Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o papel do PMDB nas eleições estaduais e presidencial.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. IMPRENSA.:
  • Considerações sobre o papel do PMDB nas eleições estaduais e presidencial.
Aparteantes
José Fogaça.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2002 - Página 18924
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. IMPRENSA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, CONDUTA, DIREÇÃO, AMBITO NACIONAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), MANIFESTAÇÃO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), SIMULTANEIDADE, DEMONSTRAÇÃO, INTERESSE, OBTENÇÃO, CARGO PUBLICO, MINISTERIOS.
  • DENUNCIA, CENSURA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUSENCIA, PUBLICAÇÃO, ENTREVISTA, ORADOR, CRITICA, ATUAÇÃO, DIREÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB).

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não ocuparei por mais de dois ou três minutos esta tribuna. Quero apenas fazer algumas considerações sobre o meu Partido e a eleição presidencial.

O PMDB, mal orientado e mal conduzido, afundou num tremendo desastre eleitoral. Em qualquer país civilizado do mundo, a direção nacional do partido já teria mostrado o seu arrependimento e, automaticamente, renunciado à condução da direção partidária. Mas parece que isso não acontece no Brasil. A nossa direção nacional, de uma forma arrogante, sem sequer pretender convocar o diretório nacional ou o conselho do Partido, já faz declarações no sentido da velha política do adesismo remunerado.

Vejo nos jornais, primeiro, a manifestação de que o Partido será de oposição ao Governo do PT ou, então, a manifestação do desejo da troca, da obtenção de Ministérios e as declarações de que tudo deve passar pela instituição formal partidária.

Eu, na verdade, não esperava a exclusão da direção do Partido - não vamos a essa violência -, mas sua renúncia. Briguei muito para que o PMDB tivesse uma posição independente, um candidato à Presidência da República, para que o PMDB apoiasse o sentimento de mudança da Nação brasileira em determinado momento, acompanhando o desejo do Brasil, que se manifestava de forma clara na candidatura do Lula, na candidatura do PT. Mas a insensível direção nacional manteve a postura arcaica do adesismo remunerado, da liberação das emendas para a eleição de alguns deputados. O desastre foi fantástico.

Eu, Presidente, como sou cristão, estou disposto a perdoá-los, mas a perdoá-los segundo o Código Canônico, porque até o perdão segue um rito especial para a nossa igreja. A Igreja Católica subsiste há dois milênios fundamentalmente por praticar o instituto do perdão. E o perdão vem acompanhado de um rito específico: primeiro, o arrependimento, pelos erros, pela má-condução, pelo adesismo remunerado; depois, a confissão, que tem que ser pública, o mea culpa, o “erramos”; em seguida, a penitência. Só depois se pode falar no perdão. Estranho a arrogância das nossas lideranças, que passaram por cima da base partidária e do desejo da Nação, fazendo uma composição rigorosamente absurda, que atendia apenas os desejos da fisiologia.

Ontem, dei uma entrevista ao jornalista Ilimar Franco, do Jornal do Brasil, e disse exatamente o que estou dizendo nesta tribuna. Tenho ficado quieto, estou cansado da campanha, mas, no corredor, instado, mostrei a posição que estou assumindo na tribuna agora. Duas horas depois, o Líder do nosso Partido no Senado, Senador Renan Calheiros, telefona-me: “Olha, li sua entrevista: não é bem assim”. Hoje, comprei o Jornal do Brasil para ver a minha declaração e o comentário do Senador Renan Calheiros, mas parece que fui objeto de censura. Não entendo como o Líder da minha Bancada leu uma entrevista que dei ao Jornal do Brasil e também não entendo como se publica a entrevista dele e a minha é suprimida. Parece, no entanto, que as nossas lideranças institucionais, se hoje não têm muito prestígio com o povo brasileiro, têm grande prestígio com setores da imprensa, porque fui censurado.

Aqui, na tribuna, deixo clara minha indignação com esse fato, mas, fundamentalmente, digo que nosso Partido tem que entender que o que sobrou da eleição sobrou da aliança com o PT. O PMDB do Paraná, pela quarta vez consecutiva, apoiou o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva para a Presidência da República.

