Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise da importância da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB para a superação da miséria e da fome no país.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.:
  • Análise da importância da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB para a superação da miséria e da fome no país.
Publicação
Publicação no DSF de 10/04/2003 - Página 7058
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, FUNDAÇÃO, ELOGIO, TRABALHO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), REALIZAÇÃO, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, DEFESA, DIREITOS, SOCIEDADE, REGISTRO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, ENTIDADE, SIMULTANEIDADE, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, FOME, MISERIA, BRASIL.

O SR. ANTÔNIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, causa-me profunda alegria constatar que o Congresso Nacional, em especial o Senado Federal, adotou a prática de realizar, anualmente, sessões solenes de homenagem à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB e à Campanha da Fraternidade.

No dia 07 do mês em curso foi realizada uma dessas homenagens à CNBB, da qual, infelizmente não pude participar. Mas participei, no dia 23 de maio de 2002, por exemplo, de uma justa Sessão Especial em homenagem ao cinqüentenário da CNBB, por requerimento do Senador Pedro Simon. Em pronunciamentos marcados pela emoção, os senadores louvaram as cinco décadas de trabalho exemplar da CNBB em prol das camadas menos favorecidas da população.

Sem sombra de dúvida - como foi dito na justificativa do requerimento de homenagem a CNBB -, para verdadeiramente avaliarmos a importância da CNBB para a vida brasileira, basta tentarmos imaginar o Brasil de hoje sem a CNBB. Se realizarmos essa tentativa, perceberemos, sem esforço, que tal façanha é impossível, de tal forma a história dessa instituição confunde-se com a própria história da luta por direitos sociais mais justos nos últimos cinqüenta anos.

E nada simboliza melhor a preocupação da CNBB com a injusta realidade social brasileira do que as Campanhas da Fraternidade. É justamente esse o ponto central do pronunciamento que ora faço: a suprema e inestimável importância das Campanhas da Fraternidade no alívio da dor, da miséria, da fome, da pobreza e do desespero experimentados pelos desamparados de nosso País.

A primeira Campanha da Fraternidade realizou-se em 1964, ano em que se registrou, no cenário político, o golpe militar que deu início a um período de 21 anos de regime ditatorial. O tempo mostraria que as Campanhas da Fraternidade não poderiam ter iniciado em momento mais oportuno. A brutalidade, a violência, a censura e o completo desrespeito aos direitos de cidadania puderam ser combatidos, desde o princípio, pela valentia, pela dedicação e pela entrega de homens como o saudoso Dom Hélder Câmara, que pugnaram, não com as armas dos opressores, mas com carinho, paz e amor ao próximo.

É interessante e instrutivo observar a evolução das temáticas tratadas pela Campanha ao longo dos anos. Em 1964 e 1965, os temas escolhidos refletiram a necessidade que a própria Igreja brasileira sentia de renovar-se e adaptar-se aos novos tempos. Os temas desses anos foram, respectivamente, “Igreja em Renovação” e “Paróquia em Renovação”. Depois foi a vez, no período 1967-1972, de renovar o cristão. Nesses anos, os temas adotados pela Campanha foram, entre outros, a fraternidade, a doação, a participação, o serviço e a vocação.

A Igreja brasileira, plenamente renovada pelos primeiros nove anos da Campanha, voltou-se então para a realidade social brasileira e encontrou-a eivada de injustiças, desigualdades e miséria. Milhões de excluídos, solenemente esquecidos pelo “milagre econômico”, careciam das mais básicas condições de vida, tanto nas cidades quanto no campo.

A CNBB passou, então, a lutar, mais ferrenhamente do que nunca, para transformar essa cruel realidade. As Campanhas da Fraternidade começaram a se dedicar, a partir de 1973, a uma série de temas que refletiam, e continuam a refletir, a realidade social do nosso povo.

O artigo 6º da Constituição Federal relaciona os direitos sociais a que faz jus todo e qualquer brasileiro. Pois bem: não há um direito social sequer que não tenha sido tema de alguma das Campanhas da Fraternidade. A saúde, por exemplo, foi o tema da Campanha de 1981, com o “Saúde para todos”. A educação teve sua vez em 1982, com o belo lema “A verdade vos libertará”. O trabalho, por seu turno, foi tema de duas Campanhas da Fraternidade, a de 1978 e a de 1991. O mesmo se deu com a moradia, em 1993, com a segurança, em 1983, e com uma série de outros direitos não menos importantes. Onde o Estado não se faz presente, muitas vezes por pura e simples omissão, lá estão as dioceses e as paróquias, efetivando ações concretas, bem planejadas e executadas com primor.

Não há dúvida de que a Campanha da Fraternidade é a mais vistosa, duradoura e bem-sucedida das ações pastorais empreendidas pela CNBB. Contudo, julgo extremamente oportuno destacar uma iniciativa recente da CNBB que reflete a preocupação dessa instituição com um dos mais graves problemas que ora enfrentamos: a fome.

