Discurso durante a 103ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a gravidade do episódio do corte de energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, que evidencia a falta de atenção do Governo Federal para as áreas estratégicas da educação e energia elétrica. Considerações sobre o ranking mundial de Desenvolvimento Humano, da Organização das Nações Unidas - ONU, que destaca o Brasil entre as nações com as maiores concentrações de renda do mundo.

Autor
Emília Fernandes (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA NACIONAL.:
  • Comentários sobre a gravidade do episódio do corte de energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, que evidencia a falta de atenção do Governo Federal para as áreas estratégicas da educação e energia elétrica. Considerações sobre o ranking mundial de Desenvolvimento Humano, da Organização das Nações Unidas - ONU, que destaca o Brasil entre as nações com as maiores concentrações de renda do mundo.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2002 - Página 15566
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA NACIONAL.
Indexação
  • REPUDIO, FALTA, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, EDUCAÇÃO, ENERGIA, REFERENCIA, AUSENCIA, PAGAMENTO, TARIFAS, UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (UFRJ), RESULTADO, CORTE, ENERGIA ELETRICA.
  • REPUDIO, ATUAÇÃO, PAULO RENATO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), ACEITAÇÃO, PROPOSTA, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), TRANSFORMAÇÃO, EDUCAÇÃO, MERCADORIA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, EXCESSO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA DE ENERGIA ELETRICA, PREJUIZO, POPULAÇÃO.
  • APOIO, ATUAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, DEBATE, EMPRESARIO, PROJETO, MELHORIA, SISTEMA ELETRICO, ELOGIO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), AUSENCIA, CRISE, ENERGIA.
  • ANALISE, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DESENVOLVIMENTO SOCIAL, CLASSIFICAÇÃO, BRASIL, EXCESSO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
  • CRITICA, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INSUFICIENCIA, CRESCIMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, POLITICA SOCIAL, IMPLANTAÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, SUBORDINAÇÃO, INTERESSE, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), TENTATIVA, ALTERAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), PREJUIZO, TRABALHADOR.
  • APOIO, REIVINDICAÇÃO, MULHER, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO, SOLICITAÇÃO, EQUIPARAÇÃO SALARIAL, HOMEM.
  • NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, AMPLIAÇÃO, SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E DAS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (SIMPLES), INCENTIVO, PRODUTIVIDADE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. EMILIA FERNANDES (Bloco/PT - RS) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, perplexos, tomamos conhecimento pela mídia de mais um episódio que evidencia o descaso, a falta de seriedade com que o Governo Federal trata as áreas estratégicas, especialmente a educação e o setor energético. A Universidade Federal do Rio de Janeiro, a maior universidade pública federal brasileira, ficou às escuras logo no começo desta semana.

A falta de luz atingiu o prédio da Reitoria e todas as unidades - incluindo dois hospitais - do campus da Praia Vermelha. Vidas foram postas em risco nesse episódio, tanto as dos pacientes dos hospitais da UFRJ quanto as das pessoas que ficaram presas nos elevadores, que só foram socorridas depois que os próprios alunos negociaram uma trégua de 20 minutos com os funcionários da Light e puderam atender aos casos emergenciais.

Este episódio é vergonhoso! A Universidade Federal do Rio de Janeiro, como todas as instituições de ensino público deste País, está nesta situação em decorrência da falta de investimentos, da inabilidade e total falta de respeito e de seriedade deste Governo para com a educação. Prova disso é que o ministro Paulo Renato já concordou, durante um fórum internacional ocorrido em maio nos Estados Unidos, com a proposta da Organização Mundial do Comércio (OMC) de tratar a educação como mercadoria e não como um bem público.

Faço aqui um parêntese para repudiar essa decisão da OMC e insistir na necessidade de realizarmos audiência pública, aqui no Senado Federal, para debater o assunto e ouvir o Ministro da Educação e o embaixador do Brasil junto à OMC, Luís Felipe Seixas Corrêa, sobre a posição do Governo brasileiro. Não podemos permitir que essa proposta ultrajante seja aprovada e passe a vigorar. Nosso repúdio!

