Discurso durante a 40ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE A FALTA DE INVESTIMENTOS PUBLICOS NO RIO DE JANEIRO. ANALISE DAS DIFICULDADES ENFRENTADAS PELOS BRASILEIROS DE MENOR PODER AQUISITIVO NA OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTOS PUBLICOS. REIVINDICAÇÃO DE UMA REFINARIA DE PETROLEO PARA O NORTE FLUMINENSE.

Autor
Marcelo Crivella (PL - Partido Liberal/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA ENERGETICA. BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.:
  • COMENTARIOS SOBRE A FALTA DE INVESTIMENTOS PUBLICOS NO RIO DE JANEIRO. ANALISE DAS DIFICULDADES ENFRENTADAS PELOS BRASILEIROS DE MENOR PODER AQUISITIVO NA OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTOS PUBLICOS. REIVINDICAÇÃO DE UMA REFINARIA DE PETROLEO PARA O NORTE FLUMINENSE.
Publicação
Publicação no DSF de 23/04/2003 - Página 8336
Assunto
Outros > ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA ENERGETICA. BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.
Indexação
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIFICULDADE, ORÇAMENTO, GOVERNO ESTADUAL, BLOQUEIO, RECURSOS, PREJUIZO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ALTERAÇÃO, COBRANÇA, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), ANALISE, DESEQUILIBRIO, ARRECADAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), RECEBIMENTO, TRANSFERENCIA, UNIÃO FEDERAL, DENUNCIA, INFERIORIDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA.
  • APOIO, CAMPANHA, REIVINDICAÇÃO, CONSTRUÇÃO, REFINARIA, PETROLEO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), BENEFICIAMENTO, OLEO MINERAL, PLATAFORMA CONTINENTAL, COMBATE, DEPENDENCIA, IMPORTAÇÃO, DERIVADOS DE PETROLEO.
  • COMENTARIO, RESPOSTA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ORADOR, ESCLARECIMENTOS, FINANCIAMENTO, EMPRESA ESTRANGEIRA, ATUAÇÃO, BRASIL, OMISSÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.
  • COMENTARIO, EXPERIENCIA, ORADOR, PROJETO, IRRIGAÇÃO, MUNICIPIO, IRECE (BA), ESTADO DA BAHIA (BA).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 22/04/2003


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DISCURSO PRONUNCIADO PELO SR. SENADOR MARCELO CRIVELLA, NA SESSÃO DELIBERATIVA ORDINÁRIA DE 16/04/2003, QUE, RETIRADO PELO ORADOR PARA REVISÃO, PUBLICA-SE NESTA EDIÇÃO.

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O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero chamar a atenção do nosso Senado para a angústia em que vivem os nossos Estados e os nossos Governadores.

Vejam só o caso do Rio de Janeiro, onde há graves problemas de segurança, revolta nos presídios, comunidades carentes que crescem a cada dia, desemprego, filas nos hospitais, ônibus incendiados. No último ano, foram mais de 300 ônibus incendiados nas vias públicas.

Penso que isso nunca aconteceu em nenhum lugar do mundo. Esse Estado, que tanto necessita de recursos, no mês de janeiro, contribuiu para os cofres da União com R$3,5 bilhões. Só de Imposto de Renda de nós, fluminenses, o Governo Federal arrecadou R$2 bilhões. De IPI, foram mais de R$130 milhões das nossas indústrias. De taxação de remessas ao exterior, foram mais de R$100 milhões. De PIS e Cofins, foram mais de R$900 milhões.

No entanto, no mês de janeiro, o sofrido Estado do Rio de Janeiro recebeu como transferências diretas menos de R$100 milhões, que ficaram retidos por conta da dívida do Estado.

