partido de trabalhadores, para, assim, participar das decisões da vida política nacional.

Eis que em 10 de fevereiro de 1980, foi fundado o Partido dos Trabalhadores. Tal como inúmeros professores, profissionais liberais, que pensavam nas questões relativas à construção de uma Nação em que todos os segmentos pudessem dialogar, senti-me honrado e feliz por ter sido convidado para ingressar no PT desde a sua fundação.

Senador José Alencar, sabemos todos das dificuldades, sabe V. Exª e sabemos todos nós que acompanhamos de perto o diálogo que se desenvolveu entre o Presidente do PT, Deputado José Dirceu; o Presidente de Honra do Partido, Luís Inácio Lula da Silva; o Presidente do PL, Partido de V. Exª, Deputado Valdemar Costa Neto; o Líder do PL, Deputado Federal Bispo Rodrigues; V. Exª mesmo, o Deputado Luiz Antonio Medeiros e outros. Sabe V. Exª que, no nosso próprio Partido, houve enorme polêmica quanto a nos aliarmos ao PL, onde estão representantes de entidades evangélicas, da Igreja Universal. A Igreja católica se indaga: o PT estará junto com o PL, onde estão representantes da Igreja Universal? Por mais ecumênicos que sejam os cristãos de cada uma das igrejas, não estão tão unidos politicamente. Assim, houve muita polêmica quanto a isso.

Eu avalio que o resultado seja um verdadeiro casamento. Por isso a imagem shakespeariana colocada por Lula, pois, nesses últimos dias, V. Exª e Lula estavam como Romeu e Julieta, somente faltando os pais de ambos - aí significando os partidos e as suas bases - darem o consentimento para se casarem.

Quero cumprimentar V. Exª, Senador José Alencar, porque tanto V. Exª quanto Lula avaliaram que se trata de algo muito positivo para o Brasil. Eu considero que a visão de V. Exª - como empresário e como um dos principais dirigentes da Federação das Indústrias de Minas Gerais - e o diálogo que manteve com Lula nesse período foi muito interessante, foi um diálogo de aprendizado mútuo, que será útil para a sociedade brasileira. A presença de V. Exª, seja na Federação das Indústrias de Minas Gerais, onde Lula esteve, seja na Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul, seja na Firjan, ao lado de Lula, proporcionou certamente um diálogo de maior profundidade e de respeito mútuo entre as partes, entre Lula e os demais empresários, seja da indústria, do comércio ou da construção. Isso resultou numa interação bastante positiva. Ainda ontem, em seu depoimento sobre as diretrizes externas de seu futuro governo perante a Comissão de Relações Exteriores do Senado e da Câmara, em reunião conjunta, Lula lembrou de episódios históricos ao mencionar a relação do Governo brasileiro com os governos das superpotências. Quando começou o diálogo com as representações empresariais, por exemplo, na Fiesp, no terceiro ou quarto encontro, Lula observou que o Presidente da Fiesp sentava-se numa cadeira mais importante, mais no alto, e os trabalhadores em outras cadeiras. Ele se deu conta de que não havia razão para os trabalhadores estarem em posições inferiores às dos empresários, já que o diálogo teria de ser de igual para igual. Essa percepção do Lula, sua inteligência, perspicácia, capacidade analítica e política continuam.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - V. Exª me permite um aparte, antes de concedê-lo ao Senador José Alencar?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com muita honra, Senador Roberto Saturnino.

Permita-me apenas dizer que eu estava dialogando há pouco com o Senador José Alencar, e S. Exª fez uma observação, no diálogo com alguns companheiros do PT, semelhante à que todos nós temos em mente diante da beleza de Romeu e Julieta, que foi lembrada por Lula. Romeu e Julieta termina em tragédia. Mas o que desejamos - quero aqui expressar meu sentimento sincero - é que esse casamento seja realmente em benefício do Brasil. Que essa aliança de V. Exª e do Lula e o Partido dos Trabalhadores seja a realização daquilo que V. Exª tem apregoado, porque será benéfica para o Brasil a alternância de poder. Que essa interação entre o PL e o PT signifique, de fato, a realização do grande anseio de justiça de que esta Nação tanto precisa, mas que, infelizmente, nesses últimos oito anos, nas últimas décadas e nos últimos séculos de história do Brasil, não foi alcançado.

Embora o Governo Fernando Henrique Cardoso tenha alcançado resultados, como diminuir a inflação, possibilitando maior estabilidade dos preços, criando um ambiente mais adequado para a realização de investimentos, no que diz respeito ao aspecto de realização de justiça, este Governo deixa muito a desejar.

