Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 02/08/2002
Discurso durante a 100ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Considerações sobre as declarações do Secretario do Tesouro dos Estados Unidos da América a respeito da gestão dos recursos emprestados pelo Fundo Monetário Internacional ao Brasil.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA EXTERNA.
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
- Considerações sobre as declarações do Secretario do Tesouro dos Estados Unidos da América a respeito da gestão dos recursos emprestados pelo Fundo Monetário Internacional ao Brasil.
- Publicação
- Publicação no DSF de 03/08/2002 - Página 14918
- Assunto
- Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
- Indexação
-
- LEITURA, CARTA, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, PAUL O'NEILL, SECRETARIO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, MOTIVO, ACUSAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, UTILIZAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, EMPRESTIMO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), DEPOSITO, BANCO ESTRANGEIRO.
- NECESSIDADE, ATUAÇÃO, EXECUTIVO, CONGRESSO NACIONAL, MELHORIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, COMBATE, CRISE, ECONOMIA.
- ANALISE, CRESCIMENTO, INDUSTRIA, FABRICAÇÃO, AUTOMOVEL, RESISTENCIA, ARMA DE FOGO, MOTIVO, EXCESSO, VIOLENCIA, AUMENTO, DESEMPREGO, FALTA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, DEMONSTRAÇÃO, DESEQUILIBRIO, ECONOMIA.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, Senadora Heloísa Helena, poucos dias atrás, o Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Paul O’Neill, fez uma declaração que teve enorme repercussão: referindo-se a países como Argentina, Brasil e Uruguai - justamente os países do Mercosul que estão no olho do furacão econômico que nos atingiu aos três -, externou sua preocupação de que os recursos que viéssemos a obter do Fundo Monetário Internacional fossem parar em bancos suíços. Considerei, Sr. Presidente, do ponto de vista do Brasil, tanto do Poder Executivo quanto do Congresso Nacional, ser essa uma declaração inadequada, que merece uma reação firme da nossa parte.
A Embaixadora dos Estados Unidos no Brasil, em encontro com o Ministro Celso Laffer, procurou corrigir aquelas declarações, e o próprio Sr. Paul O’Neill, ao receber autoridades brasileiras que foram a Washington, procurou elogiar a condução da política econômica do Brasil, da Argentina e do Uruguai. Essas declarações, feitas ontem pela manhã, contribuíram para amainar a fúria do furacão no mercado de câmbio brasileiro, tanto é que o valor do dólar em relação ao real acabou baixando 10%.
Entretanto, antes disso, no dia 29 de julho, resolvi enviar uma carta ao Secretário do Tesouro, Paul O’Neill, nos termos que aqui transcrevo, Sr. Presidente.
Secretário do Tesouro,
Pela segunda vez, o senhor fez referências a práticas incorretas de brasileiros. A primeira foi para explicar as causas das altas taxas de juros no Brasil. Quando solicitei que dissesse o que realmente sabia a respeito de casos específicos de corrupção, o senhor preferiu, em sua carta de 17 de abril de 2002, não mencionar qualquer caso.
Agora, como publicado pelos jornais brasileiros, o senhor diz que os recursos emprestados pelo Fundo Monetário Internacional podem ser enviados a bancos suíços. Diante disso, novamente, como Senador brasileiro, sinto-me no dever de lhe perguntar se realmente conhece qualquer precedente que possa ter dado ao senhor razões reais para fazer tão séria declaração.
Sinceramente,
Senador Eduardo Matarazzo Suplicy.
Sr. Presidente, espero que, assim como o Secretário do Tesouro americano me respondeu em abril último, tenha a gentileza de me responder desta vez. Precisamos deixar claro que no Congresso Nacional brasileiro há pessoas atentas a tais tipos de declarações.
