Discurso durante a 105ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa de intervenção pública para recuperação de aeronaves abandonadas pela Transbrasil no Aeroporto de Brasília.

Autor
João Alberto Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MA)
Nome completo: João Alberto de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Defesa de intervenção pública para recuperação de aeronaves abandonadas pela Transbrasil no Aeroporto de Brasília.
Publicação
Publicação no DSF de 29/08/2002 - Página 16567
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • CITAÇÃO, PERCENTAGEM, PERDA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, PREJUIZO, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, INTERVENÇÃO, GOVERNO, PRESERVAÇÃO, RECUPERAÇÃO, AERONAVE, ABANDONO, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, AEROPORTO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (PMDB - MA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desembarcar no aeroporto de Brasília, hoje, é experimentar, ao lado da satisfação proporcionada pelo avião que toca o solo, uma sensação de desalento e frustração. Esses são os sentimentos levantados ao se avistarem as aeronaves da Transbrasil posicionadas ao lado esquerdo de quem chega à Capital do País. São aeronaves abandonadas, com evidências de "canibalização", entregues à ação da ferrugem que o tempo se encarrega de instalar e aprofundar.

Tal panorama traz à lembrança as imagens dos destroços deixados pelos bombardeios das guerras; faz visualizar os tanques chamuscados e semi-enterrados na areia do deserto do Iraque; projeta na fantasia a "tábula rasa" a que foi reduzido o Afeganistão; joga na tela da imaginação os muros caídos e o ferro retorcido das casas palestinas depois da explosão das implacáveis e mortíferas bombas modernas; e, mais grave, joga na intimidade de quem olha a imagem de uma sociedade que despreza seus equipamentos, deixou de lutar pelo desenvolvimento e abandonou a vontade de assumir, renovar, progredir e viver.

Situo essa realidade no âmbito da cultural prática do desperdício que vem sendo executada no Brasil. Em nosso País, perdem-se 2,52 % dos alimentos produzidos - com extraordinários 40% na área das hortaliças e das frutas. A construção civil joga fora 22,3% do material utilizado. Desperdiça-se energia elétrica, apesar dos tremores provocados pelo "apagão". Desperdiça-se água potável em grande percentagem, não obstante as constantes advertências dos especialistas de que vai faltar água para consumo em futuro não distante.

Desperdiçam-se bens líquidos e bens sólidos - o setor público e o setor privado desperdiçam. Desperdiça-se em nível macro e em nível micro. Desperdiça-se pela falta de credibilidade dos orçamentos, pela descontinuidade administrativa, pela troca de prioridades, pelo clientelismo, pelo descompromisso e pela corrupção.

Há pouco tempo, a Comissão Especial de Obras Inacabadas do Senado Federal escandalizou o País ao anunciar 2.214 obras federais inacabadas, verdadeiros esqueletos produzidos ao custo de 15 bilhões de reais, sem nenhum benefício para o povo. A Comissão enumerou obras federais. Não fez levantamento, não era sua incumbência, das obras estaduais e municipais na mesma situação. Obras que as intempéries carcomem, apesar de terem surgido de reivindicações autênticas da população: são pontes, são estradas, são usinas elétricas, são açudes, são hospitais, são escolas, são armazéns, são programas abandonados. É patrimônio que se esvai; é povo empurrado para o ceticismo, para a descrença, para o desânimo, para o abandono da cidadania como conquista e apanágio coletivos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Antônio Cândido, ao comentar Raízes do Brasil, saiu-se com este julgamento: "Ao que se poderia chamar de ’mentalidade cordial’, estão ligados traços importantes, como a sociabilidade apenas aparente, que, na verdade, não se impõe ao indivíduo e não exerce efeito positivo na estruturação de uma ordem coletiva".

Eu acrescentaria: não exerce efeito na estruturação e no respeito a uma ordem coletiva. Percebe-se, então, o vezo do individualismo. O comportamento do cidadão que, ao servir-se do seu quinhão, o que é coletivo não perde interesse. O patrimônio iniciado ou o patrimônio adquirido por uma instituição maior pode ser abandonado. Eis, então, estruturas e bens, públicos e privados, semipúblicos ou semiprivados, relegados ao vento, ao sol e à chuva, longe, pelo interior do País, nos perímetros urbanos ou, como no aeroporto de Brasília, os aviões da Transbrasil, agredindo a sensibilidade e os olhos de quem chega à Capital da República. É claro, essas aeronaves são propriedade particular. Mesmo assim, não podem ser vistas de forma desconectada do patrimônio nacional; são parte do patrimônio nacional. Por essa razão, é oportuna e necessária a intervenção pública para que esses equipamentos sejam preservados do impessoal e irresponsável destino da sucata.

Era o que tinha a dizer!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/2002 - Página 16567