Discurso durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO NO BRASIL.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 28/06/2002 - Página 13893
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, NECESSIDADE, MELHORIA, ENSINO PRIMARIO, BENEFICIO, AUMENTO, QUALIDADE, ENSINO FUNDAMENTAL.
  • DEFESA, EDUCAÇÃO, DISTANCIA, QUALIFICAÇÃO, PROFESSOR, MELHORIA, ENSINO MEDIO, AUMENTO, QUANTIDADE, ESTUDANTE, ENSINO SUPERIOR, FACILITAÇÃO, INGRESSO, MERCADO DE TRABALHO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, peço vênia para expor, no Senado da República, neste momento de transição, algumas idéias essenciais sobre a educação de modo geral e, particularmente, a educação brasileira.

Com o mundo transformado numa imensa aldeia global, como gosta de afirmar Marshall Mc Luhan, sendo a comunicação mais rápida do que nunca, precisamos no Brasil de uma filosofia da educação fundada na reflexão dos problemas atuais, por todos conhecidos: violência, segurança, saúde, etc. A violência campeia entre nós, sendo “estrela” de TV, rádio e imprensa escrita. O medo é o grande companheiro dos cidadãos que saem para trabalhar e não sabem se voltam.

O educador deve estar a par dos conhecimentos relativos à sua especialidade, mas também dos referentes à filosofia da educação, para saber como orientar a escola em função da vida da comunidade. A integração com o ambiente do aluno é, ainda, a maneira mais adequada de encontrar soluções efetivas. Cada comunidade tem sua história, suas peculiaridades e sua identidade e cada escola está inserida numa comunidade diferente, com pessoas e anseios distintos. Se pensarmos nos inúmeros Brasis que temos no Brasil, aí, então, essas diferenças se multiplicam. O relacionamento entre a escola e a sua comunidade é essencial e, entre nós, ainda não é uma realidade, com honrosas exceções.

Temos mais de 35 milhões de alunos (35.717.948) matriculados no nosso ensino fundamental (1a a 8a série), segundo os últimos dados estatísticos de 2000, e a maioria dos projetos criados e desenvolvidos são voltados para essa grande massa estudantil; entretanto, o importante é o aluno, individualmente, que deveria ser o objeto de estudo e de atenção, desde a sua entrada na escola, permanência e saída.

A experiência mostra que o êxito do processo educacional é a troca constante entre o aluno e a escola, isto é, que o aluno ame a escola e seja por ela amado.

            EDUCAÇÃO INFANTIL - O DESAFIO DE SEMPRE

A Educação Infantil pode ter um significado particularmente importante, quando se fundamenta numa concepção nova, mas verdadeira ao considerar a criança como cidadã, como pessoa em processo de desenvolvimento, como sujeito ativo na construção do seu conhecimento.

Deve-se à atual Constituição a inovação do atendimento em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade, sob o nome genérico de educação infantil.

A educação infantil e o ensino fundamental conjugam-se como prioridade dos municípios, beneficiando-se esse conjunto com o percentual obrigatório de 25% da receita de cada um deles.

A ligação entre a pré-escola e o ensino fundamental abre o caminho para uma forma de correção da discrepância entre os níveis de ensino e o desequilíbrio da pirâmide educacional.

A educação infantil tornou-se a base do sistema, aliviando a sobrecarga que existia na 1a série do ensino fundamental, obrigada que era a assumir o que deveria ser de competência da pré-escola.

A necessidade de expansão da educação infantil é cada vez maior, pois, nas últimas décadas, a intensificação da urbanização, a participação da mulher no mercado de trabalho e as mudanças na organização e estrutura das famílias têm mostrado à sociedade a importância das experiências na primeira infância, o que motiva demandas por uma educação infantil institucionalizada.

O MEC preocupou-se em elaborar o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, que traz informações sobre as questões da Educação da criança e o papel do professor, constituindo-se um conjunto de orientações pedagógicas que visa a contribuir com a implementação de práticas educativas de qualidade, para dar as condições necessárias ao exercício da cidadania das crianças brasileiras.

            O QUE FAZER COM O ENSINO FUNDAMENTAL?

É importante que a consciência coletiva seja alertada de que somente através da Educação teremos a transformação social, econômica e política do indivíduo e do País.

Educar é transmitir o conhecimento numa perspectiva de formação da cidadania, a mudança de comportamento do indivíduo deve ser o eixo norteador do ensino fundamental - modalidade de ensino obrigatória e gratuita com duração mínima de 8 anos, sendo o maior pilar da educação básica (art. 22 da LDB/Lei no 9.394/96).

Para se alcançar os objetivos decorrentes dessa missão são necessárias muitas mudanças.

