Discurso durante a 11ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apresentação de recurso da decisão tomada pelo Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal, Senador Juvêncio da Fonseca, de não promover diligências sobre a denúncia de participação de Senador, em escutas telefônicas ilegais no Estado da Bahia.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Apresentação de recurso da decisão tomada pelo Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal, Senador Juvêncio da Fonseca, de não promover diligências sobre a denúncia de participação de Senador, em escutas telefônicas ilegais no Estado da Bahia.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 07/03/2003 - Página 2917
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, CONSELHO, ETICA, DECORO PARLAMENTAR, SENADO, OMISSÃO, APURAÇÃO, DENUNCIA, PARTICIPAÇÃO, SENADOR, ESCUTA TELEFONICA, ESTADO DA BAHIA (BA), DESRESPEITO, REGIMENTO INTERNO, CODIGO DE ETICA, FAVORECIMENTO, CONGRESSISTA.
  • APRESENTAÇÃO, RECURSO REGIMENTAL, DECISÃO, PRESIDENTE, CONSELHO, ETICA, SENADO, REFERENCIA, INVESTIGAÇÃO, ESCUTA TELEFONICA.

A SRª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um fato tem movimentado bastante os meios de comunicação, e, infelizmente, o Senado Federal não tem tratado o assunto à altura. Refiro-me às denúncias apresentadas à imprensa sobre os chamados “grampos” feitos de forma ilegal no Estado da Bahia.

Na semana passada, a Bancada do PT apresentou um requerimento ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, com base no art. 17, § 2º, da Resolução do Senado nº 20, de 1993, que instituiu o Código de Ética e Decoro Parlamentar, solicitando a apuração preliminar e sumária dos fatos, ouvindo o denunciado e providenciando as diligências necessárias.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, infelizmente, como ainda não elegemos o novo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, evidentemente, o único fórum adequado e legítimo para se posicionar a respeito é o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar ainda instalado nesta Casa.

Infelizmente, o Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar tem dado declarações jocosas contra o Partido dos Trabalhadores, dizendo que o PT não quer fazer nada com relação ao caso, que está fazendo jogo de cena. Estou com a impressão de que o Senador Juvêncio da Fonseca está acometido de um doloroso processo - reconheço, como enfermeira - de amnésia seletiva ou está fazendo parte de algum jogo, conluio, montado na Casa para proteger alguém.

Sr. Presidente, a Resolução nº 20 do Senado Federal é muito clara. A fome que passei na infância, com certeza, não foi suficiente para corroer os neurônios a ponto de eu não entender o que recentemente fez o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar ou o que a Resolução nº 20 do Senado Federal estabelece. Primeiro, é importante que o povo brasileiro que nos escuta neste momento entenda que o Código de Ética e Decoro Parlamentar não serve apenas para cassar Senador. O art. 7º estabelece as medidas disciplinares cabíveis. Existe a advertência, a censura, a perda temporária do exercício do mandato e a perda do mandato, que deve ser feita conforme estabelece a Constituição, no seu art. 55, que só trata de perda de mandato. A perda do mandato, essa sim, só pode ser feita depois de uma provocação de um partido político representado na Casa ou da Mesa da Casa Legislativa de que faz parte o Parlamentar. Quanto à representação que resultou em perda de mandato, só ocorreu uma vez na Casa, no caso do então Senador Luiz Estevão, porque já existia o processo preliminar de investigação, que era uma Comissão Parlamentar de Inquérito, com poder de investigação próprio das autoridades judiciais. Já havia sido inclusive quebrado os sigilos bancário, fiscal e telefônico.

