Discurso durante a 133ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Importância das unidades geradoras de energia termelétrica que abastecem o Estado de Roraima em virtude da possibilidade de corte na transmissão de energia oriunda de Guri, na Venezuela. Comentários sobre reportagem publicada no jornal O Globo, a respeito da existência de grupos terroristas da Al-Qaeda e Hezbollah na fronteira do Brasil com o Paraguai. Considerações sobre matéria publicada no jornal Folha de S.Paulo, intitulada "Colômbia susta Aviões do Brasil".

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA. SOBERANIA NACIONAL.:
  • Importância das unidades geradoras de energia termelétrica que abastecem o Estado de Roraima em virtude da possibilidade de corte na transmissão de energia oriunda de Guri, na Venezuela. Comentários sobre reportagem publicada no jornal O Globo, a respeito da existência de grupos terroristas da Al-Qaeda e Hezbollah na fronteira do Brasil com o Paraguai. Considerações sobre matéria publicada no jornal Folha de S.Paulo, intitulada "Colômbia susta Aviões do Brasil".
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2002 - Página 22493
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, APOIO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NEUDO CAMPOS, EX GOVERNADOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), CONSTRUÇÃO, INAUGURAÇÃO, LINHA DE TRANSMISSÃO, ENERGIA ELETRICA, CAPITAL DE ESTADO, ORIGEM, USINA HIDROELETRICA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, PRESIDENTE, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, EVENTUALIDADE, CRISE, SISTEMA DE GERAÇÃO, USINA HIDROELETRICA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, PREJUIZO, FORNECIMENTO, ABASTECIMENTO, ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, PERIODICO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CONFIRMAÇÃO, EXISTENCIA, TERRORISTA, TERRITORIO NACIONAL, PARAGUAI, DIVULGAÇÃO, DECISÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, COLOMBIA, SUSTAÇÃO, AQUISIÇÃO, AERONAVE, BRASIL.
  • DENUNCIA, TENTATIVA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), INTERFERENCIA, BRASIL, PARAGUAI, ALEGAÇÕES, EXISTENCIA, TERRORISMO, DEFESA, NECESSIDADE, PRESERVAÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há pouco tempo, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, juntamente com o Presidente Hugo Chávez, da Venezuela, inaugurou oficialmente a linha de transmissão de energia elétrica que vem da usina de Guri, mais exatamente de Macagua, na Venezuela, até Boa Vista, capital do Estado de Roraima.

Essa foi a solução encontrada depois de várias tentativas frustradas de se gerar uma energia de origem hidrelétrica na capital do meu Estado. Houve pelo menos três tentativas. A primeira delas se seu na Cachoeira do Paredão, no rio Mucajaí, mas foi abandonada. Depois, tentou-se criar uma hidrelétrica, ao mesmo tempo uma eclusa, nas Corredeiras do Bem-Querer, no rio Branco, mas esse projeto também não foi desenvolvido, apesar de as duas propostas terem consumido recursos para elaboração dos projetos, estudo de viabilidade etc. Posteriormente, surgiu uma terceira opção, a hidrelétrica do Cotingo, na região de mesmo nome, cuja geografia é altamente favorável, já que fica num canyon formado por duas montanhas, o que facilitaria muito a sua construção. No entanto, esse projeto também foi abandonado, devido a terras pretendidas até hoje pela Funai para criação de reservas indígenas. E isso ocorreu, novamente, após uma imensa quantidade de recursos terem sido aplicados na construção da estrada de acesso e nos estudos técnicos. Ao final, retornou-se à idéia inicial da Cachoeira do Paredão, no rio Mucajaí, que, lamentavelmente, também teve que ser abandonada.

Surgiu, então, a idéia de se utilizar a energia gerada na Venezuela, existente em abundância, porque o país não consumia sequer a metade do que produzia sua imensa hidrelétrica, que só perde para Itaipu.

Depois de vencer todas as barreiras institucionais, burocráticas, diplomáticas, os Governos do Brasil e da Venezuela chegaram a um entendimento sobre a importância para os dois países da construção dessa linha de transmissão.

