Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do plantio de algodão geneticamente modificado no Brasil, tendo em vista a importação do referido produto de países que já adotam a semente transgênica.

Autor
Jonas Pinheiro (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Jonas Pinheiro da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • Defesa do plantio de algodão geneticamente modificado no Brasil, tendo em vista a importação do referido produto de países que já adotam a semente transgênica.
Aparteantes
Ramez Tebet, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2003 - Página 11244
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, IMPORTANCIA, CULTIVO, ALGODÃO, EXPORTAÇÃO, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, REDUÇÃO, PRODUÇÃO, MOTIVO, CONCORRENCIA, MERCADO EXTERNO, NECESSIDADE, IMPORTAÇÃO, PRODUTO, PREJUIZO, PEQUENO AGRICULTOR, DESEMPREGO, ZONA RURAL, DESEQUILIBRIO, BALANÇA COMERCIAL.
  • ANALISE, INCOERENCIA, LEGISLAÇÃO, BRASIL, PROIBIÇÃO, CULTIVO, ALGODÃO, SEMENTE, ALTERAÇÃO, GENETICA, CONTRADIÇÃO, LIBERAÇÃO, IMPORTAÇÃO, PRODUTO TRANSGENICO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CHINA, INDIA.
  • DEFESA, LIBERAÇÃO, CULTIVO, ALGODÃO, AMBITO NACIONAL, UTILIZAÇÃO, SEMENTE, ALTERAÇÃO, GENETICA, RECUPERAÇÃO, EXPORTAÇÃO, PRODUTO, BENEFICIO, ECONOMIA NACIONAL, AUSENCIA, CONCLUSÃO, COMPROVAÇÃO, PREJUIZO, SAUDE, CONSUMO, PRODUTO TRANSGENICO.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, prometo que não usarei os vinte minutos!

O assunto que vamos expor hoje já é antigo e conhecido da Casa, porque várias vezes tratamos dele - trata-se da produção de algodão -, mas existem fatos novos sobre ele e, por isso, voltamos à tribuna.

Sr. Presidente, o Brasil, que era um grande produtor e exportador de algodão nos anos 80, viu a sua área cultivada ir diminuindo e a sua produção caindo, até assumir, em 1996, a inconcebível e desalentadora posição de importador de algodão, e um dos maiores do planeta, quando essas importações atingiram a cifra de um bilhão de dólares.

Entretanto, a partir de 1997, a cotonicultura brasileira iniciou uma nova fase, elevando a sua produção de 305 mil toneladas apenas - era o que tínhamos naquele ano - para 940 mil toneladas no ano 2000. O Brasil voltou, então, a exportar algodão e a recuperar a posição que lhe coubera outrora.

No entanto, em 2002, as previsões para o setor não foram nada alvissareiras. Novamente, o quadro dessa cultura não se tem mostrado favorável. A área plantada diminuiu 14% e a sua produção nacional caiu 18,7%. Com isso, o Brasil precisou importar cerca de 110 mil toneladas, com o que despendeu cerca de 120 milhões de dólares.

Srs. Senadores, queda na produção e importação do produto significam máquinas paradas, redução na venda de insumos, de máquinas e de equipamentos, beneficiadoras ociosas, impossibilidade de os produtores assumirem seus débitos, enfim, crise, depressão e desemprego, tanto no campo quanto na cidade. Aumento de importações significa também evasão de divisas e comprometimento do equilíbrio da balança comercial.

As razões de a área cultivada haver diminuído e, conseqüentemente, a produção do algodão, secundadas pela queda de preços desse produto no mercado internacional, são os crescentes aumentos dos custos de produção e a dificuldade que os produtores brasileiros têm de competir com os produtores de outros países, em virtude, por exemplo, dos elevados e sempre crescentes subsídios concedidos pelo Tesouro dos Estados Unidos aos produtores americanos.

Srs. Senadores, outro motivo que dificulta a produção do algodão no Brasil está diretamente ligado ao impedimento interposto pela nossa legislação de os produtores de algodão utilizarem semente geneticamente modificada para poderem, assim, concorrer com os produtores dos Estados Unidos, da China e, agora, da Índia, que as utilizam livremente, afinal o algodão transgênico é a terceira cultura geneticamente modificada mais cultivada no mundo, ocupando 6,8 milhões de hectares. Com a utilização dessas sementes modificadas, além de a produtividade física crescer, o número de pulverizações com agrotóxicos, durante o período da cultura do algodão, é reduzido a ¼, o que diminui sensivelmente o uso de pesticidas - o que é benéfico para o meio ambiente - e, por conseguinte, os custos de produção, já que esses insumos são responsáveis por elevado percentual nos gastos da produção de qualquer cultura.

