Discurso durante a 143ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a crise financeira que atinge a universidade pública brasileira.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • Considerações sobre a crise financeira que atinge a universidade pública brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/2002 - Página 24439
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL, INSUFICIENCIA, RECURSOS FINANCEIROS, MANUTENÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, QUALIDADE, ENSINO, REGISTRO, NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, LIBERAÇÃO, VERBA, ENSINO SUPERIOR.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta época em que se reconhece a importância crescente de recursos humanos altamente qualificados para o desenvolvimento do sistema de ciência e tecnologia e, por conseqüência, do próprio País, paradoxalmente, a universidade pública brasileira vive a maior crise financeira da sua história.

A crise atinge as 53 Instituições Federais de Ensino Superior do País. Há três fatores básicos: o atraso no repasse mensal do duodécimo, a não-liberação do dinheiro previsto nas Emenda do Orçamento Geral da União e o bloqueio da conta de recursos próprios das federais.

Com a falta de recursos, estão sendo tomadas medidas de economia, como restrição do uso de telefone e de aparelhos de ar-condicionado. Faltam desde material de limpeza até medicamentos em hospitais universitários.

Segundo o Ministério da Educação, o problema é de “contingenciamento de verbas públicas, necessário devido à conjuntura econômica atual”. Na verdade, sabemos que a drástica situação que as universidades públicas enfrentam hoje é reflexo das mudanças mais gerais que se acentuam na sociedade, sobretudo numa época marcada pelo avanço do pensamento neoliberal e, conseqüentemente, pelo descompromisso do Estado com a implementação do ensino gratuito e do financiamento das universidades.

É inconcebível, na lógica dos organismos financeiros internacionais, a manutenção, pelo Estado, de suas instituições públicas, quanto mais de instituições como as universidades, que são fundamentais para o desenvolvimento autônomo do País. A esse respeito, em seu mais recente relatório sobre o Brasil, intitulado “Brasil: Assuntos Selecionados e Estatísticas”, o Fundo Monetário Internacional (FMI) critica a “política de gastos sociais” do governo federal e sugere, entre outras coisas, o fim da universidade pública gratuita. Para o FMI, as universidades públicas deveriam começar a cobrar algum tipo de mensalidade de estudantes.

Esse é o grande equívoco que tem pesado sobre a universidade pública brasileira: a idéia de que, em um país com as características socioeconômicas e educacionais do Brasil, é factível exigir das famílias e dos cidadãos que assumam o ônus do financiamento da educação superior e, pelo menos em parte, do esforço tecnológico, que, no País, está definitivamente associado à universidade pública.

Análises sérias e conseqüentes já demonstram, com base em dados disponíveis em todas as universidades públicas, que o número de ingressantes que não teriam condições de permanecer no ensino superior, se para isso tivessem de pagar qualquer tipo de taxa, vem crescendo a cada ano.

Por outro lado, não faltam demonstrações do pequeno, quase desprezível, impacto que teria sobre o orçamento das universidades públicas o montante de recursos a obter da cobrança de anuidades compatíveis com a renda média dos brasileiros.

Outro ponto óbvio, que os “inimigos” da universidade pública parecem não admitir: essas instituições têm sido as principais responsáveis pelo produção científica nacional. Projetos de pesquisa, para serem executados, requerem pesquisadores, pessoal técnico capacitado e treinado, instalações, recursos e equipamentos atualizados.

Esse patrimônio, material e humano, está concentrado na universidade pública brasileira; é natural e lógico que o seu orçamento reflita essa condição.

Não podemos, portanto, Srªs e Srs. Senadores, ignorar o pedido de socorro que as universidades federais dirigiram ao Congresso Nacional. É preciso que nos mobilizemos junto ao Executivo para a liberação da chamada Emenda Andifes, que representa 25% do custeio das federais, e que facilitemos a liberação de 68 milhões reais de emendas previstas no Orçamento da União de 2002 e, ainda, que asseguremos as verbas para 2003.

Especificamente para a Universidade Federal do Pará existem emendas apresentadas pela Bancada Federal que também precisam ser liberadas. Uma delas no valor de R$ 5 milhões referente ao orçamento para o ano de 2002, a outra, no valor global de R$ 60 milhões para o orçamento de 2003. Esta, ainda depende de aprovação da Comissão Mista de Orçamento e do Congresso Nacional.

No caso das universidades situadas nas regiões mais pobres do País, onde o poder aquisitivo da população fica abaixo da média nacional, a situação ainda é mais crítica, pois a instituição pública é de fato, para a maior parte dos estudantes, a única possibilidade de ingresso ao ensino superior. O Programa de Interiorização da Universidade Federal do Pará, que já serviu de modelo para outras universidades do País, fica inteiramente prejudicado com a escassez de recursos.

A interiorização da UFPA é fundamental, por exemplo, na oferta de cursos para a formação de professores para o ensino básico e para o ensino médio, buscando a adequação desses profissionais às exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB. Hoje, dos 90.749 professores da rede pública no meu Estado, 64.358 são leigos, ou seja, não tem a habilitação exigida pela LDB.

A Universidade Federal do Pará tem uma proposta denominada CAMPUSNET que visa dotar de estrutura tecnológica seus dez campi de atuação, dos quais, nove estão no interior do Estado situados em municípios pólos. Trata-se de um projeto revolucionário que reduziria em muito o tempo de formação dos profissionais na área de educação, atendendo assim às novas exigência legais, além de propiciar a formação técnica de jovens, de modo a adequar a oferta de mão de obra às demandas e especificidades de cada micro-regiões do Estado.

Com os sucessivos cortes no orçamento da Universidade Federal do Pará e todas as instituições públicas de ensino superior, projetos como esse ficam prejudicados. Portanto, são profundos os reflexos na sociedade, dessa política de abandono das universidades públicas.

O que está em jogo, Srªs e Srs. Senadores, é a própria sobrevivência das universidades públicas, que têm de se firmar enquanto espaços autônomos de produção do saber e de revoluções científico-tecnológicas, longe das ingerências do mercado e das submissões às gestões públicas que visam a destruí-las.

Precisamos assegurar que as universidades públicas possam estar voltadas aos reais problemas da sociedade, da população, ser um espaço de desenvolvimento de novas tecnologias e parceiras fundamentais no esforço de elevação da qualidade de vida do povo do nosso País.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/2002 - Página 24439