Ouço V. Exª, Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Eduardo Suplicy, quero unir minha voz à de V. Exª para saudar o acordo feito entre o PT e o PL, entre Lula e José Alencar. Esse acordo, Senador, ficará na história do Brasil como a formação de uma unidade essencial para o bom encaminhamento do destino do País. V. Exª fez referência ao depoimento, ontem, de Lula na Comissão de Relações Exteriores, onde estive presente. Há tempos, todos temos consciência de que o grande estrangulamento da economia brasileira está no setor externo, na relação com as demais economias do mundo e com o capital financeiro internacional. Fica claro, cada vez mais, que a abertura só se fará pela negociação, por parte do Brasil, com firmeza e dignidade, sem a habitual subserviência que estamos a assistir, mas, ao contrário, respeitando os contratos, as regras estabelecidas. Entretanto, é preciso que, na renovação desses contratos, em qualquer oportunidade que se abra para o diálogo entre a economia brasileira e qualquer outra, a voz da representação brasileira se faça ouvir com firmeza, altivez, dignidade e com o respeito que a Nação merece. E é esta a especialidade do Lula. Ele se tornou uma liderança política importante no País, na América e no mundo exatamente por possuir esse saber, essa intuição, essa ciência da negociação, que sempre exerceu com muita competência. Esta é a grande qualidade que se está a exigir do próximo presidente brasileiro: que seja uma pessoa de estatura elevada na negociação, no conhecimento da realidade brasileira e na representação brasileira com altivez, com dignidade, com consciência do interesse brasileiro, com competência e com saber, qualidades que Lula possui. Esse saber da negociação e essa consciência da importância do Brasil, da dignidade da Nação brasileira e, digamos, do cacife da nossa economia, que é grande e não está sendo bem utilizado, esse mesmo saber possui o Senador José Alencar. Esse acordo significa a consolidação do saber da negociação com a unidade entre um representante da classe trabalhadora e um representante da classe empresarial, ambos brasileiros, ambos altamente respeitáveis, altamente competentes e profundamente conscientes de que a negociação tem de ser feita em outros termos. Dessa forma, o Brasil encontrará o caminho do seu destino feliz e da grandeza que a Nação tem em potencial. O Senador José Alencar, com sua integridade, sua respeitabilidade e seu saber, reforçará enormemente a candidatura do Lula. Esse acordo precisa ser saudado. Por essa razão, fiz questão de apartear o discurso de V. Exª, que é extremamente importante e oportuno.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Roberto Saturnino, agradeço o aparte de V. Exª, que fez um diagnóstico correto de que esse entendimento poderá significar, de fato, um caminho luminoso para o Brasil, além de ressaltar a qualidade do depoimento de Lula, ontem, perante a Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal e a da Câmara dos Deputados, presididas, respectivamente, pelo Senador Jefferson Péres e pelo Deputado Aldo Rebello. Lula fez inúmeras considerações, mas eu gostaria de registrar a que se referiu à construção de muros ao longo da história da civilização. Na China, em 221 a.C., foram construídos os primeiros muros para proteger aquele país da invasão de povos nômades e, posteriormente, nos séculos XV e XVI, edificou-se uma muralha de 6.400 quilômetros de extensão, que atualmente tem um sentido apenas turístico e histórico. Disse Lula que poucas edificações construídas pelos homens podem ser vistas pelos astronautas no espaço, e uma delas é muralha da China.

Construiu-se, depois, em 1961, o Muro de Berlim, que permaneceu até 1989, quando foi derrubado, o que foi festejado como mais um passo na aspiração de liberdade e de respeito entre os seres humanos.

Entretanto, após a destruição do Muro de Berlim, surgiu, primeiramente, um muro separando os Estados Unidos da América Latina, ao longo da fronteira com o México, altamente sofisticado - retratado por Sebastião Salgado e mostrado em sua exposição “Êxodos” -, onde, infelizmente, têm sido mortas pessoas em número maior do que o daquelas que tentaram fugir da Alemanha e atravessar o Muro de Berlim.

Esse fato não condiz com as aspirações de liberdade nem mesmo com a idéia de que nos falam os presidentes norte-americanos, que desejam a Área de Livre Comércio das Américas. As grandes empresas multinacionais querem investir seus capitais além das fronteiras e participar de licitações públicas municipais, estaduais e federais no Brasil, em igualdade de condições, com a possibilidade de vender seus bens e serviços através das fronteiras sem barreiras. Mas, para o ser humano, há cada vez mais dificuldade de locomoção, contrastando com o que antes representava a América, para onde se dirigiam, às vezes perseguidos por motivos religiosos, aqueles que desejavam “fazer a América”, quando não havia nenhuma barreira para o leste ou para o oeste - tanto que a França doou aos Estados Unidos a Estátua da Liberdade, que está em Manhattan, para simbolizar isso.

Por outro lado, esse fenômeno é mais recente porque o governo de Israel resolveu construir um muro de 364 km muito sofisticado, com diversas barreiras de arame, concreto e células eletrônicas por um milhão de dólares cada qual dos quilômetros, mais um gasto que não se justifica de maneira alguma. Apresentei à Casa um requerimento que está sendo considerado em primeiro lugar pela Comissão de Relações Exteriores para que seja enviado ao governo de Israel um apelo para que reconsidere a sua decisão de construir um muro para separar o norte do Estado de Israel e a Cisjordânia. Seria importante que pudéssemos fazer um apelo para Israel repensar a forma de conter os que ali estão realizando operações terroristas. É preciso haver outros meios que não o do muro. Esse não é um bom exemplo, tanto é que a Sr.ª Laura Bush disse que não lhe parece uma forma de se alcançar uma paz duradoura. E o Lula ao responder mencionou que é preciso acabar com esses muros. Não com a Muralha da China, pelo seu caráter atual de monumento turístico para o mundo, mas é preciso de fato acabar com esses muros seja ao sul dos Estados Unidos, seja em Israel. E que nem se inicie essa construção.

