Discurso durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Refutação às críticas à Medida Provisória 107, de 2003, que modifica a tributação das empresas, que, segundo S.Exa., onera apenas o setor financeiro por meio de alteração da base de cálculo da Cofins.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Refutação às críticas à Medida Provisória 107, de 2003, que modifica a tributação das empresas, que, segundo S.Exa., onera apenas o setor financeiro por meio de alteração da base de cálculo da Cofins.
Aparteantes
César Borges, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2003 - Página 11247
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • COMENTARIO, AUMENTO, DIVIDA, NATUREZA FISCAL, EMPRESA NACIONAL, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, REGISTRO, ESFORÇO, GOVERNO FEDERAL, ALTERAÇÃO, MODELO ECONOMICO, BENEFICIO, ECONOMIA NACIONAL.
  • REGISTRO, CONDUTA, IMPRENSA, CONGRESSISTA, LIDER, PARTIDO POLITICO, CRITICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), TRAMITAÇÃO, SENADO, ESCLARECIMENTOS, DETERMINAÇÃO, REABERTURA, PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL (REFIS), AMPLIAÇÃO, SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E DAS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (SIMPLES), PARTICIPAÇÃO, COOPERATIVA AGROPECUARIA, ELETRIFICAÇÃO RURAL, MOTIVO, REDUÇÃO, PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL E PROGRAMA DE FORMAÇÃO DO PATRIMONIO DO SERVIDOR PUBLICO (PIS-PASEP).
  • CRITICA, DECISÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SUSPENSÃO, PROCESSO JUDICIAL, ANISTIA FISCAL, EMPRESA, INSCRIÇÃO, PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL (REFIS), NECESSIDADE, COMBATE, CRIME, SONEGAÇÃO FISCAL, DEFESA, PRIORIDADE, INTERESSE PUBLICO, EXPECTATIVA, DEBATE, MATERIA, SENADO.
  • REGISTRO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE, INFORMAÇÕES, INVESTIGAÇÃO, LAVAGEM DE DINHEIRO, EVASÃO FISCAL, FUNDOS PUBLICOS.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos nós sabemos que o endividamento de inúmeras empresas no Brasil se deu em virtude do modelo macroeconômico adotado no nosso País, derrotado eleitoralmente no ano passado, e que estamos buscando superá-lo pela política econômica, que precisa ter controle e serenidade para operar as mudanças, principalmente a política dos altos juros, da defasagem cambial e da escassez de investimentos determinados pela sangria do endividamento público.

Por esses motivos, a Medida Provisória nº 66, que tramitou ano passado e tinha originalmente um único objetivo, reduzir a cumulatividade tributária do PIS e da Cofins, acabou sendo encarada como uma alternativa para setores endividados, principalmente por determinar a reabertura do Programa de Refinanciamento Fiscal (Refis) e ampliar o alcance do Programa de Simplificação Tributária (Simples).

A grande maioria das alterações ocorridas na Medida Provisória nº 66 acabou sendo vetada pelo Presidente Fernando Henrique, que, ao fazê-lo, transferiu para o atual Governo todo o enfrentamento da questão e, especialmente, seu reflexo nas finanças públicas.

O Governo Lula não só aceitou o desafio, aceitou a demanda, como também negociou uma proposta que atende a quase totalidade das reivindicações: tanto a reabertura do Programa de Refinanciamento Fiscal como a ampliação do Simples como ainda outras alterações inseridas pela Câmara.

Agora a Medida Provisória nº 107 está nesta Casa para apreciação. E, desde a semana passada, tem sido objeto de bombardeio da imprensa, de algumas personalidades, de alguns Senadores, de alguns Líderes Partidários, sobre o qual gostaria de me deter. Primeiro, temos ouvido sistematicamente ser dito que o que aconteceu nas negociações da Medida Provisória nº 107 - nas negociações, nas emendas e destaques, no que se passou ou não - acabou produzindo um aumento da carga tributária, que penaliza a classe média e a produção.

É muito importante detalharmos o que aconteceu, como aconteceu e por que aconteceu, para desmistificar esse discurso que vem sistematicamente sendo estampado nas manchetes dos jornais e nos artigos de Senadores.