Quero registrar, por dever de justiça, que, embora se trate de uma obra federal - portanto, feita com recursos federais -, ela só foi possível devido à pertinência, à insistência do ex-Governador Neudo Campos, que exerceu papel de diplomata, de negociador, ao convencer as autoridades brasileiras de que essa era uma alternativa viável e ecologicamente mais correta e ao se aproximar do ex-Presidente da Venezuela, tornando-se seu amigo e convencendo-o de que essa obra seria muito importante para a Venezuela, porque o sul do país é subdesenvolvido, assim como o nosso norte. Foi preciso mostrar ao ex-Presidente venezuelano que o país não estaria apenas beneficiando um Estado subdesenvolvido do norte do Brasil com a venda de energia elétrica. A linha de transmissão dentro do território venezuelano correria às custas do Tesouro da Venezuela, e a linha dentro do território brasileiro, às custas do nosso Governo. Mas a nossa parte da linha de transmissão era muitas vezes menor do que a parte da Venezuela. Portanto, o custo do investimento inicial da Venezuela era muito maior, embora, depois, o retorno pudesse pagá-lo, dentro de um espaço de tempo razoável. Assim, o ex-Governador Neudo Campos precisou convencer as autoridades venezuelanas de que esse investimento promoveria o desenvolvimento da região sul do país, incluindo regiões importantes, como o Estado Bolívar e uma cidade fronteiriça a Roraima, Santa Helena de Uairen.

Sr. Presidente, essa etapa do trabalho foi vencida, foi concluída, tanto no que tange ao conhecimento técnico quanto à eliminação das dificuldades diplomáticas e burocráticas.

Como eu disse no início do meu pronunciamento, a obra foi inaugurada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, com a presença do Presidente Hugo Chávez.

No momento em que o Brasil passava por aquela crise famosa do “apagão”, Roraima entrava na fase inversa - na fase da iluminação, justamente na fase do excesso de energia elétrica.

Paralelamente, foi feito um trabalho com recursos oriundos da Corporación Andina de Fomento, no sentido de obter recursos para financiar as linhas de transmissão de Boa Vista, a capital do Estado, para os diversos Municípios do interior, visto que seria pouco trazer a energia para iluminar apenas a capital ou os seus arredores. Evidentemente, isso seria o suficiente para promover a ida para o meu Estado de indústrias, como um grande grupo produtor de celulose que lá se instalará, gerando divisas para o Estado, duplicando a renda do Estado nesse setor e gerando milhares de empregos.

O mais importante de tudo isso é que será levada energia elétrica para o interior, para onde está o homem do campo, para que ele se beneficie desse insumo moderno e possa produzir e armazenar no seu próprio sítio, em sua própria fazenda, num freezer ou num refrigerador, um produto que, de outra forma, estragaria rapidamente pela dificuldade de escoamento. Além disso, ele poderá mecanizar muitas das suas atividades agrícolas e pecuárias.

Portanto, esse quadro foi construído com o apoio integral do Presidente Fernando Henrique, mas, repito, por uma questão de justiça, ninguém poderá dizer que não foi por uma corajosa e firme determinação do ex-Governador Neudo Campos em ver esse problema resolvido.

No entanto, ficamos a nos perguntar: se houver um problema na Venezuela, como ficará o Estado de Roraima à mercê de uma energia gerada fora do País, comandada inteiramente pelas autoridades venezuelanas?

Esse é, realmente, um dos pontos que fica sem explicação, porque, durante a construção das torres de transmissão dentro do território venezuelano, alguns índios chegaram a derrubar as torres, instigados por determinadas organizações que alegavam que a chegada da energia elétrica iria prejudicar a maneira como eles viviam. E a resposta que sempre tivemos é que o parque hidrelétrico instalado em Boa Vista funcionaria como uma alternativa a um eventual problema na vinda da energia da Venezuela.

