Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEBATE SOBRE A REFORMA TRIBUTARIA.

Autor
Tasso Jereissati (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Tasso Ribeiro Jereissati
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • DEBATE SOBRE A REFORMA TRIBUTARIA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2003 - Página 4955
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • DEFESA, VINCULAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, REFORMA TRIBUTARIA, NECESSIDADE, DEBATE, MODELO, FEDERAÇÃO, AUMENTO, PODER, AUTONOMIA, ESTADOS, MUNICIPIOS, DIFICULDADE, CONCILIAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), ALCANCE, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, GOVERNO FEDERAL.
  • CRITICA, ALTERAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), REDUÇÃO, AUTONOMIA, ESTADOS, CONCESSÃO, INCENTIVO FISCAL, INDUSTRIA, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, APREENSÃO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
  • APREENSÃO, AUSENCIA, PROVIDENCIA, COMBATE, EVASÃO FISCAL, SONEGAÇÃO.

O SR. TASSO JEREISSATI (PSDB - CE. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srªs e Srs. Senadores, as minhas observações vão muito na linha do que aqui já foi dito.

Já tive oportunidade, Sr. Ministro, de, em outra ocasião, dizer da minha dificuldade em entender por que o Governo Federal priorizava a reforma tributaria, deixando para depois a reforma previdenciária. E volto a falar nisso porque entendo que a reforma tributária é uma reforma dificílima de ser feita; não que ela não deva ser feita ou não seja importante, mas talvez seja, de todas elas, a reforma mais difícil de ser feita, porque ninguém sabe exatamente o que quer.

Eu diria, com todo o respeito, que o próprio Governo não sabe exatamente o que quer, tanto que a proposta de reforma aqui apresentada - V. Exª há de convir comigo - é muito mais um ajuste tributário do que uma reforma tributária que mude realmente as relações entre os tributos cobrados e pagos neste País. Até porque isso é praticamente impossível de ser feito sem que seja discutida a fundo a questão federativa. É a própria questão federativa que está em jogo. E, por causa disso, não existe normalmente um empenho muito grande dos governos federais. E, neste momento, dirijo-me ao meu amigo, Senador Fernando Bezerra, para dizer que não foi o Governo Fernando Henrique que não quis fazê-la. É uma tendência quase natural dos governos centrais tentar apenas fazer um ajuste tributário, visto que nenhum poder ou ente de Estado quer perder poder ou perder recursos.

Numa reforma tributária, esta questão tem que ser discutida: que tipo de País queremos ter? Um país mais centralizado? Um país em que os Estados tenham mais poder e autonomia? Ou um país em que os Municípios é que tenham autonomia para gerir, administrar e responsabilidade de certas coisas?

Essa questão é básica e tem que ser discutida pela Nação, pela sociedade e por esta Casa, antes de se falar em uma reforma tributária de profundidade. Até porque os interesses conflitantes são enormes e vêm de todos os lados. Praticamente não há interesses convergentes. Só há interesses conflitantes. Os Estados querem mais do bolo arrecadado, a União quer mais do bolo arrecadado, os Municípios também querem mais. Por outro lado, a iniciativa privada quer pagar menos e as pessoas físicas querem pagar menos. E, evidentemente, essa conta não fecha e fica muito mais difícil de fechar num País desigual como o nosso, que tem uma desigualdade de renda entre as pessoas e uma desigualdade de renda entre as regiões, com a profundidade que temos.

E, aí, uma discussão, que, provavelmente, em qualquer outro país seria mais simples, sobre origem e destino, no nosso toma um caráter quase que irreconciliável.

No mais, quando observamos, por exemplo, a reforma tributária que está sendo proposta, constatamos que, no fundo, ela faz uma troca de nomes e uniformiza padrões: aquilo que era chamado de ICMS passa a ser IVA; e uniformiza os padrões, tirando, nesse caso - já se trata de uma outra discussão -, a liberdade e a autonomia dos Estados. Essa mudança só serve a um objetivo da reforma: acabar com a autonomia dos Estados em relação aos benefícios fiscais, a chamada guerra fiscal. Uma reforma tributária que se propõe apenas a isso é muito pouco, e, a meu ver, não pode ser proposta.

Num País onde existem desigualdades regionais tão profundas, se não houver uma política industrial de desconcentração regional efetiva, se não houver uma política concreta de desconcentração de renda, tirar a única alternativa que resta aos Estados mais pobres de gerar emprego é adotar uma política concentradora de renda, Sr. Ministro.

No meu posicionamento não há nenhum aspecto ideológico ou político. Falo isso com a experiência de quem já foi Governador de Estado pobre por três vezes. E tenho certeza de que todos os ex-Governadores de Estados pobres que estão aqui sabem que tirar essa alternativa significa fazer uma política de concentração de renda. É praticamente impossível que os Estados onde não existe mercado, onde não existe poder aquisitivo, onde não existe uma infra-estrutura igual à dos Estados mais evoluídos atraiam empreendimentos que gerem emprego e renda.

