Discurso durante a 94ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com o avanço do narcotráfico no Brasil e em especial, com a necessidade de uma política geoestratégica para a Amazônia. Apelo à Câmara dos Deputados para aprovação de projeto de lei de autoria de S.Exa. que estabelece plebiscito para redivisão territorial nos Estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA. DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Preocupação com o avanço do narcotráfico no Brasil e em especial, com a necessidade de uma política geoestratégica para a Amazônia. Apelo à Câmara dos Deputados para aprovação de projeto de lei de autoria de S.Exa. que estabelece plebiscito para redivisão territorial nos Estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2002 - Página 13004
Assunto
Outros > DROGA. DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • APREENSÃO, AUMENTO, TRAFICO, CRIME ORGANIZADO, COMENTARIO, PRODUÇÃO, ENTORPECENTE, PAIS ESTRANGEIRO, FRONTEIRA, NECESSIDADE, DIVISÃO TERRITORIAL, REGIÃO AMAZONICA, MELHORIA, COMBATE, DROGA.
  • CRITICA, FALTA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, PROGRAMA, REFORÇO, FISCALIZAÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA, COMBATE, DROGA.
  • CRITICA, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEMORA, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, DIVISÃO TERRITORIAL, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), BENEFICIO, MELHORIA, COMBATE, TRAFICO, DROGA, ARMA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, a mídia brasileira escrita e televisionada e as rádios não têm falado ultimamente de outra coisa senão do narcotráfico, verdadeiro Estado paralelo que se estabeleceu principalmente no Estado do Rio de Janeiro.

Hoje houve violento ataque à sede da Prefeitura do Rio de Janeiro, com utilização de armamento pesado detonado sobre vários andares do prédio, o que demonstra - como disse o Prefeito da cidade - que o Brasil necessita de uma operação de guerra para pôr fim no que S. Exª mesmo chamou de “atos de terrorismo organizado”.

Sr. Presidente, qual é a origem de todo esse problema?

Exatamente as vultosas quantias que o narcotráfico movimenta vendendo as drogas não só nas principais cidades do País, mas também nas pequenas cidades. Serve-se do território nacional também como rota para exportação de drogas para os centros consumidores da Europa e dos Estados Unidos.

Mas é importante ver que a droga não está sendo produzida no Brasil, mas, sim, consumida em nosso País e por ele passando, repito, rumo ao exterior.

É produzida principalmente em nossos países vizinhos: Colômbia, Peru, Bolívia e Suriname. Esses Países, que fazem fronteira com a extensa Região Amazônica, têm, como nós, suas fronteiras desguarnecidas. Mantêm uma porteira aberta para que esse comércio continue sendo alimentado, para que continue cada vez maior. Enquanto nós, na ponta, nas cidades, tratamos dos sintomas, as causas estão lá.

Não temos efetivamente uma ação enérgica para quebrar, na entrada, a causa desse grande problema.

Tenho aqui lutado, Sr. Presidente, clamando pela atenção das autoridades federais para a nossa Amazônia, porque a falta de uma política geoestratégica para aquela região vem permitindo que ela tenha sido palco de biopirataria.

Há poucos dias, denunciei, da tribuna, baseado em uma reportagem da revista IstoÉ, o tráfico e a prostituição de menores da região amazônica para a Europa, utilizando principalmente as saídas da Amazônia para o exterior. Tudo isso é resultado do descaso. A causa do problema está no descaso que o Brasil tem para com a sua Amazônia.

Muitos combateram a criação do Sivam, um projeto que pode evitar a continuidade dessa situação com a vigilância, com as medidas adequadas para prevenir e detectar a movimentação de aviões e outros tipos de transporte dentro da região.

Mas existem outras medidas, Sr. Presidente, que precisam ser tomadas. Entre elas, por exemplo, existe o Projeto Calha Norte, que vem sendo praticamente nocauteado pelo Governo Federal. Idealizado na época do regime militar, ficou com o estigma de que seria apenas um planejamento de ocupação puramente militar da Amazônia. Mas o Projeto Calha Norte é interministerial e visa a desenvolver principalmente os municípios situados ao norte do rio Solimões e do Amazonas, englobando, portanto, os municípios dos Estados do Amazonas, de Roraima, do Pará e do Amapá. Esse projeto poderia ser um dos veículos para frearmos essas ações ilegais na imensidão da nossa Amazônia.