Os repasses do SUS - Sistema Único de Saúde - foram de R$90 milhões. Mas são tantas as necessidades da nossa população que esses R$90 milhões são irrisórios, se comparados à verba que o Estado do Rio de Janeiro mensalmente envia para o Governo Federal. Desses recursos do SUS, foram destinados, por exemplo, para tratamento do câncer de próstata R$1,5 mil. Essa é a verba que o Estado recebeu, para o SUS, destinada ao tratamento de câncer de próstata! Um Estado que, mensalmente, arrecada R$3,5 bilhões para os cofres da União.

Ao longo de um ano, o Rio de Janeiro arrecada mais de US$10 bilhões. Muito menos de um bilhão retorna para o Estado. Assim não é possível.

É por isso que o meu Estado vive esses dias de angústia, de sofrimento. E não são diferentes os outros. Mas o meu Estado é eminentemente importador. 90% do que se consome no Rio de Janeiro vêm de outras unidades da Federação.

Quando empurramos um carrinho - e aí lembro do Ney Suassuna, nosso Senador querido, que também reside no Rio de Janeiro; minha esposa o encontrou empurrando um carrinho no supermercado -, seja biscoito, seja macarrão, seja uma latinha de leite condensado, tudo vem de fora, vem de São Paulo, vem de Mato Grosso, vem do Paraná.

O nosso Estado só é rico em minerais, mas o ICMS cobrado pelo petróleo que produzimos não é pago na origem; mas em São Paulo, onde estão as grandes refinarias. O mesmo não acontece com os produtos industrializados de lá, cujo ICMS é recolhido na origem, e não no destino.

Portanto, trago a esta tribuna uma matemática simples. É preciso mudar: não podemos continuar mandando para o Governo Federal 3,5 bilhões por mês e receber menos de 100 milhões, que, neste instante, ficam contingenciados por causa da nossa dívida.

Assim, Srªs e Srs. Senadores, venho, hoje, à tribuna desta Casa para prestar apoio ao sofrido Estado do Rio de Janeiro, segundo arrecadador da União e 14º a receber transferências da União.

Quando vim para o Senado Federal, uma das primeiras notícias que recebi da Assessoria foi a de que cada parlamentar pode fazer emendas no total de RS$2 milhões em benefício de seus Municípios. Alertaram-me: Senador, prepare suas emendas para o Orçamento. Eu me interessei pelo assunto. Dois milhões de reais é muito dinheiro! Fui ver as emendas do Orçamento de 2002, apresentadas pela Bancada do Rio de Janeiro, 46 Deputados Federais e três Senadores, e pelo Relator, as quais totalizaram R$470 milhões. Sabem V. Exªs quanto foi empenhado dos R$470 milhões? R$120 milhões. Sabem quanto foi pago? R$20 milhões.

Muitos Prefeitos começam a fazer a obra, iludidos de que o recurso chegará. Dão a contrapartida, contratam, empenham e, no final, afundam-se em dívida, porque o recurso, aprovado no Orçamento da União, não chega para o Município.

Srª Presidente, isso é uma vergonha para este País! Assim, não é possível.

Mas gostaria de falar, hoje, sobre a Refinaria Norte Fluminense. É um pleito fundamental para o nosso Estado, que está combalido, endividado e com problemas de segurança e desemprego. A despeito da refinaria do Nordeste, que também considero importante - não podemos esquecer-nos do Norte e do Nordeste sofridos; morei dois anos em Irecê, Bahia, e conheço a dor daquele povo -, não podemos deixar de colocar, junto aos 80% da reserva de petróleo nacional, uma refinaria especializada em óleo pesado, que é o nosso óleo, retirado das águas profundas da bacia de Campos.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Marcelo Crivella, permite-me um aparte?

