Discurso durante a 11ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Precariedade das rodovias do Estado de Mato Grosso, causando prejuízos ao Estado devido à dificuldade de escoamento da produção. Críticas à morosidade, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra, na desapropriação de terras cultiváveis destinadas aos trabalhadores sem-terra.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. REFORMA AGRARIA.:
  • Precariedade das rodovias do Estado de Mato Grosso, causando prejuízos ao Estado devido à dificuldade de escoamento da produção. Críticas à morosidade, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra, na desapropriação de terras cultiváveis destinadas aos trabalhadores sem-terra.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 07/03/2003 - Página 2903
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, SUPERIORIDADE, SAFRA, SOJA, ALGODÃO, PECUARIA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), APREENSÃO, DIFICULDADE, ESCOAMENTO, ESTADO DE EMERGENCIA, PRECARIEDADE, RODOVIA, EXPECTATIVA, PROVIDENCIA, MINISTERIO DOS TRANSPORTES (MTR).
  • DEFESA, UNIÃO, BANCADA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO PARA (PA), RECUPERAÇÃO, RODOVIA, ATENDIMENTO, CORREDOR DE EXPORTAÇÃO.
  • NECESSIDADE, INCENTIVO, AGRICULTOR, COMERCIALIZAÇÃO, PRODUÇÃO, COOPERATIVA.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, TRABALHADOR, SEM-TERRA, DEFESA, ALTERAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), NOMEAÇÃO, SUPERINTENDENTE, AGILIZAÇÃO, PROMOÇÃO, DESAPROPRIAÇÃO, REFORMA AGRARIA.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, pronunciei-me ontem, desta tribuna, sobre a questão das estradas no nosso Estado de Mato Grosso. Eu disse que hoje traria dados que mostram, realmente, que o nosso Mato Grosso é o maior produtor de soja do mundo.

Mato Grosso deve colher, em 2003, uma safra de 14 milhões de toneladas, contra 13 milhões do Estado de Iowa, nos Estados Unidos. É um estado cujas terras vão produzir, este ano, 3.174 quilos por hectare, batendo o seu próprio recorde de 3.020 quilos por hectare no ano passado.

Ontem, falei também sobre a produção de algodão do nosso Estado de Mato Grosso, como também da bovinocultura. Em Mato Grosso, temos o maior rebanho bovino do País, com 22,5 milhões de cabeças. Há pouco tempo, não havia lá produção de algodão, mas, hoje, segundo estimativas da Associação Mato-grossense de Produtores de Algodão, o nosso algodão deverá se consolidar no mercado internacional, com pelo menos 100 mil toneladas de pluma no ano de 2003. Tudo isso mostra a pujança do nosso Estado de Mato Grosso.

Por outro lado, temos um problema gravíssimo, que são as estradas. No Estado de Mato Grosso, a BR-163, a BR-070, a BR-364 e a BR-158, que cortam o nosso Estado, estão com pontos de estrangulamento, com trechos em estado de emergência - aliás, temos onze trechos em estado de emergência no Estado de Mato Grosso. E o arranca-safra está lá.

As carretas estão, em alguns locais, paradas por falta de condições de tráfego da malha viária. Não há como passar pelas estradas: ou por causa dos atoladouros, como em trechos da BR-158 intransitáveis pela lama, uma estrada federal que tem em torno de 400 quilômetros de terra, ou por trechos como os da BR-070 e da BR-163, onde o asfalto já deixou de existir. Há buracos e mais buracos que fazem com que ocorram acidentes diariamente, perdendo-se vidas e causando grandes prejuízos aos carros e carretas, enfim, ao que quer que transite pela rodovia, principalmente com a dificuldade de retirada da produção. A situação está muito difícil.

Na terça-feira de carnaval, passei mais de doze horas na BR-070, onde encontramos buracos tão grandes que era possível oito ou dez pessoas entrarem, e ainda sobrava espaço. É muito difícil de se fazer em um Estado, que é o maior produtor de soja do mundo, um arranca-safra onde não tenhamos as mínimas condições nas estradas, porque praticamente toda a nossa safra, seja de soja, de milho, de arroz, enfim, de qualquer produto, é transportada pelas rodovias, pelo menos até chegar ao Alto Taquari, onde se tem a ferrovia, que só atende a uma pequena parte do território mato-grossense, nas proximidades de Alto Taquari, e que, mesmo assim, precisa das rodovias para que os produtos cheguem para embarque na ferrovia.

