Discurso durante a 124ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a ação dos Estados Unidos no uso de herbicidas para destruição das plantações de coca na Amazônia, sob o pretexto do Plano Colômbia. Apelo ao Governo eleito no sentido de que defina prioridades para a Amazônia brasileira, com a intenção de evitar sua desnacionalização.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • Preocupação com a ação dos Estados Unidos no uso de herbicidas para destruição das plantações de coca na Amazônia, sob o pretexto do Plano Colômbia. Apelo ao Governo eleito no sentido de que defina prioridades para a Amazônia brasileira, com a intenção de evitar sua desnacionalização.
Publicação
Publicação no DSF de 09/11/2002 - Página 20834
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, ESPECIFICAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA.
  • COMENTARIO, ILEGALIDADE, DROGA, AUMENTO, CONSUMO, PREÇO, MERCADO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, INSUCESSO, PLANO DE AÇÃO, AUTORIA, GOVERNO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), UTILIZAÇÃO, PAIS, AMERICA LATINA, COMBATE, DROGA, COCAINA, ELIMINAÇÃO, PLANTIO, REGISTRO, DADOS, CUSTO OPERACIONAL, PLANO.
  • APREENSÃO, ATUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), UTILIZAÇÃO, AGROTOXICO, PLANO DE AÇÃO, PREJUIZO, FLORA, FAUNA SILVESTRE, REGIÃO AMAZONICA, DESTRUIÇÃO, CULTIVO, ALIMENTOS, CONTAMINAÇÃO, AGUA, COMUNIDADE INDIGENA.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CANDIDATO ELEITO, PROVIDENCIA, MELHORIA, SITUAÇÃO, TRAFICO, DROGA, BRASIL, NECESSIDADE, PLANO DE GOVERNO, PRIORIDADE, Amazônia Legal.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os lamentáveis episódios ocorridos no presídio Bangu 1, no Rio de Janeiro, levam-nos a refletir sobre a gravidade do narcotráfico em nosso País. É inacreditável que Fernandinho Beira-Mar, de facção do Comando Vermelho, tenha conseguido chefiar uma revolta, matar traficantes de facções rivais, fazer reféns, ameaçá-los de morte violenta, tudo dentro de uma prisão considerada de segurança máxima.

Esses fatos demonstram o quanto estamos envolvidos com o narcotráfico e, principalmente, consistem em uma ameaça a nossa soberania. Temos assistido às insistentes intervenções americanas em países da América Latina, com a desculpa de auxiliar no combate às drogas.

Lembramos o caso da Colômbia, sob a mira dos Estados Unidos há já algum tempo. No governo de Pastrana, iniciou-se a guerra às drogas, que consistiria, principalmente, na eliminação das plantações de coca. Os plantios de coca naquele país ocupam cerca de 120 mil hectares e empregam 300 mil agricultores, especialmente no Sul, o que faz da Colômbia o maior produtor de cocaína do mundo. São ainda cultivados 17 mil hectares de papoula para a extração da heroína.

Os Estados Unidos calculam que 80% da cocaína e dois terços da heroína consumidos por cerca de 1,3 milhão de usuários no país sejam produzidos na Colômbia. Em 1999, elaboraram o Plano Colômbia, uma estratégia para combater o narcotráfico cuja aplicação custaria cerca de US$7,5 bilhões, divididos entre Estados Unidos, Japão, União Européia e Canadá.

Fracassou a primeira etapa do plano. Os perigosos fumigamentos das plantações de coca, iniciados em 1999, causaram preocupações não só na Colômbia como nos países vizinhos, inclusive o Brasil, que tem uma fronteira de 1.600 quilômetros de floresta densa, e onde é rigorosamente impossível definir onde termina o território de um país e começa o do outro. A fumigação com herbicidas químicos constitui grave ameaça às comunidades indígenas, às florestas e à vida silvestre na Amazônia. O uso do herbicida glifosato não impediu o cultivo da coca, mas destruiu os cultivos de alimentos, causou problemas de saúde e contaminou a água.

As conseqüências da ação americana são tão graves, que o colombiano Ricardo Vargas Meza, da Ação Andina, considera que “da intenção de ser um ‘plano para a paz, a prosperidade e o fortalecimento do Estado’, o Plano Colômbia é, na verdade, um plano para a guerra, a pobreza e o debilitamento do Estado”.

