Discurso durante a 99ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Saudação ao Presidente Fernando Henrique Cardoso pela inauguração do Sistema de Vigilância da Amazônia - Sivam. Expectativa ante o funcionamento da Agência de Desenvolvimento da Amazônia - ADA.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Saudação ao Presidente Fernando Henrique Cardoso pela inauguração do Sistema de Vigilância da Amazônia - Sivam. Expectativa ante o funcionamento da Agência de Desenvolvimento da Amazônia - ADA.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/2002 - Página 14827
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, AUMENTO, VIOLENCIA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, ORIGEM, PROBLEMA, REFORÇO, POLICIAMENTO, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA, REDUÇÃO, TRAFICO, DROGA, ARMA, CONTRABANDO, COMBUSTIVEL.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INAUGURAÇÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), OBJETIVO, VIGILANCIA, REGIÃO AMAZONICA, COMBATE, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, ARMA, DROGA, OCUPAÇÃO, REGIÃO.
  • SUGESTÃO, ALTERAÇÃO, DENOMINAÇÃO, ZONA FRANCA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), SUBSTITUIÇÃO, AGENCIA, DESENVOLVIMENTO, AMAZONIA OCIDENTAL, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, AGENCIA, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA, NECESSIDADE, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL, CORRUPÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DA AMAZONIA (SUDAM).
  • CRITICA, EXCESSO, CRIAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), PREJUIZO, AGRICULTURA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, após o recesso do mês de julho, passado no meu Estado, Roraima, parte mais setentrional da Amazônia e do País, tenho a honra de voltar à tribuna neste primeiro dia de trabalho para fazer algumas análises.

Primeiramente, como todos os brasileiros, estou preocupado com a situação econômica aflitiva que o País está atravessando e com a situação alarmante da segurança pública, principalmente nos grandes centros como Rio de Janeiro e São Paulo, e do crime organizado no Espírito Santo, que vem dominando o noticiário nacional.

No que tange ao avanço da verdadeira institucionalização do crime organizado, temos visto que há apenas um tratamento paliativo desses problemas. Costumo dizer que se trata de um tratamento dos sintomas da doença. Não estamos buscando cuidar da doença combatendo as suas causas.

É lógico que, na medida em que essa doença surge em importantes centros industriais, populacionais e turísticos, como é caso do Rio de Janeiro e São Paulo, esse fato chama a atenção de todo o País, uma vez que esses locais são as locomotivas econômicas, políticas e pensantes deste País - pelo menos é o que se costuma dizer. No entanto, parece-me que isso não vem sendo analisado com o devido cuidado. Não se tem feito um diagnóstico preciso para que seja estabelecida a cura adequada do problema.

Vejo aqui e acolá algum importante articulista ou político mais atento dizer que o problema decorre do uso de armas, das drogas, que vem das nossas imensas fronteiras com os países vizinhos, que começam ao norte com a Guiana Francesa, passando pelo Suriname, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Paraguai e até mesmo pela Argentina.

Na verdade, a grande fronteira com a Amazônia, que representa mais de 11 mil quilômetros totalmente desguarnecidos, não tem um limite intransponível. São fronteiras secas, impossíveis de se ver a olho nu. Por exemplo, nas fronteiras limítrofes, no caso de Roraima com a Venezuela, talvez existam marcos mais próximos, adensados. De lá, passa-se livremente de um lado para o outro, porque a Polícia Federal do Brasil, assim como a aduana do lado da Venezuela e a Guarda Nacional estão em um ponto só, justamente na estrada BR-174, que vai ligar a capital do Estado de Roraima e a capital do Amazonas com a Venezuela.

Perto dali, existe um estrada que recebe o nome de "Transmuambeira", por onde passa livremente o contrabando de gasolina e de diesel, vindos da Venezuela para o Brasil. Lá se pagam centavos de reais por um litro de gasolina ou diesel, e aqui, cinco ou seis vezes mais. É impossível conter esse contrabando, e não se encontra um remédio definitivo, que seria legalizar a aquisição desse combustível pela população de Roraima, para acabar com o monopólio da Petrobras ou de qualquer outra distribuidora, já que só se pode levar para aquele Estado o petróleo de Manaus, percorrendo-se cerca de 800 quilômetros, enquanto da fronteira da Venezuela para Boa Vista são quase 200 quilômetros. Essas questões irracionais, burocráticas e tecnocráticas com que o Brasil insiste em conviver estão levando os grandes centros a sofrerem. Na verdade, se pensássemos como um médico, fazendo um diagnóstico para estabelecer um tratamento, teríamos que primeiramente coibir a causa, que está na fronteira com a Colômbia, onde se produz e comercializa a droga e existe guerrilha.

Ontem, no avião, li, num jornal de Manaus, que a Polícia Federal prendeu cerca de 800 quilos de armamento que brasileiros trocariam com as FARC na Colômbia. Levariam algo de que as FARC precisam, que são as armas, e receberiam como pagamento a droga, que não ficaria na fronteira e seria consumida nos grandes centros.

Temos que tratar da guarda das nossas fronteiras de maneira séria. A Polícia Federal está sendo sucateada, com servidores mal pagos e um número insuficiente de agentes. As Forças Armadas estão sendo desmobilizadas por falta de recursos: recrutas dispensados, quadros reduzidos, armamentos sucateados, exatamente porque não se dá prioridade ao tratamento da causa. Não se fortalecem as instituições para o combate das causas. Parece até haver um plano premeditado, localizado não sei onde. É visível a forma como se está tratando o problema, e não é possível acreditar, em sã consciência, que o Poder Executivo não tenha esse diagnóstico nas mãos e não saiba aplicar o tratamento.