Conversamos com o Ministro dos Transportes e soubemos que está saindo um recurso de emergência, de pouco valor, um tapa-buraco mesmo. Acredito que precisamos tratar a questão das estradas em Mato Grosso com determinação sob pena de, na próxima safra, termos quase todos seus trechos estrangulados. Sobre a BR-163 - já falei sobre o assunto -, é necessário que haja empenho, principalmente pelos Estados de Mato Grosso e do Pará, porque o grande problema para o escoamento da safra de Mato Grosso pelo Pará é situação da rodovia no Estado do Pará. É preciso um esforço conjunto de todas as Bancadas -- diria -- para que a BR 163 tenha continuidade no Pará. Em Mato Grosso, ela está quase pronta. Faltam apenas 80 quilômetros para construir e também uns 300 quilômetros de trechos de emergência. Precisamos que ela tenha continuidade no Pará, porque ela é importantíssima no Mato Grosso, de boa qualidade, pronta e acabada.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRa SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Pois não, Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Senadora Serys Slhessarenko, V. Exª traz uma preocupação ao Plenário que tem sido constante de todos os Estados: a situação de extrema precariedade em que se encontram as rodovias brasileiras. Houve um tempo em que o País fez opção por rodovias, desdenhando da sua malha ferroviária e até extinguindo alguns ramais então existentes. Ora, se optamos pelas rodovias, deveríamos dedicar um esforço muito maior do que dedicamos hoje no sentido de construí-las bem e mantê-las permanentemente. Desafortunadamente, isso não tem acontecido no seu Estado, um Estado extraordinário, no meu, o Maranhão, enfim, em todos as Unidades da Federação brasileira. Hoje, as rodovias só estão perfeitamente trafegáveis nos Estados em que foi possível sua privatização. Onde não foi possível, o Governo não tem investido o suficiente. No meu entendimento, temos que nos dar conta de que cometemos um erro e devemos voltar ao acerto, que seria a reimplantação da malha ferroviária. Atualmente, a ferrovia mais importante que se desenha no País é a Norte-Sul, que já serve ao Maranhão e ao Pará, começa a servir ao Estado do Tocantins, do nosso Presidente Eduardo Siqueira Campos, e vai servir, seguramente, ao Estado de V. Exª, Mato Grosso. No instante em que essa ferrovia puder ligar Mato Grosso, Goiás e Tocantins ao Porto de São Luís -- o melhor porto brasileiro, por sua profundidade, e o mais próximo do mercado consumidor internacional --, teremos condições de competir com os produtores de grãos de todo o mundo e de outros produtos de exportação no País. Estamos exportando algo em torno de US$60 bilhões anuais e poderemos avançar para US$70 bilhões, US$100 bilhões rapidamente se essa ferrovia estiver funcionando, permitindo o transporte da soja de Mato Grosso, Tocantins, Maranhão, Piauí e até mesmo a exportação de carne, que poderá vir de Mato Grosso. Portanto, espero que V. Exª associe-se à luta pela ferrovia, que servirá ao Brasil, como um todo, mas fundamentalmente ao seu Estado. Cumprimento V. Exª pelo seu discurso.

A SRa SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Senador Edison Lobão, já me associei à idéia da ferrovia. Não vamos nos pronunciar hoje sobre isso porque temos outro tema para tratar, mas vamos juntar forças em prol dessa idéia, em que também acredito. Enquanto estamos lutando por ela, Senador, precisamos conservar as rodovias, cujo grande problema é a conservação. Há várias situações: de emergência, de conservação, de reconstrução e de construção. As rodovias do nosso Estado sofrem todas essas situações. A conservação de rodovias é muito cara, mas precisamos batalhar pelas existentes. Sabemos que houve desleixo total por parte dos governos anteriores. Existem rodovias no Estado de Mato Grosso há vinte anos sem conservação, o que deveria ser feito permanentemente, para se evitarem problemas. Quando abrir um buraco, faz-se o tapa-buraco. Mas, após vinte anos sem conservação, a rodovia está totalmente deteriorada; não sobra mais nada, a não ser acidentes, mortes e dificuldades no escoamento de produtos, para desespero total da região.

