Discurso durante a 147ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

BALANÇO DE SUA VIDA PUBLICA AO ENSEJO DE SUA DESPEDIDA DA CASA.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • BALANÇO DE SUA VIDA PUBLICA AO ENSEJO DE SUA DESPEDIDA DA CASA.
Aparteantes
Artur da Tavola, Carlos Bezerra, Carlos Patrocínio, Casildo Maldaner, Fernando Ribeiro, Juvêncio da Fonseca, Lindberg Cury, Lúdio Coelho, Maguito Vilela, Marina Silva, Marluce Pinto, Ney Suassuna, Ricardo Santos, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 13/12/2002 - Página 25935
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • DISCURSO, DESPEDIDA, SENADO, COMENTARIO, INICIO, CARREIRA, POLITICA, REGISTRO, HISTORIA, TRANSFORMAÇÃO, TERRITORIO FEDERAL DO ACRE, UNIDADE, FEDERAÇÃO, AGRADECIMENTO, POPULAÇÃO, ESTADO DO ACRE (AC).

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há quatro décadas, mais precisamente no dia 12 de dezembro de 1962, instalava-se no recém-criado Estado do Acre a Assembléia Constituinte, que significou o passo conclusivo para sua transição de território federal a unidade autônoma da Federação. No Plenário, cidadãos eleitos poucos meses antes, em 3 de outubro, com a tarefa de criar a legislação básica e editar normas cotidianas.

Ao fazer esse registro, não posso deixar de reverenciar a memória do autor do projeto que se transformou na Lei nº 4.070, de 15 de junho de 1962 - o Governador, Deputado Federal e Senador José Guiomard dos Santos, cujo obstinado patriotismo superou a oposição dos adversários da mudança.

A vitória de José Guiomard foi a vitória dos fundadores da sociedade acreana, consolidada em 1º de março de 1963, quando festejamos uma dupla conquista: a promulgação da Constituição do Estado e a posse do seu primeiro Governador, eleito pelo voto direto dos concidadãos, o saudoso professor José Augusto de Araújo.

Deus me propiciou a graça de participar, ativamente, desses momentos, tão importantes. No dia 12 de dezembro de 1962, quando se instalou a Constituinte estadual, eu estava entre seus integrantes, assumindo o que viria a ser o primeiro mandato de Deputado Estadual, com o apoio de eleitores de diversas regiões do Estado, principalmente dos conterrâneos do Município de Tarauacá, onde nasci, no seringal Ariópolis, em novembro de 1930 - outro ano muito especial, por marcar o início da trajetória de Getúlio Vargas pela nossa história.

Esse é o motivo de me encontrar, hoje, na tribuna do Senado Federal: cumpro a dupla missão de comemorar 40 anos de sucessivos mandatos eletivos e, também, de apresentar minha despedida a esta Casa do povo brasileiro, que tive a honra de integrar durante 16 anos, coroando uma existência incondicionalmente dedicada ao Acre, à Amazônia e ao Brasil, como constituinte estadual, constituinte federal, Deputado Estadual, Deputado Federal, Governador e Senador.

Dei meu primeiro passo na vida pública em 12 de dezembro de 1962. Dela me despeço neste 12 de dezembro de 2002, levando a certeza de terem sido quatro décadas ricas de experiências, de dedicação, de doação integral às causas populares e ao fortalecimento da República.

Candidato, nas eleições de outubro último, a um novo mandato no Senado Federal, não consegui êxito. Os motivos daquela derrota foram vários. Mas não me vou deter em explicações; prefiro lembrar Gentil Cardoso, o primeiro técnico moderno do futebol brasileiro, quando foi cercado pela imprensa, após uma derrota. Ao lhe perguntarem por que havia perdido o jogo, respondeu, direta e francamente: “perdemos, porque o adversário fez mais gols”.

O importante é que jamais tripudiei ou humilhei aqueles a quem venci, em sete sucessivas eleições - e, com a mesma serenidade, acolho o resultado desta oitava competição democrática a que me candidatei. Assim como a arrogância não me seduziu nas vitórias, a mesquinha covardia sequer passou perto de mim na derrota. Em toda essa longa jornada, sempre tive em mente a lição de Pascal, de que “a consciência é o melhor livro de moral que temos; e é, certamente, o que mais devemos consultar”.

