Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de emenda à Constituição Federal, que possibite a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios.

Autor
Chico Sartori (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RO)
Nome completo: Francisco Luiz Sartori
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Defesa de emenda à Constituição Federal, que possibite a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2002 - Página 16682
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, COLONIZAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO), ESPECIFICAÇÃO, DIFICULDADE, POPULAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, COMERCIALIZAÇÃO AGRICOLA.
  • COMENTARIO, DEFESA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPORTANCIA, REGULAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, NECESSIDADE, CRIAÇÃO, MUNICIPIOS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO).
  • APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), REGULAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CRIAÇÃO, INCORPORAÇÃO, FUSÃO, DESMEMBRAMENTO, MUNICIPIOS, NECESSIDADE, MELHORIA, LEGISLAÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, MATERIA, SENADO, REGISTRO, IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO, POPULAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO).

O SR. CHICO SARTORI (Bloco/PSDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos dias, tenho percorrido o Estado de Rondônia e, ao conversar com o povo nas suas diferentes regiões, tenho me deparado com inúmeros problemas cuja solução, de certa forma, considero vital para a sobrevivência daquele povo que escolheu a tão falada Amazônia para contribuir com o seu trabalho em busca de melhores condições de vida para suas famílias.

Tenho sido procurado com insistência, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por um grupo de cidadãos, na sua grande maioria pequenos empresários rurais e comerciantes, que constituem um comitê de emancipação política dos Distritos de Tarilândia, Nova Califórnia e Extrema de Rondônia. Esses Distritos, Sr. Presidente, fruto dos projetos de colonização do Incra, implantados em meados de 1980, ocupados por migrantes oriundos dos Estados do Paraná, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Bahia e outros.

Esses colonos, deixando o conforto de seus Estados de origem, enfronharam-se na mata virgem para cultivar os seus lotes, inicialmente plantando apenas para o consumo familiar. No início, suas rendas se originavam da extração do látex, produzido em fardos de borracha, sem nenhum conhecimento técnico, orientados apenas pelos caboclos seringueiros existentes naquelas localidades.

Não existia qualquer infra-estrutura de apoio, nem mesmo acesso aos centros urbanos mais próximos. Os comerciantes da borracha chegavam até aquelas localidades com tropas de burros, trazendo mantimentos, mercadorias de primeira necessidade, trocando-as pelos fardos de borracha.

Esses colonos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sentiam-se muito limitados em virtude de seus conhecimentos serem apenas voltados ao cultivo da lavoura, e não à produção da borracha. Por isso mesmo, não aceitaram por muito tempo aquele meio de vida. Assim, partiram para o cultivo da lavoura branca, mesmo usando os processos mais rudimentares, que consistem na derrubada e na queimada da mata.

Os resultados dessa nova experiência, logo nos seus primeiros anos, atingiram níveis elevados de produção, exigindo a construção das vias de acesso para o escoamento dos seus produtos, sob pena de dispersá-los. Em seguida, vieram os núcleos rurais para o atendimento das necessidades básicas, sobretudo educação, saúde e comercialização dos produtos.

O Governo do Estado de Rondônia passou a construir as estradas vicinais, chamadas pelos colonos de “linhas”, que passaram a servir para o escoamento da produção daquelas comunidades.

Essas famílias, Sr. Presidente, passaram a produzir arroz, feijão, milho, café, cacau, banana, mandioca, citros, suco, coco e abacaxi, além de desenvolverem a criação de aves, bovinos e suínos em pequena escala.

Entretanto, a falta de infra-estrutura de apoio à produção agrícola fez com que o colono perdesse muito em quantidade e qualidade dos seus produtos, desde o plantio até a colheita e comercialização, não lhe dando qualquer retorno para desenvolver os trabalhos agrícolas com alguma margem de lucro.

Além das inúmeras dificuldades criadas com o advento das leis ambientais que limitaram o uso do processo da derrubada das matas virgens e das queimadas, ficaram os agricultores condicionados à utilização das áreas já derrubadas, improdutivas, tomadas por capoeiras, cujo trato tornava-se impossível pelo processo manual.

Diante desse quadro, esses colonos limitados, descapitalizados, sem condições de adquirir os equipamentos necessários à recuperação das referidas áreas, sentiram-se desestimulados e não mais tiveram condições suficientes para continuar seus trabalhos agrícolas. Assim, essas populações viveram um grande dilema de sua principal atividade e meio de vida durante um período de aproximadamente cinco anos de decadência sob todos os aspectos.

Na década de 90, essas comunidades voltaram a crescer com o advento do Projeto Luminar, do Ministério da Agricultura, supervisionado pelo Incra e que tem por finalidade levar assistência técnica aos agricultores assentados naquelas glebas, levando a orientação técnica nas áreas da educação, assistência social, agropecuária, na aquisição de insumos e aquisição de equipamentos, através de linhas de crédito do Procera, do Basa, do Pronaf, do Banco do Brasil, para o custeio, e o Prorural, para a recuperação e implantação da lavoura de cacau, orientando também o beneficiamento, a comercialização, o transporte e ainda a criação de bovinos, suínos, eqüinos, galináceos, piscicultura e apicultura.

Posteriormente, Sr. Presidente, instalou-se a Emater e a Ceplac. Então o Governo do Estado levou energia elétrica, melhorou escolas, implantando o ensino fundamental e médio; instalou posto de saúde, posto telefônico, cartório de registro civil e de notas, postos de serviços etc.

Com essas melhorias implementadas pelo Governo do Estado, o comércio voltou a crescer, surgiram diversas máquinas de beneficiamento dos produtos agrícolas, laticínios, postos de gasolina, pequenas indústrias de móveis, mercearias já tomando forma de supermercados e o número de edificações foram aumentando.