É preciso salientar que o Presidente Eduardo Duhalde, da Argentina, mencionou que muitos em seu país pensam que o Sr. Paul O’Neill tem razão. Recordemos que, há poucos dias, o jornal The New York Times informou que teria havido um pagamento muito significativo, de alguns milhões de dólares, para o ex-Presidente Carlos Menem, e este acabou reconhecendo que tinha conta, sim, na Suíça. Será que foi essa informação que levou o Sr. Paul O’Neill a formular tal diagnóstico? De qualquer maneira, se ele estava se referindo à Argentina, deveria deixar clara a distinção entre o Brasil e a Argentina.
É importante solicitarmos esclarecimentos, pois apesar de muitas vezes criticarmos as ações das autoridades econômicas, especialmente o Ministro Pedro Malan e o Presidente do Banco Central, Armínio Fraga, sabemos que ambos são pessoas sérias e responsáveis e que, do ponto de vista ético, têm procedido com correção. Por essa razão, é importante haver a devida resposta sobre esse tema.
Ainda ontem, o Presidente de Honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, o nosso candidato à Presidência da República, foi bastante feliz ao propor ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que recordasse o ato de Didi na Copa do Mundo de 1958, na final, quando o Brasil sofreu o primeiro gol logo no início do jogo. Didi, capitão de nossa equipe, foi até o fundo da rede, pegou a bola e, de cabeça erguida, conclamou todos os seus companheiros de Seleção a vencerem. O Brasil venceu por cinco a dois, em memorável partida, conquistando a Copa do Mundo na Suécia. Esse foi o primeiro da série de campeonatos mundiais que a Seleção venceu. Lula, ontem, recomendou que o Presidente Fernando Henrique Cardoso fizesse ação semelhante: buscasse a bola no fundo da rede e conclamasse todos a vencerem os desafios.
Um Presidente da República tem que agir dessa forma, ainda mais porque o Brasil, como todos sabemos, tem extraordinárias possibilidades de crescer de maneira adequada. Mas é preciso que o Poder Executivo e o Congresso Nacional criem os instrumentos de política econômica que possam fazer do Brasil uma nação que caminha por um círculo virtuoso para que possamos viabilizar uma significativa diminuição das taxas de juros e para que os investimentos voltem a ser mais acelerados. Assim, a economia poderá crescer, proporcionando melhor distribuição de renda e de riqueza.
Nobre Senadora Heloísa Helena, há poucos dias conversei com uma pessoa que trabalha em um dos setores da economia que mais tem crescido. Perguntei-lhe como isso acontecia. Ela me respondeu dizendo que, em 1998, havia apenas uma empresa nesse setor. Em 2002, no entanto, já existem 45 empresas vendendo seus produtos. E cada produto custa em média R$100 mil. Ou seja, nos últimos quatro anos, não apenas o número de empresas aumentou, mas também o número de unidades vendidas. Em 2002, espera-se que sejam vendidas nove mil unidades, das quais seis mil em São Paulo.
Isso quer dizer que a economia vai bem? Que tipo de produto está sendo vendido e procurado com tamanha intensidade, Senadora Heloísa Helena? Carros blindados.
Continuando a conversa, eu disse a esse senhor que ele deveria preparar-se para diversificar suas atividades, porque, se Lula for eleito - é a minha previsão -, as coisas vão começar a mudar neste País. Tenho esperança de que finalmente conseguiremos instituir aqueles instrumentos de políticas públicas que venham a fazer do Brasil uma nação mais justa. Assim, os que atuam nesse ramo de atividade que tanto tem crescido deveriam pensar em diversificar seus produtos, porque poderá haver demanda por outras coisas. O fato de haver uma extraordinária demanda por carros blindados no Brasil, Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, é um sinal do desequilíbrio por que passa a economia brasileira.
Recordo-me de uma palestra brilhante feita pela economista Profª. Joan Robinson, em 1971, sobre a segunda crise da teoria econômica. Dizia ela, naquele início dos anos 70, que a economia dos países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento estava passando por uma forte crise, muito diferente da primeira. A primeira grande crise ocorreu nos anos 30, quando começou a grande recessão e o desemprego. Naquela época, os economistas não conseguiram encontrar uma solução para a crise a tempo.