Outra prova do descaso, despreparo e falta de sensibilidade deste Governo para com a educação, com o qual não compactuamos e trabalhamos para revogar, são os vetos presidenciais ao Plano Nacional de Educação. Esses vetos, que, tenho certeza, vamos derrubar no Congresso Nacional, são resultados concretos da falta de visão e de compromisso deste Governo entreguista e neoliberal.

Como várias universidades deste país, a UFRJ está mergulhada em dívidas. Junto à Light, o débito é de R$ 6,6 milhões. E por que a instituição chegou a este ponto? De acordo com o Reitor Carlos Lessa, porque o orçamento de custeio - de R$30 milhões anuais - é insuficiente para cobrir todas as despesas. Ele acredita que até o fim do ano a Universidade terá um rombo de R$10 milhões.

Qualquer pessoa com o mínimo conhecimento na área educacional sabe que nenhuma instituição pública de ensino tem condições de comprometer mais de 30% de seu orçamento com pagamento de conta de luz. A expectativa para o próximo ano é ainda mais tenebrosa para a UFRJ. A Universidade tem uma previsão orçamentária para o próximo ano de R$35 milhões. Pelos cálculos da direção, R$5 milhões a mais do que em 2002 não serão suficientes para cobrir os gastos com energia, especialmente porque estão previstos aumentos tarifários para o próximo ano.

O Governo Federal já se pronunciou sobre o episódio por meio do Ministério da Educação. Como de costume, este Governo, conforme vimos à época do criminoso “apagão”, disse que foi pego de surpresa com o “inadmissível” corte de energia.

Inadmissível é a postura da Light frente a tão sério assunto. A empresa já informou que só voltará a fornecer energia elétrica à UFRJ se a instituição se comprometer formalmente a pagar toda a dívida até o fim do primeiro semestre de 2003. E a ameaça de, caso isso não ocorra, manter os hospitais e todos os prédios da Universidade às escuras por tempo indeterminado.

Felizmente, o Ministério Público já instaurou, nessa terça-feira, procedimento administrativo, que precede a instauração de inquérito, para investigar o corte de energia nos campus da UFRJ. Se a energia não for restabelecida dentro de três ou quatro dias, o Ministério Público promete adotar medidas judiciais contra a Companhia Energética. Aplaudimos essa determinação do Ministério Público e acreditamos que a mesma medida deveria ser tomada com relação ao Governo Federal. A UFRJ é responsabilidade da União, que também deve ser acionada e assumir sua parcela de culpa.

É ultrajante que um ministro da Educação declare, como o fez nessa terça-feira, que o problema não é do Governo Federal, transferindo exclusivamente à Universidade, que, repito, é da União, todo o ônus por não ter negociado o pagamento da dívida ao gosto da Light.

Transferir sua responsabilidade ao trabalhador e à trabalhadora brasileira, ao povo deste País, tem sido uma regra adotada por este Governo que aí está, especialmente quando o assunto é política energética.

Vimos isso ocorrer com o apagão, que castigou a população de quase todos os Estados brasileiros. No meu Estado, o Rio Grande do Sul, isto só não ocorreu por conta da seriedade, do compromisso e da competência do Governo Democrático e Popular Gaúcho e da fundamental cooperação do povo riograndense.

Agora, mais uma vez, o Governo Federal transfere aos cidadãos e cidadãs brasileiros a conta de sua incompetência. O preço da energia elétrica no Brasil, que já aumentou três vezes mais do que a inflação nos últimos doze meses, vai continuar nas alturas. O Banco Central já avisou que o chamado tarifaço será estendido pelo menos até 2003.

Desde o fim do racionamento, quem economizou energia está pagando uma conta alta. Só no Distrito Federal, por exemplo, conforme notícia do Correio Braziliense, desde 1999 a conta de luz subiu 56,7%. Isso representa o dobro da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC-A) do IBGE no período. Até 26 de agosto, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) divulga o novo reajuste para consumidores do DF e parte do Entorno.

O tarifaço está longe de ser um problema só dos que vivem no DF. Ao contrário. Em todo o País, a energia elétrica subiu 21% somente nos últimos 12 meses, o que representa quase três vezes mais do que a inflação do período, calculada em 7,66% pelo IPC-A.