Senadores Tião Viana, José Fogaça e José Alencar, concederei com toda a honra os apartes, mas me permitam fazê-lo em primeiro lugar ao Senador Tião Viana.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Eduardo Suplicy, quero cumprimentar o expressivo pronunciamento que V. Ex.ª faz em nome da Liderança do Partido dos Trabalhadores no Senado Federal e dizer da alegria que vivemos nesse momento de consolidação da chapa que está disputando a Presidência da República do Brasil na figura de Lula como candidato a Presidente e o Senador José de Alencar, a Vice-Presidente. Entendo que essa oportunidade de consolidação da chapa traduz um sentimento que foi lucidamente expressado pelo Presidente do PT, Deputado José Dirceu há pouco dias, diante da ameaça que vivemos do sentimento de soberania nacional, de nação pela interpretação que analistas e especuladores têm feito da política brasileira. Recentemente um especulador disse que o Brasil não votaria nessas eleições, mas sim os americanos e que seria como no Império Romano onde quem decidia eram os romanos. Estamos dando um grito de liberdade, de sentimento e de nação reafirmando a nossa necessidade permanente de soberania nacional A chapa Lula-José de Alencar consolida isso e traduz o que o Presidente José Dirceu tentou expressar com uma ampla coalizão nacional, envolvendo setores políticos, empresários e a sociedade brasileira, defendendo em primeiro lugar o povo brasileiro, com um sentimento muito especial, inarredável nesse momento da decisão política. Vamos governar no início de um novo milênio, em que as relações multilaterais precisam ver um país como o Brasil fortalecido, assumindo o seu papel de líder dentro da América do Sul, do cenário internacional e recuperando a sua auto-estima para fortalecer a tese de uma ética internacional que se opõe à atitude absolutista que tem tido o poderio internacional, que é desfavorável à independência, ao enriquecimento e à justiça entre as nações. Eu entendo que essa chapa traduz esse sentimento. O Senador José Alencar, em todos os dias do seu mandato, procura apresentar a honradez como um vetor da sua vida parlamentar. Em todos os momentos em que se referiu à sua vida, ao seu passado, falou neste plenário com absoluto orgulho de que a sua honradez sempre foi entendida como um órgão vital em sua vida, o que é muito importante para a história do Partido dos Trabalhadores. O PT tem exigência absoluta de ética, coerência e respeito a um modo de fazer política pensando no povo brasileiro, numa ação participativa popular e no enriquecimento da nossa Nação. Eu entendo que essa junção em uma chapa com o Senador José Alencar e com o Partido Liberal fortalece, pela sua biografia, esse sentimento. Eu fico extremamente feliz e entendo que podemos consolidar nessa grande decisão, que será a eleição de outubro, a ética como o sentimento mais forte da vida pública do povo brasileiro para esse momento. Parabéns pelo seu pronunciamento e pela escolha do nosso partido.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Senador Tião Viana. V. Exª expressa aqui também uma percepção importante da convivência com o Senador José Alencar, o seu empenho, o reconhecimento e de como avalia que esse entendimento poderá ser produtivo no interesse maior desta Nação brasileira.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Ouço com prazer V. Exª.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Senador Eduardo Suplicy, cumprimento V. Exª e o seu partido. V. Exª está fazendo um pronunciamento moderado, carregado de bom senso, cheio de cuidados em relação a um processo político bastante delicado que é o de congregar partidos tão diferentes como o PT e o PL. Quero dizer a V. Exª que sou relator de emenda constitucional cujo teor central é a defesa incondicional deste direito, de os partidos se autodeterminarem quanto às coligações que bem entenderem fazer. Mas essa coligação do PT com o PL não é só uma demonstração prática e concreta de que os partidos podem e devem fazer as coligações que bem entenderem - porque o importante são os objetivos de uma coligação. Mas também demonstra o quanto temos razão em não aceitar a verticalização das coligações. O que faço aqui é um registro, apenas um registro do que está publicado nos jornais e do que foi publicado nos jornais ao longo dos últimos meses. No Rio Grande do Sul, li declarações formais de lideranças do PT contrárias a essa coligação. E tive oportunidade de ler também declarações formais de representantes do PL contrárias a essa coligação. O que faz ressaltar. Senador Suplicy, a importância de respeitar a história dos partidos nos Estados. Isso não se aplica somente ao PT e ao PL, aplica-se também a outros partidos, PMDB e PSDB, PDT e PTB. É preciso reconhecer que em cada Estado há uma história política autônoma. E essa história política dos partidos tem que ser respeitada. O erro não está em o Lula fazer acordo com o Senador José de Alencar; não é esse o erro mas quando Lula faz acordo com José de Alencar obriga a que partidos tão divergentes como o PT e o PL do Rio Grande do Sul se limitem pelo guarda-chuva político e legal que essa coligação lhes estabelece e lhes impõe. Tenho certeza de que os dois partidos regionais estarão se sentindo dentro de uma camisa de força política que não existiria se não houvesse a decisão do Tribunal Superior Eleitoral normatizando as verticalizações. Portanto, minha crítica não é à coligação do PT com o PL, pois defendo que o meu Partido, o PPS, também faça coligações tão abrangentes quanto necessárias para atingir seus objetivos políticos, desde que se voltem para objetivos políticos honestos e comprometidos com o interesse público, com o interesse nacional. Chamo a atenção, neste momento, para o quanto é estapafúrdia, descabida e contrária à natureza histórica dos partidos políticos a necessidade da verticalização. Tenho certeza de que recai também sobre o PT e o PL, nos Estados onde há divergência, a viva sensação, a viva experiência clara e concreta de que a verticalização não colabora, de forma nenhuma, para a uniformidade política. Nos Estados, esses partidos caminharão separados e terão dificuldades para administrar a questão quando chegarem ao processo eleitoral. Isso vale para todos os partidos - PMDB, PDT, PTB; PPB, PPS, PL, PT, PFL. Em primeiro lugar, é preciso que haja o direito de fazer a coligação que bem entendem. Depois, há que se respeitar a história política vivida pelos partidos em cada Estado. Obrigado a V. Exª.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Senador José Fogaça.

