Discurso durante a 136ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE ENTREVISTA PUBLICADA PELA REVISTA VEJA COM O ATUAL PRESIDENTE DA REPUBLICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Juvêncio da Fonseca (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Juvêncio Cesar da Fonseca
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. PROGRAMA DE GOVERNO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE ENTREVISTA PUBLICADA PELA REVISTA VEJA COM O ATUAL PRESIDENTE DA REPUBLICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/2002 - Página 22873
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. PROGRAMA DE GOVERNO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, SITUAÇÃO, BRASIL.
  • IMPORTANCIA, PROGRAMA DE GOVERNO, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PRIORIDADE, AMPLIAÇÃO, COMBATE, CONTROLE, FOME, MISERIA, DIVERSIFICAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE, PAIS, CONTINUAÇÃO, PROJETO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO AGROPECUARIO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, PANTANAL MATO-GROSSENSE.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a revista Veja publicou uma entrevista histórica com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Mais do que um balanço dos seus oito anos de governo, temos ali uma análise lúcida e esclarecida da realidade brasileira. Gostemos ou não, façamos críticas ou não ao período presidencial que ora se finda, não se pode negar a importância das reflexões desse que se mostrou um verdadeiro estadista à frente dos interesses e imensos desafios que é administrar o Brasil.

Mais do que um depoimento surpreendentemente franco e direto, muitos dos trechos das declarações do Presidente da República podem ser compreendidos como o desabafo de um homem que viveu uma experiência extremamente rica e que encerra lições importantes para aqueles que desejam mergulhar nos chamados intrincados e complexos mecanismos da governança de um País de dimensões continentais como é o nosso.

No decorrer das análises do Presidente, vai ficando evidente que os atos de governo são cada vez menos fruto da vontade individual do governante e muito mais do ordenamento dos desejos coletivos. Quem se dispõe à tarefa de decidir os destinos de uma sociedade multifacetada como a nossa muitas vezes padece dos riscos da ausência de consensos.

Por mais que tentemos implementar medidas que satisfaçam o desejo das maiorias, terminamos com a sensação de que alguém ou algo ficou de fora, que a abrangência das nossas propostas era limitada e que nossos esforços acabaram sendo pouco diante de tantos anseios a serem atendidos.

Governar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passa a ser uma corrida contra o tempo, uma urgência nunca atendida plenamente, uma necessidade na qual o muito não existe e o pouco é uma constante inabalável.

Nesse sentido, uma lição importante deixada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, nestes seus oito anos de Governo, é aquela que compreende a realidade como um processo e que as conquistas sociais importantes acontecem no plano do microcosmo, no quotidiano de cada cidadão, longe, na maioria das vezes, dos olhares da imprensa que tende, por suas limitações naturais, a apenas enxergar e dar relevância à superfície do mundo real, esquecendo-se das razões profundas das coisas.

Seria nesse aspecto - e a título de exemplificação esclarecedora do que queremos aqui destacar mais adiante -, de fundamental importância que os membros desta Casa atentassem para os acontecimentos que vêm se sucedendo após as últimas eleições.

Aos poucos, todos os Partidos (e a maioria dos Deputados e Senadores, reeleitos ou não) vão compreendendo a exata dimensão da crise vivida pelo País e começam, dessa maneira, a agregar às suas reflexões e atitudes os dados fundamentais da realidade, refutando as propostas demagógicas e irresponsáveis, reafirmando assim o compromisso democrático de não ceder à tentação do oposicionismo voluntarista por intermédio do debate estéril em torno de propostas inexeqüíveis.

O atual momento histórico, nesse sentido, é pedagógico. Ele está a nos ensinar uma lição fundamental: o País só poderá mudar na medida que compreendamos que não se avança fortalecendo os chamados núcleos das propostas inviáveis e nem se repetindo os mesmos erros cometidos pelos Partidos de oposição em passado não tão distante. O País só poderá mudar se mudarmos a maneira de se pensar e de se fazer política.

Por isso, confesso que estou cada vez mais impressionado com o fato de que a expectativa de ser governo termina por estimular um poder transformador nas atitudes, nas falas e nos gestos daqueles que, meses atrás, apontavam contradições e erros onde apenas havia lógica e coerência.

Na verdade, lembrando ainda a frase presidencial, tudo é um processo, o tempo amadurece e o Brasil segue em frente. Fico, assim, satisfeito quando observo os movimentos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, reiterando seus compromissos com os contratos estabelecidos, promovendo uma transição tranqüila, dando segurança ao País, sinalizando que pretende seguir o caminho da ordem, da justiça, da paz social, sem criar um clima de incerteza, garantindo a todos um sinal inequívoco de que em seu Governo não haverá aventuras nem mágicas surpreendentes.