Em parte, isso pode ser explicado porque os preços da energia são corrigidos pelo IGP-M, da Fundação Getúlio Vargas, um índice com forte influência do câmbio. Ou seja, em tempos de alta do dólar, as tarifas disparam. Quem sofre com isso é o consumidor e a consumidora. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), as tarifas públicas em geral, incluídas aí a energética, de gás de cozinha e de telefone, já representam 40% do custo de vida das famílias de baixa renda.

Para piorar ainda mais a situação, o Comitê de Política Monetária do Banco Central calcula fechar o ano com inflação de 6%, e o aumento da energia elétrica vai acumular em 2002 aumento de 19,2%. Em 2003, a previsão é de inflação de 4% e reajuste energético de 14,4%.

Quando digo que esses aumentos, em parte, podem ser explicados pela variação cambial é porque a maior parcela de responsabilidade pelos aumentos é deste Governo entreguista. Numa decisão irresponsável e antipatriótica, ao privatizar as companhias distribuidoras na década de 90, o Governo Federal dava início ao processo de encarecimento da energia elétrica no Brasil.

Para assegurar lucro aos investidores, elevando o ágio sobre o preço de venda das estatais para supostamente garantir investimentos na melhoria da qualidade dos serviços, este Governo entreguista, ao elaborar os contratos de concessão, não economizou facilidades para os novos controladores das empresas. Ao usar a privatização para fazer caixa e, simultaneamente, garantir remuneração que incentivasse novos investimentos, a União salgou as contas de luz.

Na verdade, salgou as contas de luz cobradas do cidadão comum. As empresas que ganharam de presente, das mãos do Governo brasileiro, as distribuidoras energéticas só têm o que comemorar. Os contratos de concessão estabelecem que o governo precisa garantir “o equilíbrio econômico financeiro das empresas”.

Privatizando o setor sem a devida regulamentação, fiscalização e sem definir o que significa na prática o “equilíbrio” das empresas, este Governo simplesmente entregou de bandeja aos novos controladores R$2,4 bilhões para repor as perdas que tiveram com o racionamento de energia do ano passado. Receberam o dinheiro em forma de empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e tiveram direito a um aumento de 2,9% para os consumidores residenciais e de 7,9% para os comerciais e industriais. Aumento concedido para o pagamento do empréstimo junto ao BNDES.

Setores produtivos de nossa sociedade, que enfrentam hoje grandes dificuldades para manter o crescimento e alavancar a economia do País, foram fortemente atingidos por este esquema. As indústrias que integram a Abrace, consumidoras de quase a metade da energia do País, passaram a ter taxa extra de R$800 milhões por mês para pagar a sobretaxa e foram obrigadas a cortar a produção no ano passado. Enquanto isso, graças aos benefícios governamentais, as concessionárias de energia elétrica tiveram, no primeiro trimestre deste ano, lucratividade em torno de 8,29% sobre o patrimônio, mal sentindo os impactos do apagão e do desaquecimento da economia.

Mas a ganância dos exploradores de tão estratégico e lucrativo setor parece não ter fim, senhoras e senhores. Mesmo com os aumentos de tarifa superiores à inflação, as distribuidoras aumentam novas sobretaxas. A justificativa é a elevação do preço da energia vinda de Itaipu - empresa bilateral e por isso com preços atrelados ao dólar. As distribuidoras argumentam que precisariam de 3% a 10% de reajuste em todas as contas, dependendo da região, para compensar a perda de receitas.

Que perdas, senhoras e senhores? Essas empresas, brindadas pela irresponsabilidade do Governo FHC, só receberam benefícios desde que assumiram o controle do setor energético brasileiras. Perdas tiveram os trabalhadores e as trabalhadoras, as famílias brasileiras, os setores produtivos, que não têm mais como arcar com tantos reajustes tarifários, impostos e arrochos salariais.

A indefinição do modelo, a falta de regulamentação e fiscalização, e o abandono dos investimentos estatais resultaram na crise de energia de 2002 e nesses aumentos espúrios. Até hoje o Governo não definiu claramente a quem cabe a responsabilidade de investir nas áreas de geração e transmissão de energia no Brasil. O modelo de privatização adotado por este Governo neoliberal está inviabilizando o desenvolvimento nacional.

