Discurso durante a 118ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Solicitação para inclusão na pauta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Projeto de Lei do Senado 116, de 2001, de autoria de S.Exa., que visa a alteração da Lei 8.560, de 29 de dezembro de 1992, que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e dá outras providências.

Autor
Valmir Amaral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO CIVIL.:
  • Solicitação para inclusão na pauta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Projeto de Lei do Senado 116, de 2001, de autoria de S.Exa., que visa a alteração da Lei 8.560, de 29 de dezembro de 1992, que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2002 - Página 18748
Assunto
Outros > CODIGO CIVIL.
Indexação
  • COMENTARIO, ELABORAÇÃO, CODIGO CIVIL, MOTIVO, EVOLUÇÃO, CONCEITO, MORAL, SEXUALIDADE, FAMILIA.
  • SOLICITAÇÃO, INCLUSÃO, PAUTA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, PATERNIDADE, FILHO, ESPECIFICAÇÃO, IMPORTANCIA, UTILIZAÇÃO, EXAME, GENETICA.
  • COMENTARIO, EMENDA, AUTORIA, JOSE FOGAÇA, SENADOR, RELATOR, PROJETO DE LEI, POSSIBILIDADE, INCLUSÃO, ARTIGO, INVESTIGAÇÃO, MATERNIDADE, FILHO.

O SR. VALMIR AMARAL (PMDB - DF) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, à medida que passa o tempo e, com o devir, transformam-se os costumes, muda também o sentido de moral das sociedades. Ainda que haja, com toda a certeza, um núcleo imutável de preceitos éticos supostos universais -- que Kant denominou imperativos categóricos --, a verdade é que a moral muda sempre. E o faz tão mais rapidamente em nossa era de vertiginoso progresso tecnológico e de globalização das informações. O contato mais direto com outros povos, outros usos, e a descoberta de novos conhecimentos e técnicas altera inevitavelmente nossa visão do mundo e de nós mesmos.

Ora, Sras e Srs. Senadores, as leis, sejam escritas ou consuetudinárias, constituem uma das mais evidentes expressões da moral de uma sociedade, pois prescrevem determinadas condutas e proscrevem outras, além de impor sanções aos indivíduos que se elidem das primeiras e incidem nas últimas. Por isso, nada mais natural que a passagem do tempo e a evolução dos costumes impliquem, ao fim de um processo de assimilação do novo, a modificação das leis.

Os conceitos relativos à moral familiar e sexual talvez sejam os que sofreram as mudanças mais radicais no último meio século, que levaram a alterações significativas do Código Civil de 1916 e até à necessidade de elaboração de um novo CC. Coisas hoje consideradas corriqueiras seriam motivo de escândalo há poucas décadas. A legalização do divórcio, em 1977, é provavelmente o exemplo mais claro de alteração do entendimento da sociedade brasileira quanto à questão da família e é também, pelo tempo que consumiu desde as primeiras proposições até sua implementação em nosso sistema legal, um exemplo da resistência de alguns setores da sociedade à mudança das leis.

Do mesmo modo, o reconhecimento, pela Carta de 1988, das chamadas uniões estáveis seria impensável até pelo menos o final dos anos sessenta. No entanto, somente a pessoas muito preconceituosas ou conservadoras ocorreria hoje condená-lo, desconhecendo o ganho social, em termos de igualdade perante a lei, concedido por essa inovação aos casais unidos sem matrimônio oficiado, bem como aos filhos resultantes dessas famílias.

Sr. Presidente, se fiz questão de citar o divórcio e a união estável como exemplos marcantes de alterações em nossa legislação relativa à família, é porque desejo chamar a atenção de meus Pares para uma proposição que apresentei no ano passado e que se encontra hoje na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, à espera de introdução em pauta, com parecer e emenda elaborados pelo Senador José Fogaça.

Essa proposição de minha autoria, o Projeto de Lei do Senado 116, de 2001, visa à alteração da Lei 8.560, de 29 de dezembro de 1992, que tem a seguinte ementa: “regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e dá outras providências”.

Pode parecer surpreendente, mesmo tendo em vista meus argumentos a respeito da mudança das leis a partir da evolução dos costumes, que um documento legal com apenas dez anos possa estar, de algum modo, ultrapassado. No entanto, é isso mesmo que se dá: nessa última década, tornou-se rotineiro o emprego da técnica de pareamento de cromossomos nos processos de investigação de paternidade, relegando definitivamente ao passado o antigo recurso à prova testemunhal e à comparação fenotípica - isto é, da semelhança de traços anatômicos ou fisionômicos. A prova por exame de DNA é cabal: exclui de todo a possibilidade da paternidade em exame ou a ratifica com grau de certeza muito próximo a 100% - quer dizer, com virtual certeza.

À evidente mudança introduzida pelo progresso da técnica de exame de genoma, deve-se acrescer uma consideração propriamente jurídica. Trata-se da expressão “filhos havidos fora do casamento”, que me soa como um resquício da moral ultrapassada pela qual havia diferença entre os descendentes ditos legítimos e os outros. A Lei 8.560, de 1992, assim, parece-me em conflito ideológico com a Constituição e com o novo Código Civil.

Por isso, meu projeto prevê a alteração da ementa pela simplificação, com a exclusão da expressão citada -- “filhos havidos fora do casamento”. O relator do Projeto na CCJ, Senador José Fogaça, com muita propriedade nestes tempos de justa igualdade entre homens e mulheres, acrescentou ao texto da ementa a possibilidade da investigação também da maternidade, pois há inúmeras situações nas quais a presunção do conhecimento da mãe é equivocada, como nos casos da chamada adoção à brasileira, pela qual a criança nascida de uma mulher, geralmente de pouca idade e poucos recursos, é registrada fraudulentamente como nascida de outra. A ementa passaria a ser, portanto, “Regula a investigação de paternidade ou de maternidade”.

A emenda do Senador Fogaça incide sobre o artigo segundo de minha proposição, aprimorando-a. Ao acrescentar um parágrafo ao artigo oitavo da Lei 8.560, de 1992, procurei abrir a possibilidade de reabertura dos casos julgados antes do advento da técnica de pareamento cromossômico, para que seja possível reexaminá-los à luz do procedimento científico agora disponível. Esse parágrafo, com a nova redação dada pelo Senador Fogaça, torna coisa julgada a ação de paternidade ou de maternidade realizada com a prova de pareamento cromossômico, mantendo, porém, passíveis de reexame as decisões anteriores, fundadas nas provas testemunhais ou fenotípicas, possibilitando o estabelecimento e a revelação da verdade, que é preceito do Código de Processo Civil.

Pelo que, em minha opinião, esse Projeto de Lei apresenta de adequação da lei à atualidade, nos sentidos moral e técnico, julgo-o digno da atenção dos membros do Congresso Nacional. O novo milênio não comporta mais os preconceitos contra as formas não tradicionais de família, que norteavam o antigo Código Civil, recentemente substituído.

Cabe às Sras. e aos Srs. Senadores considerar a oportunidade e cabimento dessas minhas considerações e de meu PLS.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2002 - Página 18748