No entanto, há algum tempo, fui alertado por pessoas da área de que a Eletronorte estaria retirando de Boa Vista os grupos geradores, para levá-los para o Amazonas e para o Amapá, deixando Boa Vista numa situação delicadíssima, sem a possibilidade de ser atendida, numa emergência, pelo parque termoelétrico lá existente. Felizmente, naquela altura, conversei com os Presidentes da Eletrobrás e da Eletronorte. Ambos conseguiram contornar o problema que existia nos outros Estados, e não foi preciso mexer no parque gerador de Boa Vista.

Agora, Sr. Presidente, recebo a informação de que uma das máquinas estaria sendo “canibalizada”, ou seja, estariam retirando suas peças para levá-las para o Amapá, que estaria passando por uma situação difícil, no que tange ao seu parque gerador. E uma outra máquina, chamada de UTI, que seria utilizada nas emergências, nos blecautes, estaria sendo levada para Manaus, que tem grandes problemas quanto à geração de energia.

E aqui quero fazer uma ressalva. Para o projeto ser mais interessante para os venezuelanos, a linha de extensão iria até Manaus, que é um mercado consumidor de maior porte. No entanto, por uma decisão pessoal, praticamente, do Governador do Amazonas, que preferiu optar pelo gás produzido em Urucu, no Amazonas, deixou de ser feito o trecho Manaus - Boa Vista. Agora sou informado de que a Eletronorte retoma essa idéia e tende realmente a estender a linha até Manaus.

Voltando à questão da canibalização de um dos geradores termoelétricos de Boa Vista e da outra UTI, tenho a dizer que liguei para o Presidente da Eletronorte, que me explicou que realmente estava sendo feita essa operação por causa da emergência nos dois Estados, Amapá e Amazonas. Depois ele me retornou dizendo que a questão do Amapá tinha sido contornada e, portanto, a usina não seria mexida. Quanto à UTI, sim, essa seria removida para o Amazonas.

Fiquei relativamente tranqüilo pelo fato de os 50% do problema terem sido resolvidos; porém, restaram os demais 50%, sobre os quais enviei um ofício ao Presidente da Eletronorte solicitando providências. Quero lê-lo aqui, como parte do meu pronunciamento, para que amanhã, acontecendo um problema desses com a subsidiária de uma geradora federal no meu Estado, não se diga que nenhum parlamentar federal, nenhum senador se posicionou claramente sobre o problema. Portanto, peço licença para ler o ofício endereçado ao Sr. José Antônio Muniz Lopes, Presidente das Centrais Elétricas do Norte do Brasil.

Senhor Presidente,

Ao cumprimentar Vossa Senhoria, manifesto minha preocupação com informações correntes na cidade de Boa Vista (RR), dando conta de que a Boa Vista Energia S. A. (Bovesa) estaria prestes a desfazer-se de duas unidades de geração termoelétrica do seu parque, com deslocamento parcial ou total para outras unidades da Federação.

Esse fato implicaria em ampliação da vulnerabilidade do sistema de alimentação de energia elétrica de Boa Vista e dos Municípios interligados, diante de uma eventual interrupção do fornecimento do Complexo de Guri, na Venezuela, causando enormes prejuízos ao setor produtivo e dissabores para a população do nosso Estado, com a inexorável implantação de racionamentos.

Diante dessa perspectiva, que muito preocupa a população de Roraima, pelas deletérias conseqüências que pode acarrear, encareço a especial atenção e providências de Vossa Senhoria, no sentido do estancamento dessas medidas em curso ou em planejamento sobre cuja evolução gostaria de ser mantido informado.

Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Senhoria protestos de elevada consideração e apreço.

Senador Mozarildo Cavalcanti.

Portanto, além de deixar registrada aqui a minha preocupação e apresentar esse histórico para dizer da importância da energia de Guri, e também dos riscos de um eventual colapso no fornecimento por alguma razão, técnica ou não, deixo também aqui o registro do meu ofício, portanto, de uma medida concreta tomada junto à direção da Eletronorte, para que, amanhã, saiba a população do meu Estado, e até mesmo do Brasil, que estive atento e que agi para que isso pudesse não ocorrer. Espero, realmente, que não ocorra. O Presidente já me adiantou que pelo menos o desmonte da máquina para levar peças para o Amapá não irá ocorrer. Espero que também o segundo item não aconteça.

