Discurso durante a 30ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre publicação da Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras intitulada "Plataforma Política Feminista".

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • Considerações sobre publicação da Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras intitulada "Plataforma Política Feminista".
Publicação
Publicação no DSF de 02/04/2003 - Página 5674
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, PROGRESSO, MANIFESTAÇÃO, MULHER, LUTA, IGUALDADE, DIREITOS, ESPECIFICAÇÃO, DIREITOS POLITICOS.
  • COMENTARIO, ELOGIO, PUBLICAÇÃO, DOCUMENTO, RESULTADO, CONFERENCIA NACIONAL, MULHER, REFORÇO, CAPACIDADE, INFLUENCIA, POLITICA, DISPOSIÇÃO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aqueles que não acompanham a continuidade da luta das mulheres, no Brasil e no mundo, e que só têm na memória as imagens dos tempos heróicos, em que as feministas faziam barulho em praça pública e ateavam fogo em alguns símbolos da sua submissão, não sabem da importância dos movimentos de mulheres para todas as questões sociais do nosso tempo.

A história de luta das mulheres, no Brasil, por seus direitos é tão longa quanto a história deste País, embora ela não seja reconhecida, contada ou visualizada, senão pelos esforços das próprias mulheres e de alguns poucos homens. O racismo, conseqüência inevitável do colonialismo, promoveu o genocídio de vários povos indígenas e a exclusão dos povos de origem africana; por outro lado, o sexismo se encarregou de eliminar os registros de resistência e luta das mulheres no Brasil, fossem elas indígenas, de origem africana ou européia, imigrantes ou brasileiras.

Como exemplo, a conquista do voto pelas brasileiras resultou de um processo de luta iniciado antes mesmo da proclamação da República. Embora a Constituição de 1891 vetasse o direito de voto aos analfabetos, mendigos, soldados e religiosos, sem excluir o voto feminino, as mulheres ainda tiveram que lutar por mais de 40 anos para conquistar esse direito.

O voto feminino só foi assegurado em 24 de fevereiro de 1932, por meio do Código Eleitoral Provisório (Decreto nº 21.076). No entanto, esse decreto era bastante restritivo, prevendo o direito de voto apenas às mulheres casadas que tivessem a autorização dos maridos. Em 1934, a Assembléia Nacional Constituinte reafirmou o direito assegurado no Código Eleitoral, eliminando as restrições existentes, mas tornando o voto obrigatório apenas àquelas mulheres que exercessem funções remuneradas em cargos públicos. A obrigatoriedade plena do voto para todas as mulheres só foi instituída com a Constituição de 1946.

No Brasil, foram 108 anos de diferença entre a primeira lei eleitoral, que assegurava aos homens o direito de votar e ser votados, e a lei eleitoral que assegurava esse mesmo direito às mulheres.

Como se vê, Srªs e Srs. Senadores, as conquistas femininas resultaram de longas e desgastantes lutas, que tiveram início há muito tempo. As mulheres de hoje dão continuidade a essas lutas e reconhecem o legado fundamental de todas as que as antecederam ao longo da história. É na qualidade de herdeiras desse processo que, contemporaneamente, as mulheres vêm tendo um papel relevante na construção da democracia em nosso País.

Há 16 anos, Brasília recebeu mais de 2000 lideranças de todos os Estados, que fizeram uma entrega solene da Carta das Mulheres ao Presidente da Assembléia Nacional Constituinte e aos representantes de diversos partidos. Essa Carta foi mensageira de reivindicações diversas, produto de uma década histórica para os movimentos de mulheres no Brasil, em que surgiam articulações, tanto na área rural quanto urbana, cada qual reunindo segmentos diversos: trabalhadoras de diferentes setores, organizações comunitárias de base, ONGs feministas, organizações de mulheres negras, militantes de pastorais, da área da saúde pública, militantes partidárias e sindicalistas, acadêmicas, etc.

As mulheres organizadas inauguravam um período de grande influência política. Os resultados foram conquistas fundamentais, consagradas no texto da Constituição de 1988, e um reconhecimento por parte da sociedade, da legitimidade política e força social dos movimentos de mulheres.

Agora, passados 16 anos da produção da Carta das Mulheres, os movimentos feministas apresentam um novo documento à sociedade. Trata-se da “Plataforma Política Feminista”, construída sobre uma base de mobilização de 5 mil e 200 ativistas de movimentos de mulheres, mobilizadas para o debate em 26 Conferências Estaduais, realizadas entre março e maio de 2002. Sua conclusão se fez em Brasília, dias 6 e 7 de junho de 2002, na Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras.

Com a “Plataforma Política Feminista”, os movimentos de mulheres reafirmam seu potencial de contestação, mobilização e elaboração política e, estrategicamente, posicionam coletivamente os conteúdos de seus discursos plurais frente ao contexto político brasileiro, reafirmando sua autonomia de pensamento, projeto e ação.

A “Plataforma Política Feminista” é um documento extenso, denso, prepositivo e de conteúdo amplo e diversificado, construído a partir de uma perspectiva feminista de questionamento da sociedade. Seu texto contém análises e desafios da sociedade, do Estado e de outros movimentos além do próprio feminismo. As ênfases da Plataforma estão traduzidas em cinco capítulos, tratando desde os temas da democracia política, da justiça social e da inserção do Brasil no contexto internacional, chegando até a democratização da vida social, e da liberdade social e reprodutiva. Nos diferentes capítulos, articulam-se as especificidades da dupla estratégia de luta do feminismo brasileiro, com vistas ao reconhecimento das diferenças e dos novos movimentos de mulheres, e à equanimidade da redistribuição de riquezas e de justiça social.

Com essa publicação, o movimento de mulheres brasileiras insere-se, decisivamente, na ação internacional dos movimentos feministas, presentes nas diferentes questões de nosso tempo, que vão desde meio ambiente, direitos humanos e desenvolvimento, até racismo, xenofobia e formas conexas de intolerância.

Mais que uma “coisa de mulheres”, o feminismo amadurecido consolida-se, no Brasil e no mundo, como uma teoria e uma prática política que tem uma produção consistente sobre as questões sociais, econômicas e culturais do desenvolvimento, da pobreza, da exclusão e da cidadania.

A “Plataforma Política Feminista” produzida pela Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras é a confirmação dessa tendência.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/04/2003 - Página 5674