Não podemos mais aceitar aumento de tarifas toda vez que o dólar sobe. Não é verdade que a especulação financeira, resultante da vulnerabilidade do País, é responsável pela inflação. A culpa é deste Governo e das dívidas interna e externa contraídas nos últimos anos. Nos anos FHC, a dívida pública saltou de R$153 bilhões para mais de R$700 bilhões, segundo o Dieese.

O Governo faz às empresas privatizadas, para não comprometer seus lucros, todas as concessões que não faz às públicas, sem que isso signifique investimentos. Ao contrário, na maioria das vezes, resulta em vultuosas remessas de lucros e dividendos ao exterior.

A sociedade tem o direito de saber como são feitos os acordos, a cisão das empresas estatais, que separa os ativos mais atraentes à captação do investimento externo. Também precisa tomar conhecimento dos efeitos das privatizações e do destino do dinheiro arrecadado com a venda do patrimônio nacional. Dinheiro cujo destino é ignorado até hoje.

O programa de privatização defendido e levado à cabo pelo atual Governo não foi acompanhado de um plano estratégico de desenvolvimento industrial. Os compradores das estatais promoveram demissões em massa, imotivadas, e reduziram direitos trabalhistas asseguradas em anos de luta democrática e legítima, com as bênção e com a ajuda dos neoliberais que estão no poder.

Urge intensificar a fiscalização das agências de regulação de forma que elas exijam o cumprimento das metas de investimentos e produção contratadas no processo de privatização, retirando obstáculos impostos pela gestão da política econômica para os investimentos das estatais.

No novo governo, as agências reguladoras precisam ter como meta principal a defesa dos interesses dos consumidores brasileiros, e não apenas o favorecimento das operadoras, como ocorre hoje. Além de permitir os aumentos indiscriminados sobre as tarifas, as agências, sem exceções, endurecem a legislação para punir os inadimplentes, mas não agem da mesma forma para punir as controladoras das empresas privatizadas que praticam preços abusivos e não primam pela excelência do serviço prestado.

Atualmente, os reais defensores dos interesses dos consumidores não pertencem às esferas governamentais. Aproveitando a temporada de revisão tarifária, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) encaminhou, nesta semana, para a Agência Nacional de Energia Elétrica, documento com propostas para a redução das tarifas energéticas.

De acordo com a entidade, entre 1995 - quando começaram as privatizações no setor - e julho de 2001, as tarifas de energia elétrica residenciais tiveram aumento médio de 129,85%, comparado com uma inflação de 72,75% medida pelo IBGE. Quando iniciou o processo de privatização, o Governo alegava que não tinha dinheiro para investir e, privatizando, as tarifas baixariam, por causa da concorrência, e o serviço melhoraria. Nem uma coisa nem outra ocorreu.

Atento à seriedade deste tema, ao drama dos consumidores e buscando uma solução democrática para a crise promovida pela incapacidade do Governo FHC em administrar setores tão fundamentais, nosso candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tem se empenhado na discussão de um novo projeto voltado para o setor energético, a ser formulado democrática e conjuntamente com representantes da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib).

Apesar de já ter uma proposta elaborada, pela primeira vez um candidato se dispõe a debater com empresários uma proposta a ser executada após as eleições. O que demonstra que é possível tratar, de forma séria e respeitosa, a energia elétrica neste País - como já foi evidenciado pelo Governo Democrático e Popular do Rio Grande do Sul, que garantiu o abastecimento elétrico em todo o Estado; impediu a privatização, já em andamento, de empresas do setor energético; estancou os cortes de energia por insuficiência de abastecimento; aumentou em 46% a capacidade elétrica do Rio Grande e ampliou o faturamento da Sulgás de R$2 milhões em 1998 para R$400 milhões neste ano e o patrimônio líquido da Companhia Riograndense de Mineração (CRM) em 731% nos últimos três anos.

Da mesma forma, queremos fortalecer o setor energético brasileiro; estabelecer o planejamento estratégico; garantir abastecimento, com qualidade e a preços acessíveis, à população de todos os Estados brasileiros; trabalhar pelo aproveitamento de fontes alternativas e pela eficiência energética, com respeito ao meio ambiente e em parceria com os diversos setores de nossa sociedade, dos consumidores e consumidoras residenciais, industriais, agrícolas, dos comércios e do setor de serviços. Isto é possível, com determinação e vontade política!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago à consideração de V. Exªs um outro assunto.