E eu ganhei a eleição dessa extrema direita que o Brizola organizou no Paraná e no Brasil de forma rigorosamente irracional, mas foi a aliança do PMDB com o PT que garantiu a vitória no Paraná.

Em Santa Catarina, ocorreu a mesma coisa: Luiz Henrique (*) é Governador de Santa Catarina pela obra, graça e apoio dado por Luiz Inácio Lula da Silva e pelo PT.

Portanto, teríamos dois Governadores eleitos pelo PMDB: o Roriz, aqui em Brasília - e não me parece que ele seja um exemplo de Governador para o PMDB e para o País - e o Jarbas Vasconcelos (*), com a sua aliança com o PFL, em Pernambuco.

Mas isso não justifica a arrogância da Direção Nacional, a pretensão de falar em nome do Partido! O Partido deve imediatamente convocar o Diretório Nacional e uma Convenção Nacional para resolver sobre os rumos. E, se não posso exigir a dignidade ética da Direção, que se traduziria pela renúncia, pelo menos posso fazer isto: daqui da tribuna do Senado, não numa entrevista ao Jornal do Brasil - que provavelmente, mais uma vez, não seria publicada -, tenho condições de exigir da Direção Nacional a convocação de uma Convenção Nacional do PMDB, para que os rumos do Partido sejam traçados pela base.

Errar é humano, persistir no erro é burrice. E essa Direção, que conduziu tão mal o Partido, tem de fazer uma autocrítica, uma reflexão. O meu apelo à unidade partidária exclui qualquer possibilidade de retaliação por parte daqueles que percebem hoje, com clareza, que estavam na posição certa há muito tempo; mas não podemos admitir mais a prepotência e a arrogância na condução de negociações que não passam decididamente pelos autores da derrota.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Concedo, com prazer, um aparte ao Senador José Fogaça.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Senador Roberto Requião, antes de mais nada, quero cumprimentar V. Exª por ter sido eleito Governador do Paraná mais uma vez. Cumprimento-o pela experiência, pelo trabalho. Novamente, V. Exª chega a uma posição que lhe é consagrada pelo voto do povo paranaense. Quero dizer a V. Exª que não posso entrar numa análise interna da vida do PMDB porque não seria ético, uma vez que pertenço a outro partido. Mas o que V. Exª está dizendo aplica-se também ao meu Partido, o PPS. Esta é uma hora em que os partidos políticos precisam ter clareza do seu passado e do seu presente, para poder enxergar um pouco deste futuro que vem pela frente. O regime presidencialista que estruturamos no Brasil é o único, no planeta, que se sustenta em cima de um sistema multipartidário. O presidencialismo, no mundo inteiro, sustenta-se em uma essência bipartidária. Às vezes, há algumas variantes - dois ou três partidos -, mas a essência é bipartidária. Dois grandes partidos sustentam o regime presidencialista. De modo que o Congresso Nacional, quando se elege um presidente da República, normalmente tem uma maioria parlamentar favorável ao eleito. Não é o caso do Brasil. Somos a única nação que adotou o regime presidencialista multipartidário, como é o sistema eleitoral, o sistema proporcional, o sistema partidário italiano, como é multipartidário o sistema partidário belga, por exemplo. Só que, nesses dois países, tanto na Bélgica como na Itália, o regime de governo é parlamentarista. O único presidencialismo multipartidário é o do Brasil. Isso resulta em que o Presidente da República precisa construir uma base de apoio parlamentar mediante negociação. Isso valeu inclusive para os dois mandatos do Presidente Fernando Henrique Cardoso. E, apesar de haver uma base de apoio ampla, majoritária, assistimos a cenas explícitas de troca de favores, de busca de interesses escusos por parte de alguns grupos parlamentares, que barganharam apoio ao Governo em determinadas situações.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Apesar dos partidos. Foi o adesismo remunerado com benefícios individuais.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Com benefícios individuais, evidentemente!

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - E esse adesismo liqüidou o PMDB no Brasil.

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - E veja V. Exª: muitas vezes, líderes que negociaram esses apoios obtiveram vantagens para si, e não para o Partido.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Com votações fantásticas!