Diante, portanto, da crise que se apresenta, o Brasil adota uma atitude questionável: os produtores não podem produzir algodão geneticamente modificado - os transgênicos -, mas poderão importar e consumir algodão transgênico. É preciso saber onde está a coerência dessa medida e a quem ela realmente interessa e beneficia. Aos produtores brasileiros, tenho certeza, que não, e afirmo isso com toda a convicção.

O que é mais lamentável é que, enquanto o Brasil não se decide sobre a adoção de biotecnologia, as pesquisas de novas culturas geneticamente modificadas não param. Agora, em fevereiro de 2003, as agências reguladoras dos Estados Unidos aprovaram a tecnologia Bt de segunda geração, que são sementes com dois genes de controle de insetos, que protegem a cultura de maneira mais abrangente.

As evidências, sobretudo frente aos últimos resultados dos estudos científicos, levam-nos a crer que a questão do uso de sementes modificadas de algodão converge mais para o campo ideológico, sem encontrar justificativas convincentes nos limites da ciência e da razão. Parece até que muitos dos que articulam o impedimento da utilização dessas sementes, sob a bandeira de assim defender o meio ambiente e a saúde, na verdade, desejam apenas defender mercados e impedir que o Brasil aumente sua produção de algodão e, por conseguinte, torne-se forte concorrente no mercado internacional.

Assim, o plantio de algodão geneticamente modificado é de suma importância para o desenvolvimento e a consolidação da produção brasileira, a exemplo do que ocorre nos demais países produtores, que adotam essas sementes.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não podemos comprometer esse importante segmento da nossa economia, até porque o desenvolvimento tecnológico não espera, e, no mercado competitivo mundial, correr atrás do prejuízo pode custar muito para o nosso país. Temos que ter a devida maturidade para enfrentar essa questão agora ou será tarde demais.

Sr. Presidente, ainda quero dar uma explicação sobre essa semente Bt. Essa semente leva esse nome porque nela é introduzida uma proteína do Bacillus thuringiensis. Os produtores americanos, há cem anos, já sabiam que onde dava esse bacilo, não tinha lagarta, ou melhor, a lagarta, ao eclodir, morria, porque a proteína daquele bacilo, ao ser consumida pela lagarta, provocava um estreitamento no seu esôfago e ela morria em conseqüência disso.

Pois bem. O que fizeram os cientistas? Depuraram aquela proteína e a introduziram na planta do algodão, no algodoeiro. Quando a lagarta rosada, a lagarta da maçã ou o curuquerê, que são as principais pragas do algodão, começam, ainda em sua tenra idade, a comer o algodão, recebem aquela proteína e, tendo seu esôfago estreitado, morrem. É um combate biológico, isso não faz mal a ninguém.

Nos Estados Unidos, sobretudo na região do Mississipi, 80% do algodão já é algodão Bt. Quem não usa o algodão Bt não produz nada, não produz. Consideramos que o Bt é um combate biológico, não tem nenhuma influência à saúde humana e, o que mais complica é que quem usa a semente Bt faz duas ou três pulverizações de defensivos em função de outras pragas, mas quem não a usa faz dez, doze ou quinze aplicações de defensivos, prejudicando não só a saúde humana como também o meio ambiente.

