Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEBATE SOBRE A REFORMA TRIBUTARIA.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • DEBATE SOBRE A REFORMA TRIBUTARIA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2003 - Página 4951
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • DIVERGENCIA, ORADOR, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), VIABILIDADE, REFORMA TRIBUTARIA, GOVERNO, DIFICULDADE, CONCILIAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, SETOR PRIVADO, PRODUTOR, CONSUMIDOR.
  • QUESTIONAMENTO, PROPOSTA, ALTERAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), PREJUIZO, ESTADOS, EXPORTADOR, INCIDENCIA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, FATURAMENTO, PENALIDADE, MODERNIZAÇÃO, EMPRESA.
  • QUESTIONAMENTO, ALTERAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PARA FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL (COFINS), APREENSÃO, SETOR, SERVIÇO, AVALIAÇÃO, INJUSTIÇA, IMPOSTO DE RENDA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, EXTINÇÃO, MAIORIA, IMPOSTO FEDERAL, REFORÇO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, Sr. Presidente, quero cumprimentar V. Exª por ter atendido ao apelo feito por mim e por outros Srs. Senadores no sentido de restabelecer as sessões vespertinas de quinta-feira e transformá-las num grande fórum de debate. Saúdo o Ministro Antonio Palocci Filho pela responsabilidade e competência com que, até aqui, tem conduzido a política macroeconômica do País.

Sr. Ministro, começo manifestando uma discordância, infelizmente básica, com V. Exª. Sou inteiramente céptico a respeito de reforma tributária no Brasil, principalmente neste momento.

Meu cepticismo decorre da constatação de algo que me parece óbvio. A incompatibilidade que existe em fazer uma reforma profunda com este modelo tributário perverso que temos. Temos posições incompatíveis. É uma coisa curiosa, Sr. Ministro. Acho que, se ouvirmos cem pessoas, em qualquer local, todas dirão que são favoráveis à reforma tributária. Só que, na cabeça de cada um, a reforma tributária é aquela pela qual ele sempre ganha e os outros perdem.

Temos, de um lado, o setor público, que não quer perder receita e, se possível, quer ganhar; de outro lado, o setor privado, que quer pagar menos impostos. Um quer pagar menos, o outro quer arrecadar mais. E dentro de cada segmento, cada um querendo aumentar a sua participação: ou pagar menos ou arrecadar mais. De um lado, União, Estados e Municípios; de outro, produtores, consumidores, indústria, comércio, serviços. Cada um quer a reforma que lhe dê vantagem, o que é natural. Não estou criticando nem ironizando. Apenas demonstrando como é impossível o consenso em reforma tributária. Aqui e em qualquer outro país. Com a agravante de que, neste momento e durante muito tempo, o Poder Público, inclusive a União, não pode se dar ao luxo de perder receita, devido ao constrangimento fiscal em que se encontra.

Não é à-toa que, desde a Constituição de 1988, Sr. Ministro, se fala em reforma tributária. Dizer que os Governos anteriores não fizeram a reforma tributária porque não quiseram é uma injustiça. Não é fácil. Não fizeram, porque não puderam. E não puderam, porque é impossível fazer reforma tributária profunda no Brasil. Essa é a minha convicção e, é claro, posso estar errado.

Mudanças têm sido feitas, Sr. Ministro. Desde 1990 que se fazem mudanças pontuais e fragmentárias no Brasil. Não se pode dizer que não mudou nada; mudou muito. Criaram-se tributos, reduziram-se algumas alíquotas, outras foram aumentadas, tributos foram modificados. Houve muitas mudanças, mas nada mudou em profundidade.

É dramática a carta que recebi, ontem, de um médio empresário de Manaus, na qual ele diz: “Senador, sempre fui um empresário honrado e, também, um cidadão honrado, mas sou obrigado a sonegar, porque, do contrário, não sobrevivo, porque não poderia competir com os sonegadores”. Mudar esse quadro com uma pequena reforma tributária, Sr. Ministro?

