Discurso durante a 102ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o abandono de instituições públicas brasileiras, como as universidades, as polícias e as Forças Armadas.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Considerações sobre o abandono de instituições públicas brasileiras, como as universidades, as polícias e as Forças Armadas.
Aparteantes
Geraldo Cândido, Roberto Requião, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2002 - Página 15196
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, ABANDONO, INSTITUIÇÃO PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, UNIVERSIDADE, FORÇAS ARMADAS, PRECARIEDADE, RECURSOS, MELHORIA, SERVIÇO, BENEFICIO, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, PRECARIEDADE, PRESIDIO, APREENSÃO, POLICIA, PREJUIZO, SEGURANÇA PUBLICA, PAIS, REGISTRO, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, PROVIDENCIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nós, mais velhos, a toda hora e a todo instante ficamos um pouco desencantados e desiludidos com o deterioramento das instituições, das coisas, das patentes e das posições no País.

Lembro-me que, na minha infância, dizer “senador fulano de tal” era falar de um cargo de pompa, era falar de um senhor cargo. Lembro-me que, quando alguém falava “o general”, parávamos para pensar, assim como quando se dizia “o bispo”, ou “o juiz”. Lembro-me de que, quando se falava em “Forças Armadas”, era um orgulho. Hoje, ouvi o Senador Jefferson Péres falando de uma realidade triste: as nossas Forças Armadas estão depauperadas, humilhadas, tendo de cortar contingente, economizar munição e gasolina, com os aviões parados por falta de peças.

No entanto, o que mais me causa espécie, porque influi na vida de todos nós, é o problema da polícia e da segurança nacional.

Há cerca de um mês e meio, soubemos, estarrecidos, que, em uma penitenciária de alta segurança, bandidos encomendavam foguetes, granadas e decidiam se eliminariam ou não o advogado com quem dialogavam. Isso chocou toda a Nação, todos nós, e criou uma celeuma grande entre o Governo do Estado e os Procuradores, a Polícia Federal.

Hoje, ao abrirmos o jornal, ficamos sabendo que no mesmo Bangu - um presídio especial, de alta segurança - onde, há um mês e meio, tinham sido tomados nove ou dez telefones celulares e alguns revólveres, foram encontrados mais cento e quatorze telefones celulares, inúmeras armas e bastante tóxico.

Pergunto-me: se aquela foi uma “operação pente fino”, esses cento e quatorze telefones celulares entraram no presídio nesse período de um mês e meio? O que está acontecendo com as nossas penitenciárias, com a nossa polícia e, como reflexo, o que está acontecendo com a segurança deste País?

Todos nós passamos a ver essa situação de uma forma rotineira, da mesma forma como abotoamos a camisa todos os dias: só paramos para olhar o botão se ele não entra na casa. Senão fazemos o gesto automaticamente. Mas esse era um caso para inquérito. Se a primeira revista foi mal feita, houve erro; se ela foi bem feita, como entraram mais cento e quatorze telefones celulares? Até nos vasos sanitários eles estavam escondidos! Quem os leva? Como os leva?

A verdade é que o crime, a cada dia, está mais forte, embora o contribuinte pague impostos pesados. Ainda ontem, falei em reforma tributária. Todos concordam com ela, mas ninguém a faz. Não há candidato que, no debate, não tenha concordado com uma minirreforma tributária.

Pagamos os impostos mais caros do mundo e, no Brasil, ainda pagamos o vergonhoso imposto sobre a comida - dizem, aqui, que somos o único País a fazê-lo, mas acredito que deva existir pelo menos mais um, no mundo, para fazer coro conosco. Mesmo assim, lemos notícias como essa, sobre o presídio de segurança máxima que foi varrido e completamente analisado por uma força que não era policial - o que criou até uma crise entre o Secretário de Segurança, a polícia estadual, os Procuradores, a polícia federal - e onde foram encontrados, depois, mais cento e quatorze telefones celulares.

O que está acontecendo com as nossas instituições?