Vejamos o aumento de carga tributária quando incluímos no Simples outros segmentos. Na proposta original, deveriam incluir no Simples apenas as creches e pré-escolas. O que foi acrescentado? Acrescentaram estabelecimentos de ensino fundamental, auto-escolas, agências lotéricas, corretoras de seguros e escritórios de serviços contábeis. Portanto, a ampliação da possibilidade de inscrição no Programa de Simplificação Fiscal, o Simples, de outros segmentos de micro, pequenas e médias empresas foi muito significativa. Todos nós sabemos que isso não aumenta a carga tributária; muito pelo contrário, isso reduz a carga tributária e simplifica a burocracia.

Outro ponto negociado e aprovado foi a desoneração do PIS/Pasep e Cofins das Cooperativas de Produção Agropecuária e de Eletrificação Rural. Isso significa aumentar a carga tributária e onerar a produção? É óbvio que não. Muito pelo contrário, até porque esses segmentos - a agropecuária e a eletrificação rural - representam infra-estrutura e têm a ver diretamente com a questão de exportação, principalmente para dar condições ao nosso campo, que tem sido tão bem-sucedido na política de exportação, de operar e continuar produzindo uma balança comercial favorável, o que é indispensável ao desenvolvimento do nosso País.

Mas, se diminuiu a arrecadação com a ampliação do Simples e com a desoneração da produção das cooperativas agropecuárias e de eletrificação rural, isso deve ir para algum outro setor. E a Medida Provisória nº 107 fez isto: retirou de segmentos importantes -- micro, pequenas e médias empresas, cooperativas agropecuárias e de eletrificação rural -- e colocou em outros setores. Qual foi o setor que teve aumento de carga tributária? Para haver essa redistribuição, tira-se de determinados segmentos e coloca-se em outro. O aumento da carga tributária se deu na elevação da Cofins de 3% para 4% no sistema financeiro. Ali é que houve aumento efetivo de carga tributária, mas foi aumentada a alíquota de base da Cofins, de 3% para 4%, exatamente para poder suprir, sanar a perda de arrecadação, em que foram beneficiados outros segmentos da produção e da organização produtiva do nosso País.

Achar que tributar mais os bancos no nosso País, que têm a maior taxa de lucratividade do planeta, é penalizar a classe média ou a produção é de uma hipocrisia que não podemos admitir em hipótese alguma.

O outro ponto é o que vem sendo dito a respeito desse aumento da Cofins de 3% para 4%. A proposta original do Governo não era realmente aumentar a alíquota de 3% para 4%, mas, sim, mexer nos privilégios do sistema financeiro, para reduzir as bases de cálculo relativas do PIS e da Cofins, que são os descontos que eles podem fazer na hora do cálculo -- eles podem descontar determinadas situações que os outros setores produtivos não podem.

E aqui apresento um documento produzido pela Unafisco, que traz exatamente a medida de como esses benefícios se dão para o sistema financeiro. Esses privilégios que reduzem as bases de cálculos relativos do PIS e da Cofins têm a seguinte conotação. Para efeito de ilustração, a Unafisco produziu o detalhamento dos três maiores bancos privados que operam no País. Esses bancos, que poderiam pagar adicionalmente à União cerca de R$860 milhões de PIS e Cofins, se tivessem subordinados às mesmas regras de todos os demais setores da economia brasileira, se suportassem a mesma carga efetiva, gerariam algo em torno de R$860 milhões de PIS e Cofins a mais. A alíquota efetiva que esses três bancos têm com relação ao PIS e Cofins, porque eles têm privilégio de desconto, é de apenas 2,08%, enquanto todos os outros setores da economia brasileira têm a alíquota efetiva de PIS e Cofins de 3,65%.

Portanto, está aqui configurado que o benefício concedido ao sistema financeiro para poder praticar esses descontos faz com que, para eles, haja uma alíquota efetiva muito menor, quase a metade da praticada para os demais setores da economia brasileira.

Houve Senador, Líder de Partido, que disse que o Governo “amarelou”, que não quis mexer nisso e que, em vez de mexer na questão dos descontos, preferiu aumentar a alíquota de 3% para 4%, como se a correlação de forças nos plenários, tanto da Câmara quanto do Senado, não recebesse a ação permanente da Febraban, como se ficasse mais fácil, ao aumentar a alíquota de 3% para 4%, passar para a conta, como se o sistema financeiro brasileiro não repassasse tudo o que eles dizem que tem que pagar de imposto para a conta dos clientes!

