Discurso durante a 142ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ANALISE DAS ESTATISTICAS DO IBGE SOBRE A MORTALIDADE DECORRENTE DA VIOLENCIA.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • ANALISE DAS ESTATISTICAS DO IBGE SOBRE A MORTALIDADE DECORRENTE DA VIOLENCIA.
Aparteantes
Geraldo Melo, Lindberg Cury.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2002 - Página 23652
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), CRESCIMENTO, MORTE, VIOLENCIA, BRASIL, REDUÇÃO, EXPECTATIVA, VIDA, CRITICA, AUSENCIA, POLITICA, COMBATE, HOMICIDIO, ACIDENTE DE TRANSITO, AMPLIAÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL, ESPECIFICAÇÃO, SITUAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ESTADO DA PARAIBA (PB), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ATUAÇÃO, CRIME ORGANIZADO.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, CRIME, INEFICACIA, APLICAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, SEGURANÇA PUBLICA.
  • COMENTARIO, ELOGIO, TRABALHO, COMISSÃO MISTA, CONGRESSO NACIONAL, DETALHAMENTO, SUGESTÃO, MEDIDA DE EMERGENCIA, EXPECTATIVA, URGENCIA, VOTAÇÃO, MATERIA, CAMARA DOS DEPUTADOS.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Inicialmente, quero agradecer ao nobre Senador Eduardo Suplicy.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna, neste dia, para tratar de um tema que diz respeito a todos os brasileiros e que muito nos assusta: a crescente onda de violência que assola o País, de ponta a ponta. A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou uma pesquisa recentemente que coloca o Brasil em primeiro lugar no ranking dos crimes cometidos com arma de fogo, e em terceiro lugar no ranking de homicídio juvenil.

O crescimento do número de mortes inibe o aumento da expectativa de vida dos brasileiros. Segundo o IBGE, a expectativa ao nascer, em 2001, era de 68,9 anos, resultado que subiria 1,4 ano se não fossem as mortes violentas.

Em matéria veiculada na Folha de S.Paulo de anteontem, 03 de dezembro, fundamentada em pesquisa do IBGE, descobre-se que é a violência, uma vez mais, que explica a diferença da expectativa de vida entre homens e mulheres, que em 2001 era de 7,8 anos. Ou seja, morrem mais homens do que mulheres.

De acordo com a referida pesquisa, São Paulo, lamentavelmente, é líder no índice de mortes violentas entre homens de 15 a 24 anos - em 1990, o Estado estava em quarto lugar. Já o ex-líder, Rio de Janeiro, caiu para o terceiro lugar nesse ranking macabro.

Conclusão do IBGE: “A violência está deixando no país uma cicatriz demográfica”. E não é para menos. O total de mortes violentas em 21 anos representa praticamente duas vezes a população da cidade de Campinas, que é de quase um milhão de habitantes. Estamos falando de dois milhões de pessoas mortas de forma violenta em 21 anos de registros no Brasil. Esses são os dados oficiais, o que significa dizer que o número deve ser bem maior. Representa, ainda, oito vezes e meia os cerca de 226 mil americanos e vietnamitas mortos na Guerra do Vietnã (1959 - 1973).

A carência de política, especialmente para o combate a homicídios e acidentes de trânsito, está na raiz dos números apurados e, em parte, tem anulado ganhos obtidos em outras áreas das políticas sociais, como saúde e educação.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o estarrecedor dos dados divulgados é que o Brasil, um País onde não existe guerra civil declarada nem histórico de secessão (razões mais freqüentes para o número de óbitos não naturais), lidera esse índice macabro, posicionando-se à frente de países africanos, tradicionalmente sacudidos por guerras tribais, ou de países como Porto Rico e Colômbia, onde o narcotráfico criou um Estado dentro do Estado.

Entretanto, o mais preocupante é que, mesmo internamente, a mudança do perfil da violência apresenta aspectos no mínimo surpreendentes. Por exemplo, Recife, em Pernambuco, já ocupa o primeiro lugar em assassinatos com armas de fogo, e João Pessoa, capital do meu Estado, a Paraíba, até pouco tempo uma ilha de tranqüilidade e sossego, passou a ocupar o décimo lugar em homicídio entre jovens na faixa etária de 15 a 24 anos. Insisto em dizer que estamos falando de dados oficiais, mas o número deve ser bem maior, porque muitos casos não são registrados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as comparações com dados internacionais mostram que o padrão de violência que vitima o jovem e a sociedade brasileira está ligado, quase sempre, ao porte de arma de fogo.