Aliás, nossa região do Estado de Mato Grosso está em situação de desespero. Estive com o Prefeito de Primavera do Leste, Sr. Érico Piana, com o Prefeito de Poxoréu e com o Superintendente do Denit no Estado de Mato Grosso, Sr. José da Silva Thiago, durante todo o domingo, na BR 070, onde se procedeu ao estudo técnico da restauração dessa estrada e a uma discussão política, que acredito seja muito importante para os municípios por onde passa a BR 070. Cito essa rodovia apenas como exemplo, porque há outras também que estão sendo vistoriadas. Estamos passando por todas elas para, in loco, verificar os problemas existentes e, a partir deles, otimizarmos os poucos recursos disponíveis. Além de o Governo atual ter encontrado em estado de calamidade as estradas federais, pelo menos as de Mato Grosso, encontrou cortes no Orçamento e outros problemas mais.

Ou seja, falando apenas em estradas, são grandes os problemas e pouquíssimos os recursos para a sua recuperação. Assim, o objetivo agora é verificar os problemas in loco e otimizar o uso dos poucos recursos de que dispomos para que elas se tornem ao menos trafegáveis. Contudo, isso resolveria a situação apenas emergencialmente. Daqui a um ano, nas próximas chuvas, o problema reaparecerá. Estamos a falar das estradas para o escoamento da produção, em especial do grande produtor, mas também do pequeno e do médio produtor. Seria a grande safra do Estado de Mato Grosso. E precisamos tratar da questão dos pequenos produtores, inclusive os que praticam a agricultura familiar, da qual também já tratamos algumas sessões atrás. Falamos da importância desse tipo de agricultura, mas também da necessidade de não só nos restringirmos a ela. O produtor que pratica a agricultura familiar deve, com alguns produtos, também se dedicar à agricultura de mercado, pois só a subsistência não resolve. É necessário um grande programa nacional, que dê sustentação não somente à agricultura familiar, mas também ao agricultor, para que ele, que produz o sustento do dia-a-dia, tenha também a possibilidade de lançar alguns de seus produtos no mercado, por meio de cooperativas. Essa discussão também deve ser levada em conta.

Além disso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaríamos de tratar aqui de uma questão bastante complicada que está acontecendo praticamente em todo o Brasil: a dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. É dramática a situação desses companheiros, que lutam pela terra há muitos e muitos anos e não conseguem essa terra para nela sobreviver e dela tirar o seu sustento e de sua família com a dignidade de que são merecedores. Há problemas grandes e graves em Goiás, Paraná, São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, entre outros. Tal realidade coloca pobres contra pobres, miseráveis contra pobres, pobres contra remediados e assim sucessivamente. Isso é muito complexo e difícil. Obviamente, ninguém aqui está apoiando quebradeira, mas ela reflete o estado de desespero e de desesperança dessas populações. Essa é a razão dos casos que vêm acontecendo, principalmente nesses Estados já citados.

Em Mato Grosso, conheço bem de perto a situação, sei do que acontece lá. E, quanto ao Incra, que costumo chamar em Mato Grosso de “incravado”, nada faz. Infelizmente, são necessárias mudanças rápidas no Incra de Mato Grosso, que está paralisado há praticamente um ano, pois a superintendência anterior não fez absolutamente nada. No segundo semestre do ano passado, praticamente nenhum processo saiu das gavetas do Incra. Completados dois meses de Governo, ainda não foi nomeado o novo superintendente, mas acreditamos que esteja para sair a nomeação a qualquer momento, para que realmente o Incra consiga mobilizar-se.