E, aqui, Sr. Presidente, é interessante lembrar que os Estados Unidos fazem esse papel de “xerife” em todos os cantos do mundo e, no nosso caso, sob a desculpa do combate à droga e da defesa de certos interesses. Mas, na verdade, estão fazendo uma intervenção aberta em um país amigo. Portanto, é bom que nós, no Brasil - tenho repetido isso desta tribuna -, estejamos alerta para que o próximo passo não seja na Amazônia brasileira, sob a desculpa de que aqui estão se escondendo ou para cá estão se transferindo os narcotraficantes, os guerrilheiros. Com essa desculpa daqui a pouco também vão intervir no Brasil. Aliás, eles têm feito sucessivas gestões para que o Governo brasileiro se alie a esse plano, dito “Plano Colômbia”, para ajudar, como se fosse um esforço internacional de combate às drogas. Eles, os Estados Unidos, que são os maiores consumidores do mundo! É um paradoxo: de um lado Estados Unidos e Europa, os maiores consumidores da droga no mundo querendo combater esse mal justamente onde se produz a droga e, sob esse pretexto, portanto, dominar, como dominam, a América Latina!

É bom lembrar que um quilo de cocaína comprado na Colômbia por US$2 mil é vendido, no varejo, nas ruas de Frankfurt, por US$150 mil - vejam, portanto, o lucro dessa operação -, concedendo ao narcotráfico um de seus melhores momentos. Diz-se que a capacidade de exportação do país é de 500 toneladas de cocaína e que a capacidade de interdição é de apenas 20%, o que dá uma exportação de 400 toneladas. Reclama Ricardo Vargas Meza de perigosos efeitos sociais e ambientais na aplicação do Plano Colômbia.

A maioria dos analistas critica o caráter militar do plano. E alguns ainda vão mais longe, considerando que o interesse em derrotar a guerrilha colombiana e acabar com as plantações de coca faz parte de um projeto geo-estratégico de dominação da América Latina. Basta ver que, apesar da propaganda imperialista de preservação da Amazônia - falsa pregação -, os americanos não abrem mão das fumigações com desfolhantes, especialmente com o uso de fungos como o fusarium oxysporum, de conseqüências devastadoras para a fauna e a flora da região, podendo transformar a floresta amazônica em um novo Vietnã.

Nova fase do Plano Colômbia está sendo implementada agora. Um acordo entre camponeses e o governo colombiano previa uma ajuda para aqueles que abandonassem as plantações de coca e se dedicassem a um outro tipo de cultivo. A promessa foi pagar mil dólares a 38 mil camponeses para o cumprimento do acordo. Entretanto, só 25% deles começaram novos plantios.

Com a ascensão de Alvaro Uribe ao poder, os Estados Unidos resolveram atacar novamente, uma vez que, na primeira tentativa, fracassaram totalmente: a produção de coca cresceu 25% nos últimos anos, como se a interferência americana tivesse ajudado, e não atrapalhado. Agora, o Departamento de Estado americano pretende matar tantos cultivos que o replantio não possa acompanhar o ritmo.

A ilegalidade da droga fez os preços alcançarem níveis fantásticos no mercado internacional. Lamentavelmente, o Brasil tem sido um corredor para o transporte da droga para os Estados Unidos e a Europa. As ligações do tráfico brasileiro com a Colômbia são intensas. Fernandinho Beira-Mar, preso naquele país, continua dominando, de dentro do presídio, o narcotráfico no Rio de Janeiro e em alguns outros Estados brasileiros.

É preciso que as autoridades brasileiras atentem para esse problema que nos afeta de perto. Em primeiro lugar, a possibilidade de destruição de nossas florestas com as fumigações americanas, o perigo que corre nossa população fronteiriça e a possibilidade de contaminação de nossas águas. Isso sem falar, Sr. Presidente, no perigo que corre nossa soberania à mercê de políticas americanas desastrosas. Sempre é bom lembrar a proposta já feita pelos Estados Unidos de que os países devedores podem pagar suas dívidas com a cessão de parte de seu território, frase que demonstra o pouco caso daquele país para com países mais pobres, devedores do Fundo Monetário Internacional.

Faço, portanto, mais um apelo, desta tribuna, ao novo Presidente eleito para que atente para a Amazônia brasileira e a inclua como prioridade no seu plano de Governo para que ela possa continuar sendo brasileira.

Confiando no bom senso e no discernimento de nossas autoridades, esperamos que o Brasil possa sair incólume dessa desastrosa confusão internacional.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/11/2002 - Página 20834