Quando Keynes elaborou a teoria geral sobre emprego, juros e moeda, em 1936, Hitler, na verdade, na Alemanha, já havia demonstrado que era possível, sim, acelerar a atividade econômica através do aumento de gastos do governo. Os economistas, no entanto, chegaram atrasados e aquilo se constituiu em tragédia, porque Hitler havia aumentado os gastos - mas os gastos militares - com instrumentos bélicos de destruição. Com isso, ele conseguiu aumentar o nível de emprego na Alemanha mais rapidamente do que em outros países, mas causou outras tragédias.
A Profª Joan Robinson disse que não queria que os economistas chegassem novamente atrasados para resolver a segunda grande crise. No entanto, já estamos em 2002, passados 31 anos desde aquela palestra, e observo, Srª Presidente, Senadora Heloísa Helena, que os países não conseguiram resolver adequadamente aquilo que ela denominou o cerne da segunda crise: o emprego e a distribuição da riqueza entre países ricos e pobres e dentro de cada país. O Brasil está muito atrasado neste aspecto.
Na semana passada, a Organização das Nações Unidas publicaram relatório do Pnud sobre o desenvolvimento humano dos países. Infelizmente, o Brasil está em quarto lugar entre os campeões mundiais da desigualdade, atrás apenas de três países como Suazilândia, República Central Africana e outro. Ou seja: trata-se de uma posição que nada nos honra.
Por que o Brasil hoje está vivendo solavancos tão fortes? Por que há sinais sérios de desequilíbrio em relação ao valor de nossa moeda? Tenho convicção, Senadora Heloísa Helena, que isso tem a ver com o desequilíbrio ainda não resolvido.
Nessa mesma palestra, a Profª Joan Robinson dizia que há algumas pessoas que têm saudades daquilo que elas denominam tempo da normalidade, do padrão ouro, tempo em que, ao final do século XIX e início do século XX, as coisas pareciam estar mais normais. Ora, disse ela, se as coisas estivessem tão normais, não teria estourado a Primeira Grande Guerra Mundial.
Ora, se as coisas no Brasil estivessem normais, não estariam ocorrendo situações críticas como as observadas na tragédia do assassinato bárbaro do jornalista Tim Lopes, na favela do Morro do Alemão, simplesmente porque ele queria mostrar o que se passava entre os jovens nos bailes funkies. E não estariam os jovens de São Paulo procurando o último CD dos Racionais MC’s, com composições de Mano Brown, Nada como um Dia Após o Outro, que expressa a violência do quotidiano em São Paulo: jovens, muitas vezes não encontrando oportunidades de trabalho, vêm-se instados a venderem seus corpos e a participarem das quadrilhas de narcotraficantes.
Enquanto isso, nos bairros melhores, as pessoas investem na construção de grandes muros, cercas eletrificadas, guaritas e compram carros blindados, cuja fabricação foi um dos itens que mais cresceu principalmente a partir da segunda metade do Governo Fernando Henrique Cardoso. Sr. Presidente, digo isso como um alerta.
Estamos vivendo a sucessão presidencial. Como Líder do Bloco da Oposição e do PT, assinalo a nossa disposição de, mesmo durante os meses de agosto, setembro e outubro, quando temos a responsabilidade de ajudar os nossos partidos e candidatos pelo Brasil afora, examinar as medidas urgentes e necessárias para retirar o Brasil dessa crise econômica. Portanto, se for vontade do Poder Executivo encaminhar ao Congresso Nacional medidas relativas à reforma tributária, por exemplo, medidas que desonerem o custo da produção e das exportações, que possam significar um sistema tributário mais eqüitativo e racional do que aquele que temos, nós do PT, do Bloco da Oposição, estamos prontos a examinar essas medidas e a trabalhar com afinco no Congresso Nacional. Essa é a nossa responsabilidade.
Muito obrigado.
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