Sr. Presidente, um outro ponto do meu pronunciamento - que, aliás, tenho reiteradamente abordado desta tribuna - diz respeito às nossas fronteiras da Amazônia. Tenho em mãos recortes de dois jornais, um da Folha de S. Paulo e outro do jornal O Globo, do Rio de Janeiro.

Primeiro, lerei o artigo do jornal O Globo, que diz: “Terror treina em Brasil e Paraguai, diz revista - ‘Vanity Fair’ afirma que há cinco campos de treinamento do Hezbollah e da Al-Qaeda em operação nos dois países”.

Ora, esse é um ingrediente a mais, um tempero a mais que os Estados Unidos, no comando dos países mais poderosos do mundo, colocam agora exatamente sobre a Amazônia. Diz claramente essa revista que há cinco pontos, localizados entre o Brasil e o Paraguai, chamados “campos temporários para treinamento de terroristas”, que seriam, no Brasil, o campo de Miranda e o campo de Boa Vista, ambos em Mato Grosso do Sul - aliás, não confundir com Boa Vista, capital do meu Estado -, e de Guaíra, no Paraná. Do lado do Paraguai, Palma Chica e Pedro Juan Caballero. Então, são cinco ao todo, sendo três no Brasil e dois no Paraguai, todos na linha de fronteira. Portanto, na Amazônia brasileira e na Amazônia paraguaia.

Isso mostra muito bem, repito, como mais um ingrediente é colocado para justificar, aos olhos do mundo, uma futura intervenção dos Estados Unidos no Paraguai ou no Brasil. Na Colômbia eles já estão - é sobre isso que trata a matéria do jornal Folha de S. Paulo -, ativamente, combatendo a guerrilha, fazendo fumigação química, jogando, portanto, produtos químicos para matar as plantações de coca, de papoula e, por tabela, prejudicando também todo o ecossistema.

Mas o enfoque do interesse dos Estados Unidos não é somente o combate à droga. Tenho, aqui, Sr. Presidente, a manchete do jornal, que diz justamente o seguinte: “Colômbia susta compra de aviões do Brasil - Anúncio foi feito um mês após general americano pedir a revisão da compra; colombianos e EUA negam pressão”. Isso quer dizer que os Estados Unidos dão com uma mão - se é que estar intervindo militarmente e politicamente em um país significa dar - e retiram com a outra, porque, na medida em que a Colômbia recebe recursos para essa operação, ela é obrigada a comprar aviões e produtos químicos dos Estados Unidos. Enfim, ela é obrigada a comprar tudo o que os Estados Unidos quiserem. Isso está afetando, agora, as nossas relações comerciais com a Colômbia, pois a Embraer já estava com um contrato acertado sobre o fornecimento de aviões para aquele país e os Estados Unidos vetaram a compra desses aviões.

Coincidência ou não, o anúncio do cancelamento da compra dos aviões Tucanos, da Embraer, pela Força Aérea Colombiana (FAC), anteontem, aconteceu após a visita a Bogotá do general William T. Hobbins, chefe da 12ª Divisão de Aviação, da Força Aérea do Comando Sul dos Estados Unidos.

Na semana passada, a própria Ministra da Defesa da Colômbia, Marta Lucía Ramírez, apesar de negar uma intromissão dos EUA no caso, disse que a presença do general daria ao governo “melhores elementos técnicos para decidir se compram esses aviões [os Tucanos] ou se reformam [os antigos aviões em uso pela FAC]”.

A ministra disse que a carta que havia recebido do general James T. Hill, chefe do Comando Sul dos Estados Unidos, recomendando a revisão da compra dos aviões, não significa uma ingerência externa.