No caso de Paraíba, João Pessoa, hoje em 10º lugar no ranking, ocupava, há 10 anos, o 21º lugar. A taxa de óbitos por homicídios na Paraíba subiu de 12,5 em cada 100 mil habitantes, no ano de 1991, para 15,0 em 2000.

É evidente que esses dados devem ser analisados à luz de diversas variáveis de natureza social e econômica, de caráter estrutural, visto que esse resultado não foi produzido no curto prazo, mas traduz a ineficácia e, muitas vezes, a ausência de políticas públicas específicas para a infância e a adolescência.

A má distribuição da renda, o êxodo rural, a desigualdade social e a deficiência do nosso sistema escolar são, provavelmente, os principais fatores responsáveis pelo crescimento da violência no País. Os altos índices de criminalidade assustam a população e confundem as autoridades governamentais, incapazes de tomar ações positivas no combate a essa praga que se abate sobre a sociedade brasileira.

Estamos atingindo um ponto imperdoável: o conformismo com a violência. Todos estamos começando a considerar a violência normal, e não é. É imperdoável quando sabemos que 38% dos nossos jovens têm seu primeiro contato com drogas entre 8 e 10 anos de idade. No Rio de Janeiro, cerca de sete mil jovens são envolvidos com o tráfico de drogas, e cinco mil andam armados e não hesitam em atirar. A sensação de impunidade é um dos fatores que animam os criminosos, especialmente os seqüestradores, a permanecerem no mundo do crime.

Segundo o sociólogo Túlio Kahn, o custo da violência em São Paulo atinge R$9 bilhões por ano. Estão previstos no Orçamento da República apenas R$7 bilhões para investimento em segurança em todo o País. Ou seja, o custo da violência em São Paulo, entre guardas contratados, sistemas de alarmes e carros blindados, é superior ao que está previsto para investimento nessa área durante todo o ano em todo o País. E o crescimento da criminalidade no interior paulista, que em alguns itens já supera os padrões de violência da capital do Estado, preocupa as autoridades.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, anualmente, perdemos cerca de 40 mil brasileiros, principalmente jovens, de forma violenta. Os estudantes das grandes metrópoles inseriram em seu currículo uma nova disciplina: viver entre o fogo cruzado dos traficantes dos morros próximos às escolas. A outra opção é ficar sem aula, porque as escolas são fechadas por absoluta falta de segurança, como aconteceu recentemente no Rio de Janeiro, nos bairros do Grajaú e Vila Isabel.

Para prevenir episódios como esses, o Estado do Rio de Janeiro lançou o programa Informação, Ação em Rede - RIAR, que consiste em intervenções urbanísticas nos pontos com maior incidência de roubo, furtos e agressões, a fim de dificultar a ação dos infratores nessas áreas. Por outro lado, a Governadora Benedita da Silva, com motivação social maior, lançou os Programas Territorialmente Definidos - PDTs, que prevêem intervenções sociais em locais com baixas condições econômicas, carências de serviços públicos e maiores índices de criminalidade.

Essas ações afirmativas estão nas ruas desde maio e demonstram que o interesse e a boa vontade dos governantes podem buscar caminhos para a redução da violência. A parceria entre governos estaduais, prefeituras e Governo Federal será de grande valia para a população do País, principalmente para as populações paulistana e carioca, e deveria ser estendida a outros Estados e Municípios brasileiros, tendo em vista a disseminação irrestrita da violência por todo o território nacional.

Nos últimos vinte anos, verificamos uma coisa ridícula, trágica, mas verdadeira: a criação de organizações criminosas, como o Comando Vermelho e o Terceiro Comando, voltadas para o tráfico de entorpecentes, no Rio de Janeiro, e o Primeiro Comando da Capital, com atuação criminosa diversificada em São Paulo. E o mais importante: esses movimentos estão se espalhando por todo o Brasil. E pasmem, Srs. Senadores, os líderes estão dentro das cadeias. A prisão é o álibi deles: “Estou preso, portanto, não sou o responsável”. Mas bancos são assaltados, assassinatos são praticados, ações são realizadas contra a polícia, que, agora, passou a ser refém. Antes, o policial tinha orgulho de usar a farda; agora, esconde-a, com medo de usá-la e ser fuzilado, metralhado.

E nas grandes cidades, há áreas, como as linhas amarela e vermelha, no Rio de Janeiro, pelas quais muitas vezes não é possível passar. É uma vergonha! E o rádio informa como se fosse uma situação natural: “Está fechada, porque está havendo tiroteio entre a polícia e os marginais”. Além disso, de quando em vez, os marginais, por divertimento, resolvem atirar nos carros da polícia. Isso é inadmissível!