O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Vantagens para grupos de interesses, não para o seu partido, não para o País! Vantagens muitas vezes específicas e individuais, e algumas até não publicáveis. De modo que V. Exª está diante de um quadro a ser vivido pelo País, um quadro assustador! O Governo eleito tem uma base de apoio de 91 Parlamentares na Câmara dos Deputados e 11 Senadores nesta Casa. O próximo Governo vai precisar também de montar a sua base de apoio quase que tópica e pontualmente, ou seja, matéria por matéria, questão por questão. Projeto por projeto terá que ser negociado com o Senado Federal e com a Câmara dos Deputados. Imagine V. Exª, Senador e Governador Roberto Requião, o que está prestes a acontecer, que bazar persa será instalado no Congresso Nacional! E não digo que essa disposição de barganhar exista no Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, porque, como será a primeira vez que exercerá um cargo executivo, não se pode acusá-lo de já ter feito isso antes. Essa acusação - reitero - não cabe ao Lula. No entanto, sabemos que algumas personagens do Congresso Nacional têm enorme experiência na arte de barganhar, na arte de comprar e vender, de trocar influências, interesses e vantagens em favor de si próprios. V. Exª flagra isso com muita precisão. Saliento que isso se aplica também ao meu Partido. Não pode haver esse adesismo em troca de vantagem, do benefício imediato, do favorecimento pessoal. Registro isso porque V. Exª está apontando na direção certa. É preciso que haja uma composição política. Composição política - repito -, e não de interesses pessoais, para beneficiar o País nas grandes decisões a serem tomadas pelo Congresso Nacional. Muito obrigado.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR) - Senador José Fogaça, a observação de V. Exª é de extrema precisão. O adesismo remunerado viabilizou a aquisição de votações fantásticas para alguns determinados candidatos. Isso ocorreu não somente no PMDB, mas no Congresso Nacional.

Agora, essa foi a razão do enterro eleitoral do PMDB. Daqui da tribuna, cobro uma posição ética dos dirigentes do nosso Partido. Eles devem colocar à disposição seus cargos institucionais - essa estrutura institucional do Partido que eles levantam agora como bandeira, para serem interlocutores de uma negociação provavelmente na mesma linha antiga do adesismo remunerado. E uma Convenção Nacional do Partido haverá de confirmá-los ou não. Mas, o mínimo que se pode exigir da Direção Nacional do PMDB é a disposição dos cargos. Convoca-se uma Convenção, eles se submetem à critica e à autocrítica, e o Partido dirá a eles se serão perdoados ou não, depois do público arrependimento, da confissão e da penitência. Antes disso, não há absolvição. E a arrogância é absolutamente injustificada.

Alardeiam por aí: “O PMDB será um partido de oposição.” Ao mesmo tempo, nos órgãos de imprensa, solicitam ministérios. Não, não mais! Não negociam o PMDB do Paraná, não negociam o PMDB de Santa Catarina.

Hoje, pela manhã, conversei com o Governador eleito Germano Rigotto, que, muitas vezes, não teve uma posição muito semelhante a minha em algumas questões partidárias, mas que tem um comportamento de uma correção indiscutível. Como não vou estar aqui na tal reunião de Governadores, que não é o órgão para decidir coisa alguma, deleguei ao Governador Germano Rigotto* a competência de falar em meu nome que não aceitamos mais conversa mole em reunião de três ou quatro Governadores.

O PMDB do Paraná quer convenção nacional para discutir os rumos e solicita, gentil e cordialmente, à direção nacional do Partido o comportamento ético e decente desejável de colocar à disposição da convenção os seus mandatos institucionais, depois dessa absurda, injustificável e fragorosa derrota que o Partido sofreu em virtude da péssima condução partidária.

Apesar do JB, utilizando esse milagre da televisão do Senado, manifesto a minha posição e deixo uma pergunta: como o Líder da minha Bancada, Senador Renan Calheiros, lê, antes provavelmente do editor-chefe do JB, uma entrevista que dei, reclama dela, dá uma outra entrevista e, no dia seguinte, não são publicadas a minha entrevista nem a dele? Que respondam os responsáveis pela editoria do JB.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2002 - Página 18924