Rogo a V. Exªs que me permitam abrir mão da habitual humildade, característica de meus atos e minhas palavras. Afinal, é digno de registro que essa marca, de 40 anos ininterruptos no cumprimento de mandatos populares, jamais foi alcançada por qualquer acreano e só pode ser encontrada no currículo de pouquíssimos homens públicos, nos demais Estados da Federação. Sou grato e reverencioso aos meus coestaduanos, que me propiciaram tal glória.

É com esse espírito de dever cumprido e missão vitoriosa que hoje ocupo a tribuna desta Casa, onde permaneci por 16 anos, para apresentar a minha despedida - como muitos colegas já fizeram ou irão fazer, nos próximos dias.

Do Senado Federal levo uma grande experiência de vida, das lides político-parlamentares e do convívio, amigável e generoso, com os colegas, com os jornalistas e com os servidores. Nesses 16 anos, participei, três vezes, da Mesa Diretora, integrei comissões permanentes e temporárias, inclusive diversas CPIs e sou membro da Comissão Mista de Orçamento, onde o Brasil do futuro é construído a cada ano.

O Senado é o passo final na jornada que teve início na Assembléia Legislativa do Acre, onde, entre outras funções destacadas, exerci a Liderança do meu Partido e ocupei a Primeira Secretaria da Mesa. E acredito haver contribuído para a consolidação do jovem Estado, mesmo enfrentando os árduos tempos do Golpe de 1964 e a convivência, nem sempre democrática, com Governadores e Presidentes impostos pelos militares, que usurparam o poder por mais de 20 anos.

Pela minha atuação, oposicionista e vigorosa, a alguns desses Governadores, vivi sob o permanente risco de vir a perder o mandato e os direitos políticos, como aconteceu a alguns companheiros da Assembléia.

Em 1974, depois de cumprir três mandatos de Deputado Estadual, candidatei-me à Câmara dos Deputados. Eleito, tive o privilégio de conviver com figuras estelares da política brasileira, como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Thales Ramalho e Freitas Nobre, naquela Casa, e Paulo Brossard, Marcos Freire, Jarbas Passarinho, Petrônio Portela, Adalberto Sena, Teotônio Vilela, José Sarney e outros do mesmo porte, no Senado, entre tantos grandes homens, cuja passagem pelo Parlamento foi marcada pelo brilho de suas inteligências e dedicação à causa pública.

Embora calouro no cenário da Capital da República, procurei desempenhar com toda dedicação e patriotismo o meu mandato de Deputado pelo Acre, o que me proporcionou a reeleição, em destacado primeiro lugar, no pleito seguinte. A partir daí, já maduro e experiente nas lides federais, integrei a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e também a Comissão Executiva Nacional do MDB, a convite do Deputado Ulysses Guimarães e o do Líder da nossa Bancada, Deputado Freitas Nobre.

Com a falência da ditadura militar, em 1982, foram realizadas eleições diretas para Governador. Convocado pelos companheiros de Partido para concorrer ao Governo do Acre, fui eleito, sabendo que imensas dificuldades me aguardavam. Consciente disso, atravessei a primeira metade do mandato em oposição ao último General-Presidente, o Sr. João Figueiredo, que nunca me prestou qualquer apoio.

O restabelecimento da democracia plena, todavia, foi marcado pela tragédia, que nos roubou o estadista Tancredo Neves. Em meio ao inevitável tumulto institucional, tomou posse seu sucessor, nosso atual colega, Senador José Sarney, que deu ao Acre um atencioso tratamento. Mas, a despeito disso, enfrentei grandes dificuldades, por ser o Acre um Estado pobre, então desprovido de qualquer estrutura econômica ou receita tributária compatível com suas necessidades. Até 1985, todos os Prefeitos eram nomeados pelo Ministro da Justiça, exceto o da capital - ou seja, os Municípios eram administrados por adversários do Governador.

Mesmo assim, minha administração foi aprovada pelo povo, em pesquisas de opinião que me atribuíram índices positivos, sempre superiores a 60%. E, mais importante, ainda: em 1985, quando os Municípios acreanos foram politicamente liberados e puderam escolher, livremente, os respectivos Prefeitos, meu Partido, o PMDB, foi vitorioso e elegeu os Prefeitos de todas as doze comunidades então existentes.

As dificuldades financeiras não me impediram de manter em dia o pagamento do funcionalismo estadual, concedendo-lhe, ainda, reajustes periódicos em pelo menos duas ocasiões, a cada ano.

Graças a esse desempenho, candidatei-me pela primeira vez ao Senado, em 1986, tendo obtido a maior votação dentre os que então concorreram. E, como todos os eleitos naquele ano, integrei a Assembléia Nacional Constituinte, que teve como Presidente e inspirador maior, a grandiosa figura de Ulysses Guimarães.