O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - V. Exª tem a palavra, nobre Senador.

O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Nobre Senador Ney Suassuna, V. Exª aborda um dos assuntos mais importantes e momentosos. Realmente, esse conflito no Rio de Janeiro já vem de longas datas. E, muitas vezes, a polícia está envolvida com os traficantes, com a ação criminosa nos morros. E o pior de tudo é que os habitantes, as crianças dependem muito dos contrabandistas e dos “transportadores de drogas”, como são chamados na gíria popular. Esse é um problema dos mais sérios. É o mundo do desemprego, o mundo da fome, que adere à primeira oportunidade de negócio que surge. Não é segredo para ninguém o envolvimento da nossa polícia com o alto escalão do crime no Rio de Janeiro. Certa feita, criei uma polêmica muito grande, quando afirmei que o Exército deveria interferir em casos excepcionais como esse em que o conflito tornou-se uma guerra. No Rio de Janeiro, está ocorrendo uma guerra. Sabemos que os bandidos hoje têm armamentos mais sofisticados do que a própria polícia. Portanto, é muito oportuno o pronunciamento de V. Exª. Por isso, pergunto, apesar de saber que é anticonstitucional: na sua visão, num caso excepcional, num clima de guerra, não poderíamos ter a presença do Exército?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Senador Lindberg Cury, se eu fosse o Governador de um Estado que estivesse tendo um conflito como esse, com toda a certeza, pediria a presença do Exército, nem que fosse por tempo determinado, apenas para fazer uma varredura e tomar o maior número possível de armamentos.

Mas essa situação não ocorre apenas no Rio de Janeiro. Em meu pronunciamento, estou citando São Paulo e o restante do País. Há poucos dias, o Senador Geraldo Melo me contava sobre ações que estavam ocorrendo no Rio Grande do Norte. Em cidades pequenas, chegavam caminhonetes com bandidos armados com metralhadoras, que assaltavam bancos, matavam delegado, subdelegado e sumiam. Na Paraíba, não tem sido diferente. Em todo o território nacional estão ocorrendo fatos como esses que chocam a todos nós.

E as metralhadoras são modernas, importadas e vendidas por militares. Mas o que é pior, as granadas vêm do país irmão, a Argentina. E por onde entram esses armamentos pesados? Mísseis são encomendados de dentro de uma penitenciária de segurança máxima. Isso é inadmissível!

O que me traz à tribuna é que estamos começando a achar tudo isso normal. A nossa indignação está esmaecendo com a rotina dessas ações. É incrível não se poder transitar - um direito constitucional garantido a todo cidadão brasileiro -, porque grupos de marginais resolveram fechar uma rua.

Outro dia, fiquei arrasado, passei o dia todo chateado porque um trabalhador humilde de uma instituição de minha propriedade disse-me: “Senador, dê uma força para Fulano, porque ele está arrasado”. E eu quis saber o que era. O cidadão disse-me: “Senador, eu moro em um bairro de periferia, onde tem um pedágio. Toda vez que passo por lá tenho que pagar o pedágio para o bandido. Como não tinha dinheiro, ameaçaram-me e tomaram a minha marmita. E o bandido disse-me: ‘Se a comida desta marmita estiver azeda, na volta você me paga. Eu te conheço’”. E ele estava rezando para que a comida não azedasse. Veja o tipo de humilhação pela qual está passando o cidadão que tem que ir ao trabalho. É uma situação revoltante. Como é que um homem desses pode estar satisfeito com um Governo que permite que haja um status quo desses?! 

