Discurso durante a 103ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato de suas experiências frente ao Ministério de Minas e Energia.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA.:
  • Relato de suas experiências frente ao Ministério de Minas e Energia.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2002 - Página 15595
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, POPULAÇÃO, APOIO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, CRISE, ENERGIA, REDUÇÃO, CONSUMO, ENERGIA ELETRICA.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, ORADOR, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), CRIAÇÃO, CAMARA DE GESTÃO, CRISE, ENERGIA ELETRICA, APRESENTAÇÃO, DADOS, REDUÇÃO, CONSUMO, COMBATE, PERDA, ENERGIA, BENEFICIO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, EMPREGO, CONSTRUÇÃO, USINA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste momento em que a sociedade brasileira, os veículos de comunicação e o meio político estão imersos no debate eleitoral, à procura de alternativas para os graves problemas que atingem nosso País, venho a esta tribuna trazer à memória de todos aqueles que pensam em soluções para o Brasil o exemplo de cidadania e responsabilidade social dado pela população quando da crise de abastecimento de energia que enfrentamos no ano passado.

Fui testemunha privilegiada desse momento histórico em que o povo brasileiro deu provas inequívocas de amadurecimento social, organização e solidariedade. Atendendo a um apelo do Governo, assumiu o desafio de poupar energia, como única medida realmente capaz de evitar o desabastecimento.

Os meios de comunicação, da mesma forma, desempenharam papel fundamental. Com iniciativas espontâneas, provenientes de todas as regiões do país, cartilhas foram elaboradas por inúmeros jornais, ensinando a população a poupar energia. Tabelas com os diversos níveis de consumo de eletrodomésticos foram amplamente divulgadas, popularizando o uso das lâmpadas eletrônicas. As emissoras de televisão produziram programas especiais sobre o assunto, dando conhecimento a todos os brasileiros do real valor da energia elétrica e da necessidade de se combater o desperdício.

Antes de abordarmos diretamente o assunto, devo fazer um preâmbulo relatando um pouco de minha experiência frente ao Ministério de Minas e Energia em um momento tão grave para o setor. Assumi o cargo no dia 13 de março de 2001, enfrentando, de imediato, as graves conseqüências decorrentes do acidente e posterior afundamento da Plataforma P-36 da Petrobrás, tragédia de grande proporções, principalmente pela perda de vidas humanas.

Na semana seguinte, o Operador Nacional do Sistema - entidade responsável pela operação do complexo Sistema Interligado Nacional - informou oficialmente ao Ministério o estado crítico em que se encontravam os reservatórios das regiões Sudeste/Centro-Oeste e Nordeste. A conclusão do estudo apontava para a dramática condição: caso não ocorressem índices pluviométricos superiores à média histórica dos meses de março, abril e maio, o sistema não atenderia à demanda nessas regiões a partir do segundo semestre.

Deparei-me com o desafio e constatei, imediatamente, que a estrutura administrativa do Ministério não seria capaz de enfrentá-lo. A crise era grave e poderia gerar, caso ocorresse o desabastecimento, conseqüências imprevisíveis para a economia e para a sociedade. Era questão de governo e, como tal, necessitava do envolvimento e do empenho de todas as áreas da administração. Não seria um ministério setorial, desaparelhado e enfraquecido em razão de um processo de transição incompleto, o meio eficiente para se enfrentar o desafio.

Consciente desse quadro, solicitei ao Presidente Fernando Henrique uma reunião interministerial e propus a criação de uma câmara com poderes de articulação suficientes frente à gravidade do momento. Antes de qualquer vaidade pessoal, movida pelo poder transitório de um cargo público, pensei no País.

O sucesso resultante dessa iniciativa é do conhecimento de toda a sociedade. A Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica transformou-se em um exemplo acabado da moderna administração pública. Sua experiência nos deixou um enorme aprendizado e alguns de seus aspectos emergiram como fundamentais: a transparência, que prevaleceu em todas as atitudes tomadas, e a comunicação permanente com a sociedade foram imprescindíveis para o sucesso do racionamento. De outro lado, a gestão coordenada do processo mostrou a importância da unicidade de comando em situações de crise.

Quando veio a crise, tínhamos um desafio imenso à frente: a capacidade de geração era, então, insuficiente para atender à demanda prevista, que tendia ao crescimento. É importante, aliás, que se registre que o crescimento do consumo de energia elétrica nacional tem sido historicamente superior ao aumento do Produto Interno Bruto, em razão do crescimento populacional e da sua concentração nas zonas urbanas, do esforço de universalização da oferta e da modernização da economia. A taxa média de crescimento anual da demanda tem ficado em torno dos 4,5%

Entre uma série de medidas, a CGCEE estabeleceu o sistema de metas de economia para cada segmento de consumo, de maneira que cada consumidor pudesse decidir como economizar e contribuir para a imprescindível redução da demanda. Editada a Medida Provisória nº 2.147, em 15 de maio de 2001, cuja versão final foi a MP nº 2.198, de 28 de junho de 2001, tivemos uma agradável surpresa com a capacidade de cooperação e de mobilização da sociedade brasileira.

A resposta foi instantânea e os números são eloqüentes. Já no mês de junho, o primeiro do racionamento, houve, na Região Sudeste/Centro-Oeste, uma redução de 6.765 MW médios em relação ao consumo projetado para julho de 2001, o que representou uma diminuição de cerca de 20% da demanda em relação a junho de 2000. Essa redução se manteve mais ou menos estável nos meses que se seguiram.