Veja, Sr. Presidente, como a Colômbia, lamentavelmente, enquadra-se naquele verso que diz assim: “No primeiro dia, eles chegam e pisam a grama do nosso jardim, e não dizemos nada. No segundo dia, eles entram, roubam uma rosa do nosso jardim, e não dizemos nada. No terceiro dia, eles entram e matam o nosso cão, e não dizemos nada. No quarto dia, eles vêm e cortam a nossa garganta, e já não podemos dizer mais nada”. A Colômbia foi cedendo cada vez mais e, hoje, pouco pode realmente dizer.

Essa foi a política de descaso que a Colômbia usou com a sua Amazônia. A região que está hoje sob o domínio dos Estados Unidos, onde estão a FARC e outros grupos guerrilheiros, é justamente a região da Amazônia colombiana.

Portanto, os inúmeros fatos que tenho denunciado sobre a Amazônia brasileira, de ocupação de imensas reservas indígenas e ecológicas, decretadas sob a bandeira bonita de defesa do meio ambiente e de defesa das minorias índias, são, na verdade, fruto de um trabalho inteligentemente armado pelos serviços de informação dos Estados Unidos, que estão, portanto, plantando as sementes na Amazônia brasileira para ocupá-la dentro em pouco.

Na verdade, eles já colocaram na cabeça de muitos brasileiros que existem nações indígenas, que é preciso que os índios voltem a falar na sua língua original e não no nosso português, que não se pode produzir na Amazônia porque ela tem que se tornar um patrimônio da humanidade. E eu pergunto: qual humanidade? A nossa humanidade do Brasil ou a humanidade composta pelos países mais ricos do mundo?

E essa notícia agora, de que existem células do terror, mais especificamente, como diz a revista, do Hezbollah e da Al-Qaeda, em operação no Brasil e no Paraguai, para mim parece que é a pitada final que está faltando para que os Estados Unidos efetivamente intervenham na região de uma maneira aprovada internacionalmente e consentida nacionalmente.

Realmente, Sr. Presidente, posso até me considerar, como alguns dos companheiros de Senado, como aquela figura do beija-flor que tentava apagar um incêndio na floresta. Ocorria um incêndio de vastíssima proporção e um beija-flor levava em seu bico uma gotinha d’água, quando alguém perguntou: “O que você está fazendo? Esse incêndio é incontrolável”. E ele respondeu: “Estou fazendo a minha parte”.

Considero que, daqui desta tribuna, tenho feito a minha parte, denunciando esses fatos, sem nenhum viés ideológico. Se há alguma ideologia nesses meus posicionamentos é a ideologia da Amazônia brasileira, é o desejo de vê-la integrada ao Brasil de maneira sólida e definitiva, e, mais ainda, de convencer os brasileiros que 60% do território correspondente à Amazônia deve ser amado e visto como brasileiro, e como tal defendido. Uma notícia como esta parece inocente, “Terror treina em Brasil e Paraguai”, e, portanto, ninguém reage. Não tomei conhecimento de nenhuma nota do Ministério da Defesa, do Ministério da Justiça ou do Presidente da República contestando essa notícia. E sabemos que uma mentira dita e repetida várias vezes acaba por se tornar verdade.

Se europeus e norte-americanos, conforme pesquisa recente, não sabem sequer onde fica Nova Iorque ou Iraque - país contra o qual estão declarando guerra -, imaginem se sabem onde fica o Brasil, que eles acham tem como capital Buenos Aires. Que interessa a eles o Brasil ou o Paraguai? Nada. O que interessa é que esses dois países sejam reservas estratégicas. No entanto, é muito delicado dizer isso abertamente à Nação.

Chamo a atenção para esses dois jornais: a Folha de S. Paulo, que noticia que a Colômbia sustou a compra de aviões do Brasil por ingerência dos Estados Unidos; e O Globo, que noticia que uma revista americana afirma categoricamente que o terror treina no Brasil e no Paraguai, indicando, inclusive, o nome das cidades onde isso estaria acontecendo.

Estamos, portanto, altamente vulneráveis, e não vemos nenhuma reação.