Mesmo assim não podemos deixar de considerar que o momento econômico é delicado e o contexto internacional cada vez mais adverso. O Brasil, nos últimos anos, teve a oportunidade de demonstrar ao mundo que adotou políticas macroeconômicas corretas, o que não impediu que houvesse um crescente endividamento externo e interno, o que hoje preocupa a todos indistintamente, em função da nossa crescente fragilização diante dos intensos fluxos de capitais na direção de outras regiões do Planeta.

No próximo ano, precisaremos de novos investimentos e não podemos nos dar ao luxo de arriscar em experimentalismos, que podem até causar impactos psicológicos surpreendentes e de momentos, mas não garantirá crescimento econômico, investimentos sociais e perspectivas de desenvolvimento tecnológico.

Sabemos que 2003 será um ano difícil, tumultuado e repleto de complicadores no horizonte político. Para todos será um verdadeiro teste de resistência emocional. Haverá dúvidas, controvérsias e perplexidades. Mas não podemos nos perder em detalhes esquecendo os objetivos gerais da Nação.

Temos que nos desvencilhar dos acontecimentos de curto prazo e vislumbrar os movimentos gerais num processo histórico. Não podemos ter a ilusão de que todas as mudanças prometidas na última campanha eleitoral venham sem esforço coletivo, num ato apenas de vontade pessoal do Presidente da República, à margem das instituições, numa simples canetada ou em gestos simbólicos.

Nada disso: a mecânica do poder exigirá negociações permanentes além do apelo reiterado ao bom senso e à coerência. O momento é de esforços conjuntos e de abdicação de vaidades. O País é maior do que nossas ambições individuais e a busca permanente de consenso devem ser sempre a regra e nunca a exceção.

Não temos dúvida de que a ampliação de programas como o de controle à fome deve ter tratamento prioritário, bem como a diversificação e ampliação de programas de renda mínima para atender a população carente de todo o País. Mas é preciso não dispersar esforços e recursos e agir sem que antes se tenha dimensionado com exatidão quais são as verdadeiras facetas da miséria brasileira. Caso contrário, corremos o risco de dar um passo atrás, fortalecendo o mero assistencialismo sem dar os instrumentos necessários para que a população mais carente supere suas adversidades no rumo da emancipação, mas com trabalho.

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, tempos atrás, que sua vitória eleitoral era uma demonstração de que a esperança havia vencido o medo. Pois acreditamos que, a partir de agora, devemos reafirmar que não se deve temer a perda gradual do sentimento de esperança por causa dos desdobramentos de uma realidade incerta, nebulosa e repleta de dúvidas.

Estamos convencidos de que a linha correta é estar todos os dias construindo um novo País, de maneira incansável, com determinação e com a certeza de que venceremos as inúmeras dificuldades, principalmente se agirmos compreendendo de que nada poderá ser mais prejudicial do que a ruptura inconseqüente e a descontinuidade de projetos de fundamental importância estratégica para os Estados.

A equipe de transição do Presidente eleito deve trabalhar sem perder a perspectiva daquilo que é importante para o desenvolvimento de cada região do País, não permitindo que o rompimento de vários programas prejudique os esforços empreendidos até o momento.

Nesse sentido, falando do meu Estado, governado pelo PT, seria um contra-senso não dar continuidade a um trabalho de extrema relevância para Mato Grosso do Sul e também para Mato Grosso, que é o Programa Pantanal. Esse Programa representará não só a redenção dos dois Estados como a reafirmação da nossa principal vocação: desenvolvimento agropecuário sustentável e preservação ambiental, em projetos que vêm sendo resultado de esforços técnicos e políticos nos últimos oito anos, sem que se tenha conseguido, até o momento, iniciá-lo de maneira efetiva e consistente.

Acredito que deva haver esforços convergentes entre as Bancadas federais dos dois Estados para levarmos essa importante questão ao próximo Governo e, com isso, possamos, finalmente, tirar do papel o que até o momento foi objeto de muito discurso e pouca ação concreta.

Por isso, estou aqui para cobrar providências dos Governos federal e estaduais (Mato Grosso do Sul e Mato Grosso) para que não permitam a paralisação do Programa Pantanal, visto que se tratam de investimentos fundamentais para o desenvolvimento da bacia do alto Paraguai, que depende, mais do que nunca, dos recursos previstos para a execução dos inúmeros projetos envolvendo desde proteção ambiental até saneamento básico de uma região de suma importância para todo o País.