A mudança da nomenclatura, trocando o que era ensino de primeiro grau para ensino fundamental pode, até, ser importante, pois, o termo fundamental sugere que seja uma educação essencial ao desenvolvimento da pessoa. Entretanto, somente a mudança do nome não é suficiente para a consecução de transformações estruturais e conceituais do sistema. É preciso muito mais:

- O aumento de percentual das verbas destinadas à educação precisa constar dos orçamentos, tanto na esfera federal, quanto nas esferas estaduais e municipais;

- Os governos federal, estaduais e municipais devem priorizar o ensino fundamental; somente melhorando a qualidade desse grau de ensino haverá possibilidade de obter a expansão e a melhoria da qualidade nos demais níveis de ensino (vontade política);

- O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério precisa assumir, efetivamente, as suas responsabilidades definidas, evitando-se as atuais irregularidades anunciadas, nas prefeituras;

- A municipalização do ensino fundamental precisa ser uma realidade, pois as prefeituras estão muito mais a par das necessidades da sua clientela do que o próprio governo estadual. Para que isto aconteça, é essencial que haja um pacto viável entre cada estado e as suas prefeituras;

- A obrigatoridade escolar na faixa etária determinada por lei precisa ser observada e controlada pelos municípios através de mecanismos próprios;

- No planejamento anual, os parâmetros e referenciais curriculares precisam ser sempre avaliados e reformulados de modo que estimulem um moderno modo de ensinar e de aprender, respeitando sempre as especificidades de cada comunidade escolar. Qualidade do ensino é a grande meta a ser buscada;

- A reciclagem dos professores precisa acontecer de verdade, contemplando todos os docentes. Há um enorme leque de opções para o atingimento de todos os envolvidos, não podendo ser esquecida a opção de educação à distância;

- A mudança do modelo de gestão escolar precisa ser meta dos gestores para dar mais autonomia às agências de ensino, através de suas direções, pois o diretor e sua equipe são os maiores conhecedores das suas comunidades escolares;

- A integração da escola com a comunidade precisa ser uma constante para que o intercâmbio cultural aconteça, e

- Um sistema de avaliação coerente com a realidade de cada escola precisa ser elaborado, testado e reformulado sempre que se fizer necessário.

Segundo o educador Arnaldo Niskier, “educar com qualidade é preparar crianças, jovens e adultos para exercer a cidadania em todas as suas dimensões e atender às exigências impostas para o desenvolvimento da sociedade.”

            UMA NOVA ERA

Estamos vivendo uma nova era, com uma nova economia, na qual as organizações operam de maneira diversificada. Há um leque maior de oferecimento de estudos, aparecendo, inclusive, pela primeira vez no texto legal a referência ao ensino à distância (§ 4o, art. 32 da LDB/96).

... § 4o O ensino fundamental será presencial, sendo o ensino à distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais. (grifo nosso).

Além da sistemática de produzir ensino por níveis, séries ou graus, o pluralismo escolar admite sistemas alternativos, como a educação à distância. Cercada de preconceitos que a equiparam a um ensino de segunda classe, a educação à distância existe no Brasil, mas não nas proporções desejáveis, e quando o sistema regular é notoriamente impotente para cobrir o território nacional.

O preconceito abrange ainda a suposição de que tal metodologia prescinde da figura do professor, o que não corresponde à verdade.

O magistério para a educação à distância é diferente. Somente professores habilitados nas técnicas do ensino à distância elaboram e produzem materiais didáticos, acompanham a sua utilização, fazem a monitoria ou a tutoria dos alunos.

Historicamente, a educação à distância pode ter mais de 500 anos, pois os nossos índios, quando se comunicavam por tambor, certamente exercitavam uma forma de transmissão que tinha características pedagógicas. 

No Canadá, a Schoolnet faz o maior sucesso, utilizando o satélite doméstico de telecomunicações para a educação à distância. Lá, eles fazem isso há 20 anos, com total êxito, sendo os seus técnicos bastante disputados pela sociedade, graças à qualidade com que são formados.

Há, também, sistemas poderosos na Austrália e na Inglaterra, onde viceja, servindo de modelo a outros países, a bem sucedida Open University, hoje com cerca de 200 mil alunos, depois de um início desconfiado. O segredo do seu êxito? Qualidade nas aulas elaboradas e rigor nos exames.

E no Brasil? As experiências oficiais não têm entusiasmado, sendo muito mais provável que bons resultados provenham de iniciativas como a Rede Futura, já espalhada por todo o nosso imenso território - e com uma gestão competente.

O Plano Nacional de Educação prevê o credenciamento das instituições que ministram cursos à distância com direito a certificação. Os exames e o registro de diplomas também serão regulamentados, a fim de que se assegure a qualidade do ensino ministrado e a correção absoluta nos procedimentos indispensáveis à preservação da seriedade com que a modalidade precisa ser tratada.

O Decreto no 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, conceituou o que se entende por educação à distância: é uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação.