Percebo que a Senadora Heloisa Helena deseja me apartear e aproveito para apelar a S. Exª, membro do PT, o novo governo, que carrega uma grande esperança do povo brasileiro, no sentido de que haja uma maior nacionalidade e um maior interesse em relação à Amazônia brasileira, para que não fiquemos, como os colombianos de Bogotá, muito assustados com o que está ocorrendo na Amazônia. Talvez os brasileiros do Rio, de São Paulo ou de Brasília, amanhã, possam estar assustados, como estão os colombianos de Bogotá.

Com muito prazer, ouço a nobre Senadora Heloisa Helena.

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Mozarildo Cavalcanti, não tive a oportunidade de acompanhar todo o pronunciamento de V. Exª, mas tenho obrigação de dizer que sou testemunha do esforço que V. Exª tem empreendido nesta Casa no sentido de chamar atenção para as questões da Amazônia. Por várias vezes conversei sobre esse assunto com a nossa querida companheira Senadora Marina Silva, que é uma alma dedicada à questão do desenvolvimento sustentável. Claro que qualquer pessoa de bom senso sabe que há alternativas interessantes para viabilizar o desenvolvimento econômico, protegendo e respeitando a natureza e o ambiente. Existem mecanismos e alternativas altamente eficazes e extremamente qualificados do ponto de vista tecnológico que demonstram claramente que se pode viabilizar o desenvolvimento econômico, promovendo a devida preservação do meio ambiente. Não poderia deixar de me solidarizar com V. Exª - embora, repito, não tenha tido a oportunidade de acompanhar todo seu pronunciamento - no que diz respeito à soberania nacional, especialmente relacionada à Amazônia, pois sou testemunha das várias vezes em que V. Exª fez essa defesa da tribuna. Realmente, o desafio do novo Governo brasileiro é muito grande, no sentido de articular com outros países, como os da América Latina, que estejam em situação semelhante de dependência aos que, hoje, se apresentam como um deus do Planeta Terra, os Estados Unidos, em relação a questões gravíssimas, como a imposição da política econômica, especialmente por meio do Fundo Monetário Internacional e das instituições multilaterais de financiamento. Essa situação, sabemos, colide claramente com a Constituição brasileira. Temos princípios ideológicos diferentes, V. Exª e eu, mas, certamente, concordamos em assuntos que tratam da soberania nacional, conforme determina o art. 1º, inciso I, da Constituição Federal brasileira. A ordem jurídica vigente no nosso País realça a questão da soberania nacional tanto no art. 1º, inciso I, da Constituição Federal, quanto nas questões econômicas, no inciso I do art. 170. Compartilho das mesmas preocupações de V. Exª. Nesses últimos anos no Brasil, de uma forma especial, discursos foram feitos, protocolos assinados, discussões realizadas, assim como em vários países e parlamentos mundo afora, sobre a possibilidade de a Amazônia ter a chamada soberania limitada e uma administração compartilhada. E não vimos reação do Presidente da República ou de qualquer autoridade. Não é delírio persecutório, não é mania de perseguição, é algo gravíssimo. Não apenas porque temos um escritório da CIA, a inteligência americana, instalado no Brasil, mas há ainda o problema sério relacionado à Base de Alcântara e podemos visualizar documentos e mais documentos produzidos pelas grandes nações, que têm a ousadia de dizer que a Amazônia é patrimônio da humanidade. Pode ser patrimônio da humanidade, mas com a soberania nacional brasileira. É evidente que é um patrimônio do Brasil! É um patrimônio da humanidade assim como as pirâmides do Egito e todas as belezas do mundo o são, como os mares, os oceanos - a nossa querida Carminha até me lembra que muitas cidades estruturas arquitetônicas de vários lugares, no Brasil e no mundo, são consideradas patrimônio da humanidade também. Não é em relação a isso que estamos tendo a obrigação de discutir. Mais uma vez, saúdo o pronunciamento de V. Exª sobre a necessidade de viabilizar os mecanismos alternativos para garantir à nossa Amazônia a sua complexidade, a sua biodiversidade e, especialmente, a soberania nacional. Solidarizo-me com V. Exª por esse pronunciamento, lembrando que muito da fragilidade das Forças Armadas e das defesas brasileiras certamente teve essa intenção. Os investimentos realizados pelas chamadas instituições multilaterais de financiamento, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano, talvez tenham como objetivo utilizar, depois, o argumento de que estão realizando investimentos em infra-estrutura na Amazônia, que os investimentos são americanos, dos chamados grandes credores do Estado brasileiro no mundo. Portanto, não se trata de uma brincadeira, mas de algo extremamente grave o que vem acontecendo com a Amazônia e com o Brasil. É de fundamental importância que estejamos vigilantes. Estaremos, V. Exª e eu, atentos, cobrando atitudes, como temos a obrigação de fazer, envidando esforços para que o novo Governo garanta o que dispõe a Constituição: a autodeterminação dos povos, o respeito nas relações internacionais a serem estabelecidas e o respeito em relação à convivência com outros países. Respeito não significa subserviência e subordinação aos interesses dos grandes. Portanto, compartilho da preocupação de V. Exª com relação à Amazônia. Muito obrigada.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Agradeço-lhe a manifestação, Senadora Heloísa Helena.