Participei ativamente da elaboração da Carta Democrática. Apresentei centenas de emendas, subemendas e pareceres; muitas conquistas do povo brasileiro se concretizaram a partir de propostas minhas, como a criação dos Fundos Constitucionais do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste (art. 159 da Constituição Federal) e o confisco das terras utilizadas para plantio de culturas ilegais de plantas psicotrópicas, com sua destinação aos programas de reforma agrária (art. 243 das Disposições Constitucionais Gerais). Outros Constituintes também tiveram iniciativas semelhantes; unidos, conseguimos aprová-las.

Merece destaque a proposta, de minha iniciativa, que resultou na concessão de pensão mensal vitalícia, no valor de dois salários mínimos, para os Soldados da Borracha, trabalhadores levados do Nordeste para a Amazônia, durante a Segunda Guerra Mundial, a fim de produzir, nos seringais nativos da grande região, o látex exigido pelo esforço de guerra contra o Eixo nazi-fascista (art. 54 e parágrafos 1º, 2º e 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Faço questão de reconhecer, por dever de justiça, a colaboração que recebi do então Senador Aluízio Bezerra, na luta para ver aprovado e regulamentado, de maneira satisfatória, esse benefício aos veteranos da epopéia acreana.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, seria enfadonho enumerar as emendas que apresentei durante a elaboração da nossa atual Carta Magna. Várias propostas foram aprovadas, outras anexadas a propostas paralelas, algumas rejeitadas. Todas me deixaram, todavia, a convicção de haver cumprido o meu dever de Senador Constituinte, representando o Acre. Essa tarefa foi concluída em 1993, quando participei, ativamente, da Assembléia Revisora, tendo contribuído com várias emendas para o aprimoramento do Texto Constitucional de 1988.

Em 1994 concorri novamente ao Senado. E obtive a minha segunda eleição para esta Casa, a fim de participar de mais duas legislaturas: de 1994 a 1998 e esta, de 1998 a 2002, que está prestes a ser concluída.

Ao longo desses 16 anos, procurei ter uma atuação que correspondesse aos anseios dos acreanos. Para tanto, apresentei diversos projetos, pronunciei centenas de discursos, dediquei-me ao árduo trabalho nas Comissões e na Mesa Diretora e, sobretudo, empenhei-me na busca de recursos para o Estado e seus Municípios.

O resultado positivo aí está, em inúmeras obras e serviços, executados pelos diversos Governadores e Prefeitos, que passaram pelas administrações estadual e municipais, fundamentados em verbas orçamentárias e convênios federais que consegui aprovar. Creio que, apesar das dificuldades e limitações de verbas da União para os Estados do Norte e Nordeste, cumpri com o meu dever, tanto que tive o reconhecimento dos demais Senadores e Deputados Federais do Acre, quando, por duas vezes, elegeram-me coordenador da nossa Bancada.

É com esse espírito tranqüilo e construtivo que retorno à tribuna que ocupei tantas vezes. Olho este plenário, do qual fui, com muito orgulho, um dos mais assíduos freqüentadores. Vejo, com reverência, a Mesa Diretora, cujos trabalhos tive a honra de presidir em muitas ocasiões.

O recesso está prestes a ser iniciado, com a suspensão dos trabalhos parlamentares até a posse dos novos eleitos. Talvez ainda tenhamos algumas poucas sessões, antes do encerramento do período legislativo, mas venho, hoje, cumprir o dever de dizer adeus. E o faço precisamente na mesma data em que completo quarenta anos de seguidos e ininterruptos mandatos. Despeço-me do Senado, dos ilustres colegas Senadores e dos funcionários da Casa, que sempre me deferiram atenciosa colaboração.

Faço questão de endereçar uma palavra de especial gratidão aos profissionais que compõem meu Gabinete, diversos deles acompanhando minha carreira há muitos anos, em sucessivos mandatos, sempre com inexcedíveis lealdade, dedicação e competência.

Aos conterrâneos do Acre, especialmente aos do meu querido município de Tarauacá, desejo expressar o mais sincero reconhecimento, não apenas pelas vitórias que me proporcionaram nesses 40 anos de vida pública, mas, acima de tudo, pela generosa sinceridade e pelos exemplos que colhi nos seringais, na minha infância e nas amizades calorosas que me acompanharam por toda a vida.