Em todos os outros casos nesta Casa - dos Senadores ACM, José Roberto Arruda, Jader Barbalho e Luiz Otávio -, prefiro não pensar que o art. 17, § 2º, funcionava porque interessava a alguém, ao Palácio, a parlamentar da Casa, a partido político ou porque interessava dar uma resposta à mídia. Acredito que não era isso que ocorria. Em todos esses casos, fizemos o mesmo procedimento. Requerimentos semelhantes foram assinados por parlamentares, como reza o art. 17 do Código de Ética e Decoro Parlamentar: “Perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, poderão ser diretamente oferecidas por qualquer parlamentar, cidadão ou pessoa jurídica denúncias relativas ao descumprimento por Senador de preceitos contidos no Regimento Interno e no Código”. E o que determina o Código de Ética? “Recebida a denúncia, o Conselho promoverá a apuração preliminar e sumária dos fatos, ouvido o denunciado e providenciadas as diligências que entender necessárias”.

Aliás, Sr. Presidente, o Código de Ética e Decoro Parlamentar é tão claro, que reza, no seu § 4º: “Poderá o Conselho, independentemente de denúncia ou representação” - deixando clara a diferença entre denúncia e representação -, “promover a apuração, nos termos deste artigo, de ato ou omissão atribuída a Senador”.

Sr. Presidente, o Código de Ética e Decoro Parlamentar é muito claro, a Resolução nº 20 do Senado é muito clara, assim como a Constituição do País é muito clara. Mas existem coisas que não posso entender! Essa amnésia seletiva do Senador Juvêncio da Fonseca está preocupante! S. Exª tem de ir ao médico! O Senador Juvêncio da Fonseca, quando Vice-Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, assinou alguns documentos. Ainda bem que a minha memória, apesar da idade, não está tão ruim a ponto de não relembrar os fatos. Fui pessoalmente pegar esses documentos assinados por S. Exª.

No caso do Senador Luiz Otávio, foi feita uma denúncia, conforme possibilita o art. 17, § 2º, da Resolução nº 20, por um cidadão, que anexou uma página da revista IstoÉ com reportagem sobre o caso do Senador Luiz Otávio. Imediatamente, o Senador Ramez Tebet, Presidente do Conselho de Ética na época, e o Vice-Presidente, Senador Juvêncio da Fonseca, designaram-me Relatora. Ouvimos por duas vezes o Senador, tivemos a oportunidade de ouvir três delegados da Polícia Federal e ouvimos a assessoria jurídica do Banco do Brasil e do Banco do Pará. O Senador Juvêncio da Fonseca assinou os documentos, que estão em minhas mãos, do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar. O Ofício nº81/2000, de 28 de novembro, traz: “Comunico a V. Exª” - ao Presidente do Banco do Brasil - “que, acolhendo sugestão da Exmª Srª Senadora Heloísa Helena, Relatora da Denúncia nº1/2000, apresentada contra o Senador Luiz Otávio, por infração ao decoro parlamentar, esta Presidência está convocando um advogado do Banco para prestar depoimento”. Esse documento está assinado pelo Senador Juvêncio da Fonseca.

Também está assinado pelo Senador Juvêncio da Fonseca um encaminhamento para ouvir testemunhas nos autos da Denúncia nº 1. E também para a Assessoria Jurídica Regional do Banco do Brasil solicitando, com base na sugestão da Senadora Relatora da denúncia apresentada contra o Senador Luiz Otávio, para prestar depoimento. Outra, para prestar depoimento. Está aqui. E outra, também aos advogados e ex-advogados e à Assessoria Jurídica Regional do Banco do Brasil do Estado do Pará para prestar depoimento, pedindo, inclusive, a emissão de passagens para tais pessoas. E, mais uma vez, aos delegados da Polícia Federal.

Aliás, o documento do Banco do Brasil responde ao Senador Juvêncio da Fonseca, dizendo que vai liberar os advogados do Banco do Brasil. S. Exª, que de repente foi acometido por um legalismo da conveniência, participou das oitivas. E, segundo está aqui registrado, fez perguntas aos delegados da Polícia Federal, ao Senador Luiz Otávio e aos ex-advogados do Banco do Brasil e à Polícia Federal. Está tudo aqui registrado.