Senador Ronaldo Cunha Lima, vou atendê-lo. Permita-me apenas conceder também ao Senador José Alencar o aparte final. Quero transmitir ao Senador José Fogaça que nós, do PT e do PPS, apoiamos o seu parecer. Ainda há pouco, o Senador José Agripino Maia nos disse que, com tal decisão, acaba perdendo a possibilidade de ter um primeiro suplente do PL em sua chapa para o Senado. No Estado do Paraná, decidiu-se pela não-coligação com o PL. No Estado do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra e Genro Tasso pronunciaram-se criticamente. No Estado de Alagoas, nossa candidata é a Senadora Heloísa Helena. Tenho a convicção de que S. Exª vai brilhar muito nestas eleições, como tem sido aqui no Senado, e vai ser eleita Governadora do Estado. Ali o PT votou pela não-coligação com o PL.

Se o seu projeto, que já aprovamos no Senado, tramitar com rapidez na Câmara, haveria possibilidade de este desejo expresso por V. Exª ser respeitado.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Concedo um aparte, com muita honra, ao Senador José Alencar.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Eminente Senador Eduardo Suplicy, pedi a V. Exª que me concedesse esta oportunidade, primeiro, para levar uma palavra de agradecimento a toda essa sua manifestação a respeito da aliança que acabamos de acertar e que será homologada no próximo domingo pela convenção nacional do nosso Partido, o PL. Quero também levar uma palavra de agradecimento aos eminentes Senadores Roberto Saturnino, Tião Viana e José Fogaça pela participação nos debates do tema trazido à tribuna por V. Exª. Nós, realmente, ontem tivemos uma reunião importantíssima, na qual se consolidou a idéia da coligação entre o PT e o PL. Dessa reunião participou pessoalmente o eminente candidato à Presidência da República, Luís Inácio Lula da Silva, Presidente de honra e fundador do Partido dos Trabalhadores, ao lado do Presidente do PL, Deputado Valdemar da Costa Neto e do Presidente do PT, Deputado José Dirceu. Também estiveram presentes a eminente Deputada Maria do Carmo Lara, Presidente do PT em Minas Gerais, assim como o Deputado Nilmário Miranda, candidato posto pelo PT a Governador de Minas Gerais, bem como o Deputado Tilden Santiago, que também tem seu nome posto como representante do PT para disputar uma das vagas do Senado Federal nas próximas eleições. Além de S. Exas, havia a presença de outras Lideranças, não só Deputados, como também assessores de ambos os partidos. Naquela reunião ocorreu um episódio que é também histórico, como histórica é a aliança que se confirmará agora, se Deus quiser, no domingo 23, da parte do PL, e mais no fim do mês - parece-me que dia 28 - da parte do PT.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador José Alencar, eu gostaria de reiterar - o Presidente José Dirceu o fará - a minha sugestão de que V. Exª venha ao Diretório Nacional no dia 28 para dialogar conosco. Farei a sugestão ao Deputado José Dirceu, conforme já lhe havia comunicado, para então dialogarmos até mesmo antes da consolidação da decisão. Acho que será muito produtivo.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Muito bem, estarei presente, atendendo ao honroso convite. Como eu estava relatando, aconteceu naquela reunião um fato muito significativo. O Lula havia estado na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, onde fez uma palestra. Depois disso, teve outros compromissos - parece-me que de almoço, na CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - e alguns outros que o levaram a chegar àquela reunião por volta de 5 horas da tarde. Ele já estava com a passagem e check in, pronto também para embarcar num vôo das 19 horas para São Paulo. Tínhamos pouco menos de duas horas para a reunião, das quais teriam que ser retirados no mínimo 40 minutos, o tempo de transportá-lo dali para o aeroporto. No fim, conversamos por cerca de uma hora e dez minutos e sentimos suceder, naquele momento - e aí a razão pela qual estou trazendo esta informação -, a verdadeira razão pela qual, surpreendentemente, a coligação foi acertada. É que, anteontem, as notícias não eram boas em relação à viabilidade da coligação. Tudo isso por força das dificuldades impostas pela legislação de verticalização, de que falou muito bem o Senador José Fogaça. E V. Exª até trouxe um exemplo. Há cerca de uma hora, veio cumprimentar-me o meu eminente amigo e eminente Senador José Agripino, do Rio Grande do Norte, desejando-me boa sorte, ainda que tivesse perdido o seu candidato a primeiro suplente, nada menos que o Dr. João Maia, que é um dos mais brilhantes quadros do nosso Partido, o PL. Pois bem, voltando ao episódio que considero de relevância muito grande, ...

