Discurso durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações à pesquisa sobre índices de corrupção mundial divulgada por empresa americana de consultoria e pela organização não governamental "Transparência Brasil".

Autor
Olivir Gabardo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: João Olivir Gabardo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ECONOMIA NACIONAL.:
  • Considerações à pesquisa sobre índices de corrupção mundial divulgada por empresa americana de consultoria e pela organização não governamental "Transparência Brasil".
Publicação
Publicação no DSF de 04/12/2002 - Página 23328
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ECONOMIA NACIONAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, CIDADANIA, COMBATE, CORRUPÇÃO, COMENTARIO, PESQUISA, AUTORIA, EMPRESA ESTRANGEIRA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), BRASIL, REGISTRO, DADOS, VINCULAÇÃO, POBREZA, PREJUIZO, CRESCIMENTO ECONOMICO, OBSTACULO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO.
  • ANALISE, CORRUPÇÃO, PODER PUBLICO, INICIATIVA PRIVADA, ESPECIFICAÇÃO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, SONEGAÇÃO FISCAL.

O SR. OLIVIR GABARDO (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado na tarde de hoje para falar sobre um assunto que tenho debatido em minha longa carreira política.

Acredito que em muitas nações, dentre elas o Brasil, há que se despertar uma profunda consciência cívica para que a corrupção seja reduzida a níveis suportáveis.

Recordo-me dos debates travados na Câmara dos Deputados, há mais de 20 anos, quando ainda vigia o regime militar e era perigoso denunciar autoridades que corrompiam e se corrompiam. Em um deles, falávamos sobre o ex-governador nomeado do Paraná, e logo a seguir cassado pelo próprio regime militar, Leon Peres. O Líder do Governo, Cantídio Sampaio, defendia com todo o vigor que não havia corrupção, mas, caso houvesse, era fato corriqueiro que ocorria em todo o mundo. Espero que esse pensamento não prevaleça, a fim de que possamos encarar esse canto da sociedade moderna como um dos maiores males que atingem a nossa sociedade.

E é esse o tema analisado em uma grande revista americana, em recente publicação. Acho oportuno dar conhecimento a esta Casa para que o assunto seja debatido com seriedade e a sociedade possa acompanhar de perto, ajudando-nos e ajudando a si própria, para que possamos, senão eliminar, reduzir a corrupção a níveis suportáveis. 

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não pode passar despercebida a pesquisa recentemente divulgada pela Kroll, uma multinacional americana que atua na área de consultoria e gerenciamento de riscos, e pela Transparência Brasil, uma ONG dedicada ao estudo e combate da corrupção. A pesquisa, realizada com o maior rigor, relaciona a corrupção que grassa no Brasil com os elevados índices de pobreza entre nós.

A novidade, contudo, não está nessa constatação que, de resto, não é nova, mas sim no fato de que mais de um terço das empresas privadas, ouvidas sigilosamente na pesquisa, admitiram que a corrupção envolvendo o poder público no Brasil é uma prática aceita por elas. Aí, sim, reside a cruel constatação de uma situação que, repito, não é nova, a de que a prática da corrupção encontra-se enraizada também na estrutura empresarial do País.

É preciso considerar que todo ato de corrupção envolve pelo menos duas partes: a que pede e a que dá. Dir-se-á que o empresário é compelido a ceder aos apelos dos corruptos, sob pena de não sobreviver, o que é absolutamente verdadeiro - e lamentável -, mas nem por isso a constatação do fato, em uma pesquisa das dimensões dessa que a imprensa nacional está divulgando, deixa de causar estupefação.

Segundo a pesquisa, mais da metade das empresas consultadas admitiu que houve menção explícita, por exemplo, de favores a serem prestados por políticos em troca de contribuição financeira para campanhas eleitorais. Entre as empresas consultadas, 70% delas já se sentiram compelidas a dar dinheiro para campanhas.

A cobrança de propinas por agentes do poder público também foi admitida pelos empresários ouvidos na pesquisa. Nada menos de 48% das empresas ouvidas já receberam propostas de propina para não pagar impostos e taxas. A pesquisa aponta ainda para o fato de que os setores financeiro e industrial são os mais procurados pelos corruptos.

A pesquisa Kroll/Transparência Brasil faz uma radiografia da corrupção entre nós e coloca o País em posição nada lisonjeira. Por exemplo, em termos de corrupção, ocupamos a 70ª posição no mundo, ao lado de países como Sri Lanka, Peru, Jamaica e mais duas ditaduras: a de Cuba e a da Bielo-Rússia, uma companhia nada honrosa certamente.

Esse nível de corrupção, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de acordo com os organismos pesquisadores, está diretamente relacionado com a renda per capita dos países. Após o cruzamento de dados entre os países onde a corrupção é maior, os pesquisadores concluíram que, se a situação brasileira se agravar mais ainda, atingindo o mesmo nível de Angola - uma calamidade em termos de corrupção - a renda per capita brasileira ficará 75% menor em oito décadas.

