Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o lucro dos bancos privados e a necessidade de mudança na política econômica.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Considerações sobre o lucro dos bancos privados e a necessidade de mudança na política econômica.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2002 - Página 13259
Assunto
Outros > BANCOS. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, VALOR, ESTADO DO PARA (PA), CRITICA, EXCESSO, LUCRO, BANCO PARTICULAR, AUMENTO, ARRECADAÇÃO, RECEITA FEDERAL, AGRAVAÇÃO, ONUS, PESSOA FISICA, ESPECIFICAÇÃO, ASSALARIADO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, EXCLUSÃO, FONTE, RENDA, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, FATOR, CRESCIMENTO, DIVIDA EXTERNA, PAIS, GARANTIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, JUSTIÇA SOCIAL, POPULAÇÃO.

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O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, reportagem do jornal Valor de poucas semanas atrás, começa com a seguinte frase: “O lucro dos grandes bancos privados que sobreviveram à queda da inflação no Brasil praticamente dobrou após o Plano Real”.

Ora, para um Governo que tem dificuldade em aceitar que nada contribuiu para melhorar a redistribuição de renda no País e, ainda, que pleiteia sua continuidade por meio da candidatura do Senador José Serra à presidência da República, tal notícia não poderia ser mais incômoda. Mais ainda: desnuda verdades que tanto faz questão de esconder do povo brasileiro.

Sr. Presidente, é duro ver que, em um País como o Brasil, o sistema financeiro continua a atuar como uma gigantesca sanguessuga a sorver a minguada poupança nacional e a fabricar lucros estratosféricos apenas com a manipulação do dinheiro. Em números, isso quer dizer, por exemplo, que, em 1994, primeiro ano da chamada estabilização monetária, os dez maiores bancos privados lucraram juntos 3 bilhões de reais, em valores atualizados. Em 2001, o lucro desse mesmo grupo foi de 8,4 bilhões, traduzindo o nada módico crescimento de 180%.

O lucro líquido consolidado dos dez maiores bancos foi de 41 bilhões no período de 8 anos de existência do Plano Real. Estranhamente, o imposto de renda que eles têm pago, calculado em valores atualizados, diminuiu no mesmo período, passando de 2,6 bilhões, em 1994, para 1,29 bilhões, em 2001.

Gostaria de poupar meus nobres Pares e os que nos assistem pela televisão e pelo rádio de um tecnicismo enfadonho. O assunto, todavia, é sério e deve ser tratado com a exata medida da relevância que tem para o nosso equilíbrio social e desenvolvimento econômico.

O primeiro indicador de que o sistema funciona mal para os cidadãos e excessivamente bem para os bancos é o fato de que a Receita Federal teve um aumento de arrecadação de 42,73% acima da inflação no período 1994-2001. Nesse período, a Receita conseguiu um crescimento da participação do setor financeiro de apenas 11,77%, enquanto das pessoas físicas arrecadou a mais 53,6%.

Eis, Srªs e Srs. Senadores, uma demonstração cabal de como é fácil para o Governo pegar os desprotegidos contribuintes individuais e pouco cômodo arrecadar junto das empresas do setor financeiro. Ou seja, as pessoas jurídicas têm sempre meios de contornar as regras de imposição, atitude impossível para os contribuintes assalariados, cuja renda, transparente nos contracheques de cada mês, não pode ser maquiada e, portanto, subtraída ao controle do fisco. Assim, fica sempre a tentação simplista de aumentar a tributação das pessoas físicas em vez de apertar o cerco às pessoas jurídicas - e aqui refiro-me especialmente às instituições financeiras no sentido de que dêem uma maior contribuição à sociedade.

Outro detalhe assaz estarrecedor é que os bancos estrangeiros que aqui operam conseguiram, em 2001, fazer render cada dólar aplicado no Brasil 50% mais do que no resto do mundo. A rentabilidade sobre o patrimônio líquido dessas instituições, que dá a medida exata de quanto os bancos lucram, foi 24% maior no Brasil do que no exterior. Ou seja, nosso País é um paraíso para se ganhar dinheiro com dinheiro, mesmo que ele não seja seu. Isso parece mais negócio de agiota do que legítimas transações de transferência de capital entre emprestadores e tomadores.

Na verdade, os bancos ganham no exterior com o volume de operações de empréstimo, ou seja, emprestam muito para poderem lucrar - o capital deve girar muito para se rentabilizar. No Brasil, os bancos lucram com o famoso spread, isto é, a diferença entre o que pagam para captar os recursos e o que cobram quando emprestam esses recursos. Ou seja, emprestam para poucos a juros altos, principalmente quando entre eles está o Governo; é muito mais lucrativo e dá menos trabalho do que socializar o acesso ao financiamento produtivo.

E agora, Sr. Presidente, retornamos mais uma vez, ao problema dos juros no Brasil. São eles uma das maiores fontes de renda das instituições financeiras que aqui operam. E também o principal fator do crescimento da dívida interna do País; do refreamento da capacidade de investimento produtivo, pela impossibilidade de captação de recursos no sistema financeiro; da inadimplência no sistema de crediário; do crescente volume de cheque sem fundos e assim por diante, numa cadeia tenebrosa de efeitos perniciosos para nossa economia. Porém, mais do que para a economia, esse ciclo é maléfico para a população, sobretudo a de baixa renda, sempre desprotegida contra a ciranda financeira.

E, Sr. Presidente, sempre que o sistema financeiro se torna prioritário na política de governo, quem paga a conta é o povo, com a retração do nível em empregos formais e a perda de renda nominal e real. A renda per capita real do brasileiro, calculada em dólares, caiu no período FHC, o que significa empobrecimento real da população.

Se verificarmos que praticamente a metade da população economicamente ativa do Brasil ou está sem emprego ou vive na economia informal, podemos entender porque nos encontramos no atual beco sem saída.

Sr. Presidente, está na hora de alterarmos profundamente a política econômica do País. Ou fazemos isso, ou iremos para a inexorável crise socioeconômica que já se anuncia. A crise da reforma agrária e a ação denunciadora do MST; a crise da segurança pública e a ação cada vez mais ousada das quadrilhas do narcotráfico e da indústria dos seqüestros; o crescimento da marginalidade nas grandes cidades são todos sintomas da crise que se avoluma e se torna caldo de uma situação que tem tudo para se tornar explosiva.

Assim, ou mudamos por decisão nossa e por consciência da gravidade da situação, ou teremos de viver a mudança ditada pela convulsão social descontrolada. E que não se venha dizer que foi por falta de aviso. As forças conservadoras que sempre governaram o Brasil nunca tiveram a percepção da brutalidade cometida contra a população brasileira por sua política excludente e concentradora de renda.

Temos uma chance excepcional de mudar isso em outubro próximo, elegendo um presidente progressista, que possa colocar um freio na voracidade do sistema financeiro e propiciar a redistribuição de renda e o resgate social das camadas mais pobres da população brasileira.

Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2002 - Página 13259