A Região Nordeste, severamente atingida pela crise de abastecimento, conseguiu, do mesmo modo, reduzir a sua demanda em cerca de 20% em relação a junho de 2000, deixando de consumir o equivalente a cerca de 1.335 MW médios em relação ao consumo estimado para julho de 2001. Essa redução média de 20% do consumo também foi mantida nos meses subseqüentes.

Vale lembrar que a Região Norte, embora tivesse seus reservatórios em níveis bastante satisfatórios, também recebeu uma meta de redução da carga de 20% da média dos meses de junho, julho e agosto de 2000, a ser cumprida a partir de 15 de julho de 2001, com o objetivo de gerar sobras de energia para socorrer o Nordeste, que tinha sérios problemas de abastecimento. A economia de energia no primeiro mês do racionamento, naquela Região, foi de 389 MW médios.

Os números finais da economia de energia durante o racionamento são extraordinários. A Região Sudeste/Centro-Oeste economizou 37.104 GWh no período de junho de 2001 a fevereiro de 2002, em relação às previsões de consumo da região. Essa carga corresponde ao consumo do Estado de Minas Gerais durante aquele período.

No Nordeste, a redução de consumo foi de 8.216 GWh em relação ao que se previa que a região consumiria durante o período do racionamento, economia equivalente ao consumo do Estado da Bahia nesse mesmo intervalo de tempo. No Norte, a redução foi de 1.726 GWh, igual ao consumo do Estado do Pará, excluída a Albras, um grande consumidor situado naquele Estado.

Mas o que desejo mesmo destacar foi a grande lição aprendida pela sociedade brasileira: a lição da economia de energia. Em cada lar, as pessoas se esmeraram nas medidas de contenção do consumo, chegando a extremos de sacrifício para cumprir suas metas e para ajudar na travessia da crise. Com isso, aprenderam que havia desperdício de energia, que, se eliminado, pode representar economia na conta de luz do fim do mês e uma tremenda ajuda no orçamento do País.

Nas empresas, notadamente na indústria, foram adotadas inúmeras medidas, muitas delas estruturais, que passaram a produzir economia de energia permanente. Mas, sobretudo, forjou-se uma cultura de combate ao desperdício que, para o benefício do Brasil, veio para ficar.

Graças a ela, havia uma previsão dos técnicos de que o País iria incorporar após o período de racionamento uma redução da demanda de 7% a 8% do consumo previsto para o ano de 2002. Com base nisso, foram calculadas as famosas curvas de segurança e de aversão ao risco para o controle do volume de água dos reservatórios das Regiões Sudeste/Centro-Oeste e Nordeste. Sobre elas, projetou-se, para 2002, um consumo que envolvia essa economia assimilada pela sociedade.

O resultado, entretanto, revelou-se bem melhor do que o previsto nos três meses após o fim do racionamento. O consumo médio efetivo nos meses de março, abril e maio foi 5,16% menor que o valor projetado de 26.000 MW médios para o Sudeste/Centro-Oeste. No Nordeste, o resultado é ainda melhor, tendo ficado, na média dos três meses, 7,14% abaixo dos 5.881 MW médios calculados para a região.

As vantagens da economia de energia são inúmeras para o Brasil. Ficarei apenas em duas, que já são suficientes para mostrar o ganho que esse novo espírito de combate ao desperdício representa. A primeira, imensurável pela sua natureza, é o ganho na preservação ambiental. Como é do conhecimento de todos, a geração de energia acarreta prejuízos ao meio-ambiente. Ao economizar energia elétrica, estamos todos contribuindo para a redução desse impacto, altamente benéfico não só ao País, mas a toda humanidade.

A segunda pode ser traduzida em números e representa a economia na construção de usinas e infra-estrutura de transmissão, como linhas e subestações. Estima-se, hoje, uma necessidade de acréscimo de cerca de 3.000 MW/ano ao parque gerador nacional. O custo estimado para o acréscimo dessa geração, mais as instalações de transmissão correspondentes, chega a US$ 6 bilhões/ano.

Assim, tudo o que pudermos reduzir em desperdício terá grande valor para o País e para o consumidor de energia elétrica, dado o aumento do seu preço, que tenderá a se nivelar aos preços internacionais, a despeito das grandes vantagens da nossa matriz predominantemente hidrelétrica e da interligação do sistema de transmissão, que potencializa nossa geração.

Não é por outra razão que os países do mundo desenvolvido têm perseguido com tanto afinco a racionalização do consumo de energia elétrica. Sem a abundância de recursos naturais de que, felizmente, dispomos, aqueles povos já entenderam, há bastante tempo, a importância ambiental e econômica do combate ao desperdício de energia e têm investido fortemente nisso.

Resta-nos, assim, aproveitando a difícil, porém didática experiência que vivemos, avançar por essa senda que se abriu, atuando com determinação na busca de eficiência energética, sobretudo pelo lado da demanda. Aproveitar o entusiasmo do brasileiro com a sua descoberta da economia de energia é fundamental. Precisamos criar e expandir os programas de racionalização do consumo, realizando campanhas publicitárias de estímulo à manutenção dos bons hábitos de uso da energia elétrica.

Penso que os ganhos para o País serão muitos. Estaremos preservando a natureza para os nossos filhos e netos e economizando recursos financeiros tão caros a um País que tem na dívida interna e externa um de seus grandes problemas contemporâneos. Não há o que pensar. Economizar energia é poupar recursos para construir o futuro do Brasil.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2002 - Página 15595