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - É uma honra, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Marcelo Crivella, V. Exª não imagina a alegria que tenho, ao ver um Senador - sem demérito aos demais, categorizados em outras áreas e menos preocupados com a economia do Estado -brigando por emendas, por refinaria, por coisas palpáveis que o Estado do Rio de Janeiro precisa. O Rio é decantando por sua beleza e sua importância nas comunicações, mas é muito sofrido, como disse V. Exª. O Estado da Paraíba, graças à sua Bancada eficiente, composta de 12 Deputados Federais e três Senadores, tem recebido, em média, quatro vezes mais que o Estado do Rio de Janeiro, que não teve a mesma sorte nos últimos Orçamentos. Contudo, não ocorre apenas a discriminação econômica: por exemplo, uma delegacia da Embratur, que funcionava há até poucos dias, foi fechada, embora estivesse localizada no lugar onde se faz mais turismo no Brasil; estava programada a realização da 11ª Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, e, surpreendentemente, de acordo com carta do Prefeito endereçada ao Ministro Celso Amorim, embora a organização do evento estivesse em andamento, a Prefeitura recebeu a comunicação de que o Governo Federal decidira realizá-lo na cidade de São Paulo; a corrida de Fórmula 1, no Brasil, não acontece mais no Rio de Janeiro, mas em São Paulo. Como força auxiliar do Rio de Janeiro, sem descuidar do meu Estado, não posso deixar de lamentar esses fatos. É difícil entender o fechamento do escritório da Embratur no lugar onde mais há turismo e uma beleza ímpar. Apesar da boa infra-estrutura - Riocentro, bons hotéis e tudo mais -, o próprio Governo Federal transferiu para outro Estado um evento que traria uma grande movimentação à economia do Rio de Janeiro. Fico pasmado com essa discriminação. O Rio de Janeiro não merece isso, até porque mostrou o maior índice de votação do Governo Lula. É preciso voltar a colocar os destinos do Rio de Janeiro nos trilhos, daí minha alegria de vê-lo como defensor daquele povo. Conte com o Senador Ney Suassuna para lutar pelo Rio de Janeiro, como força auxiliar.

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Muito obrigado, Senador Ney Suassuna.

V. Exª citou São Paulo. Gostaria de corroborar suas palavras, dizendo que São Paulo arrecadou, em janeiro, para o Governo Federal - em fevereiro, esse número caiu um pouco - aproximadamente R$8 bilhões, três vezes mais do que arrecadou o Rio de Janeiro, que foram R$3,5 bilhões. Se as verbas do Rio de Janeiro, em repasse direto, são menos de R$100 milhões, as de São Paulo deveriam chegar a menos de R$300 milhões, porque a receita não é três vezes maior; no entanto, foram R$550 milhões. Há uma desproporção clara. Por isso, o Governo de Fernando Henrique se caracterizou por um “paulistério”.

Lembro-me da posse de Anderson Adauto, do meu Partido, como Ministro dos Transportes. Recebi, depois, um caderninho, muito bem feito, sobre as realizações do Governo Fernando Henrique na área de transportes. Enquanto, em São Paulo, duplicaram-se a Fernão Dias e a Regis Bittencourt, obra de bilhões de reais, e se fez um anel rodoviário que chegou a quase R$10 bilhões. No Estado do Rio de Janeiro, em oito anos do tucanato, foi feita apenas a privatização da ponte Rio-Niterói, da BR-040, de uma rodovia de acesso à Teresópolis e do eixo sul e norte da Rio-São Paulo. Essa foi a grande realização do Ministério dos Transportes em oito anos do Governo Fernando Henrique.

Isso tem que acabar. Isso vai acabar. Chega. Há um limite para que o cidadão agüente os problemas que estamos vendo no Rio de Janeiro. E a nossa Governadora já está sofrendo: o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro enviou para o Presidente da Assembléia um pedido de cassação, e tramita na Justiça um pedido de prisão, porque S. Exª não consegue pagar precatórios vencidos, não consegue pagar sequer a folha de pagamento. Todo mês, apesar da arrecadação do ICMS, ficam faltando ao Estado, que já está combalido, R$400 milhões para fechar a despesa com a receita.

Não sei aonde vamos parar no Estado do Rio de Janeiro?

Por isso, no meu Estado, a droga já alcança US$300 milhões, dizem os jornais. São 50 mil pessoas trabalhando, desde aquele menino chamado de “vaporzinho” até o traficante, os comandos.