Embora exista a previsão legal de emprego da metodologia em todos os graus de ensino, há uma primeira ênfase com o ensino superior, recomendando-se que o credenciamento só seja feito se a instituição já for autorizada como entidade de ensino superior, mantendo pelo menos um curso reconhecido. Somos partidários de que a oficialização do ensino à distância se faça a partir dos cursos de formação e aperfeiçoamento de professores e especialistas.

            ENSINO MÉDIO

Registramos, hoje, um acelerado processo de transformação tecnológica. A transitoriedade no mundo do trabalho é uma realidade e o homem precisa estar preparado para situações imprevisíveis. Por conseguinte, a educação é percebida como fator estratégico na vida das nações.

Esse cenário impõe um programa de melhoria do sistema educacional como um todo, para melhor adequá-lo à configuração traçada pela competitividade mundial, exigindo uma outra postura de tratamento da educação.

A LDB trouxe um grande desafio aos educadores brasileiros quando separou no seu texto a Educação Profissional (Capítulo III) da Educação Básica (Capítulo II).

Desta maneira, a educação profissional deve ser desenvolvida em “articulações com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho (artigo 40 da lei).” A lei propõe, então, duas vertentes para o ensino médio: a primeira delas conduzirá ao prosseguimento de estudos; a segunda se relaciona à formação profissional, esta amparada pelo Decreto presidencial no 2.208/97, que cuida de esmiuçar a matéria.

Foi recomendado aos Estados, por intermédio dos seus Conselhos de Educação, que utilizem adequadamente 25% da carga horária para estabelecer currículos diferenciados, de acordo com os interesses dos alunos. Isso significa a existência de 600 horas/aula disponíveis para essa escolha, ficando as demais 1.800 horas/aula para as matérias que assegurarão uma certa unidade, ao lado da garantia de aquisição da cultura que precisa ser incorporada ao universo dos estudantes. Cuidar, como se diz, de valorizar o aprendizado humanístico essencial.

Não se trata de voltar ao antigo eixo clássico/científico, mas sim educar de tal forma que os jovens tenham possibilidade de acesso ao mercado de trabalho, em nível intermediário, com um currículo diferenciado, sem perder a sua formação integral.

            A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Há hoje, no mundo, nada menos de 82 milhões de estudantes universitários, entrando o Brasil com pouco mais de 2,3 milhões desse total. Forçoso é convir que se trata de um número rigorosamente ridículo, se consideradas as nossas virtualidades. Alguns especialistas estimam que deveríamos ter algo em torno de cinco milhões de universitários, até mesmo para nos ombrearmos com nações como a Argentina e o Chile, que estão numa situação bem superior à nossa, se considerada a quantidade e mais ainda a qualidade.

O Brasil já acordou para formas alternativas de estruturar o seu ensino superior. Além das tradicionais universidades, existem os centros universitários, isentos da responsabilidade de projetos de pesquisa; as faculdades integradas e os cursos seqüenciais.

À universidade caberá a missão de zelar pela indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, como estabelece a nossa Carta Magna de 1988, além de produzir, armazenar e difundir o conhecimento, em qualquer campo.

A universidade brasileira está longe de representar o instrumento decisivo na política de formação de recursos humanos. Uma enxurrada de normas, leis e pareceres não consegue levar à associação de inovação e competência.

Não é suficiente que a universidade cresça. O fator qualidade deve ser-lhe inerente tanto nos cursos de graduação quanto nos de pesquisa e de pós-graduação, com o despertar para a valorização da ciência e da tecnologia.

Não se pode alcançar este objetivo enquanto o nível superior estiver sujeito ora à retórica, ora ao pragmatismo, ora ao afastamento de sua moderna concepção de difusão do saber para aplicá-lo aos problemas da sociedade, ora à crença de que só ele é capaz de proporcionar formação profissional.

Esses objetivos não podem ser radicalizados, mas devem concentrar-se num tripé indissociável como responsabilidade do ensino superior: ensino, pesquisa e extensão.

A busca da qualidade em cada uma dessas funções apóia-se basicamente na formação dos docentes, eles também empenhados na extensão de sua qualidade individual em escala cada vez mais alta e de forma ininterrupta. E no pagamento adequado dos seus salários.

Constitucionalmente, é no padrão de qualidade que se alicerça todo o ensino, sem distinção dos níveis em que seja ministrado. A universidade que se deseja e o para quê nem sempre coincidem na multiplicidade de cursos existentes no país.

As distinções entre eles originaram-se na demanda por cursos superiores, em critérios desenvolvimentistas, na criação de cursos de baixo custo de implementação, na estimativa de outros que excedem as necessidades e na formação ou “deformação” de recursos humanos, posteriormente rejeitados pelo mercado de trabalho. Hoje, vale menos o diploma e mais a qualificação do indivíduo. É para esse aspecto essencial que chamo a atenção desta Casa.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/06/2002 - Página 13893