No entanto, embora praticamente morto, graças à atuação de parlamentares da Amazônia que colocaram recursos das suas emendas individuais ou das emendas de Bancada, esse projeto começou a reviver e a atender os municípios dos Estados que citei, com ações voltadas principalmente para a infra-estrutura, construção de escolas, de postos médicos, enfim, uma série de ações que podem vivificar as fronteiras da nossa Amazônia, principalmente das regiões fronteiriças a países com problemas seriíssimos de drogas e de narcotráfico.

Além do Calha Norte, temos um projeto especial das faixas de fronteiras, que nunca foi também levado a sério, ao qual nunca foi dado ênfase e recursos necessários para desenvolver os municípios situados ao longo dessa imensa faixa de fronteiras. Só na Amazônia, são mais de 11 mil quilômetros de fronteiras geralmente secas, sem nenhuma divisão concreta, pouco fiscalizadas, porque nem a Polícia Federal nem as Forças Armadas têm efetivo para policiar toda essa região. Tomei conhecimento de que a Polícia Federal vai abrir concurso para, no mínimo, duplicar o seu efetivo, a fim de que possa levar a essas áreas complexas a presença do policial mais treinado, que tem domínio da questão.

Estive na região de Surucucus, no Estado de Roraima, onde há um posto da Polícia Federal, que estava fechado naquele dia, porque, segundo informação do funcionário da Funai que lá estava, o policial tinha que fazer um período de rodízio e foi para a capital; por isso não havia ninguém no local naquele momento. Então, há um descaso enorme.

Outro ponto importantíssimo é a imensidão dos Estados que compõem a Amazônia. O Estado do Amazonas sozinho é maior do que os sete Estados do Sul e Sudeste. Logo, é impossível ao Governo do Estado estar presente nos Municípios fronteiriços com os países latino-americanos complicados no que se refere à droga e ao contrabando de armas. Portanto, nada mais importante do que promover a redivisão do Estado.

Nessa questão, o Senado está na frente, porque aprovou um projeto de minha autoria que visa a justamente fazer a redivisão territorial desses três Estados enormes da Amazônia, que são, pela ordem: o Amazonas, com 1,6 milhão km2; o Pará, com 1,3 km2; e o Mato Grosso, com 906 mil km2. O Senado aprovou, pois, um projeto cujo objetivo é criar três territórios federais justamente na fronteira oeste do Amazonas e também a matéria que visa a criar, na parte oeste do Pará, o Estado do Tapajós, que, sempre digo, é um Estado que já está feito de fato. Falta de direito transformar-se em um Estado. Há também proposição para criar, ao norte do Mato Grosso, o Estado do Araguaia, que também foi aprovado pelo Senado.

Esses projetos estão na Câmara dos Deputados. O do Tapajós está pronto para ser votado em plenário, inclusive com requerimento assinado pelas Lideranças, que precisa ser aprovado pela Câmara dos Deputados, para que, possa, portanto, tornar-se lei.

Considero incrível que, durante todo este tempo, a Câmara dos Deputados não tenha ainda se decidido a aprovar esses projetos, que visam apenas - é bom que se diga - à realização de plebiscito. Não se está criando Estados nem os territórios. Está-se buscando realizar um plebiscito para que as populações possam se manifestar a esse respeito.

Pois bem, já há várias semanas está na Comissão da Amazônia o projeto que cria os territórios no Amazonas e o que cria o Estado do Araguaia no Mato Grosso. Todavia, sucessivamente, não tem havido quorum para votação e, surpreendentemente, no que tange à criação dos territórios federais no Amazonas, uma Deputada do PCdoB - um Partido dito popular de esquerda, um Partido que se diz progressista, que tem uma tradição de ouvir a população, de fazer a ausculta da vontade popular - posiciona-se contrariamente à realização do plebiscito. Para mim, é realmente uma surpresa uma Deputada da região manifestar-se contra a oportunidade de o povo manifestar-se, Sr. Presidente.

