Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

AVALIAÇÃO DOS ENSINOS FUNDAMENTAL E SUPERIOR DURANTE A GESTÃO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Luiz Pastore (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Luiz Osvaldo Pastore
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • AVALIAÇÃO DOS ENSINOS FUNDAMENTAL E SUPERIOR DURANTE A GESTÃO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2002 - Página 27031
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, REDUÇÃO, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, ENSINO FUNDAMENTAL, REFERENCIA, PESQUISA, AUTORIA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS (INEP), INVESTIGAÇÃO, PROBLEMA, ENSINO PUBLICO.
  • CRITICA, INEFICACIA, ATUAÇÃO, PAULO RENATO SOUZA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), IMPLANTAÇÃO, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTICIPAÇÃO, PROJETO, MELHORIA, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO.
  • EXPECTATIVA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REALIZAÇÃO, MELHORIA, EDUCAÇÃO, AMBITO NACIONAL.

O SR. LUIZ PASTORE (PMDB - ES) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprensa brasileira tem destinado grande parte de seu espaço nobre às avaliações do ensino fundamental e superior na gestão do Presidente Fernando Henrique, sob a batuta do Ministro Paulo Renato. Apesar dos inegáveis avanços quantitativos, o destaque maior ficou por conta da queda de qualidade do ensino, particularmente no tocante ao ensino básico. Diante desse quadro, a conclusão não poderia ser outra senão a de que houve, sim, descaso e desatenção do Governo com a educação de nossas crianças e de nossos jovens.

Não por acaso, a média de anos de estudo no Brasil ainda patina em níveis extremamente baixos quando comparada com a de países de mesmo porte: enquanto, na Argentina e no Chile, a média gira em torno de 11 anos, no Brasil, permanece aproximadamente na faixa dos seis anos. Vale aproveitar o momento para dizer que, nos Estados Unidos, a média anda em torno de 13 anos. Não custa frisar que as conseqüências da baixa escolaridade incidem diretamente sobre o grau de dificuldade na conquista de emprego no mercado de trabalho.

A explicação para o baixo desempenho escolar no Brasil estende-se desde a baixa escolaridade dos próprios pais até a baixa escolaridade do conjunto de mães e pais da comunidade em que o aluno está envolvido. Embora o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets) reconheça que o problema tenha sido reduzido nos últimos tempos, as estatísticas demonstram que quase 60% dos brasileiros com mais de 15 anos de idade não chegam a ostentar oito anos de estudo. Em outras palavras, vasto contingente de cidadãos brasileiros sequer concluiu o ensino fundamental.

Isso não destoa do que foi divulgado, em setembro último, pelo Ministério da Educação, por ocasião da publicação dos dados preliminares do Censo Escolar 2002. Enquanto as duas pontas do sistema educacional brasileiro, a das crianças de até seis anos de idade e a dos jovens com mais de 15 anos, apresentaram crescimento significativo, o ensino básico, que compreende a faixa etária de sete a 14 anos, cresceu apenas 1%. Pior que isso é constatar que as matrículas na primeira série do ensino básico foram reduzidas em 1,5% em relação a 2001, o que confirma a forte hipótese de que mesmo a inexpressiva expansão nesta faixa escolar somente foi obtida graças às matrículas nas séries finais.

O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em documento divulgado recentemente sobre a educação básica no Brasil, aponta descompasso flagrante entre o que é proposto pelos currículos e o desempenho real dos alunos. A justificativa mais razoável para a existência do descompasso ancora-se, sobretudo, na perversa heterogeneidade dos sistemas de ensino, em termos de infra-estrutura disponível no vasto território nacional, que acaba por atuar como mecanismo reforçador das desigualdades sociais. Para o IPEA, outro fator igualmente importante para a negatividade do aproveitamento escolar no ciclo básico é a denominada distorção idade-série. 

Diante disso, por delegação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) ocupa-se de produzir um diagnóstico da educação brasileira no ciclo básico. Resumidamente, trata-se da aplicação de provas e de questionários sobre professores, diretores e instalações físicas. Pois bem, no último exame aplicado, em 2001, já se anteviam problemas crônicos na condução política do ensino básico no País. Desses problemas, sem dúvida, a falta de professores, os baixos salários e a baixa efetividade do ensino em disciplinas básicas constituem fatores preponderantes para a situação de precariedade no setor.