Cito um fato para que as Srªs e os Srs. Senadores fiquem atentos para essa questão em seus Estados. Em Mato Grosso, há pouco tempo, quatro fazendas totalmente impróprias para assentamento foram desapropriadas, principalmente por uma política muito comum em Mato Grosso. Embora não possamos de maneira alguma generalizar, pois há muitos fazendeiros sérios, há fazendeiros e corretores inescrupulosos e possivelmente - não estou fazendo essa afirmação - alguns funcionários do Incra que talvez possam estar agindo de má-fé no sentido de fazer com que desapropriações de terras impróprias ocorressem com certa facilidade para grupos que realmente não tinham a vontade e a determinação de exigir terras de boa qualidade. Buscava-se a desapropriação de terras totalmente impróprias, que não renderiam nada, que não produziriam nada, que não servem para a produção, principalmente para o pequeno produtor, que não têm as condições necessárias para a sua recuperação. O MST, um movimento extremamente sério, que jamais aceitará a desapropriação de uma fazenda em que a terra seja imprópria para o assentamento das famílias, não consegue as terras porque exige terras boas e a preço justo, porque não permite a corrupção, que, com certeza, não mais existirá no Governo Lula.

Quando me refiro a terras improdutivas, falo no sentido da produtividade para a desapropriação, de terras de boa qualidade e que não produzem nada, embora sejam ótimas. Há aquelas terras improdutivas por não serem de boa qualidade para a produção do pequeno agricultor rural. Em Mato Grosso, há terras boas de boa qualidade cuja desapropriação vem sendo buscada com dificuldade. Cito o nome de algumas terras desapropriáveis e de boa qualidade e que estão há três, cinco anos em processo de desapropriação. São elas Sul da Mata, em Tangará da Serra; São João, em Santo Afonso; a Barra Bonita, em Poxoréu; São Carlos do Jurique e Serra Formosa, em Pedra Preta; Flor da Prata, em Guiratinga*, Três Irmãos e Santa Maria, em Rio Branco. Trata-se de algumas fazendas que têm terras de boa qualidade, avaliadas como próprias para a reforma agrária, com preço de mercado para desapropriação, mas com processos de difícil conclusão.

Acreditamos que, com a nomeação do próximo superintendente do Incra, ocorrerá a agilidade devida, porque está realmente insuportável a situação dos acampados no nosso Estado de Mato Grosso. O complicador maior que encontramos em Mato Grosso deve-se especialmente à morosidade com que até há pouco tempo esses processos vinham sendo tratados, que fez com que atos muitas vezes indesejáveis ocorressem em vários Estados.

Precisamos de agilidade nos processos antigos, que estão prontos e que deverão desencadear uma conclusão com muita habilidade e rapidez, pois vemos a dificuldade de vida, a fome, o desespero e a desesperança dos nossos pequenos trabalhadores do meio rural que não são proprietários hoje, nem produtores - a grande maioria. Muitos aguardam à beira das estradas, em pequenos espaços de terra, geralmente concedidos por meio de comodato, e armam seus barracos de lona, numa espera que parece quase eterna. Há famílias acampadas há três, quatro, cinco anos, aguardando processos que não avançam no Incra.

Acreditamos que, no Governo Lula, tão logo seja nomeado o novo superintendente no Estado de Mato Grosso, esses processos praticamente prontos tenham a possibilidade de desapropriação imediata, porque não dá mais para esperar. Para o pequeno produtor, que está buscando a terra, a reforma agrária é fundamental para o combate à fome. Terra regularizada e política agrícola claramente definida são fundamentais para o combate à fome dele e de seus familiares, assim como é fundamental a sua produção para o Projeto Fome Zero e para o combate à fome de milhões de brasileiros no campo e na cidade.

Infelizmente, meu tempo já acabou. Agradeço a sua benevolência, Sr. Presidente. Apelo para que realmente trabalhemos num esforço conjunto para atender as necessidades dos nossos sem-terra, sejam eles provenientes de movimentos independentes ou de movimentos da federação, em especial do MST, um movimento de que conhecemos a seriedade, formado por destemidos companheiros de luta e responsável pelo pouco que andou a reforma agrária no Brasil, graças a sua organização e determinação.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/03/2003 - Página 2903