Isso precisa ser visto pelo Governo Federal, e, conforme bem disse V. Exª, o Presidente Lula sabe do amor que o povo do Rio de Janeiro tem por Sua Excelência. Aliás, o Presidente Lula não ganhou apenas este ano, com 82%, no Rio de Janeiro; já havia ganho de Fernando Collor de Mello e de Fernando Henrique Cardoso, nas duas eleições.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho, hoje, à tribuna desta Casa, para prestar apoio à campanha “A Refinaria é Nossa”, lançada, nos primeiros dias de janeiro, na sede da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), com o objetivo de organizar uma grande mobilização, sem qualquer vinculação político-partidária, em defesa da construção de uma refinaria de petróleo no norte fluminense, onde se concentram mais de 80% da produção nacional.

É importante ressaltar que a campanha deixa transparente seu caráter suprapartidário e revela-se como uma iniciativa onde o interesse econômico e o futuro do Estado estão acima de qualquer outro. Dela participam políticos, profissionais, intelectuais, estudantes, religiosos, empresários, comerciantes, donas de casa, artistas, gente do povo, enfim, representantes de um grande leque de entidades da sociedade civil. O crescimento do movimento tem sido espontâneo e várias iniciativas já foram tomadas para apressar a conquista desse objetivo. Entre elas, merece destaque a criação de um fundo para a criação da Refinaria do Norte Fluminense (Renorte), inclusive já aprovado por unanimidade pela Assembléia Legislativa, com 42 votos a zero, no início do ano passado - trata-se de lei feita pelo governo Garotinho no ano passado.

Autoridades estaduais da área do petróleo asseguram que o fundo, além de causar grande repercussão social, impulsionará o desenvolvimento econômico das regiões norte e noroeste do Estado. Aliás, veja que coisa, Srª Presidente: essas sofridas regiões norte e noroeste do Estado, embora contem com tanto petróleo em suas águas, ainda são regiões que possuem grande número de pessoas passando fome. Além disso, recentemente, essas regiões foram vítimas daquele desastre ecológico provocado pela empresa de Cataguases, que veio manchando o rio Paraíba do Sul - a maior riqueza do meu Estado é aquele rio - e o rio Pomba, impedindo que as atividades agrícolas e o consumo de água de mais de sessenta mil fluminenses se dessem normalmente. A propósito, queria sugerir neste plenário que Fernandinho Beira-Mar fosse transferido para Minas, porque pelo castigo que nos foi imposto por aquela empresa de Cataguases eles mereciam ficar com Fernandinho por pelo menos dez anos.

Autoridades estaduais da área do petróleo asseguram que o fundo terá grandes repercussões e demonstram ainda que ele será capitalizado com 50% dos recursos excedentes das receitas de royalties e das participações especiais, descontadas as parcelas referentes àquelas já comprometidas com o pagamento da dívida com a União e àquelas destinadas ao Fundo Estadual de Conservação ambiental e Desenvolvimento Urbano, sendo, ademais, fiscalizado pelo Tribunal de Contas do Estado. Os mesmos técnicos assinalam que o Estado poderá capitalizar cerca de 45 milhões de dólares por ano, até chegar a 315 milhões de dólares em sete anos. As mesmas fontes informam ainda que os cálculos dos recursos excedentes tiveram como base parâmetros conservadores para o preço do barril de petróleo e da produção prevista. Foi usado como referência o preço do petróleo a 22 dólares o barril - sabemos que hoje o barril está sendo vendido a 35 dólares devido à guerra no Iraque

Por sua vez, estudos técnicos têm destacado que o Brasil ainda precisa de duas ou três refinarias - essa é a boa notícia -, que devem ser instaladas no Nordeste e no Sudeste. Quando defendo a refinaria em meu Estado, não o faço em detrimento da refinaria do Nordeste. Acho que lá ela se impõe pelo consumo e, no meu Estado, pela produção. Portanto, a viabilidade técnica das duas é perfeita.