Assim trago à discussão do Plenário do Senado este assunto, que conheço profundamente, pois o estudo há muito tempo, na tentativa de liberar o uso de semente modificada, pelo menos a do algodão. Mais uma vez, repito, é um combate biológico; portanto, não afeta a saúde humana e o meio ambiente nem provoca qualquer tipo de poluição.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Com muito prazer, ouço o aparte do Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Jonas Pinheiro, aproveito a oportunidade do pronunciamento de V. Exª para fazer algumas considerações sobre o tema, mais especificamente sobre um outro mercado, o de produtos orgânicos, do qual diversas organizações de produtores começam a se manifestar. Recebi um e-mail de uma associação importante de produtores orgânicos no Brasil que afirma que esse setor começa a se sentir prejudicado, pois a sua produção está sendo contaminada - se essa é a palavra correta - pela qualidade de um produto geneticamente modificado. É preciso que se faça, imediatamente, um planejamento de regiões, para que esse setor não venha a ser prejudicado. Quero falar também sobre a propriedade da tecnologia. Partilho da idéia de que não é possível parar de fazer ciência, pelo contrário, o País precisa investir nessa área, porque corremos o risco de nos tornar dependentes de determinadas tecnologias. Os empresários e o governo poderiam incentivar instituições como a Embrapa e as universidades a apresentarem estudos com o patenteamento dessas tecnologias. Na Câmara dos Deputados, já se discute que a Monsanto nega que tenha vendido sementes da soja RR para os produtores que as plantaram. Portanto, até hoje não há certeza de quem as forneceu. Suspeita-se de um contrabando dessa semente da Argentina. Assim, o debate sobre a Medida Provisória nº 113 teria que englobar a descoberta do fornecedor da semente. A riqueza desse debate é desmistificar a modificação genética. Mas o Governo precisa ter o controle total da situação, via Ministério da Agricultura ou via Ministério da Saúde, para que tenhamos o domínio da tecnologia e o controle da distribuição desse tipo de semente para produção da nossa agricultura. Faço este comentário para que fique claro que não é da natureza do PT ser contra simplesmente. Há um setor do PT que concorda com isso e acha que esse é o caminho. No entanto, eu me preocupo com estes dois aspectos: a dependência tecnológica a que o País pode estar se sujeitando e o problema do setor orgânico, que chega a movimentar US$20 bilhões na Europa e US$30 a 40 bilhões na América do Norte. Isso não é pouca coisa. Poderia movimentar pelo menos uma parte do setor primário do País. Era isso que eu queria dizer para V. Exª.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Obrigado, Senador. V. Exª tem razão quando trata dos transgênicos ou da soja. Esse é um fato que existe, tanto é que o Governo aceitou elaborar uma medida provisória sobre o assunto devido à produção deste ano. Os transgênicos vêm sendo introduzidos no País, sobretudo pelos Estados do Sul. O Rio Grande do Sul voltou a produzir soja, aumentando a sua produção, por causa dos transgênicos, uma vez que as pragas e doenças, sobretudo os inços nas terras do Rio Grande do Sul, não permitiam o plantio da soja convencional. Em função disso, eles buscaram essa alternativa, que gerou este caso tão grande que levou à edição da Medida Provisória nº 113. V. Exª alerta muito bem: este é um momento importante para discutirmos o assunto.

Com respeito à garantia do produto, mesmo feito por multinacionais, na lei da biotecnologia ficou bem registrado que todo e qualquer produto a ser introduzido no Brasil teria que ter a parceria da Embrapa, exatamente para que o País não perdesse o domínio dessa tecnologia para outros países. Portanto, a Embrapa tem a incumbência de fazer parceria com as empresas multinacionais para o desenvolvimento da tecnologia e produção de semente modificada.

Abordei um ponto no meu pronunciamento - talvez V. Exª não estivesse aqui no momento -, que é a aberração da situação que estamos vivendo. Somos proibidos de plantar transgênicos. Portanto, é proibido o transgênico de algodão, mesmo sendo Bt, mesmo sendo um combate biológico que se faz com o fungo. Há um fungo que destrói insetos. No Acre, é comum o fungo que destrói a mosca branca da seringueira. É um combate biológico. Pois bem, não podemos plantar essa semente. Entretanto, no ano passado, importamos 110 mil toneladas de algodão. De onde? Dos Estados Unidos, da Índia e da China. Todos esses países produzem algodão transgênico. Entrou no País, porque é algodão.

Por que não podemos permitir a produção do algodão transgênico no Brasil? Estamos perdendo competitividade. A nossa produção está caindo. Estamos gastando muito dinheiro e não estamos conseguindo competir com outros países, apesar de produzirmos o melhor algodão do mundo, comparado com o egípcio. Estamos perdendo espaço e dinheiro. O produtor continua perdendo dinheiro, porque até agora não conseguimos introduzir a semente de algodão transgênica no nosso País.

Muito obrigado pelo seu aparte, Senador Sibá Machado.

Ouço o Senador Ramez Tebet.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos) - Vou ousar interromper V. Exª para registrar, com alegria, a presença, nas galerias desta Casa, dos adolescentes e das crianças da Pueri Domus. Se a Mesa não estiver equivocada, Casa da Criança.