A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou recentemente seu ranking mundial de Desenvolvimento Humano. De acordo com o levantamento, nosso País, mais uma vez, destaca-se dentre as nações com as maiores concentrações de renda do mundo. O Brasil é o 73º colocado entre os 173 países pesquisados e o quarto pior do Planeta no quesito de distribuição de riquezas. Apenas Serra Leoa, República Centro-Africana e Suazilândia têm índices de concentração piores. Dentre nossos irmãos latinos, Argentina, Chile, Uruguai, México, Colômbia e Venezuela estão em melhor situação.

Este levantamento, mede a qualidade de vida e baseia-se no Índice de Desenvolvimento Humano das nações pesquisadas. Além de computar o PIB per capita, levam-se em conta indicadores de Educação, baseados na alfabetização, no nível de matrículas e expectativa de vida. Neste ínterim, é triste constatar que 20 milhões de brasileiros se sustentam com menos de 1 dólar por dia (o que, para as Nações Unidas, os coloca abaixo da linha de pobreza).

Apresentamos estes dados, Srªs e Srs. Senadores, por acreditarmos que eles são frutos do modelo econômico implantado no Brasil: o neoliberalismo. Não é possível viver mais uma década perdida, como foi a de 80, com crescimento negativo da economia por causa da crise da dívida externa. Tampouco compactuar com o continuísmo. Nos anos FHC, o PIB cresceu, em média, apenas 2,4% ao ano - o quarto pior desempenho de um Presidente, desde a República, em 1889. No mesmo período, a massa salarial caiu em 36% para 26% e os lucros, juros e aluguéis passaram de 64% para 74%.

Vemos, recorrentemente, projetos, pacotes e acordos financeiros serem elaborados de forma paliativa, visando apenas aplacar a fúria do mercado e a ganância dos especuladores nacionais e internacionais. No entanto, Sr. Presidente, é para o povo que devemos propor um novo modelo econômico, com desenvolvimento sustentável e integrado. Um novo projeto de Brasil é possível, com Justiça e Inclusão Social.

Mais do que oscilação de bolsas de valores, insegurança e instabilidade econômica, crises econômicas representam sofrimento, mais miséria, desemprego e exclusão social. É justamente nos países pobres e em desenvolvimento, nas Nações constantemente atingidas pelas crises financeiras, que encontramos a maior parte dos 800 milhões de pessoas que passam fome no mundo.

A política de ajuste estrutural é uma barreira à construção do bem-estar e à superação das desigualdades, que afeta as conquistas alcançadas até hoje no campo social e acelera o processo atual de exclusão. Os programas de privatização e de diminuição dos gastos sociais do Estado, bem como as políticas de flexibilização das relações trabalhistas - que aumentam o desemprego e a exploração da força de trabalho -, atingem especialmente as mulheres, quer como trabalhadoras, quer como mulheres em famílias trabalhadoras.

A doutrina neoliberal - que define e orienta o ajuste estrutural - atribui ao mercado o papel de regulador prioritário das relações sociais, desmobilizando a organização política da sociedade e redefinindo as responsabilidades do Estado. Para o neoliberalismo, o consumo é a principal forma de participação social, o que acaba excluindo de todos os direitos os não-consumidores, acelerando ainda mais a exclusão e o crescimento das desigualdades.

Ao relegar o Estado a um lugar menor diante das forças de mercado, o neoliberalismo promove o desmantelamento da estrutura deste Estado, com forte impacto sobre o desenvolvimento das políticas públicas. Nos últimos oito anos, o atual governo, assim como alguns governos estaduais e municipais, implementaram uma política neoliberal de desmonte do Estado e de desestruturação da área social.

A globalização do grande capital produziu um panorama extremamente negativo, que tem entre seus efeitos: a fragmentação do mundo do trabalho; a exclusão de grupos humanos, em especial a exclusão feminina, e o abandono de contingentes e regiões.