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Concedo a palavra ao Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - Senador Ney Suassuna, há algum tempo, esse mesmo tema que V. Exª aborda, que nada mais é do que a explicitação da grande aflição em que vive hoje a família brasileira, foi objeto de manifestação minha. E quero recordar um ponto que considero importante não ser esquecido. A violência no País está sendo encarada, a meu ver, de uma forma extremamente simplista: a questão não é apenas um problema de polícia, do mesmo modo que não se trata apenas de chamar o Exército, a Marinha e a Aeronáutica e transformar os soldados dessas organizações em policiais, porque isso representaria apenas um aumento no efetivo policial que estaria mobilizado. As Forças Armadas podem ter até um melhor treinamento, uma melhor qualificação, mas o fato de um indivíduo ser soldado das Forças Armadas não lhe dá maior capacidade de representar - e nem isso representaria - uma mudança na nossa postura em relação à violência. O aspecto que precisa vir ao centro das preocupações - e digo isso como uma voz da Oposição, mas olhando para um Governo que vai começar, porque penso que esta reflexão é necessária - é o fato de se estar criando um Estado paralelo. A característica básica do Estado é a sua capacidade de definir as regras e ter o poder de torná-las eficazes. Ele precisa ter capacidade de coerção para, conhecidas as regras, garantir que sejam aplicadas. Quando alguém está preso numa penitenciária por ordem do Estado, isto é, por ordem da justiça, que é um braço do Estado, portanto, está legalmente detido, e um helicóptero entra na penitenciária, passa por cima de todos os dispositivos que o Estado montou para fazer cumprir a sua determinação, retira dali quem quer e vai embora e não há nada que o Estado possa fazer, é porque a autoridade do Estado, a sua efetividade está claramente desafiada. No Rio de Janeiro, um amigo que reside numa área próxima a um morro, contou-me que, no seu condomínio, não havia sossego, isto é, a polícia do Estado, os mecanismos de segurança do cidadão não lhe davam, nem a ele nem a seus vizinhos, as garantias de que precisava. Por isso, recorreram ao morro, onde contrataram a segurança do condomínio e, a partir daí, passaram a viver tranqüilos, porque nem se picham mais as paredes. Essa força paralela que desafia o Estado está sendo capaz de dar às pessoas uma segurança que o Estado não dá. Na realidade, todas essas iniciativas românticas de desarmar a população, de proibir a fabricação de arma, tudo isso nada tem a ver com o problema. A questão, Senador...

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - É fazer valer a lei.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - É que a guerra moderna, a guerra de hoje no mundo, não é mais aquela guerra de um soldadinho com a farda de uma cor de um lado e um soldadinho com a farda de outra cor de outro lado, um atirando no outro. Não há mais a Cruz Vermelha. Não há mais regra para prisioneiro de guerra. Não há mais Tratado de Genebra para proteger ninguém. As forças com as quais se lutam hoje são forças que, por exemplo, estão dentro de um elevador: um sujeito vestido com uma bomba. Faz-se um ataque hoje, e não se sabe se o próximo ataque será daqui a um mês, daqui a um ano ou daqui a vinte e quatro horas.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - E nem onde.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - Não se trata de uma questão de polícia equipada ou desequipada. A polícia mais equipada do mundo é a dos Estados Unidos, e, mesmo assim, fomos surpreendidos com o 11 de setembro. A questão é que a guerra moderna, a guerra que alguns pensadores chamam de conflito do terceiro tipo, é uma guerra nova, em que não se sabe onde está o inimigo, que, em geral, está dentro do próprio país. Trata-se de uma reformulação na questão da segurança em termos mundiais. Para se enfrentar tudo isso, é preciso basicamente que é o Estado esteja em condições de funcionar como Estado e considere que a informação antecipada, oportuna e tempestiva é a grande arma do futuro. Concluindo e pedindo desculpas por me ter alongado, digo a V. Exª o seguinte: o ponto mais grave e que mais me preocupa em tudo isso - além da preocupação que eu como cidadão brasileiro tenho, igual à de todo mundo - é a iminência de se associarem os bandidos que precisam de proteção moral agora a movimentos sociais moralmente válidos, que, entretanto, precisam de dinheiro para continuar funcionando. Se essa associação, que já se fez em Angola e na Colômbia, for feita no Brasil, não sei, com os instrumentos de que dispomos e com a forma meio amadorística como tratamos essa questão, se estaremos em condições de enfrentá-la. Obrigado, Senador Ney Suassuna.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Geraldo Melo. Peço à Presidência um pouco de complacência apenas para que eu termine o discurso.

Senador Geraldo Melo, concordo com V. Exª em gênero, número e grau. Quando falo da possibilidade do uso das Forças Armadas, quero dizer que isso serve apenas para uma ação específica de varredura, de desarmamento, porque não é possível que não possamos cercar uma favela, desarmar todo mundo, partir para outra e assim por diante. O seu uso permanente seria inócuo e traria, exatamente como disse o nobre Senador, apenas o aumento do policiamento ostensivo.

Infelizmente, todas as medidas de combate à criminalidade não lograram superar o descompasso entre as engenhosas e inventivas modalidades de ação dos criminosos e as técnicas desenvolvidas pela Polícia para coibi-las. A impressão que fica para a sociedade é que os criminosos se movem à velocidade dos supersônicos, enquanto o Poder Público reage à velocidade da tração animal.