Alguns dados sobre a importância da produção de petróleo para o Estado do Rio de Janeiro e, conseqüentemente, para o desenvolvimento nacional, comprovam a força da economia fluminense. Convém dizer que a produção brasileira de petróleo vem crescendo a um ritmo de 12% ao ano, graças às grandes reservas que foram descobertas pela Petrobras na Bacia de Campos. Para termos uma idéia das enormes potencialidades dessa área, basta dizer que a exploração nos campos gigantes de Marlim e Marlim Sul, em águas profundas, já respondem por mais de 50% da produção da Petrobras.

Apesar de caminharmos a passos largos para a conquista da auto-suficiência em petróleo daqui a dois ou três anos, refinamos muito pouco. Somos dependentes de uma gama de derivados que temos de comprar no mercado externo, quando poderíamos muito bem suprir as nossas próprias necessidades e mesmo exportar, se investíssemos mais no refino. Dessa maneira, não existe qualquer dúvida de que precisamos urgentemente construir mais refinarias. A decisão é estratégica e vital para o país, que poderá libertar-se da dependência externa, e para a economia interna, que certamente ganhará muito mais com a utilização de insumos a um custo bem menor.

Interrompo meu pronunciamento para registrar que é uma honra discursar tendo V. Exª à frente da Presidência da Casa, porque V. Exª é das senadoras mais combativas, e não tem se poupado quando se trata de defender seus pontos de vista.

Gostaria de dizer que vivi no sertão por dois anos, em Irecê. Dei um duro danado para poder ter ali uma fazenda com 500 crianças, 40 pessoas assentadas e 100 hectares irrigados. Ao mesmo tempo em que eu lutava, sem uma ajuda dos governos municipal, estadual ou federal, o BNDES, essa mãe tão pródiga em financiar empréstimos estrangeiros, emprestou dois bilhões de reais para a construção da nossa fábrica em Camaçaí. Até aí, nada de mal, precisamos mesmo de fabricar carros no Nordeste, isso é maravilhoso, mas o problema é que a contrapartida americana não se realizou. Era meio a meio - acabei de receber a resposta de um requerimento feito ao BNDES, chegou hoje, está fresquinho, estou com ele em cima da minha mesa. Meu Deus do céu, aquela contrapartida de meio a meio dos americanos não somou metade, e a nossa dobrou! A nossa dobrou! Não sei como isso acontece.

Pedi um outro esclarecimento, porque há uma cláusula ali que quero ver mais bem esclarecida - um empréstimo que foi dado aos americanos, à Ford. Quero lembrar que é uma empresa que aufere receitas de 200 bilhões de dólares enquanto o PIB do Brasil alcança 600 - três fords equivalem ao Brasil,é a terceira maior empresa americana. Eles têm quarenta e dois meses de carência e o empréstimo é de dez anos, mas se amortizarem a dívida em cinco anos terão um desconto de 90%. 90% de desconto! Ah, chegou aqui o requerimento trazido por esse funcionário que já foi diretor da consultoria do Senado e é meu professor, Dr. Téo. Está aqui: previsão total do projeto em 25.11.99: 2 bilhões; recursos próprios: 1 bilhão; BNDES: 1 bilhão. Hoje, 31.12.2002, contrapartida dos americanos: 500 milhões; BNDES: 2 bilhões. Dobrou! Vejam que coisa! Não há matemática que explique algo assim!

O Sr. Magno Malta (Bloco/PL - ES) - Concede-me V. Exª um aparte, Senador Marcelo Crivella?