Vem ocorrendo uma concentração sem precedentes de riqueza em algumas empresas e países e a perda de poder da maioria dos Estados em favor das corporações privadas. Aumentam as desigualdades entre os países ricos e pobres. O Brasil tem seguido as regras dessa perspectiva de globalização neoliberal e, assim, priorizado as formas de inserção ditadas pelos interesses do mercado capitalista, que se dão de forma subordinada e subalternizada.

Considerando a população mundial, os 20% mais ricos ganham 74 vezes mais do que os 20% mais pobres. As 200 pessoas mais ricas do mundo possuem mais dinheiro do que a renda combinada dos 40% mais pobres da população mundial. Este cenário internacional compacta desigualmente os sexos, raças e etnias. Para se ter idéia, Srªs. e Srs Senadores, atualmente, 80% dos pobres do mundo são mulheres.

Devemos lembrar que não só o Brasil, mas todos os países que adotaram o neoliberalismo sofreram fortes turbulências. Perplexos, acompanhamos as dificuldades enfrentadas diariamente por trabalhadores, empreendedores e pela população dos países em crise, especialmente na América Latina. Há meses, nos solidarizamos com o drama do povo argentino; há semanas, acompanhamos o agravamento das dificuldades econômicas no Uruguai e em nossa Nação.

Durante toda a década de 90, nada menos que 40 mercados emergentes experimentaram crises ligadas ao mercado de crédito e capital. Mercados estes que correspondem a um terço dos países em desenvolvimento no mundo.

Países em dificuldade, incluindo o nosso, constantemente vêem-se envolvidos num círculo vicioso que, em vez de solucionar o problema, só o agrava, aumentando a dependência das nações soberanas junto aos organismos internacionais como o FMI, o BID e o BIRD.

A regra sempre é a mesma: diante de um pedido de ajuda, estes organismos fazem novas exigências, estabelecem condições e, na melhor das hipóteses, liberam recursos que, paliativamente, aliviam a situação do pleiteante, mas não a resolve. Em meses, a via-crucis em busca de novos empréstimos financeiros se repete, de forma mais grave e nefasta.

O Governo Brasileiro, mais uma vez, parte para uma negociação com o Fundo Monetário Internacional. Um socorro que nos leva a questionar se já não seria hora de andarmos com nossas próprias pernas. Desde 1998, o FMI interfere em nossa política monetária e cambial. Afinal, o atual acordo em vigor, que acabaria no próximo dia 15 de dezembro, pode ser estendido com a aprovação do “acordo de transição”. Tal “parceria” permanente, e não em regime de exceção, como deveria ocorrer em casos de socorro financeiro, é inconcebível para uma Nação soberana e independente como deveria ser a nossa.

Sr Presidente, o povo brasileiro não pode mais ser subestimado. Este modelo econômico, que transformou a nossa pátria em quintal do FMI, pretende alugar a estratégica base de Alcântara aos Estados Unidos; quebrar nossos setores produtivos com a proposta de anexação que hoje é representada pela ALCA; tratar a Educação como mercadoria, como propõe a Organização Mundial do Comércio; desmontar a Consolidação das Leis Trabalhistas, retirando direitos, enfraquecendo sindicatos e os legítimos representantes dos trabalhadores.

Seguindo a lógica neoliberal, que orienta suas políticas, este governo tem elaborado projetos de lei para destituição de direitos e que flexibilizam as relações trabalhistas. São exemplos o anteprojeto de lei que busca alterar o artigo 7º da Constituição (que define os direitos dos trabalhadores) e o artigo 618 (normatização das negociações coletivas) da CLT. A proposta de reformulação deste último artigo pretende fazer prevalecer acordos de negociações coletivas sobre o que já está previsto na lei como direito trabalhista.

Destaca-se ainda a Lei 9601/95, que cria o banco de horas, modificando o artigo 59 da CLT. Sob este regime - que autoriza a substituição do pagamento de horas-extras pela compensação por horas trabalhadas -, crescem os riscos de super exploração da força de trabalho em detrimento da qualidade do emprego, em especial no caso da força de trabalho das mulheres, já submetidas mais intensamente à informalidade.