Mas, se o Líder do PFL no Senado quiser partilhar a emenda para acabar com os privilégios, eu concordo e assino junto. E aí haverá a correlação de forças no plenário para fazer essa mudança, para mexer nesse ninho de marimbondos dos privilégios do sistema financeiro.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Pois não, Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Serei breve, pois não quero interromper o discurso de V. Exª, que está excelente. V. Exª está colocando o dedo na ferida. Este Congresso sempre foi -- e até hoje tem sido -- submetido a essa pressão de interesses, a essa manipulação de interesses comandada pelo sistema financeiro. Mas estamos com disposição de enfrentar isso, pela primeira vez, com o chamamento e a mobilização da opinião pública nacional, para que esses assuntos sejam esclarecidos. Essa situação deve ser esclarecida de forma definitiva, como V. Exª está fazendo da tribuna. V. Exª será muito importante na discussão da reforma tributária nesta Casa. Meus cumprimentos!

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço ao Senador Roberto Saturnino pelo aparte.

Volto a reafirmar: quem está reclamando do aumento da carga tributária e acha que o Governo “amarelou”, porque, em vez de mexer nos privilégios que reduzem os descontos, acabou fazendo uma opção do aumento da alíquota de 3% para 4%, porque senão a matéria não seria aprovada na Câmara, pode apresentar um emenda. Eu até a redijo, e vamos apresentá-la juntos. Chega de hipocrisia!

Para mostrar até aonde vai a hipocrisia, Senador Roberto Saturnino, quero tratar de uma outra questão que tem sido sistematicamente abordada, a de que houve o aumento da carga tributária, porque a base de cálculo da Contribuição sobre o Lucro Líquido passou de 12% para 32%. E eles fazem o seguinte cálculo: elevando-se a base de cálculo de 12% para 32%, haveria um aumento de 167% na carga tributária na Contribuição sobre o Lucro Líquido para empresas prestadoras de serviço e para profissionais liberais. Só que há um detalhe, sobre o qual existe má-fé: eles não dizem, em nenhum momento, que esse aumento da base de cálculo da Contribuição sobre o Lucro Líquido de 12% para 32% se dá na opção. Ou seja, aquele que quiser fazer sua declaração pelo lucro real não sofrerá esse aumento de 12% para 32%. Só será aumentada a contribuição daquele que optar por fazer a declaração pelo lucro presumido. Só pelo termo “lucro presumido” já se pressupõe que ninguém vai presumir que terá um grande lucro. Ou alguém pensa que se vai presumir o lucro efetivo, o lucro real? Quando se faz a declaração por lucro presumido, todos já sabemos, de antemão, que o lucro será reduzido. Por isso, para evitar a elisão fiscal, ou seja, a brecha da lei para permitir que o recurso não vá para os cofres públicos, é que, quando se opta por fazer a declaração por lucro presumido, a contribuição sobre o lucro líquido será maior do que aquela obtida quando se faz sobre o lucro real.

Então, vejam bem, não aumentou a carga tributária, porque isso continua sendo opcional. Se o prestador de serviços, as factorings, as administradoras de imóveis, as empresas de intermediação de negócios não quiserem se sujeitar aos 167% de reajuste, como temos recebido reclamações a esse respeito por cartas, e-mails, etc., é muito simples: devem fazer a declaração pelo lucro real, como muitos fazem. Dessa maneira, não haverá nenhum prejuízo para o cidadão.

Só para se ter uma idéia de como as coisas funcionam, na coluna de um dos principais articulistas políticos do nosso Estado, o Moacir Pereira, apareceu uma notinha ontem - e, por coincidência, recebi um e-mail sobre a matéria. A nota diz:

Tributos

Apelo aos Conselhos Federal e Estadual da OAB para que façam uma campanha no Senado contra o aumento de 167% na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido está sendo feito pelos advogados Rafael Bornhausen e Marcelo Peregrino Ferreira. A nova base de cálculo corresponde a 32% da renda bruta mensal de escritórios, clínicas e microempresas de serviços.

Recebi a carta, assinada por Marcelo Ramos Peregrino Ferreira, que menciona aquilo a que já me referi. Fala dos 167%, do aumento da alíquota, da carga tributária e, em nenhum momento, em nenhuma das linhas, diz que é opcional. Esconde, falseia.