Não teria como hoje relacionar todos os familiares, amigos e companheiros que me acompanharam nessa jornada, mas não posso deixar de citar meus filhos, minha esposa, Darcy, a leal companheira de todas as horas, minha saudosa mãe, D. Rosaura, e o maior incentivador de todos os meus passos na vida pública, meu falecido pai, Nabor da Rocha - que, nas horas cruciais, sempre teve as palavras decisivas de ânimo e de apoio, mesmo contrariando outras opiniões.

Devo meu sucesso e minhas conquistas a muitos outros, também, cujos nomes e vultos estão impressos, de maneira indelével, em meu coração.

A todos o mais sincero agradecimento, com a certeza de que a jornada não foi em vão. Ao contrário, nossas conquistas ajudaram a fazer um Acre mais forte, mais solidário, mais influente no cenário político e na sociedade brasileira. E é graças a todos que, hoje, ao despedir-me do Senado, tenho o orgulho de proclamar “que saio daqui com a consciência do dever cumprido, de fronte erguida, pensando no futuro grandioso do Acre e do Brasil”.

As Sagradas Escrituras nos ensinam que “tudo tem o seu tempo determinado e há tempo para todo propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, tempo de morrer; tempo de chorar, tempo de rir; tempo de abraçar, tempo de afastar-se”.

O genial cineasta Billy Wilder nos deu, no recém-encerrado século XX, um lema precioso, uma lição que procurei honrar em todos os momentos da minha vida. Dizia ele: “Lembra-te que és tão bom como o que de melhor tiveres feito na vida.” E, em minha vida de cidadão e de homem público, sempre procurei dar o máximo dos meus esforços e fazer o melhor possível em prol de um futuro mais próspero e mais feliz para o nosso Brasil.

O meu muito obrigado a V. Exªs, Srªs e Srs. Senadores, que, de certo, muito contribuirão, com seu talento e seu patriotismo, a fim de que essa luta voltada para o progresso do povo brasileiro não perca jamais o ímpeto e a determinação que lhe dediquei.

Que Deus abençoe e proteja o povo brasileiro.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Nabor Júnior, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Com muita honra, ouço o aparte de V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Nabor Júnior, por mais de 8 anos, convivi com V. Exª nesta Casa. Ouvi a oração de V. Exª, em que relaciona alguns atos e, nessa sua humildade de sempre, nessa sua parcimônia de decantar os seus feitos vejo que foram enumerados muito poucos dos atos que V. Exª praticou pelo País e pelo seu Estado. Por exemplo, V. Exª deixou de relacionar o seu papel no nosso partido, o PMDB, um papel gigante - contrastando com o tipo franzino de V. Exª -, sempre um papel gigante, de conselheiro, de uma pessoa delicada, mas firme. Posso dar esse testemunho, porque quando tivemos um entrevero no PMDB do meu Estado, V. Exª foi designado para tentar fazer o acordo entre as partes, e com paciência, com ponderação fez com que encontrássemos uma solução. Convivi com V. Exª em dois lados, seja aqui como Senador ou seja lá no Ministério da Integração; como Ministro vi também a dedicação de V. Exª e a firmeza nos pedidos pelo Acre e por toda aquela área de fronteira em relação aos projetos que solicitou e sempre lutou com muita garra, para levar lá para aqueles longínquos rincões do Brasil recursos, melhoramentos. Então posso dar esse testemunho com muita tranqüilidade, porque, se por um lado convivi com V. Exª no Senado, vendo exemplos, vendo no partido o seu comportamento, também vi como parlamentar no outro lado o quanto V. Exª é aguerrido quando se trata de lutar pelos interesses do Acre. Tenho certeza de que as palavras que V. Exª profere neste momento ao se despedir - já que é hora de afastamento -, são palavras temporárias porque outras missões virão. Uma pessoa que amealhou a experiência de V. Exª, que deixou o exemplo de lisura, firmeza e probidade nesta Casa, na Câmara dos Deputados, na Assembléia e no Governo do seu Estado, com certeza, não será esquecida pelo povo. Em breve, a justiça será feita e V. Exª estará de volta seja no Senado Federal, seja na Câmara dos Deputados para a nossa alegria. Lamento estar ouvindo a despedida de V. Exª, um companheiro firme, leal, sincero, probo, humilde e doce. Parabéns pelo discurso. Registro, com muita tristeza, pois gostaria de conviver mais tempo com V. Exª.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Ney Suassuna. Peço permissão à Mesa para conceder apartes aos oradores que pretendem interferir no meu discurso e, ao final, darei uma resposta para todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/12/2002 - Página 25935