No caso, não se está contra a criação do território em si, porque o exame do mérito dessa matéria virá depois que o povo disser se quer ou não a criação. Se a população disser que não quer a criação dos territórios, do Estado do Tapajós e do Estado do Araguaia, não haverá os outros passos, que são apreciar a lei complementar, que deverá ser votada pelas duas Casas do Congresso Nacional, Senado Federal e Câmara dos Deputados, e ouvir a Assembléia Legislativa do Estado.

Na verdade, ainda há muitos passos a serem dados, mas os Deputados não querem permitir sequer que o povo dê o primeiro passo, que é manifestar sua vontade.

Então, se não mudarmos a realidade da Amazônia, fazendo a redivisão territorial e aumentando a presença da Polícia Federal e das Forças Armadas, se não investirmos nos Municípios da fronteira do nosso País com esses países, não será combatendo os sintomas que resolveremos os problemas da droga e do contrabando de armas. Falo isto pela minha experiência de médico: não adianta dar remédio para os sintomas se não se ataca a causa da doença. Por exemplo, não adianta dar somente antitérmico para um paciente com malária, porque, dando remédio somente para passar a febre, o paciente vai morrer de malária, já que não se combate o parasita que está causando a doença. Esse é o caso da droga e do contrabando de armas no Brasil. A causa está nas fronteiras da grande Amazônia, que permitem a entrada livre de barcos, de pequenos aviões, de toda forma de transporte com droga para os grandes centros.

Basta lembrar, de novo, que Fernandinho Beira-Mar foi preso na Colômbia. Portanto, a conexão está muito clara, até fisicamente provada pela prisão desse que é considerado o maior narcotraficante do País, no país vizinho, a Colômbia. A atenção com a Amazônia precisa ser redobrada. E não é uma atenção apenas romântica, uma atenção poética, em que se fale apenas que a Amazônia é um santuário ecológico, que deve permanecer intocado, que a Amazônia é mata, é bicho, é índio. Dessa forma, a região, onde vivem 25 milhões habitantes, está lá, vulnerável e, o que é pior, servindo de porta de entrada para os problemas que se agravam nas grandes cidades do País, como o que estamos vendo no Rio de Janeiro.

A droga que está sendo consumida no Rio de Janeiro não é sequer plantada no Brasil, não é produzida no Brasil, ela entra através das fronteiras da Amazônia. É, portanto, necessário que façamos um tratamento correto desse problema. Sem descuidar, digamos, de dar o remédio para o sintoma, vamos cuidar da causa, vamos ver onde está o problema para cortar na nascente aquilo que é um problema de todos os brasileiros, mas que não pode ser resolvido, como agora, apenas com uma intervenção federal, no Rio de Janeiro, ou com uma decretação de estado de defesa, na cidade do Rio de Janeiro. Na verdade, isso seria apenas cuidar dos sintomas, que devem, sim, ser cuidados, mas precisamos fazer esse diagnóstico e adotar o tratamento correto para que a nossa Amazônia seja vivificada, as nossas fronteiras sejam protegidas, para que, além de termos a soberania sobre a Amazônia, que ela não seja a porta de entrada de contrabando de armas e de drogas e também, como disse a revista IstoÉ, da saída das nossas crianças, de menores prostituídas, para o Primeiro Mundo, para a Europa ou para os Estados Unidos, exatamente porque a Amazônia é desguarnecida.

Então, Sr. Presidente, como Senador da Amazônia, como homem que me bato todo dia aqui por essa grande região, que representa 66% do território brasileiro, quero chamar, mais uma vez, a atenção do Poder Executivo para que lembremos que o Brasil não é apenas o litoral, o Sul e o Sudeste, mas é, acima de tudo, a grande Amazônia. E a Amazônia não é o problema do Brasil. Pelo contrário, ela pode ser a solução para os inúmeros problemas brasileiros. Para isso, basta que haja, da parte do Governo Federal, em sintonia com os Governos Estaduais, um programa que faça com que o Brasil seja um só e as desigualdades regionais sejam eliminadas em benefício de todos os brasileiros.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2002 - Página 13004