Por outro lado, temos uma boa notícia no que tange ao problema da guarda, vigilância e ocupação racional de nossas fronteiras: a inauguração do projeto Sivam. Esse projeto enfrentou controvérsias, a meu ver, bem plantadas, porque sempre que se pensa em fazer algo para desenvolver a Amazônia, misteriosamente surgem campanhas bem armadas na grande imprensa nacional, que colocam a opinião pública contra os projetos.

O projeto Sivam busca não só a vigilância militar da Amazônia, mas uma ampla vigilância da região, no que diz respeito à biodiversidade, ao contrabando de armas, ao narcotráfico, objetivando também um sensoriamento real em termos de ocupação desordenada, para que se possa traçar uma política, não baseada na verdade isolada de algum cientista ou na utopia de alguns sonhadores, mas calcada em dados corretos, tendo em vista a soberania que almejamos em relação à região.

Saúdo esse ato concreto feito pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso recentemente, ou seja, a inauguração do Projeto Sivam. Realmente, é um avanço que precisa ser garantido, aperfeiçoado, mantido de maneira muito vigorosa, para que a nossa Amazônia não continue sendo a porta de entrada de problemas para o País, mas venha a desempenhar aquilo que tem sido a sua vocação ao longo destes cinco séculos: a solução de muitos problemas para o Brasil. No passado, foi a solução, quando se extraía borracha de maneira desordenada; hoje o tem sido para muitos problemas que envolvem a biodiversidade e os recursos minerais. Entretanto, o que existe é um completo abandono da Amazônia pelas elites, quer governamentais, quer políticas ou empresariais.

Gostaria de tecer comentários sobre a Zona Franca de Manaus, que não mais deveria chamar-se Zona Franca de Manaus, mas Agência de Desenvolvimento da Amazônia Ocidental. A recente posse dos diretores da Agência de Desenvolvimento da Amazônia e a eficiência desse órgão, que está substituindo a Sudam, suscitam-me, ainda, muitas dúvidas. Novamente, a Agência está sediada em Belém. A Amazônia - é bom não esquecer - representa 60% do território nacional, é um gigante. A Amazônia Oriental, onde se localiza Belém, é muito diferente da Amazônia Ocidental, onde estão o Amazonas, Roraima, Acre e Rondônia. A Amazônia Ocidental é outro gigante, mas representa, mais ou menos, a metade de toda a Amazônia.

É preciso haver o fortalecimento da Zona Franca de Manaus - inclusive, com a mudança de seu nome - e da Agência de Desenvolvimento da Amazônia. No entanto, quero acompanhar, de perto, os primeiros passos da Agência de Desenvolvimento da Amazônia, para que não repita o que a Sudam foi no passado, justamente pelo descaso e pelo pouco cuidado que teve com as questões da Amazônia. É muito fácil, hoje, citar três ou quatro pessoas, ou até mesmo algumas dezenas, que cometeram irregularidades na Sudam - extinta pelo Governo por esse motivo. A instituição já foi punida; resta, agora, descobrir aqueles funcionários e políticos que se envolveram em falcatruas, bem como os empresários, muitos deles do Sul do País.

Espero, portanto, que a Agência de Desenvolvimento da Amazônia não percorra o mesmo caminho e não represente apenas uma troca de sofá. Nós, da Amazônia, estamos cansados de levar a pecha de que, na Amazônia, praticam-se crimes do colarinho-branco, desviam-se recursos, cometem-se crimes contra o meio ambiente, bem como injustiças contra as minorais, quando, na verdade, a história do Sul e do Sudeste não tem nada de glorioso a nos ensinar nesse sentido.

Precisamos inverter essa situação e dar prioridade ao desenvolvimento de uma região que até deveria ser analisada à luz da Amazônia dos países vizinhos: a colombiana, a venezuelana, a da Guiana, onde se produz a droga e muito se trafica, a do Suriname, onde existem inúmeras acusações de tráfico de armas e de drogas, e a boliviana, que, todos os dias, está nos jornais. Os nossos países vizinhos relegaram a sua Amazônia e estão pagando um preço alto. Por tabela, no Brasil, nós o estamos pagando também, porque somos o maior mercado consumidor e uma escala para o grande tráfico de drogas e de armas, bem como para a prostituição infantil, que foi denunciada recentemente pela revista IstoÉ e que tive a oportunidade de denunciar desta tribuna.

Dessa forma, Sr. Presidente, neste primeiro dia de trabalho do mês de agosto, voltando do recesso, registro a minha reclamação, a minha advertência e o meu inconformismo com a forma com que a Amazônia vem sendo tratada. Por exemplo, Roraima, meu Estado, de maneira incompreensível, vem sendo agredida no que tange à questão fundiária. De um lado, existem imensos parques ecológicos; de outro, 57% da área do Estado estão reservados para apenas 7% da sua população indígena, que não é uma só. É bom esclarecer que não há somente os índios ianomâmis, que vivem na selva, vestindo-se precariamente e sem falar o português adequadamente. A maioria deles, os outros 26 mil índios de Roraima, é aculturada, falam bem o português, são funcionários públicos, comerciantes, prefeitos, vice-prefeitos. Enfim, precisamos ter coragem de dizer à Nação claramente, visto que não é possível fazê-lo na grande mídia, que só apresenta a verdade dos ecologistas, dos ambientalistas de Ipanema ou da Avenida Paulista. Não é apresentada a verdade daquele amazônida que está sofrendo e conhece de perto o problema do índio, do branco, dos 25 milhões de habitantes da Amazônia, uma população muito maior do que todos os países da América Latina.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/2002 - Página 14827