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Pois não, Senador Magno Malta, líder do meu partido.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PL - ES) - Senador Marcelo Crivella, imagino que as pessoas que estão vendo a TV Senado - ou que venham a assistir ao famoso reprise da sessão - estejam agradecendo a V. Exª, porque agora passam a entender a razão de tantas mazelas neste país, quando V. Exª começa a apresentar essa matemática ilógica. Na história, só tenho notícia de uma ocasião em que a matemática se inverteu e que um ficou maior do que nove: foi quando Jesus curou os dez leprosos, e só um voltou para agradecer. Um foi maior do que nove. E agora V. Exª está mostrando uma matemática complexa, mas de uma facilidade de entendimento tão grande que qualquer criança, qualquer cidadão indouto, que não pôde ir à escola, a partir da sua fala, vai entender com clareza a razão de nossas mazelas. Os bancos de fomento dos nossos Estados - cada qual tem o seu, como o Band, do Espírito Santo -, ao longo dos anos, viraram locais de rolagem de dívida de pilantras. Esses bancos nunca tiveram dinheiro para dar ao pequeno para investir, para trabalhar, incentivar o micro, o pequeno empresário, mas estão sempre com dinheiro à disposição para financiar empreendimentos que, em sua grande maioria, já nascem mortos - e eles sabem disso -, e depois têm mais dinheiro para rolar a dívida dessa gente. E os funcionários desses bancos de fomento estaduais decoraram uma frase maravilhosa: “É norma do Banco Central.” Tudo mentira para não emprestar para o pequeno empresário, para não ajudá-lo. O pequeno que vai tomar o empréstimo precisa comprovar se a empresa, nos últimos dez anos, não teve cheque sem fundos. Ora, quem tem empresa pequena neste país teve cheque sem fundos ontem; não vai ter empréstimo nunca. Fazem inúmeras exigências absurdas para, no fim, dizer “é norma do Banco Central”. E aquele pobre coitado, que precisava de R$50 mil ou R$100 mil para continuar dando três ou quatro empregos, solicita 100, 200 vezes, e os bancos passam seis meses para, no final, indeferir, dizendo assim: “é norma do Banco Central”. Já os pilantras conseguem tudo com muita facilidade. Eles venderam o nosso patrimônio, privatizaram o Brasil com o nosso dinheiro. As multinacionais compraram o nosso patrimônio com o nosso dinheiro e, agora, contam com uma cláusula maravilhosa: se, em cinco anos, amortizarem 50% da dívida, têm 90% de desconto. Duvido que minha mãe, D. Dadá - a pessoa que mais amei em minha vida -, em se tratando de negócios, fizesse uma proposta desse tipo para mim. Ela diria: “Não, tu vais pagar o teu. Tu vais suar e pagar a tua parte para aprender a ser homem”. É um absurdo isso que V. Exª nos diz agora, algo de que apenas meia dúzia de nós tem conhecimento. Com o seu tom de voz pastoral, amável, convidando-nos à reflexão e falando fácil e devagar - se eu tivesse falado isso, provavelmente ninguém entenderia nada, porque falo ligeiro demais e me exalto -, V. Exª expõe as questões de forma cristalina. O Brasil está refletindo sobre as suas palavras, e hoje o cidadão mais simples desta Nação é capaz de entender a razão das nossas mazelas: cinqüenta e quatro milhões de pessoas passam fome, não têm onde dormir e nem onde morar. Quem conhece o Projeto Nordeste, de sua autoria, sabe exatamente da sua dor quando fala dessa mãe pródiga. Também tenho duas casas de recuperação de drogados; são cento e cinqüenta drogados fora das ruas a cada noventa dias. Essa mãe pródiga nunca se aproximou para nos ajudar. Mas este Senado começa a mudar, deixa de ser uma casa da elite e acolhe pessoas do povo, como V. Exª, que é cheio de sensibilidade - e é por isso que o País lhe respeita. Esse é um sinal positivo. Espero que, a curto prazo, tenha início, de fato, essa mudança pela qual o Brasil anseia. O Brasil pede e clama nas ruas para que essa mudança se dê o mais rápido possível. Não se pode - e costumo não esquecer isto - viver no único país do mundo que tira três colheitas por ano e que ainda tem 54 milhões de filhos seus passando fome. Parabéns a V. Exª pela sua matemática!

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Muito obrigado a V. Exª, nobre Senador Magno Malta, pelo seu aparte. Quando V. Exª fala de pessoas se matando...Matam-se mesmo. Passei dez anos na África e nunca vi miséria como a que vi no sertão.