Mas o que aconteceu com o requerimento absolutamente correto? Se houvesse provas... Aliás, se o Senador Juvêncio da Fonseca e seu Partido possuem a prova, estão prevaricando. Pois já deveria ter sido encaminhada ao Senado Federal a representação para a cassação. Se possuírem a prova, estão prevaricando.

Encaminhamos ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar algo absolutamente claro.

Fomos informados pelos jornalistas da revista IstoÉ de que eles possuem documentos, que têm provas. Eles nos apresentaram a transcrição da fita que foi gravada e querem testemunhar em juízo, querem testemunhar no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, como têm direito.

            Sr. Presidente, depois do nosso requerimento, vem o mais engraçado. Engraçado, não, trágico. É por isso que o povo odeia político; porque as conveniências são sempre maiores do que a ordem jurídica vigente. Nós fizemos o requerimento - volto a repetir - do mesmo jeito que fizemos em todos os outros casos, do mesmo jeito que manda o art. 17, § 2º, do Código de Ética e Decoro Parlamentar. Qual foi o despacho? “Encaminhe-se à Mesa Diretora, enviando cópia à Polícia Federal.” Não pede providências: “Encaminhe-se à Mesa Diretora...” Aí o Presidente da Casa, Senador Sarney, diz: “O encaminhamento à Mesa é apenas para dar conhecimento, não sendo solicitada qualquer manifestação.” Portanto, S. Exª assina ciente, nada a despachar. Então, eu vejo um assassinato e mando um bilhetinho ao Senador Amir Lando, dizendo: “Senador Amir Lando, eu vi um assassinato”. O Senador Amir Lando me responde: “Está certo, você viu”. Pronto.

Sr. Presidente, estamos apresentando um recurso ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar com base no Regimento da Casa, porque qualquer país que queira ser uma nação civilizada não pode deixar que suas instituições estejam a serviço das amizades, do conluio político, da conjuntura, da pressão da mídia ou dos interesses do Palácio. Isso não pode acontecer. Quando uma instituição fica à mercê dessa conivência, desse jogo sujo, fica desmoralizada.

E o que é mais grave - porque agora estão atuando como advogado de defesa -, na imprensa, hoje, os dois Presidentes atuam como advogado de defesa, já passando a senha do que é que o Senador pode fazer: “Não, ele não precisa renunciar. Se ele perder o mandato, ele recorre ao Supremo, alegando que não estava no exercício do mandato quando as escutas telefônicas foram feitas”. O outro diz: “Não, Sarney agiu bem. A investigação sumária não leva a nada”.

Ora, mas é o Código de Ética que manda realizar a investigação sumária e preliminar. Então, para uns, Senador tal, não tem partido político, é inimigo de fulano de tal, para ele a lei, o Código de Ética; agora, para outro, que é amigo não sei de quem, parente de não sei quem, conveniado com não sei quem, com esse não acontece nada.

Não, o Código de Ética e Decoro Parlamentar tem que ser respeitado. Por isso estamos apresentando um recurso a essa decisão imoral, insustentável juridicamente.

Sr. Presidente, dizer que são “fatos anteriores ao mandato”? É a revelação do fato que desmoraliza a instituição. Esse é que é o problema! Não é à toa que o Supremo, em outros casos, como no do ex-Deputado Talvani e em vários outros, reconheceu isso. A Polícia Federal é uma coisa, o Ministério Público é outra, e a Procuradoria-Geral da República, outra coisa.

Esse tipo de desculpa não vale, porque foi a mesma desculpa usada nesta Casa e não paralisou nossos trabalhos.

Precisamos explicar à sociedade por que, no caso do Senador A, o Código de Ética foi cumprido, no caso do Senador B, não importava que a Polícia Federal estava investigando e, no caso do Senador C, as coisas aconteceram de forma diferente.

Por isso, apresentamos um recurso da decisão tomada pelo Presidente do Conselho de Ética e pelo Presidente da Casa, que é uma decisão que fragiliza a instituição, desmoraliza e colide porque não tem nenhuma sustentação regimental e constitucional.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senadora, V. Exª me permite um aparte?