Refiro-me ao Mutirão Nacional para a Superação da Miséria e da Fome. Esse louvável movimento surgiu na 40ª Assembléia Geral da CNBB, realizada em abril de 2002, ocasião em que se aprovou, por unanimidade, o Documento 69, intitulado “Exigências Evangélicas e Éticas de Superação da Miséria e da Fome”.

Esse documento vem servindo de base para a elaboração de cartilhas de ação nas Arquidioceses de todo o Brasil. Ações concretas já vêm sendo organizadas, em duas vertentes principais: políticas e ações estruturais, voltadas para a eliminação das causas da fome, e políticas e ações específicas que buscam atacar o mal diretamente, com o atendimento a famílias e a comunidades subalimentadas.

O Mutirão é mais uma manifestação de uma postura histórica da CNBB: por mais que o Estado demonstre vontade política de combater as injustiças sociais - no caso presente, a fome -, a CNBB não se sente dispensada de contribuir com sua parcela de esforço, conclamando os homens e as mulheres de bem a realizar o ideal cristão e a oferecer ajuda ao próximo. Não tenho dúvida de que o sucesso do programa Fome Zero depende, em última instância, de iniciativas como a da CNBB. Não basta aguardar, de braços cruzados, a solução governamental. É preciso que atentemos para a voz de Cristo, que diz: “Dai-lhes vós mesmos de comer.” (Mc 6, 37).

A mensagem bíblica é clara: ninguém está dispensado de prestar auxílio ao próximo e de contribuir para a eliminação das causas dos males sociais. E a CNBB não nos deixa esquecer essa verdade, congregando nossos melhores sentimentos em torno de uma meta comum: erradicar a fome, a miséria, a desigualdade, o desperdício e outros males inaceitáveis em um mundo tão desenvolvido materialmente, mas ainda tão atrasado no que diz respeito aos direitos humanos mais fundamentais.

A própria Arquidiocese de Aracajú, a semelhança de outras, realiza diversos trabalhos sociais e comunitários de atendimento aos marginalizados. Temos em Aracajú a “Pastoral da Criança”, cujo objetivo é acompanhar crianças desde o ventre materno até os 6 anos de idade, desenvolvendo ações básicas de saúde e vigilância nutricional, atendendo aproximadamente 6 mil crianças e possuindo cerca de 150 líderes comunitários em 29 paróquias.

À semelhança dessa pastoral, existem ainda na atuante Arquidiocese da capital de Sergipe, a “Pastoral do Menor”, que proporciona a luz do evangelho a crianças e adolescentes em Aracajú e em mais 6 municípios do interior, trabalhando com crianças de ruas; a “Pastoral da Saúde”, que presta apoio material e espiritual a aproximadamente 1000 doentes e contatos com 250 famílias, por meio de visitas regulares em hospitais, asilos e postos de saúde; a “Pastoral Carcerária”, cujo objetivo é possibilitar dignidade à vida dos presidiários de Aracajú, Areia Branca, Manicômio Judiciário e CENAM, organizando regularmente a “feira de móveis e artesanatos do presidiário” na Praça Fausto Cardoso.

Ademais, a Arquidiocese de Aracajú, promove a “Pastoral da Mulher Marginalizada”, à qual convida mulheres e meninas prostituídas a freqüentarem a Escola João XXIII, onde são realizados cursos profissionalizantes de corte e costura, pintura sobre tecidos, manicure e tapeçaria. Temos ainda a “Pastoral das Domésticas” e a “Pastoral das Lavadeiras”, nas quais também são ofertados cursos profissionalizantes na área de atuação dessas trabalhadoras.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diversas comunidades de leigos engajados na coordenação dos trabalhos comunitários da Arquidiocese de Aracajú trabalham em pontos particularmente difíceis e de imensa carência em Aracajú, sempre prestado um serviço religioso e de assistência social: Existe a presença da Comunidade Servos e Servas da Santíssima Trindade e a Comunidade dos Irmãos da Misericórdia, ambos trabalhando na “Terra Dura”, que é o lixão da Capital de Sergipe; Comunidade Santa Terezinha e Comunidade Bom Pastor no Coqueiral; Irmãs de Tereza da Calcutá, no Lamarão, além de outros diversos trabalhos realizados sem nenhuma divulgação e, muitas vezes, sem a contribuição de quem poderia participar muito mais.

O sucesso inquestionável de propostas como a Campanha da Fraternidade, do Mutirão Nacional para a Superação da Miséria e da Fome, além dos trabalhos de cada Arquidiocese comprova, de forma inatacável, a importância fundamental da CNBB para os destinos do Brasil. Portanto, não poderia deixar de reconhecer o brilhante e inestimável trabalho em prol deste País.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/2003 - Página 7058