Tenho uma história registrada no filme que iria exibir hoje, mas, por problemas técnicos, resolvi exibi-lo na semana que vem. Essa história é da família de uma senhora chamada dona Edna Medeiros, que mora lá no sertão da Bahia, no interior de Irecê. O marido dela precisava de dois poços. Fez uma proposta para um empréstimo de R$6.000,00 e preencheu o formulário no Banco do Nordeste. O banco enrolou, enrolou, dizia que o dinheiro ia sair e nada. No meio do caminho, ele pegou dinheiro emprestado com um cigano a 10% ao mês - alguns ciganos são agiotas no sertão. Ele, certo de que o dinheiro ia sair - e isto é contado no filme -, partiu para fazer o poço. O dinheiro não saiu e o cigano parou na porta da casa dele - no Nordeste é assim: o cigano empresta dinheiro, mas se não pagar, ele vai para a porta do morador; ele não pagou e assim aconteceu. Esse homem acabou se suicidando, enforcou-se. Deixou uma carta - carta que faz parte desse filme - em que ele diz: “Desculpe, não agüentei a pressão. Talvez com a minha morte alguma coisa mude para vocês. Amei muito vocês até o último dia da minha vida. Que Deus se apiede da minha alma. Adeus. Aécio Medeiros”. O conterrâneo do meu nobre governador e herói na Bahia, César Borges, deixou essa carta chorando, angustiado, aflito, desesperado, e todo mundo lá em Irecê conhece a história dele.

O sertão é muito fértil; aquela terra tem sede, mas é de uma fertilidade absurda. A manga, a goiaba, a cana, enfim, tudo o que se planta ali cresce, e cresce com um gosto, com um cheiro, com uma cor que não se encontra em parte nenhuma do mundo. Não fui eu quem disse isso: foram os técnicos de Israel que moraram comigo em Irecê, vieram de Israel para fazer aquele projeto de irrigação. Eles me disseram que trabalharam no mundo inteiro e nunca haviam visto uma terra com tanto potássio, com tanto nitrogênio. Era a antiga capital do feijão na época em que o feijão tinha valor, na época do “Plante que o João garante”. Nessa época, imigrantes do Nordeste inteiro vieram morar em Irecê. Hoje, são 60 mil pessoas, só que as chuvas descontinuadas e o preço do feijão lá embaixo - pelo menos o feijão de sequeiro - transformaram Irecê num lugar muito pobre e que enfrenta muitas dificuldades. Quando lembro disso fico muito triste porque, meu Deus, não precisava ser assim. É tão fácil, tão simples transformar tudo isso.

Tive oportunidade de conversar com várias pessoas na época em morava em Irecê, acho que já conversei até com o Governador César Borges. Se não me engano, na Bahia há um milhão de hectares irrigáveis. Gastei, por cada hectare irrigado - é verdade que trouxe material de Israel, importei mangueiras, bombas - 1500 dólares. Gastei 150 mil dólares para irrigar as terras. Seria 1,5 bilhão para irrigar toda a Bahia. Não é possível que não tenhamos um dinheiro desses...

Fui ao BNDES pedir empréstimo para fazer minha fábrica - V. Exª sabe do meu sonho: gostaria muito de fazer milho em conserva, seleta de legumes. Por quê? Porque essa é a vocação daquela região. Plantar cenoura, batata e milho seria perfeito e uma fábrica desse tipo ali iria fornecer para o Nordeste a mesma coisa que o automóvel. Não se viabilizou uma fábrica para vender automóveis lá? Então vamos viabilizar uma fábrica de milho em conserva, porque já vi nas prateleiras dos supermercados do Nordeste que o milho em conserva vem do Paraná, de São Paulo, do Mato Grosso. Quando eu dizia isso, os técnicos do BNDES diziam: não há mercado. Se você irrigar toda aquela área e plantar, o preço cai, vivemos num mundo neoliberal. Mas como não há mercado? Temos 50 milhões de pessoas passando fome! A resposta era que essas pessoas não têm poder aquisitivo e, portanto, não são enxergadas pelo mercado.