Por essa razão, penso que a reforma tributária é importantíssima, mas tem que ser discutida com muita profundidade e vai exigir uma discussão ampla, com uma participação muito mais abrangente da sociedade brasileira.

No momento em que o Governo dá prioridade à reforma tributária na grande proposta de transformação, para que os juros baixem e o País retome o seu crescimento, fico preocupado. Na verdade -- e, neste ponto, abraço o ceticismo dos outros --, não vamos chegar a lugar algum com uma discussão que tem essas dificuldades. E, nesse caso, as reformas, mais uma vez, irão por água abaixo; se forem por água abaixo, vamos cair - tenho repetido isso, tive oportunidade de falar a respeito no Senado e é esse o meu receio; digo isso como quem tem interesse apenas em ajudar o Governo, porque, dessa forma, estaremos ajudando este País - na mesmice que vivemos nos últimos anos.

Em função de não conseguirmos fazer as reformas necessárias, fica impossível abaixar os juros, porque a vulnerabilidade do Estado brasileiro, do País, fica cada vez maior. Não diminui perante as tempestades que vêm do exterior. E não podemos ficar esperando que as tempestades que vêm do exterior se acalmem, porque elas não se acalmam nunca! No momento em que passa uma, vem outra; ou é a da China, ou é a da Índia, ou é a da Rússia, ou é uma guerra, ou é o mercado americano, ou é um escândalo numa Bolsa. Estaremos sempre sujeitos a esses percalços.

Sr. Ministro, pelo que entendi, fez-se referência também à cumulatividade, que, evidentemente, é um aspecto bastante interessante. Porém, a grande evasão fiscal que existe neste País é a feita pelas grandes empresas, por meio do planejamento fiscal apoiado no Imposto de Renda. Entretanto, na reforma proposta, não vejo nada que venha a contribuir para a diminuição dessa evasão fiscal.

A outra evasão - nesse caso, não é evasão, mas sonegação - é a das pessoas físicas, principalmente dos profissionais liberais e dirigentes. Nas classes média e média alta, existe uma grande sonegação.

O outro tipo de sonegação é a do ICMS, nas pequenas e médias empresas. E essa sonegação existe não por culpa da falta de uniformidade entre os Estados, mas em função do tamanho das alíquotas. É clássico em qualquer estudo tributário que nada é mais convidativo para a sonegação do que a alíquota alta. E quanto mais alta a alíquota, maior é a vantagem que há em sonegar e maior é a sonegação que existe no País desse tipo de imposto.

Por essa razão, registro aqui, mais uma vez, o nosso sentimento. Defendo que ele é importante para que saiamos desse círculo vicioso em que temos vivido nos últimos anos, pois ficamos rodando ao redor de um crescimento medíocre - e isso vem de alguns anos -, e vamos repeti-lo, sem dúvida nenhuma, este ano. Não existe mais possibilidade de haver um bom crescimento no ano de 2003.

É importante que se enfoquem alguns aspectos: um é a reforma previdenciária, que deve trazer evidentemente uma clara perspectiva, de curto prazo, de poupança pública, para dar resultados imediatos. E novamente, como falou o Senador Fernando Bezerra, deve-se cobrar um pouco de criatividade, como ocorreu na época do Plano Real, quando se procurava algo novo para se sair do círculo vicioso da inflação.

Na área do crédito, por exemplo, Sr. Ministro - já tive oportunidade de conversar com V. Exª sobre isso -, o problema não é apenas o custo do crédito, mas a falta de acesso ao crédito que existe neste País. Não há crescimento, não existe possibilidade de retomada de crescimento sem crédito. São as pequenas e médias empresas que retomam o crescimento, mas, sem acesso ao crédito - não importa, sequer, se o crédito é alto -, isso é absolutamente impossível. Por mais que melhorem as condições externas, não vamos retomar o crescimento em ritmo acelerado se não existir crédito neste País. E não estou vendo essa questão ser discutida. Discute-se, agora, a reformulação do sistema financeiro do País, mas essa questão, essencial ao crescimento econômico, não está no centro das questões.

Há pouco tempo, tive oportunidade também de conversar com o Senador Aloizio Mercadante sobre a proposta que está sendo examinada de regulamentação dos factorings, que se tornaram uma verdadeira safra de pequenos emprestadores de dinheiro, de pequenos agiotas, que servem de fachada para uma série de outras atividades.

Evidentemente, existem aquelas empresas corretas, que não estão fazendo nada mais nada menos que substituir os antigos pequenos bancos, para fazer face à necessidade de crédito que existe por todo este País.

Eram esses os comentários que eu gostaria de fazer, Sr. Ministro.

Muito obrigado pela sua atenção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2003 - Página 4955