Em 1994, o Presidente Fernando Henrique Cardoso redigiu um texto sobre a insegurança no Brasil, prevendo as diretrizes básicas da política governamental para a área. O Presidente também lançou o Plano Nacional de Segurança Pública. Nenhuma das duas iniciativas logrou o êxito almejado.

As excessivas despesas com o combate à violência, de 8% a 10% do Produto Interno Bruto, não correspondem aos resultados esperados. Em 2001, foram gastos neste País cerca de R$80 bilhões com segurança, pela iniciativa privada, pelo cidadão, por órgãos públicos, e mesmo assim os efeitos não são visíveis.

A violência generalizada se espalha, contaminando todas as regiões brasileiras. Mesmo nos grotões mais distantes, o cotidiano das famílias passou a ser uma epopéia vergonhosa de horror, medo, perdas e impotência.

A interminável onda de seqüestros, que está abalando o País, levou o Congresso Nacional a criar uma Comissão Parlamentar Mista Especial de Segurança Pública, com a finalidade de elaborar textos consolidados para projetos de lei e propostas de emendas constitucionais, já apresentadas anteriormente na Câmara e no Senado num pequeno prazo. O relatório dessa Comissão trouxe sugestões valiosas para o enfrentamento do problema.

Diversas modificações no Código de Processo Penal foram sugeridas e novas tipificações criminais reconhecidas, como, por exemplo, seqüestro-relâmpago, seqüestro por meio de transporte coletivo, clonagem de cartões de crédito e celulares, pedofilia na Internet e roubo e receptação de carga. Alguns itens modernizaram a Lei de Execuções Penais.

Uma das principais idéias da Comissão consiste na unificação das duas Polícias, civil e militar, num prazo de até oito anos, ao término do qual ambas integrarão a força de Polícia estadual. As Guardas Municipais foram regulamentadas, e foi criado o Fundo de Segurança, que permitirá agir com maior rigor contra a corrupção.

As sugestões da Comissão encaminham-se para a adoção de ações emergenciais, de políticas públicas imediatas. Se a vontade política tomar o rumo certo, destinando recursos orçamentários suficientes para as esferas federal, estadual e municipal, talvez tenhamos resultados positivos.

As principais sugestões propostas pela Comissão referem-se à Criação do Ministério da Justiça e da Segurança Pública e do Fundo Nacional de Segurança Pública; à autonomia de gestão administrativa, operacional, financeira e orçamentária de todos os segmentos que compõem o Sistema de Segurança Pública; a um aporte tecnológico moderno para o setor; à instalação de um banco nacional de dados para combate à criminalidade; a maiores investimentos em equipamentos e instalações; à valorização dos recursos humanos; à participação efetiva dos Municípios no encontro de soluções locais para os problemas de violência.

A Comissão sugeriu, ainda, que o Executivo adote um sistema de segurança pública interativo, que leve em conta a complexidade dessa atividade, composto por sistemas de inteligência, como há pouco disse o Senador Geraldo Melo, de conhecimento de operações, disciplinar e correcional, além de comunitário e preventivo. Tal sistema poderá ser viabilizado por intermédio da Escola Superior de Segurança, do Sistema Nacional de Inteligência e do Sistema de Inteligência Policial.

Algumas outras soluções mais simples não examinadas pela Comissão, por dependerem apenas de vontade governamental, seriam o aumento da oferta de empregos de baixa qualificação, para tirar da rua os ociosos; a educação e o combate às drogas; a certeza de punição; o controle de venda de armas e de bebidas alcoólicas; as políticas de assentamentos do meio rural, entre outras.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao finalizar este discurso, tenho certeza de que conto com a sensibilidade do Governo para desenvolver as propostas contidas no cuidadoso e competente trabalho da Comissão Mista. Aproveito para parabenizá-la pelo excelente trabalho, pois a população brasileira não agüenta mais o clima de terror em que vive atualmente. Esperamos, também, que o Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Aécio Neves, honrando sua ascendência materna e paterna, comprometa-se a votar rapidamente os substitutivos dos projetos de lei e as emendas constitucionais propostas pela Comissão, bem como o texto definitivo e outros apresentados anteriormente no Congresso Nacional.

Essa, Sr. Presidente, é a atitude necessária, pois a Comissão Mista conseguiu fazer em dois meses o que se tenta, em ambas as Casas do Congresso Nacional, há mais de dez anos. Prioridade na tramitação das proposições é a única atitude que se pode esperar do Presidente da Câmara dos Deputados.

Muito obrigado, Sr. Presidente, inclusive pela condescendência de ter-me dado um tempo a mais.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2002 - Página 23652