Dá para entender essa matemática? Eu não consigo entendê-la. Essa não é a matemática da solidariedade, do amor ao próximo, de uma nação em que um dá a mão ao outro, ajudando-se mutuamente.

Vou concluir o meu pronunciamento falando sobre essa angústia que sinto por ser fluminense e ver que meu Estado entrega três bilhões e meio todos os meses para a União e recebe menos de cem milhões como recursos diretos - recursos que, atualmente, ficam retidos por conta da nossa dívida.

Estou contrariado, inconformado com os cem milhões de repasse para o SUS, recursos que se esvaem naqueles hospitais quebrados, com filas. Para o tratamento de próstata são destinados R$1500; para varizes, quatro mil reais. Imaginem, ao Rio de Janeiro, cheio de morros, com aquelas senhoras heróicas que sobem às 18h para levar para um barraco do alto aquelas duas cestas de supermercado, aquele prêmio delas que são balconistas - hoje o maior empregador no Rio é o balcão -, a verba destinada para o tratamento de varizes é de R$4000. Essa é a verba do SUS destinada ao meu Estado para tratamento de varizes. Isso não é justo.

Peço que o novo governo, que o Presidente Lula examine essas questões, esse desequilíbrio orçamentário, essa sanha de obtenção de tantos recursos e de sua concentração. Hoje estão reunidos o presidente e os governadores: vamos definir o ICMS, equilibrar as nossas receitas para construir um Brasil mais justo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Ouço o nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Marcelo Crivella, quero me ater a um ponto do pronunciamento de V. Exª que considero importante. Refiro-me à resposta ao requerimento de informações que V. Exª solicitou ao BNDES, inclusive agradeceria se pudesse me enviar a cópia da resposta, pois ainda ontem o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que o BNDES estaria disposto a acelerar a tramitação e a concessão de empréstimos para aquelas empresas que venham a criar empregos e possibilidades de crescimento saudável neste País, deixando de acudir os amigos do rei, as empresas que não tiveram procedimentos adequados ou que vieram a falir também por procedimentos administrativos não adequados, e emprestando dinheiro para a aquisição de empresas nacionais por parte de empresas estrangeiras. Sendo assim, é muito importante que no caso da Ford, que recebeu uma quantia significativa do BNDES, tenha um procedimento adequado, ou seja, que os compromissos assumidos sejam efetivamente cumpridos. E como o BNDES, sob a Presidência do Sr. Carlos Lessa, está procurando ter uma administração a mais transparente possível, a informação recebida por V. Exª é muito significativa. Assim, espero que o fato de V. Exª ter trazido o assunto à tribuna faça com que a direção da Ford, de pronto, venha a cumprir com os compromissos assumidos. Obrigado.

O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL - RJ) - Muito obrigado Senador Eduardo Suplicy.

Gostaria de dizer que não tenho nada contra os americanos, pelo contrário, penso que eles são um país desenvolvido e que, de certa forma, tem contribuído com o nosso País. Não tenho, portanto, nada contra a fábrica na Bahia. Sou um entusiasta. Quem dera que em todo Estado do Nordeste tivéssemos fábricas empregando pessoas, fabricando caminhões e tratores. Isso é maravilhoso! Mas uma empresa que é a terceira maior organização americana, 200 bilhões de PIB de turn over - ora, três empresas Fords correspondem ao Brasil em termos de PIB. Puxa vida! -, não dar a contrapartida que previa?! Vá plantar batata!

Muito agradecido, Srª Presidente. Muito agradecido, Srªs e Srs. Senadores.

Que Deus abençoe os nossos trabalhos!

            A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena) - Amém! Assim seja!


             V:\SLEG\SSTAQ\SF\NOTAS\2003\20030422DO.doc 4:13



Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/04/2003 - Página 8336