A SRª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL) - Ouço V. Exª , Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senadora Heloísa Helena, quero solicitar ao Presidente Eduardo Siqueira Campos, que preside esta sessão, que encaminhe ao Presidente José Sarney um apelo, pois, no Boletim da Secretaria-Geral da Mesa, observo que todas as comissões estão constituídas regularmente, mas o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar que, de acordo com a Resolução do Senado nº 20, de 1993, contará com 16 membros titulares, tem relacionados apenas 7 e, dos 15 suplentes, apenas 6. Estamos no dia 6 de março e já é tempo de termos constituído o Conselho. Portanto, faço um apelo à Presidência no sentido de que sejam tomadas as providências para que os Líderes façam as indicações. Inclusive há aqui um registro totalmente desatualizado no Boletim, ao fazer referência ao Bloco Parlamentar de Oposição, quando agora é Situação. Esse erro precisa ser corrigido. Sr. Presidente, neste aparte, gostaria de informar que o recurso que nossa Bancada de 14 Senadores vai apresentar deverá ser apreciado pela Mesa. Se o Presidente arquivou nossa solicitação, cabe recurso ao Conselho de Ética, que deverá examinar a decisão do Presidente, Senador Juvêncio da Fonseca. Ademais, é preciso que o Conselho de Ética esteja constituído, e que possa, refletindo, dialogando, ajudar o Presidente, Senador Juvêncio da Fonseca, a tomar uma decisão tão séria. É o mínimo que deve fazer. Em primeiro lugar, acredito que V. Exª tem razão, Senadora Heloísa Helena, porque mencionou fatos da história do Conselho de Ética. Quando Senadores souberam de ações que poderiam estar infringindo o decoro parlamentar avaliaram ser necessário acionar o Conselho de Ética, o que foi feito, inclusive, em termos semelhantes ao que agora aconteceu. À medida que os Senadores Aloizio Mercadante, Tião Viana e V. Exª assistiram ao depoimento de jornalistas da IstoÉ que teriam ouvido do próprio Senador Antonio Carlos Magalhães que, por iniciativa própria, teria realizado a oitiva dos telefonemas do Deputado Geddel Vieira - constatando-se um acontecimento que obviamente infringe as normas constitucionais - relataram os fatos aos 14 membros do PT no Senado. Por essa razão, fizemos uma representação para que o Conselho de Ética inicie um processo de apuração dos fatos. Ressaltou a Senadora Heloísa Helena que, como não temos inteira prova material, cabe-nos apenas a solicitação de um processo de apuração para verificar o possível envolvimento. Seria natural que o Senador Antonio Carlos Magalhães, a exemplo do que já fizeram outros Senadores, como o Senador José Eduardo Dutra, tivesse a iniciativa de propor ao Conselho de Ética uma apuração. Tenho a convicção de que provas não há porque, realmente, por hipótese, S. Exª não teria qualquer responsabilidade. S. Exª quer ir ao Conselho de Ética para que este ouça todas as pessoas e prove que não há responsabilidade. Assim, proceder-se-ia com toda a tranqüilidade, no Conselho de Ética, para dirimir inteiramente o fato. Diante da decisão do Presidente do Conselho de Ética, Senador Juvêncio da Fonseca, de não ouvir um conselho ainda não existente, peço-lhe que seja formado o quanto antes, porque trabalho já existe e não deve ser postergado. Avalio que o recurso deverá ser efetivado tanto ao Conselho de Ética quanto ao Presidente do Senado para o exame da decisão, o que possivelmente será feito até pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Creio que o que V. Exª aqui apresenta tem respaldo regimental e que será analisado. Portanto, Sr. Presidente, peço-lhe que seja tomada essa providência.

A SRª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL) - Sr. Presidente, por economia processual, vamos encaminhar o recurso à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, à Mesa do Senado e ao Presidente do Conselho de Ética, não encaminharemos ao Papa, porque não está a ele delegada a tarefa da analisar esse caso ainda.

É só, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/03/2003 - Página 2917