É importante dizer isto aqui: o próprio colunista mencionou o nome Rafael Bornhausen; e, no e-mail do BAZPF Advogados Associados, vem PKB. Em Santa Catarina, todo mundo sabe quem é PKB, e acredito que, aqui, o nome não deve ser muito estranho: Paulo Konder Bornhausen. Portanto, as situações são vinculadas. Um lobby está sendo feito de forma muito clara.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Pois não, Senador César Borges, deixe-me apenas concluir o meu raciocínio. Depois, concederei um aparte a V. Exª.

Não houve aumento de carga, mas redistribuição de carga. Amplia-se a base do “Simples”, desoneram-se o PIS/Pasep e o Cofins para as cooperativas agropecuárias e de eletrificação rural. Agora, isso será repassado para alguém. Foi repassado para os bancos: 3% a 4% do Cofins. Isso é ruim? Poderia ter sido melhor? Sim. Não houve correlação de forças na Câmara. Talvez haja aqui; talvez aqui consigamos construir uma correlação para mexer efetivamente na alta taxa de lucratividade, sem a oneração tributária que os bancos vêm sofrendo.

Antes de conceder o aparte solicitado, eu gostaria de falar sobre um outro ponto. Na Medida Provisória nº 107, fruto das emendas que foram vetadas na Medida Provisória nº 66, foi reaberto o Programa de Refinanciamento Fiscal. E existem alguns pontos muito importantes a serem ressaltados. Foi uma reabertura negociada, produzida, construída, que não estava na proposta original do Governo, mas existem questões fundamentais a serem ressaltadas. Primeiro: foi a primeira vez que se permitiu o refinanciamento fiscal para pessoa física. Antigamente, essa possibilidade era dada só para pessoa jurídica, quando sabemos que muitos cidadãos têm dívidas com os governos e, agora, poderão parcelá-las, a partir dessa iniciativa.

A outra questão é o prazo. No Refis anterior, havia situações de prazos indeterminados, havia casos em que o pagamento seria efetuado quase durante séculos. Neste caso, apesar de o prazo ainda não ser o que o Governo queria - o que ele queria era muito menor, era a metade do que foi aprovado -, ele é de até 180 meses, e não a perder de vista, como era antes. A proposta do Governo era no sentido de que houvesse uma parcela de entrada; na negociação, acabou saindo sem entrada.

Outra questão fundamental é que a taxa Selic deu lugar à TJLP, o que diminuiu significativamente o endividamento. Modificou-se o cálculo dos juros, e isso diminuiu muito o que as empresas têm que pagar.

A redução das multas em 50% também foi negociada, assim como os valores mínimos de pagamento. Para microempresas, R$100,00; para empresas de pequeno porte, R$200,00 ou 0,3% do faturamento; e, para outras empresas, no mínimo R$2.000,00 ou então 1,2% do faturamento.

Tudo isso foi fruto de negociação, exatamente para permitir que as empresas endividadas pudessem ter fôlego, pudessem rever as suas dívidas com o Governo Federal para colocar em dia os seus pagamentos, o recolhimento dos seus impostos.

Há algo que foi feito na Câmara, como já disse na segunda-feira e volto a dizer, com o qual não concordo, e espero receber o apoio de todas as Bancadas. Estamos vindo de uma audiência na Comissão de Fiscalização e Controle e sabemos de todos os crimes fiscais, dos crimes contra a ordem pública que são cometidos, e não podemos mais admitir que tenhamos, no Programa de Refinanciamento Fiscal, suspensão de processo e, ao final do pagamento, anistia. V. Exªs vão me desculpar, mas já presidi a CPI da Sonegação Fiscal no meu Estado, vi empresário ser preso por ser falsificador de nota, por ser falsificador de crédito tributário e sair da cadeia porque se inscreveu no Refis. O pobre rouba a galinha, devolve-a e continua na cadeia, porque o crime não prescreve com a devolução do objeto roubado. Essa é a única circunstância em que o reconhecimento e o ressarcimento anulam o crime cometido. Isso foi incluído na Câmara, mas espero que possamos retomar, no plenário desta Casa, esse debate, referente à suspensão dos processos.