As Forças Armadas não têm armamentos e orçamento. Quanto à polícia, disseram que ela receberia todo o apoio e ouvimos falar de um Plano Nacional de Segurança, com a criação de uma força tarefa, mas em um mês e meio surgem muito mais celulares no presídio.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, Senador Roberto Requião.

O SR. Roberto Requião (PMDB - PR) - Senador Ney Suassuna, gostaria de fazer apenas uma curta observação ilustrativa. V. Exª falou do nosso País, onde a comida é gravada por impostos. Nesta semana, nós lemos, em todos os jornais, que o Governo Federal, depois de ter facilitado o que podia para a indústria automotiva, por intermédio da sua famosa política automotiva, ampliada por Governadores rigorosamente irresponsáveis, reduziu, de forma drástica, o imposto dos automóveis. A comida tem impostos, os automóveis deixam de ter e a política automotiva se suportava na hipótese de que faríamos favores enormes mas cobraríamos impostos depois. É um Governo que, realmente, só se preocupa com as elites e com o grande capital internacional. O povo está rigorosamente esquecido e dessa marginalização do povo, Senador Ney Suassuna, desses 54 milhões de brasileiros que, segundo o IBGE, vivem abaixo do nível da pobreza, surgem a possibilidade e o ambiente para a proliferação da violência. É a marginalidade, dela para a contravenção é um passo e, com um passo a mais, chega-se na criminalidade.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Obrigado, nobre Senador Roberto Requião. Não tenho dúvidas de que esse é o mecanismo. O ambiente é propício e falta respeito às instituições. Iniciei a minha oração de hoje falando exatamente isto: deixamos de respeitar as instituições e as autoridades. Por quê? Porque fatos como esses nos deixam pasmos. A cada dia os criminosos estão mais bem aparelhados.

Ontem, em Brasília, a polícia encontrou uma quadrilha que está fazendo dólares e tudo o que se possa imaginar na área de impressos. Os documentos também já não merecem confiança. Marcas d’água, tudo o que se possa imaginar estava sendo impresso. E por quê? Porque as pessoas não temem. A Justiça é lenta e não por culpa dos juízes, mas porque está abarrotada de processos. E os impostos? Falta dinheiro, mas há R$180 bilhões a serem cobrados só nas cinco regiões federais. Os juízes não conseguem acelerar o seu trabalho porque não têm nem contingente nem celeridade. Aliás, Sr. Presidente, quando os processos chegam a ser julgados já se passaram dez, quinze anos. Na Procuradoria-Geral da Fazenda há 1,5 milhão de processos tramitando, a passo de tartaruga. Quando chega a hora de cobrar, o cidadão já morreu ou já tirou todos os bens do seu nome.

O que está acontecendo com este País? Na semana passada houve uma crise de histerismo: o dólar chegou a três reais e sessenta e poucos centavos. 

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Senador Ney Suassuna, V. Exª me concede um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Com muita satisfação, Senador.

O Sr. Geraldo Cândido (Bloco/PT - RJ) - Senador Ney Suassuna, quero fazer coro com V. Exª quando aborda a questão da segurança, dos presídios, da falta de recursos e de armamento adequado para as Polícias Federal, Civil e Militar. Somando-se a isso, há o problema da falta de recursos para as Forças Armadas. Na semana passada, os jornais anunciaram que o Exército iria dispensar 44 mil recrutas. O que considero algo muito grave. Por exemplo, no Rio de Janeiro, no 1º Exército, o quartel-general teve a luz cortada pela Light por falta de pagamento. Ontem foi a vez da UFRJ - inclusive está nos jornais de hoje, estampada, na primeira página, a fotografia do Reitor, com os alunos, segurando uma vela acesa. Em situação mais grave do que a da Universidade Federal do Rio de Janeiro, estão os hospitais, que também tiveram sua energia cortada. Imagine, por exemplo, na hora de uma cirurgia, a suspensão do fornecimento de energia! Isso é criminoso até! E aconteceu no Estado do Rio de Janeiro: os hospitais estão funcionando com geradores, o que apenas atenua a situação, não resolve o problema. No Arsenal de Marinha, há a dispensa de todos os servidores em um dia da semana, para evitar gastos, já que os servidores se alimentam onde prestam serviço. Veja V. Exª: estão dispensando servidores para cortar despesas, estão dando feriado forçado. Soma-se essa situação à das universidades e das Forças Armadas e à questão da segurança pública. No Estado do Rio de Janeiro vivemos uma situação ímpar. Infelizmente, temos um poder paralelo hoje no Estado. Ou seja, o crime organizado e o narcotráfico se estabeleceram como um poder acreditado. Precisamos acabar com isso imediatamente! Agradeço a V. Exª pelo aparte.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Geraldo Cândido, pela intervenção de V. Exª, que me deixou sensibilizado.