Concordo com tudo o que o Governo poderá propor, na forma enunciada por V. Exª. A uniformização da legislação do ICMS é boa. Porém, não se vai avançar muito além disso. Na origem e no destino, Sr. Ministro? Não se vai conseguir, pois os Estados exportadores não podem concordar com isso. E a disputa não é apenas entre ricos e pobres. O meu Estado, o Amazonas, é pobre, mas tem um pólo industrial expressivo, é um Estado exportador. Cobrança no destino? Nós iremos perder 80% da arrecadação. Um fundo compensatório, Sr. Ministro? Nem pensar. É deixar-nos criar uma situação de incerteza que não podemos aceitar. Assim pensa o Estado de São Paulo também. Não acredito na cobrança no destino. É impossível, sob pena de se romper o pacto federativo. Qual é a reforma profunda que será feita no ICMS? Não acredito nela, Sr. Ministro.

Contribuição previdenciária sobre o faturamento e não sobre a folha. Em princípio, concordo. Mas não se estará penalizando as empresas mais produtivas, mais modernas, que investem em tecnologia para reduzir a folha? É preciso levar em conta isso.

Terminar a cumulatividade da Cofins. O Governo pensa nisso. É bom acabar com a cumulatividade, em princípio, mas há complicadores também. A supressão da cumulatividade da Cofins exigirá o aumento da alíquota. Parece bom isso. E o setor de serviços como fica? Sofrerá um aumento muito grande da carga tributária.

O Imposto de Renda foi criado para fazer justiça. No Brasil, é o imposto mais injusto. Isso porque o meu é descontado na fonte e pago tudo o que manda a lei. Ainda que fosse sonegador - e não seria - não poderia fugir. No entanto, quando vejo circularem a meu lado pessoas com carros importados, iates - que não posso ter -, com vida faustosa e que declaram menos do que eu, como se pode chamar esse imposto de justo? Como impedir isso, Sr. Ministro? Até porque em muitos casos nem é sonegação, mas a possibilidade de fazer planejamento tributário.

Todas as vezes em que sou candidato no Amazonas eu me sinto frustrado. Quase todos os meus competidores têm patrimônio menor do que o meu. Pergunto-me se muitos não o terão porque têm dinheiro em paraísos fiscais ou em outros lugares. Eles pagam menos Imposto de Renda do que eu! Chamar Imposto de Renda de justo e tentar modificá-lo apenas com o aumento das alíquotas dos assalariados que ganham mais?

Enfim, Sr. Ministro, se V. Exª fizer tudo isso que o Governo está propondo, terá feito mudanças - algumas até boas -, mas chamar isso de reforma tributária e acreditar que mudará substancialmente o País e melhorará a vida dos brasileiros, eu não acredito! Oxalá, eu esteja errado!

V. Exª dirá: “Então, não tem jeito”. Eu e outros Srs. Senadores entendemos e acabamos de apresentar um projeto que é altamente polêmico, não tenho a ilusão de que será aprovado. Nós reembarcamos na canoa do ex-Deputado Marcos Cintra* no sentido de, ao invés de diminuir ou extinguir a CPMF, transformá-la realmente num imposto de movimentação financeira com a extinção de quase todos os impostos federais, menos o Imposto de Importação, que é um imposto regulatório e serve como instrumento de política econômica.

Segundo as simulações feitas, a receita seria praticamente a mesma, com uma alíquota de 1,7% ou um pouco mais, com todas as vantagens daí decorrentes, como acabar com os impostos declaratórios, acabar ou reduzir consideravelmente a corrupção, o ônus da fiscalização. Sei que há argumentos contrários. Dizem que a cumulatividade é muito alta, que oneraria nas exportações. Isso tudo é discutível e contornável, a meu ver.

Não estou pedindo, Sr. Ministro, que debatamos isto agora. Aliás, até lhe agradeceria, embora sem a pretensão de convencer a sua equipe, talvez eu até seja convencido por ela, que V. Exª permitisse que eu e um grupo de Senadores debatamos no Ministério, a portas fechadas, este assunto. Repito, não vou convencê-los, mas gostaria, pelo menos, de ser convencido.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2003 - Página 4951