Discurso durante a 96ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

MANIFESTAÇÃO DE APOIO AO APELO FEITO PELO SENADOR TIÃO VIANA DE INCLUSÃO DOS AUDITORES DO SISTEMA UNICO DE SAUDE COMO CARREIRA TIPICA DE ESTADO.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • MANIFESTAÇÃO DE APOIO AO APELO FEITO PELO SENADOR TIÃO VIANA DE INCLUSÃO DOS AUDITORES DO SISTEMA UNICO DE SAUDE COMO CARREIRA TIPICA DE ESTADO.
Publicação
Publicação no DSF de 27/06/2002 - Página 13617
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • APOIO, DISCURSO, AUTORIA, TIÃO VIANA, SENADOR, SOLICITAÇÃO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), AGILIZAÇÃO, ENCAMINHAMENTO, CONGRESSO NACIONAL, PEDIDO, RECONHECIMENTO, AUDITOR, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), CARREIRA, ESTADO, MELHORIA, FISCALIZAÇÃO, SAUDE PUBLICA.


            O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a recente cúpula mundial sobre a fome, realizada em Roma, traz de novo essa questão como algo que está longe de ser resolvido. E esse impasse, que já se naturalizou na consciência de muitos, não pode perdurar; não pode perdurar, principalmente, em um país como o nosso, em que não faltam alimentos.

            Segundo revelaram os participantes, mesmo com a produção abundante de alimentos no planeta, uma em cada sete pessoas não tem o que comer.

            E é a própria ONU quem define essa realidade como “um enorme fracasso”. Não é nenhum segredo que são produzidos mais alimentos que o necessário para atender as necessidades do planeta. Mas, apesar disso, em torno de 800 milhões de pessoas não podem alimentar-se devidamente.

            E onde estão essas pessoas? Não muito longe de nós. Muitas delas, aqui mesmo no Brasil e em outros países chamados “em desenvolvimento”: a maioria delas na Ásia e na África subsaariana.

            Essa conferência ocorreu como reafirmação de outra, ocorrida cinco anos atrás. Daquela conferência, já havia saído o propósito de salvar cerca de 400 milhões de pessoas da fome até o final de 2015.

            Mas, para que tal intenção saísse do papel, seria necessário que, a cada ano, novos trinta milhões de pessoas passassem a se alimentar dignamente. Desde 1996, no entanto, não têm sido mais que 6 milhões os “incluídos” no universo dos que têm o mínimo para se alimentar. Nesse ritmo, seriam necessários mais de 65 anos para cumprir aquela meta de erradicar a fome até 2015.

            Para que esse quadro não perdure, chegou a ser proposta uma espécie de cruzada contra a fome, como essa contra o terrorismo, alavancada pelos Estados Unidos.

            Ironicamente, foram esses mesmos Estados Unidos que levantaram resistência para a aprovação de um código de conduta sobre “o direito à alimentação adequada para todos”. Esse código, segundo seu formulador, Jacques Diouf, Diretor-Geral da FAO, “daria aos pobres e desamparados condições de exigir responsabilidades aos governos e outros protagonistas desses temas”. Mas, enquanto a União Européia, o Vaticano e países em desenvolvimento endossaram o conceito, os EUA a ele se opuseram, pois tal medida dificultaria a manutenção de embargos econômicos, como os atuais contra Cuba e o Iraque. Daí não nos restar dúvida de que a fome mundial, mais que decorrente de pragas, intempéries ou acidentes climáticos, decorre diretamente das escolhas políticas feitas pelos dirigentes mundiais.

            Mas e entre nós, como andam as coisas? Não é fácil para nós ver que o País continua a ser um dos que não resolvem o problema da fome em função da alta concentração de renda.

            Para a própria delegação oficial brasileira, chefiada pelo Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Pratini de Moraes, a concentração de renda é o principal obstáculo para levarmos a dignidade a milhões de brasileiros.

            Segundo nossas autoridades, mesmo com a melhoria de muitos indicadores sociais, a concentração de renda no País ainda é muito acentuada e os níveis médios de remuneração dos 10% mais pobres da população continuam muito baixos, equivalentes a 17 dólares, o que compromete o nível de consumo alimentar.

            Como conseqüência, “morrem anualmente cerca de 80 mil crianças antes de completar um ano de idade e metade desses óbitos está relacionada com a fome e com a desnutrição”, de acordo com o relatório da delegação oficial. Isso não é novidade, pois, conforme declara a ONU, 50% da mortalidade infantil está ligada à desnutrição.

            Um documento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), denominado “Exigências Evangélicas e Éticas de Superação da Miséria e da Fome”, reivindica melhor distribuição de renda, pois alega que esta é a principal causa da fome no Brasil.

            E, a nosso ver, aumentar o número de empregos seria a melhor maneira de fazer chegar renda aos mais desfavorecidos.

            Mesmo que hoje os dados sobre a dimensão da fome sejam um tanto discrepantes, haveria pelo menos 15 milhões de miseráveis no Brasil, segundo a ONU; ou, mais grave: 22 milhões de indigentes, segundo o IPEA.

            Em todo caso, o volume é por demais significativo para que não sejam tomadas providências desde já, para reduzir esse percentual.

            Gostaria, pois, de parabenizar a FAO pela realização de mais essa cúpula e relembrar aqui a memória de Josué de Castro, o brasileiro que “descobriu a fome”.

            Nascido em Recife, em 1908, Josué dedicou sua vida, seus estudos, sua militância política a denunciar a “produção” da fome e de famintos. Seu Geografia da Fome, cuja primeira edição ocorreu em 1946, modificou a percepção do mundo sobre essa questão. Essa obra, já traduzida em 25 idiomas, assinala o início das denúncias contra esse grave flagelo que, ainda hoje, assola a humanidade. Josué foi a pessoa que, pioneiramente, teve a coragem política, científica e cidadã de denunciar a fome como flagelo fabricado pelos homens, contra outros homens. E essa coragem lhe custou muito caro, como se pode constatar pela condenação de morrer no exílio, França, em 24 de setembro de 1973.

            Passados quase 30 anos de sua morte, continuamos às voltas com esta questão tão delicada. Será que venceremos a fome em 2015, como propôs a conferência? Não estou certo. Mas, por outro lado, estou certo de que não há nem um só minuto a perder na luta sem tréguas contra essa iniqüidade. Uma iniqüidade que é originária das próprias escolhas de políticas sociais e econômicas feitas por governantes, empresários, cidadãos. E, mesmo que nossos meios sejam limitados, não podemos deixar de nos ocupar com a superação da fome entre nossos conterrâneos, nem um só dia.

            Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/06/2002 - Página 13617