Nós, no Rio de Janeiro, acabrunhados, temos visto a polícia de cócoras, atrás dos muros de concreto, enquanto os bandidos, armados com metralhadoras AR-15, os metralham. Isso quando eles não pegam um jornalista e o executam - e não antes de ter matado, no mesmo local, outras 60 pessoas.

Dizemos que não há pena de morte no Brasil. É engano. Há pena de morte, sim, em vários lugares. E tribunais sumaríssimos: qualquer bandidos tem o direito de matar.

Chegamos ao exagero, nesta Casa, de querer proibir o porte de arma até para fazendeiros, em suas propriedades. Os homens de bem não podem ter armas, mas os bandidos têm armamentos os mais modernos possíveis, os quais a polícia nem sequer conhece. Essas são situações que nos surpreendem.

V. Exª falou das universidades. Mas isso não acontece somente com as do Rio. Posso lhe afirmar que as universidades do Rio de Janeiro, onde sou professor, estão passando por uma fase terrível, porque sequer a conta de luz estão podendo pagar. O mesmo vem acontecendo em outras universidades, onde não se pode pagar xerox, não se pode pintar o prédio, não se pode consertar os encanamentos e nem sequer pagar a conta telefônica. Vivemos o caos nas universidades.

Sr. Presidente, se podemos mudar um país, podemos fazê-lo por meio da educação, da Justiça, e do seu braço armado, que é a polícia. Ou da liberdade, cujo braço armado são as Forças Armadas. Nesta Casa, hoje, falamos de caos nas Forças Armadas, nas universidades e na polícia. E os nossos impostos são os mais caros do mundo. Precisamos repensar o nosso País e o nosso papel nesta Casa Legislativa e na Câmara.

É culpa nossa a lentidão no andamento dos processos? É culpa do Executivo? Quem é o culpado? Com certeza não é o contribuinte, porque ele, principalmente o mais pobre, tem o seu imposto descontado diretamente no contracheque.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Senador Romeu Tuma, V. Exª tem a palavra.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Desculpe-me interrompê-lo, nobre Senador, mas V. Exª praticamente se dirigiu a mim ao citar a questão da segurança.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Porque V. Exª é um especialista no assunto segurança, que tem nos preocupado.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - V. Exª tem toda razão. Estou ciente de que tem havido interrupção em investigações e em operações por falta do elemento principal, que é o financeiro. Há cerca de 15 dias - não faço crítica a ninguém - tomei um susto quando li que a força terrestre, que é o Exército, estaria, infelizmente, coagida a dispensar 44 mil jovens no meio de sua formação profissional como soldados. Entrei em contato com diversas pessoas a fim de me inteirar da veracidade dos fatos, já que tal atitude é perigosíssima, principalmente no que diz respeito ao aspecto social e no risco de a criminalidade aumentar. Soube então que o Presidente da República teria determinado a suplementação de verba para que se resolvesse o problema dessa força terrestre. Mas, uma semana depois, vi, na televisão, jovens chorando porque estavam sendo dispensados quatro meses antes de sua formação e dizendo que só poderiam servir à Pátria com o coração. Preocupei-me, Senador Gilberto Mestrinho, porque, em seguida a esse fato, pude ver um outro jovem, de óculos escuros, bem postado, ex-pára-quedista do Exército, dizendo na televisão que, por falta de oportunidade de emprego - desculpa de malandro; aliás, isso serve para observarmos o que pode acontecer -, ele passou a ser instrumento de instrução das quadrilhas organizadas do Rio de Janeiro. Por ser pára-quedista, tinha técnica em lançamento de bombas, em armamento, em tiro. Então, os bandidos o contrataram para ser instrutor, ou seja, para ensiná-los a fazer o que eles estão fazendo: atirar em prédios, no Rio de Janeiro, jogar bombas nos tribunais, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Preocupei-me. Não por achar que esses jovens possam ir para a criminalidade, pois há uma formação boa no Exército brasileiro. Há amor à Pátria, há cidadania, há disciplina e também algumas profissões - lá eles aprendem a dirigir, aprendem mecânica, aprendem datilografia. Tudo isso poderia abrir a porta para um emprego. Muitos, lá, estavam lutando para fazer concurso para Cabo para tentar seguir carreira no Exército. Imagine V. Exª 2% a 3% desse efetivo sendo cooptado pela criminalidade por falta de opção! Imagine o que poderá acontecer no aspecto do aumento da criminalidade! Deixo essa interrogação para V. Exª e para aqueles que precisam pensar e decidir. Temos o FAT que, muitas vezes, oferece cursos em vários sindicatos, em várias organizações. Por que não pagam para esses meninos aprenderem uma profissão e terem um futuro sadio, para melhor servirem à Pátria, à própria família e a seus próprios interesses?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Romeu Tuma. Fico honrado com a intervenção de V. Exª, e, com toda a certeza, o seu aparte será de grande importância nesta oração.