Não apenas no que se refere à Amazônia, mas, em muitos outros pontos, não temos divergido, até porque viemos do mesmo campo profissional - V. Exª é enfermeira e eu sou médico - e compartilhamos do problema do mais pobre, do mais sofrido, dos desiguais. Transportando-se essas preocupações para o Brasil e para a Amazônia, em particular, que representa 60% do território brasileiro, temos quase uma identidade. É evidente que, em alguns pontos, podemos divergir, o que é normal até entre membros de uma família, mas o importante é que, neste caso, a questão ideológica de todos os partidos converge para um único ideal. Alguns partidos podem até não convergir, por omissão ou por esquecimento. Mas quem observar o que está acontecendo, com um pouco de paciência, e verificar a cadeia de providências tomadas, como bem o disse V. Exª, como o enfraquecimento das Forças Armadas, a limitação dos investimentos na Amazônia, verá que tenho razão.

Senadora Heloísa Helena, bastava que se utilizassem as áreas que já foram trabalhadas pelo homem; como se diz na linguagem técnica, antropologicamente movimentadas para o desenvolvimento da Amazônia. Não estamos nem nos referindo a novas áreas a serem desmatadas ou colonizadas, mas somente àquelas que receberam do Incra ajuda para realizar os assentamentos que lá existem. Bastava que se investissem nessas áreas. Lá, não há acesso ao Pronaf, não há acesso à mecanização da lavoura, não existem vicinais. Enfim, a Amazônia está realmente programada para ficar inviabilizada e, com isso, fragilizada por esse tipo de dominação.

Os colonialistas modernos usam todos os artifícios. Um deles, tão antigo quanto o mundo, é a propaganda, o convencimento. Na medida em que os próprios brasileiros se convencerem de que a Al-Qaeda e o Hezbollah estão na fronteira do nosso Brasil, nós mesmos aceitaremos que, amanhã, a ONU intervenha nessa região. Portanto, isso nada mais é do que um trabalho de propaganda, de convencimento, primeiramente, do mundo composto pelos países mais ricos, o G-7, que comandam a OTAN e a ONU, e, depois, dos próprios brasileiros, para não haver nem sequer reação. Vamos ficar preocupados se a Al-Qaeda e o Hezbollah estiverem no Brasil.

Portanto, Sr. Presidente, essa é a minha denúncia, feita repetidamente. Nós, brasileiros, de todos os rincões do Brasil, precisamos acordar para defendermos a nossa Amazônia, desenvolvê-la de maneira inteligente e, principalmente, responder por vinte e cinco milhões de brasileiros que lá vivem, que estão desamparados pelo Governo Federal e que são pouco assistidos pelos governos estaduais, que não têm recursos suficientes. Isso agrava, portanto, cada vez mais, a profunda desigualdade regional que existe entre a Amazônia brasileira e o restante do País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2002 - Página 22493