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Histórica.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - ... histórica, anteontem correu a notícia a coligação estava praticamente inviabilizada. Toda a Imprensa Nacional repercutiu a inviabilidade da aliança, e o fez de forma a demonstrar, por meio de artigos publicados, editoriais, notícias, entrevistas e matérias outras que no Brasil estava havendo uma grande frustração. Frustração nacional, de 70% da sociedade brasileira, que deseja a alternância de poder. Estes 70% estão retratados em todas as pesquisas publicadas em todos os institutos de pesquisa, porque o Brasil não pode dar continuidade a essa política que aí está: a de empobrecimento nacional, trazendo total desesperança para jovens que não encontram, em um País tão rico como o nosso, condições de se realizarem. Eles vão buscar outros países, alguns de menor potencialidade que o nosso e, em alguns casos, até clandestinamente, invertendo o fluxo migratório. Nós todos somos descendentes de migrantes que, no passado, viram no Brasil a verdadeira terra prometida: portugueses, espanhóis, italianos, alemães, asiáticos não só do Oriente Médio como do Extremo Oriente, como japoneses principalmente.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Africanos também.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Sim, e quantos! Daí porque construímos, no Brasil, essa raça miscigenada que nos oferece condições de sermos versáteis, inclusive dando motivos para especialistas do mundo inteiro observarem a inteligência e a versatilidade do nosso povo. Pois bem, nós invertemos esse fluxo migratório e estamos exportando jovens, que não encontram futuro em um País de dimensões continentais como o nosso; de riquezas imensuráveis, não somente de subsolo, mas de solo, de fotossíntese. E mais: 8 mil Km de costa; 200 milhas de mar territorial; um território de 8,5 milhões de km2 que se eleva a mais de 10 milhões de km2, se considerarmos as 200 milhas de mar territorial em toda essa extensão. Terra de clima adorável. É um privilégio nascer e viver neste País! Então, há tudo isso. Mas 70%, retratados nas pesquisas, querem mudanças, querem alternância de poder. É a soma que possuem os candidatos de Oposição. E pertencem, os três, a Partidos que retratam mais uma posição à esquerda, como é o caso do PT, do PSB e do PPS. Havia uma frustração no ar. Além disso, as notícias, todas, mostravam que a não realização da aliança significava um fracasso para o PL, assim como também para o próprio PT, sem prejuízo da vitória de Lula. Eu concordo com V. Exª, pois a vitória de Lula não dependeria nunca dessa aliança. Eu acredito que essa vitória está assegurada porque é isso que a sociedade brasileira deseja. Há os que acreditam que o Lula seja um perdedor - são pessoas que não tem capacidade de observação, por uma razão muito simples: o Lula é um homem simples, que vem de uma origem humilde, e é um gigante do ponto de vista político: construiu uma vida voltada para a atividade política das mais vitoriosas de toda a História Republicana brasileira. É um homem que disputou a sua primeira eleição à Presidência da República em 1989, e saiu dela vitorioso. Por quê? Disputou com nada menos do que o saudoso Dr. Mário Covas, o saudoso Dr. Ulysses Guimarães, o nosso grande mineiro Dr. Aureliano Chaves, o Dr. Leonel Brizola, o Dr. Guilherme Afif Domingos, o Dr. Paulo Maluf, Dr. Enéias, enfim, todos esses disputaram com o Lula e com o Collor a eleição de 1989. É só perguntar quem foi a segundo turno. Portanto, o Lula superou a todos esses grandes nomes nacionais, sem nenhum desapreço a eles, mas foi uma vitória de Lula. Em 1994, Lula não perdeu a eleição para o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Perdeu a eleição para o Plano Real. Não havia quem pudesse vencer uma eleição diante do Plano Real, porque acabou com a inflação no Brasil. Em 1998, o mesmo caso. E mais: uma reeleição da Presidência da República. Então, Lula é um vitorioso! Além disso, naquele momento, havia também a conscientização - daí o fenômeno - dos companheiros do PL e os do PT, que estavam ali presentes e que estavam em seus Estados, com os quais foram feitos alguns contatos.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Permite-me V. Exª acrescentar algo?