Diante deste quadro, no documento Plataforma Política Feminista, lançado hoje na Câmara dos Deputados, as mulheres organizadas nos vários movimentos reivindicam o fim da discriminação de gênero e racial - salarial e profissional. Exigem igualdade de oportunidades e justiça no mundo do trabalho. Reafirmam o compromisso com a construção de um novo Brasil, com um governo de reconstrução nacional que priorize o bem-estar do povo brasileiro, em especial das trabalhadoras e dos trabalhadores, e com independência, soberania nacional e democracia popular, sem aplicação da política neoliberal e visando uma sociedade com justiça social.

É chegada a hora da mudança, de fortalecer nossas matrizes produtivas, apoiar e garantir os direitos dos trabalhadores, gerar emprego e renda, ampliar a cidadania, a participação política e democrática de toda a nossa população.

Esta rápida análise evidencia que, mais do que ações emergenciais de socorro, devemos considerar a raiz das crises econômicas, buscando soluções eficazes, a médio e longo prazos. No Brasil, necessitamos de uma mudança imediata, no eixo da política econômica, como forma de conter a crise no mercado. Devemos sim fazer a reforma tributária, fortalecer as exportações, diminuir a carga tributária que onera a produção e castiga os trabalhadores.

Estamos em pleno período eleitoral, mas não podemos esquecer que as eleições se travarão num cenário de dificuldades econômicas que não podem ser ignoradas. Devemos mostrar à sociedade que estamos dispostos a cumprir nossa parte na luta comum de fazer com que os problemas de todos os brasileiros sejam superados com menos ônus para o povo - do qual somos os legítimos representantes. Porém, é importante que o governo FHC assuma toda a sua responsabilidade, os equívocos no campo econômico e social. Não tente transferir ou dividir responsabilidades e nem alimente a onda determinante contra um outro modelo de país, que é possível.

A Câmara dos Deputados, após destrancar sua pauta de votação, pretende priorizar a votação do PL 6.665/02, que dispõe sobre o fim da cumulatividade de impostos, com o objetivo de sinalizar positivamente aos investidores e dar oportunidade às empresas de competir no mercado externo.

Seria importante que, assim que a matéria fosse remetida ao Senado Federal, também nos concentrássemos, com urgência e seriedade, em sua apreciação. Devemos apoiar, em caráter emergencial, esta minirreforma tributária, que dentre vários fatores porá fim a cumulatividade do PIS e da Confins, visando desonerar a produção, contribuindo para a geração de novos empregos e para o incremento das exportações.

Atualmente, o PIS incide de forma cumulativa na produção. Por isto, é necessário um novo formato para o tributo de forma a desonerar o setor produtivo. Assim, o PIS deixará de incidir sobre o faturamento das empresas e será calculado sobre uma base menor, possibilitando a dedução de vários gastos.

Temos a consciência de que a cumulatividade não é o único problema do sistema financeiro. O que realmente compromete a competitividade e a eficiência dos setores produtivos é a imposição de uma carga tributária incompatível com o nível de renda do país e muito superior a que é suportada por seus competidores internos e externos.

Mesmo assim, apoiaremos a minirreforma por acreditarmos que ela pode ajudar o Brasil neste momento de crise, aliviando as pressões do mercado e nos dando a tranqüilidade necessária para realizarmos a transição política que se aproxima sem sobressaltos.

É necessário nos debruçarmos na apreciação de projetos que mudam aspectos da tributação para reduzir os males que este governo provocou ao não permitir a aprovação de uma reforma tributária global. Uma das propostas, também em apreciação na Câmara dos Deputados, é ampliar o Simples (Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte).

Apoiamos o projeto de lei, visto que este imposto está defasado em decorrência da flutuação cambial. A ampliação do teto do Simples para o setor de serviços é uma questão de justiça, de isonomia fiscal. Para as pequenas e microempresas, significa a retirada de muitas delas da clandestinidade. Para milhares de trabalhadores, será o reconhecimento de seus direitos trabalhistas e previdenciários.

Desta forma, Senhor Presidente, acreditamos que a minirreforma dará, de imediato, fôlego à produção e a geração de empregos, além de abrir caminho para o novo governo realizar a reforma tributária que nosso País e seus setores produtivos precisam e tanto almejam.


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