Causa-me estranheza, Srªs e Srs. Senadores, que, depois de tanto se falar em Programa Pantanal, depois de se promoverem inúmeras reuniões e debates no âmbito dos Governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e do BIRD, o assunto esteja amortecido, sem que se saiba claramente o que está sendo ou não realizado, em que fase encontram-se os projetos.

O mais grave são as notícias de que os órgãos estaduais não concluem os projetos técnicos necessários para dar andamento aos processos, visto que organizações não-governamentais estão reivindicando a revisão da licitação que escolheu a gerenciadora do Programa, o que tem provocado reiterados atrasos em seu andamento. É lamentável ter que esperar para ver acontecer um Programa que há quase uma década é discutido sem que haja força de vontade política para operacionalizá-lo.

Vejo que está havendo descaso com um Programa que pode, por exemplo, resolver o grave problema do assoreamento do rio Taquari, que a cada ano tem sua situação agravada, criando um problema ambiental de proporções imensas numa das regiões mais belas e ecologicamente frágeis do planeta.

O Programa Pantanal entrou num círculo vicioso, prevalecendo um verdadeiro jogo de empurra-empurra entre os Estados e a União, e acredito que somente com mobilização política podemos fazer com que o processo avance e supere as atuais dificuldades.

Como disse no começo deste pronunciamento, evocando a entrevista do Presidente da República à revista Veja, muitas vezes os governantes não conseguem fazer prevalecer as suas vontades em função da necessidade da formação de consensos.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Juvêncio da Fonseca, V. Exª me concede um aparte?

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PMDB - MS) - Tem V. Exª o aparte.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Juvêncio da Fonseca, quero dizer à Casa que tive o prazer de, em companhia de V. Exª, visitar Mato Grosso do Sul e também inúmeros projetos que me impressionaram sobremaneira, tendo em vista a abundância da riqueza natural daquela região. Um Programa dessa envergadura, como o Projeto Pantanal, não deve ser postergado. Muitas vezes, pela limitação de recursos e por diversas dificuldades não conseguimos fazer tudo o que desejamos. No entanto, penso que nós, brasileiros, temos que investir neste Projeto por se tratar de uma região diferenciada, que trará riquezas para o País, seja no campo da exploração do turismo, na produção de produtos naturais e de essências, enfim, são tantas as vertentes produtivas para aquela região que, com certeza, muitas riquezas trarão para nosso País e para a região. Portanto, não podemos tardar na implantação do Programa Pantanal.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PMDB - MS) - Senador Ney Suassuna, o aparte de V. Exª enriquece o meu pronunciamento. E aproveito este momento para render minhas homenagens a V. Exª. Quando Ministro da Integração Nacional, V. Exª visitou praticamente todo o Estado de Mato Grosso do Sul, fiscalizando e incentivando a execução de projetos. Naquela oportunidade pôde ver quão importante é aquele Estado, quão importante é aquela região e quão frágil é o Pantanal, que precisa de cuidado ambiental. E este Projeto, Senador Ney Suassuna, de suma importância para o País e para nós, não é apenas de preservação ambiental, é também de desenvolvimento econômico sustentado. Portanto, é grande a nossa esperança. Em Mato Grosso do Sul serão mais de 25 Municípios abrangidos por este Projeto que envolve desde o de saneamento básico, passando pela de infra-estrutura urbana e chegando até à preservação ambiental.

Sr. Presidente, este Projeto é de importância capital tanto para os mato-grossenses-do-sul quanto para os mato-grossenses que, com certeza, também estão ansiosos para que ele saia do papel e das gavetas para ser implantado naquele grande ecossistema, a grande região úmida deste País, que se chama Pantanal, trazendo para todos nós os seus benéficos resultados.

O Governador do meu Estado, acredito, pôde perceber no exemplo do Programa Pantanal as inúmeras dificuldades enfrentadas por um governante ao necessitar operacionalizar interesses multilaterais para viabilizar recursos importantes que irão contribuir decisivamente para o desenvolvimento das potencialidades regionais. Este é um caso típico para se promover parcerias amplas, envolvendo parlamentares, técnicos e entidades de classe no sentido de dar encaminhamento e solução de problemas de interesses regionais e nacionais.

Sr. Presidente, eu diria que a minha esperança maior para que esse Projeto realmente caminhe está justamente no fato de o nosso Governador pertencer ao PT, e, portanto, ter o apoio e a simpatia do futuro Presidente da República, que tomará posse em 1º de janeiro. Certamente, Mato Grosso do Sul e a Presidência da República estarão em perfeita harmonia.

Espero que esta Casa possa, a partir de agora, trabalhar para ajudar a definir prioridades, sem o ranço das diferenças políticas, e dar sua contribuição decisiva para o crescimento do Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/2002 - Página 22873