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Certamente.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - O Presidente, Senador Ronaldo Cunha Lima, certamente há de compreender que o Senador José Alencar está trazendo um depoimento histórico de grande relevância e de enorme interesse para todos os brasileiros. Houve um papel que me parece fundamental do Governador Itamar Franco, nestes últimos dias, que talvez V. Exª possa inserir em sua análise.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Pois não. Complementando esse episódio, que considero histórico e da maior relevância, é que o noticiário, frustrante, os artigos, os editoriais, as notícias frustrantes publicadas pela mídia, ontem, em razão da frustração de anteontem, trouxeram conscientização dos companheiros, que abriram mão dos interesses particulares de cada Estado ligados a alianças impossíveis, em face da verticalização. Um casuísmo grosseiro, imposto extemporaneamente, desrespeitando inclusive dispositivo constitucional. Essa conscientização foi que nos levou à decisão de não recuarmos ao obstáculo trazido pela verticalização. E assim, por exemplo, João Maia, de quem estávamos falando, entrou em contato conosco, dizendo que seria sacrificado, mas que abriria mão e não teria nenhum problema, porque estaria aplaudindo a aliança em nome deste objetivo maior de alternância de poder no Brasil. Havia também uma manifestação de um grande Deputado do Mato Grosso Welinton Fagundes, que tinha sido convidado para ser vice-Governador na chapa do nosso eminente colega Senador Antero Paes de Barros, com o apoio do eminente Governador Dante de Oliveira, que tem hoje uma posição invejável no seu Estado, pelo trabalho admirável que lá realizou. Então, aquilo era a verdadeira nomeação do Deputado Welinton Fagundes na chapa do Senador Antero Paes de Barros. S. Exª não poderia mais viabilizar isso, e queria deixar de ser Deputado - S. Exª está na sua terceira eleição - e voltar para o seu Estado. S. Exª abriu mão e fez pronunciamento, o que demonstrou o desprendimento dele em favor desta aliança que amplia as forças que desejam implantar no Brasil um novo rumo, que nos devolva o sentimento nacional, a sensibilidade social e a intransigência em relação à improbidade no trato da coisa pública. Todos esses três fatores - sentimento nacional, sensibilidade social e probidade - estão presentes na figura de Luiz Inácio Lula da Silva, que disputou três eleições presidenciais e não possui um arranhão sequer que lhe macule, nem de leve, o seu comportamento ético e moral. Um homem acreditado como sendo de palavra. Tanto é verdade que todas essa notícias de que há um nervosismo de mercado em razão da sua eleição não é verdade. Qualquer nervosismo que haja ou é provocado para maior especulação ou é porque os banqueiros credores do Brasil conhecem a fragilidade e total vulnerabilidade a que foi levada a economia brasileira por força dessa política equivocada que coloca - e V. Exª, que é economista, sabe disso - em prática uma política monetária restritiva de taxas de juros, não altas, mas simplesmente onzenárias, impossível de serem remuneradas por qualquer economia por longo tempo. Nenhum economista por mais arraigado monetarista que seja, como por exemplo, Milton Friedman, adota ou recomenda uma política monetária restritiva por longo tempo. Achatamos o consumo da sociedade brasileira. Nós nos tornamos um País de subconsumo, com consumo achatado por força das taxas de juros elevadas. Temos de mudar isso sem prejuízo da estabilidade da moeda, porque a estabilidade é a maior conquista, dos últimos tempos, do povo brasileiro e nenhum de nós participaria do Governo com a intenção de perturbar a economia e voltar a conviver com inflação. Não há mais espaço para isso. E ninguém vai transigir em relação à responsabilidade fiscal. Da mesma forma ninguém vai desrespeitar unilateralmente qualquer contrato. Tudo isso é uma falácia. Entretanto, vamos mudar, sim, a economia, porque vamos estabelecer como meta não a inflação, mas o desenvolvimento. Nossa meta vai ser o desenvolvimento realizado por meio da pequena empresa, por intermédio daquilo que os americanos chamam de sweat equity, quer dizer, o capital construído pelo suor, pelo trabalho. Nas pequenas empresas, o esforço de capital representa cerca de 10% em relação ao esforço do trabalho (90%). Na minha vida, assim como na história das civilizações, o capital nasceu depois do trabalho. Digo “na minha vida”! Sou testemunha disto: primeiro nasceu o trabalho para depois formar o capital. Aprendi isso em 50 anos de trabalho ininterrupto cumprindo com os meus contratos. Uma das primeiras conversas que tive como Lula foi com relação à sua intenção. É admirável o comportamento do Lula, mas ele não abre mão, por exemplo, de oferecer às crianças brasileiras tratamento igualitário nas escolas, igualitário na educação, na alimentação e em tudo aquilo que representa o que é necessário oferecer. Nós sabemos fazer conta. O Brasil tem condições de sobra para cuidar disso. Cada ponto percentual da taxa de juros administrada inconseqüentemente, para não dizer “irresponsavelmente”, cada ponto percentual representa R$6,5 bilhões hoje, quase R$7 bilhões por ano. Isso tem que mudar no Brasil; não podemos, de forma nenhuma, conduzir a economia brasileira dessa maneira. Se fôssemos ainda mais honestos do que somos, não podemos dizer que vamos pagar nossa dívida se mantivermos essa política. O empobrecimento da economia brasileira é evidente. Hoje devemos quase 60% do PIB. Nosso passivo externo líquido é de mais de 80% do PIB - e todos sabem que passivo externo líquido, ainda que não seja formado somente de dívidas, demanda divisas para ser remetido e remunerar os investimentos diretos. Quando vendemos uma hidrelétrica ou uma telefônica, aumentamos nosso passivo externo líquido e precisamos remunerar. Agora, por exemplo, as telefônicas pagarão dividendos até mesmo sem obter lucro. Depois de enfraquecer as empresas, será preciso aumentar as tarifas. É isso o que está ocorrendo no nosso País e estamos todos a assistir de braços cruzados. Senador Eduardo Suplicy, não ingressei na vida pública a fim de atender necessidade material minha, mas tentando trazer alguma contribuição oriunda da minha experiência no setor privado. Estou muito tranqüilo ao lado de Lula, que acredito ser um homem de bem, sério, brasileiro que conhece o Brasil. Juscelino Kubitschek foi um dos maiores Presidentes da história republicana, não por ter sido um grande médico. Ao contrário: toda sua obra foi de engenharia. Energia e transporte foram seu binômio. Foi um grande Presidente, porque era um grande político. Lula, da mesma forma, é um grande político. Pode-se formar na universidade um grande cientista político, mas não se pode formar um político, porque este nasce. Quem ensina isso é um poeta