Sr. Presidente, ao encerrar, quero dizer que o crime não está sofisticado apenas porque estão sendo usados celulares dentro dos presídios de alta segurança e porque se passou a utilizar impressoras de alta definição e estão sendo feitas notas de dólar e de real e papel com marca d’água e tudo o mais. O crime está organizado também porque de, quando em quando, vemos - e de novo naquele embotamento de quem está acostumado a fazer isso na rotina, porque isso passou a ser rotineiro - os crimes financeiros.

Na semana passada, houve uma crise financeira em que bancos importantes fizeram operações “Zé com Zé”: “Eu compro de você, e você compra de mim, para levantarmos o dólar”. Quem tinha vencimento a pagar - e eram muitas as empresas que o tinham - teve que comprar no pico. Quantos milhões de dólares ganharam essas instituições? E não foram só essas instituições que lucraram com isso.

Há poucos minutos, eu comentava essa situação com o Senador Romeu Tuma. Entrei com um requerimento pedindo ao Banco Central que levantasse quem são os ganhadores - e são os mesmos de sempre -, porque os perdedores sabemos quem são. Mas quem são os ganhadores de sempre? Quem está ganhando nessas supervalorizações do dólar? Quem está ganhando com esse aumento do risco país Brasil? É um outro tipo de crime, é um crime mais sofisticado, feito por gente mais inteligente, mas tão criminosa quanto os que estão fabricando moeda falsa ou comandando o crime de dentro de penitenciárias.

Encerro, Sr. Presidente, dizendo que me preocupo quando vejo universidades, as Forças Armadas, as forças policiais e a Justiça em crise por falta de recursos e, principalmente, por falta de uma máquina que as valorize. Sei que a cada dia se pensa em criar um imposto novo e que são necessários novos recursos, mas a carga recai sobre o trabalhador e os gêneros alimentícios. Não é isso que o povo está esperando de nós ou do Governo; o povo está esperando soluções. E vejo com muita tristeza o fato de que essas soluções não são alcançadas. Embora muitos no Senado Federal estejam lutando por isso, a maioria dos Parlamentares paga o preço, porque todos jogam a culpa no poder desarmado que representamos. Temos uma parcela grande de responsabilidade.

Deixo essas preocupações e essas indagações para a reflexão de V. Exªs. Espero que meu requerimento pelo menos chegue ao final, para que saibamos quem são os ganhadores nesse último tipo de crime.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/08/2002 - Página 15196