De maneira, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que aqueles pequenos núcleos urbanos já se tornaram pequenas cidades, exigindo do Poder Público mais equipamentos urbanos, mais aproximação com os governantes. A comunidade passou a exigir a aplicação dos tributos oriundos de suas produções nas necessidades assistenciais, sendo claro e evidente que chegou a hora daquelas populações lutarem pelas suas respectivas emancipações políticas, a fim de se transformarem nos mais novos municípios do Estado de Rondônia.

Essa luta já começou, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. As referidas comunidades, já mobilizadas, iniciaram os seus processos junto à Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia, que, por meio de decreto legislativo, aprovaram as referidas pretensões. No entanto, aquela Assembléia, ao solicitar a consulta plebiscitária junto ao Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, obteve inicialmente a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral contrária à consulta plebiscitária, sob a alegação de julgados do colendo Tribunal Superior Eleitoral, ensejando o não provimento dessa matéria, em razão da inexistência de regulamentação por meio de lei complementar federal, como prevê o art. 18 da nossa Carta Magna.

Diante da decisão do Tribunal Regional Eleitoral negando provimento ao pedido de consulta plebiscitária, coube à Assembléia Legislativa do Estado, em grau de recurso, apelar para o Tribunal Superior Eleitoral na expectativa daquele egrégio Tribunal entender legítimos os anseios daquelas populações, interpretando a norma constitucional diante da luz de vários fatos concretos ocorridos neste País.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, informou ao Juiz Dr. Raduan Miguel, do TER-RO, por solicitação do mesmo para instruí-lo quando da oportunidade do seu voto no julgamento naquele Tribunal, que foram criados, a partir de 1997, 533 (quinhentos e trinta e três) novos municípios no Brasil, sendo que as leis estaduais de criação desses municípios foram promulgadas antes da Emenda Constitucional n.º 15/96, que deu nova redação ao §4º do art. 18 da nossa Constituição Federal. Informou, ainda, o IBGE, àquele magistrado, que a partir da promulgação da Emenda Constitucional n.º 15/96, foram criados no Brasil 54 (cinqüenta e quatro) novos municípios nas diversas unidades da nossa Federação, como no Piauí, Rio Grande do Norte, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás e Alagoas.

Sr. Presidente, seriam esses municípios inconstitucionais? Foram criados com base em uma norma que ofenderia o texto constitucional porquanto inexiste a tal legislação que lhe completaria? O que me parece é que essa questão está encontrando resistência na interpretação dada pelo Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, que sustenta que o §4º do art. 18 é inaplicável porque necessita, como imperativo, da existência de uma lei complementar federal para regulamentar apenas o período em que se realizaria essa criação, essa incorporação, essa fusão ou desmembramento.

Ademais, Sr. Presidente, analisando o texto constitucional “dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito,...”. É imperativa a realização de consulta às populações envolvidas que se dará por plebiscito. Parece-me que é essa a postulação das populações dos distritos de Tarilândia, Nova Califórnia e Extrema de Rondônia. A quem será feita a consulta por meio de plebiscito? “As populações dos municípios envolvidos,...”. É óbvio. A população do município, que está perdendo uma faixa territorial, deve concordar ou discordar com tal perda, bem como a população do distrito que será criado. Terão o direito de dizer: “quero continuar pertencendo àquele município, ou quero pertencer ao novo município, ou quero continuar como está”.

Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não pode prevalecer dois pesos e duas medidas. Como foram criados novos municípios em outros estados, não podemos admitir esse entrave para a criação dos novos municípios do Estado de Rondônia, não podemos engessar o progresso deste Estado. Se os referidos distritos já cumpriram os requisitos institucionais e legais para suas criações, não vejo outra saída senão aprovarem as suas respectivas consultas plebiscitárias.

Sr. Presidente, não obstante estarmos diante de uma norma de direito constitucional, muito embora não sendo jurista, e após ouvir opiniões de assessores desta Casa com conhecimento abalizado nesta matéria, entendo cabível a aplicação do art. 335 do Código de Processo Civil, que diz: “Em falta das normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.”

O que esperamos é que o Tribunal Superior Eleitoral enfrente essa matéria, suprindo a lacuna da lei, no caso da inexistência de norma complementar. Ao interpretar a norma, também a interprete aplicando o artigo do Código de Processo Civil que acabo de citar.

Sr. Presidente, diante de tais dificuldades e da minha preocupação com as iniciativas de criação dos novos Municípios de Rondônia - que, com certeza, emancipados politicamente, contribuirão de forma definitiva para o progresso do Estado que tenho orgulho de representar nesta Casa como Senador da República -, apresentei, antes do recesso parlamentar, projeto de lei complementar para regulamentar o § 4º do art. 18 da Constituição Federal, dispondo sobre a criação, incorporação, fusão e desmembramento de Municípios, com o intuito de suprir a lacuna constitucional que inibe a criação de novos municípios brasileiros, em especial no meu Estado de Rondônia.

Essa, Sr. Presidente, é a minha contribuição àquele povo que, como eu, escolheu a Amazônia para viver e trabalhar, em busca de uma condição de vida mais digna para seus familiares, e cujo trabalho tem trazido grandes frutos para o progresso de Rondônia.

Apresentei o referido projeto de lei complementar, que atualmente tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desta Casa, tendo como Relator o eminente Senador Jefferson Péres, ilustre representante do nosso vizinho Estado do Amazonas, que, com toda certeza, emitirá seu parecer com a propriedade de quem é profundo conhecedor do direito.

Ao finalizar este pronunciamento, tenho a certeza de que esta Casa, ao entender a importância dessa matéria, haverá de agilizar sua tramitação, propiciando a essas populações o direito de usufruírem a cidadania, objeto do seu sagrado direito.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2002 - Página 16682