brasileiro dos mais populares, um gigante da poesia popular, Noel Rosa. No samba que é seu hino ensina que o “samba é um privilégio que não se aprende no colégio”. Da mesma forma é a política. Não somos iguais. Somos semelhantes, pois somos todos do reino animal, da espécie humana. Apesar de semelhantes, cada um de nós tem sua vocação, sua aptidão, seu modo de ser, seu temperamento. Lula é um político, nasceu político. Ninguém lhe retira essa característica. Ele tem condições excepcionais, por sua comprovada honorabilidade e pelo gigantesco trabalho que realizou de vitorioso no campo político, de realizar um excelente trabalho à frente da Nação brasileira, que precisa ser construída sobre este País rico que Deus nos deu. É preciso que esta Nação recupere seu sentimento de defesa da sua soberania. Estamos subservientes e obedientes, entregando o Brasil. Mas essa política tem de mudar. E ninguém deve ter medo disso. Devemos temer o que está aí. O exemplo próximo que temos, o da Argentina, revela-nos que, conduzindo o País da mesma maneira, poderemos ficar na mesma situação, razão pela qual devemos interromper esse caminho. Precisamos exportar. E isso não gera nenhuma incompatibilidade com o crescimento do mercado interno. Não estamos trabalhando. E os brasileiros querem trabalhar! Os jovens desejam trabalhar! Mas estamos todos proibidos de fazê-lo. Devemos apenas administrar a questão monetária. Essa é a nossa preocupação: a questão monetária se transformou em fim, quando todos sabem que é meio para promover o desenvolvimento. Não podemos, de forma alguma, pensar que estabilidade monetária seja fator de estagnação. Está errado! Sempre quisemos a estabilidade monetária para que as empresas pudessem crescer a longo prazo. Não há como alavancar nossas empresas com recursos de terceiros, porque, se formos a bancos, estaremos condenados à morte. Essa situação não pode continuar. As taxas de juros estão onerando donas de casa em 8% ao mês, o que corresponde a 150% ao ano. Não podemos continuar. Devemos reagir. E a nossa reação dá-se pelo voto democrático. Se o Lula ganhar as eleições, todos os jornais da face da Terra, a começar pelo Le Figaro e o The New York Times, publicarão, na primeira página: “As Esquerdas acabam de vencer as eleições no Brasil”. E haverá, provavelmente, uma segunda manchete: “As instituições democráticas estão consolidadas naquele País”. O texto será de respeito ao Brasil por reconhecerem que assumiu a Presidência da República um brasileiro pelo voto democrático. A alternância de poder é intransigência dos países já consolidados democraticamente. A Inglaterra, após a 2ª Guerra Mundial, teve seu maior herói: Winston Churchill. Entretanto, na primeira eleição que disputou no País, depois da guerra, o povo inglês o derrotou, porque não abria mão da alternância de poder. Precisamos dessa alternância. É urgente! Alguém falou em Partidos. A incompatibilidade entre PL e PT não existe mais. Sabemos que o grande estadista chinês Deng Xiao Ping pronunciou uma metáfora importantíssima sobre a qual a China está construindo a sua abertura econômica: “Não importa a cor do gato, mas, sim, que ele cace o rato”. Essa expressão foi traduzida por cientistas políticos inicialmente na China e por outros até do Brasil da seguinte forma: “Não importa a coloração ideológica, mas, sim, o bem comum”. Atualmente, no Brasil, poderíamos traduzi-la assim: “Não importa a coloração partidária, mas que se alcancem os objetivos sociais”. Então, não há mais esse problema - precisamos esquecer-nos dele. Devemos lutar para salvar o nosso País. Vamos ganhar a eleição para o Brasil. Votar no Lula é votar no Brasil. Nunca postulei a minha participação em sua chapa. Sempre repeti que daria apoio a Lula independentemente de participar de sua chapa como candidato a Vice-Presidente. Da mesma forma, iniciei um trabalho com o Governador do Rio de Janeiro, Sr. Anthony Garotinho, para que houvesse unidade dos partidos de Oposição a fim de ganhar a eleição no primeiro turno. Com relação ao ex-Ministro e ex-Governador do Ceará, Sr. Ciro Gomes, conversei sobre o assunto com o próprio Presidente do PPS, nosso eminente colega Senador Roberto Freire. O meu propósito era construir uma aliança dos partidos de Oposição, que hoje reúnem aproximadamente 70% dos votos, para vencer a eleição do primeiro turno e para governar. Então, não tenho dúvida nenhuma, nobre Senador Eduardo Suplicy, de que estamos no momento mais importante dos últimos tempos da história republicana brasileira. Há a aliança de dois partidos que têm características do ponto de vista ideológico, mas cuja ideologia política de extrema direita ou esquerda é uma imagem do passado. Construiremos isso com probidade, sentimento nacional, sensibilidade social, com responsabilidade no trato da coisa pública e também levando condições para que - uso apenas como uma imagem - os jovens brasileiros se realizem no Brasil. Não somos contra as migrações, mas não aquelas forçadas por uma premência, por uma necessidade absoluta de ganhar alguma coisa. Há engenheiros que se oferecem para trabalhar por dois salários mínimos! O Governo se ufana e diz que não há mais greve por reivindicação salarial, como se isso fosse uma vitória! Não há mais greve porque o trabalhador tem medo de perder o emprego. Se não há emprego, como é que se vai fazer greve? A greve é um movimento de reivindicação salarial absolutamente legítimo. Mas não há por que as coisas irem bem; não há por que elas irem mal. É preciso que meus Colegas também acordem, pois da forma com que tem sido conduzida a economia ela está quebrando a empresa brasileira. E já quebrou, por exemplo, toda a indústria de autopeças no Brasil. Aquelas que eram grandes foram desnacionalizadas e as pequenas fecharam porque esse Governo deu 70% de proteção aduaneira para as montadoras importarem o automóvel e 2% para importarem autopeças, quando a verdadeira indústria automobilística brasileira era a de autopeças. Assim, são contra fatos dessa natureza que nos revoltamos, assim como contra o contrabando de armas sofisticadas e pesadas que estão nas mãos do crime no Rio de Janeiro e em São Paulo, que têm até poder paralelo nas favelas do narcotráfico brasileiro, utilizando-se de armamento a que nem o Exército brasileiro tem acesso. Essa é uma situação que precisamos mostrar para os brasileiros por não ser política partidária, mas brasileira. Temos que voltar a ter a humildade para aprender que nem todos podemos ostentar o nome de Orleans ou de Bragança, mas precisamos valorizar os nossos sobrenomes simples, que poderão ser grandes um dia.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - A generosidade do Senador Ronaldo Cunha Lima permitiu que V. Exª, Senador José Alencar, primeiro, desse um depoimento histórico sobre os entendimentos havidos, sobretudo ontem, entre o PT e o PL.