Na hipótese de navegarmos em direção contrária, ou seja, se o combate à corrupção for efetivo e atingirmos o nível de honestidade, por exemplo, da Inglaterra, a renda per capita brasileira ficará quatro vezes maior no mesmo período. Caso o Brasil apresentasse o mesmo índice de corrupção da Dinamarca, país considerado de menor corrupção no mundo, os investimentos nacionais gerariam um maior Produto Interno Bruto, o que, por sua vez, implicaria em um aumento estimado em cerca de US$2,85 na renda per capita nacional, significando um acréscimo de 70% em relação à atual. Estendendo o raciocínio, é possível concluir-se que, levando em consideração tão-somente o fator desonestidade e desprezando-se todos os componentes que influem no crescimento de um país, seria possível o Brasil atingir, em apenas oito décadas, uma renda per capita da ordem de US$14 mil.

Vê-se, pois, Sr. Presidente, como é importante o combate sem trégua à corrupção. Aliás, para usarmos textualmente a expressão de Daniel Kaufmann, economista do Banco Mundial que estudou a questão verificando a situação de 160 países, “o combate à corrupção é um instrumento eficaz para fazer crescer a economia de uma nação”. Faço coro com ele, Sr. Presidente, pela absoluta verdade que o pensamento exprime. Não há como contemporizar com a corrupção, sob pena de vermos os esforços pelo desenvolvimento do país soçobrarem num mar de lama, com perversos efeitos sobre as camadas mais necessitadas da nação. Sim, porque um estudo realizado por Kaufmann e Aart Kraay, ambos do Banco Mundial, conclui pela existência de uma relação intrínseca entre os elevados níveis de corrupção e os baixos índices sociais. Não há como deixar de concordar com eles que o dinheiro desviado pelo superfaturamento de obras públicas e pela sonegação de impostos vai fazer falta na hora de se investir em infra-estrutura, em saneamento básico, em educação e em saúde pública. O dinheiro que se esvai pelo ralo da corrupção tem efeito negativo na criação de postos de trabalho. Os estudiosos do Banco Mundial concluem que, em economias contaminadas por elevados índices de corrupção, os investimentos são de 2,6 pontos percentuais mais baixos do que em nações com índices éticos mais elevados.

Os pesquisadores Marcos Fernandes, Fernando Garcia e Andréia Bandeira, da Fundação Getúlio Vargas, também se debruçaram sobre o estudo da corrupção e chegaram a esta mesma conclusão: a corrupção afeta o crescimento econômico nacional de forma avassaladora. Em estudo que divulgaram, no ano passado, eles mensuraram o impacto dos desvios de conduta na produtividade e na renda de diversos países. O estudo afirma que a corrupção caminha, lado a lado, com estruturas institucionais ineficientes e possui intensa interferência na qualidade dos investimentos públicos e privados, além de afastar investidores estrangeiros. Aliás, a ONG Transparência Internacional, em estudo que também realizou sobre a questão, concluiu que o Brasil deixa de receber bilhões em investimentos em função da corrupção e mostrou que grandes empresas do mundo inteiro - as chamadas multinacionais - analisam o ranking dos países corruptos para verificar onde devem fazer investimentos e têm, de certa forma, evitado o Brasil. Com isso, Sr. Presidente, estamos perdendo empregos, oportunidades de trabalho, salários, rendas e receitas públicas. Em resumo: o País se empobrece exatamente porque a corrupção tem sido um fator de impedimento a grandes investimentos de empresas estrangeiras em nosso território.

Recente estudo da Consultoria Simonsen Associados com 132 executivos integrantes da Câmara Americana de Comércio foi realizado para saber quais fatores desestimulam os investimentos produtivos no Brasil e a conclusão foi a de que a corrupção é o terceiro maior obstáculo, atrás apenas dos impostos e do chamado custo Brasil. É que a corrupção é responsável pela concorrência desigual e pelo clima de insegurança no meio empresarial brasileiro, deixando a sensação de que quem tem maior chance de ganhar o contrato com o Governo não é a empresa mais competitiva e competente, mas sim aquela que se rende à propina.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o combate à corrupção em todos os níveis é hoje uma tarefa que se impõe a todos quantos se interessam pelos destinos desta Nação. Hoje qualquer pesquisa de opinião vai indicar que o combate aos corruptos se tornou uma das prioridades da sociedade brasileira, já suplantando, mesmo em importância, o controle da inflação. E com razão, pois, como vimos, os esforços pela estabilidade econômica do País são comprometidos pela ação de desonestos nos mais variados escalões da vida pública e privada do Brasil e, se não conseguirmos superar esse triste estado de coisa, não poderemos jamais almejar atingir os elevados índices de desenvolvimento e bem-estar que esta Nação de povo ordeiro e trabalhador tanto merece.

Assim, Sr. Presidente, este pronunciamento é quase uma conclamação à sociedade brasileira, para que ela passe a vigiar diuturnamente todos os atos para ver se a corrupção não se está alastrando de forma vigorosa em nosso País. Somente com a vigilância da sociedade brasileira poderemos afastar esse terrível mal que tem comprometido o desenvolvimento do nosso País.

Muito obrigado, Sr. Presidente e nobres Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/12/2002 - Página 23328