O Senado os recebe com grande alegria.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Gostaria de ouvir o nosso Líder, Senador Ramez Tebet, nosso co-estaduano do Mato Grosso do Sul, onde o algodão e outros produtos têm uma influência muito grande na balança comercial do Estado.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Jonas Pinheiro, eu o conheço desde a década de 70. Sempre o conheci envolvido, preocupado, discutindo, debatendo, colaborando, prestando serviços ao homem do campo. Portanto, se me pedissem para indicar um Senador para, em nome do Senado discutir os problemas da agricultura no País, eu não teria dúvida em indicá-lo. Que me relevem todos os Senadores da Casa, mas V. Exª é o mais indicado para tratar dessa questão, pois, além de gostar, é um entendido no assunto. Tanto que, dificilmente, V. Exª assoma à tribuna se não for para falar sobre problemas da agricultura, da pecuária e do homem do campo. Meus aplausos, portanto, a V. Exª, que hoje traz à consideração desta Casa um tema tão discutido no País, os transgênicos. De um lado, estão aqueles que querem proteger a saúde humana e alegam que a semente transgênica não está definitivamente testada, que querem ter certeza absoluta. De outro lado, estão os mais pragmáticos, que entendem que não há jeito de evitar isso. Eu me encontro entre esses: não há como evitar, os transgênicos proliferaram no mundo inteiro. Temos, no Brasil, uma instituição como a Embrapa, uma das mais categorizadas do mundo - V. Exª e toda a Casa reconhecem -, que merecia maior apoio e mais recursos orçamentários para continuar sua pesquisa e seu trabalho em favor do desenvolvimento tecnológico e científico, de tudo o que diz respeito à agricultura neste País. Creio que V. Exª tem inteira razão. Não podemos mais perder terreno. Estamos vivendo em um mundo competitivo, e não existe nada provando que o transgênico é prejudicial à saúde. A Organização Mundial de Saúde já se pronunciou sobre esse assunto. Outro dia, o Ministro da Agricultura esteve na Comissão de Assuntos Econômicos e fizeram-lhe uma pergunta muito séria e direta - que eu não faria: “V. Exª aceita um produto transgênico na mesa da sua família?” E ele, com o conhecimento que tem, vencida, talvez, a surpresa da pergunta, disse que não tinha dúvida em aceitar, porque estava consciente de que esse alimento não prejudica a saúde. Ora, o Brasil não pode continuar perdendo recursos. Não podemos ficar para trás, vendo os outros agirem, importando, como V. Exª falou, 110 mil toneladas de algodão - o Brasil, que foi um dos maiores produtores de algodão do mundo. E nisso veio o algodão transgênico para cá! Senador Jonas Pinheiro, parabenizo V. Exª, vamos para a frente. Se resolvermos os problemas do campo no Brasil, estará resolvido o problema da cidade, inclusive o da violência. Portanto, vamos estimular a pesquisa, a tecnologia e a produção. Não quero fazer um discurso paralelo, mas o assunto é apaixonante, é preciso dar crédito ao homem do campo. V. Exª tem razão quando diz que a agricultura, a pecuária e o campo é que vão propiciar uma solução para os problemas do Brasil. Está aí a balança comercial a comprovar isso. Muito obrigado a V. Exª por ter permitido meu aparte, pois fazia tempo que queria dar minha opinião.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL - MT) - Sr. Presidente, gostaria de mais um minuto para comentar o aparte do eminente Senador Ramez Tebet.

Senador Ramez Tebet, hoje já são 58 milhões e 600 mil hectares de transgênicos no mundo. Vinte e um países, dos maiores produtores, já usam produtos transgênicos sem nenhum problema, e há vinte e cinco anos já vêm sendo feitas experiências e pesquisas a respeito dos efeitos que os transgênicos podem provocar na saúde. Em nenhuma parte do mundo há indícios de que o uso de transgênicos prejudica a saúde humana ou animal. O que existe, na verdade, é um excesso de zelo, de precaução. Em vinte e cinco anos não apareceram problemas, mas podem aparecer em trinta, quarenta, cinqüenta anos. Vamos esperar até lá? Será que até lá não ficaremos muito para trás? De qualquer maneira, o Brasil não pode perder o bonde da história, o Brasil que pode contribuir muito para acabar com a fome dos brasileiros e de gente de toda a parte do mundo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2003 - Página 11244