Sr. Presidente, o governo do Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, já anunciou que pretende universalizar, até 2006, todo o ensino básico do País. Na verdade, o programa para a área de educação propõe ampliação significativa do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), repassando valores maiores para os Estados com menores gastos per capita na educação fundamental. Aliás, segundo a imprensa, o governo eleito pretende criar outro fundo, o Fundeb, com exclusiva destinação à educação infantil. Mais que isso, promete elevar os gastos públicos com o setor educacional, dos atuais 5,2%, para 7% do Produto Interno Bruto.

Em 97, quando foi criado o Fundef, o Ministro Paulo Renato argumentava que sua finalidade era redistribuir os recursos entre Estados e Municípios, considerando a premissa de que parte dos orçamentos estaduais e municipais ficassem vinculados ao ensino fundamental. No entanto, conforme declarações de especialistas, embora o Fundo tivesse propiciado maior transparência no gasto público com educação, aos Estados e Municípios reservou margem muita estreita para financiar a expansão do ensino infantil (entre zero e 6 anos). Para resumir, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Educação, o Fundef, embora tenha engendrado efeitos positivos, precisa ser urgentemente aperfeiçoado, de modo que a garantir a educação básica, de zero a 17 anos.

Não seria descabido registrar que, logo após ter sido criado em 97, o Fundo terminou por provocar reação exatamente contrária àquilo que se esperava. De fato, em 96, antes da introdução do Fundef, estavam matriculados nas pré-escolas brasileiras 4,3 milhões de alunos. Em 98, derrubando todas as expectativas, o número caiu para 4,1 milhões. Para essa inusitada situação o Ministro Paulo Renato procurou uma explicação pouco convincente: o longo processo de adaptação das prefeituras às normas do Fundef.

Na mesma linha, outra crítica que merece ser ressaltada é o fato de o Governo Federal não ter majorado sua cota de participação no Fundo. Ao estabelecer um valor baixo para o custo anual por aluno, à revelia da própria legislação vigente, o Governo Fernando Henrique eximiu-se de contribuir para o projeto educacional de maneira mais significativa e engajada. Isso, inevitavelmente, afetou a qualidade do ensino oferecido pelas escolas públicas, sobre as quais pesa enorme carga de estigma e preconceito.

Decorrência disso é a baixa qualidade do ensino público de nível médio, que dificulta o acesso dos seus alunos às universidades públicas. Não há mágica capaz de esconder o fato de que as falhas dos ensinos básico e médio da rede pública são a maior causa da exclusão de candidatos mais pobres nos vestibulares. No Rio de Janeiro, por exemplo, mediante recente investigação científica, demonstrou-se que praticamente metade dos alunos do ensino médio público não domina sequer 20% do conteúdo curricular que lhe deveria ter sido ministrado durante todo o ciclo de aprendizagem escolar.

No entanto, para a Secretária-Executiva do Ministério da Educação, a falta de interesse e de entusiasmo dos alunos deve-se muito mais à inadaptação da sala de aula às mudanças da sociedade, que é mais eletrônica, midiática e informacional, do que a qualquer outra coisa. É ela quem confessa que, apesar de todo o acesso fácil ao computador, à biblioteca e ao sistema informacional, o aluno brasileiro ainda é bombardeado por uma pedagogia ultrapassada e ineficaz, para cuja operacionalidade o quadro negro e o giz configuram instrumentos indispensáveis.

Não surpreendentemente, quando consultados sobre a importância da escola, os alunos brasileiros respondem, quase em uníssono, que não detectam qualquer relevância no conteúdo que aprendem em sala de aula. No fundo, não conseguem estabelecer uma linha consistente de continuidade entre a sociedade que se sofistica tecnologicamente e o aprendizado mais clássico e maciço do ensino escolar. Na mesma perspectiva, vários estudiosos apontam o ensino descontextualizado e a formação do professor como fatores responsáveis pela deficiência e pela precariedade dos ensinos básico e médio em geral.

Para concluir, não poderia deixar de frisar que, a despeito dos avanços inquestionáveis na educação em geral durante a gestão do Presidente Fernando Henrique, há muito por fazer no ensino básico no Brasil, durante o qual o aluno adquire instrução indispensável para seu desenvolvimento intelectual e de aprendizagem. Destituído de um ensino básico de qualidade, tem comprometida sua perspectiva de um futuro promissor, de uma esperança de vida mais digna e correta. Por fim, desejo ao Presidente eleito melhor sorte na educação, honrando literalmente todos os compromissos de campanha.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2002 - Página 27031