Em segundo lugar, V. Exª talvez tenha batido um outro recorde, porque acredito que o seu aparte talvez tenha sido um dos mais longos na história do Senado, mas todos o respeitamos pelo seu valor significativo e, certamente, parte desse entendimento entre os nossos Partidos.

Quando V. Exª relembra a beleza do poema e da canção de Noel Rosa, cita que “o samba realmente é um privilégio que não se aprende no colégio”. Em verdade, o Lula é a pessoa que mais tem a vontade de aprender. Está sempre estudando, e os seus filhos já estão na universidade. Como político que é, bem exaltado por V. Exª, Lula tem feito questão de dialogar, nestes últimos anos, por exemplo, com os especialistas da habitação, da energia, da segurança pública. Ele tem se preocupado sobretudo com uma maneira de acabar com a fome e a miséria. Por isso elaborou programas de governo com as suas equipes, que poderá agora colocar em prática.

Ressalto, diante das suas observações, a importância do encontro que teremos na próxima terça-feira na Comissão de Assuntos Econômicos, onde já foi confirmada a presença do Ministro Pedro Malan e do Presidente Armínio Fraga, para dialogar sobre muitos dos pontos que V. Exª levantou e para dizer como nós queremos o bem do Brasil e como queremos fazer, com as nossas proposições, que a todos os brasileiros seja garantido o direito inalienável de participar da riqueza da nossa Nação.

Sr. Presidente, para não abusar mais do tempo, vou deixar as reflexões que faria sobre o pronunciamento do Senador Ramez Tebet para a semana próxima, quando S. Exª aqui estiver presente.

Parabéns, Senador José Alencar, pela sua atitude, pelo casamento, que agora está com o noivado completado, faltando apenas a cerimônia na próxima semana em ambas as convenções. Ressalto que aqui estava presente e preferiu hoje não apartear, mas é importante a sua presença, a Senadora Heloísa Helena, testemunha deste nosso diálogo.

Muito obrigado.


Modelo1 4/19/243:10



Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/2002 - Página 12774