É crime não recolher os impostos. Tudo bem! É um crime grave? Sim. Porém, o não-recolhimento ocorre por situações diversificadas. Há, por exemplo, o que não recolheu porque ficou numa situação financeira difícil - “Devo, não nego; pago quando puder” -, mas há o crime que foi cometido por ato intencional. Por exemplo, falsificar nota fiscal, falsificar documentos, falsificar lançamentos para poder se beneficiar. Esse é um crime, no meu ponto de vista, dos mais graves, porque é contra o interesse público. É impedir que o que as pessoas já pagaram quando adquiriram o serviço ou o bem seja recolhido aos cofres públicos. Como é que isso pode ser admitido? Como pode um crime ser suspenso, ser anulado no fim do pagamento?

Queremos realizar esse debate a respeito da suspensão dos processos judiciais das empresas inscritas no Programa de Refinanciamento Fiscal. Creio que este Plenário merece.

Perdoem-me, mas eu gostaria de concluir o meu raciocínio.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. Fazendo soar a campainha.) - A Mesa apenas esclarece à nobre oradora que o seu tempo está esgotado. Peço a contribuição do nobre Senador César Borges para que seja breve no seu aparte.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Sr. Presidente, serei breve. Nobre Senadora Ideli Salvatti, quero parabenizar V. Exª pela ênfase, pelo entusiasmo em fazer a defesa do Governo do qual V. Exª faz parte, pelo seu Partido. Mas vejo que a senhora tem um pouco de dificuldade em fazer essa defesa, porque é, como se diz na minha terra, como “tapar o sol com a peneira”. O próprio Chefe da Casa Civil do Governo, José Dirceu, já afirmou que o Governo Federal tem que preservar suas receitas e, se possível, tentar aumentá-las. Portanto, não é neste Governo; eu diria que, desde o período de transição entre os Governos passado e atual, iniciou-se o deliberado aumento da carga tributária, com a edição da Medida Provisória nº 66, aprovada com a complacência do Governo anterior, mas por pedido do atual Governo. Já houve aumento substancial da Cide, houve aumento também de outras contribuições, houve o congelamento do Imposto de Renda, por meio de deduções que não foram corrigidas, apenando principalmente a classe média trabalhadora, que tem nos seus salários reduções substanciais, porque não houve correção dos descontos previstos. A Medida Provisória nº 107 que, aprovada pela Câmara, vem ao Senado, prevê realmente aumento de carga tributária, porque o Sistema Financeiro não pagará essa diferença, mas a repassará a todos aqueles que fazem uso dos seus serviços. Por outro lado, ao impedir-se que o profissional liberal, o artista, o jornalista que se utiliza de empresa faça, como hoje, a contribuição pelo lucro presumido, voltando a pagar o Imposto de Renda, far-se-á reaparecer a sonegação. O lucro presumido foi criado para trazer à base de arrecadação um universo muito grande de sonegadores. Acredito que, com essa tentativa de aumento de carga tributária, voltarão a sonegar. Senadora, todos os articulistas do Brasil vêem isso e o estão escrevendo nas principais colunas. Com as condições atuais, muito em breve a carga tributária será elevada para 40% do PIB. Enquanto isso, infelizmente, a economia está paralisada, o desemprego está aumentando e os juros foram elevados para 26,5%. Esse é o receituário do FMI, o qual está sendo colocado em prática como nunca o foi neste País. O Governo do Presidente Fernando Henrique não teve coragem de adotar todas essas medidas, mas, infelizmente, o de V. Exª a tem e está implantando o pleno receituário do FMI, a fim de que tenhamos condições de pagar os juros da dívida externa. O Partido de V. Exª dizia que era necessário um novo pacto com relação a essa dívida e que isso já era discurso do passado. Hoje, está, efetivamente, havendo um aumento de carga tributária e a população brasileira é quem vai ser apenada. Louvo V. Exª, pelo trabalho que realiza; seu esforço é hercúleo, mas é difícil tapar-se o sol com a peneira.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Senador, agradeço a V. Exª pelo aparte, mas quero dizer, de forma muito clara, que quem esteve no apoio direto e integrado, durante oito anos, ao Governo de Fernando Henrique, que pegou a carga tributária em menos de 26% do PIB e nos entregou, no final do ano passado, em quase 36%, deve ter muito cuidado com o que fala e tem que prová-lo.

Estou trazendo os dados: na MP nº 107, houve aumento de carga tributária, sim, mas houve, também, ampliação de inclusão de setores do Simples, o que é redução dessa carga. A desoneração do PIS e da Cofins de cooperativas agropecuárias - um setor estratégico para a continuidade do programa de ampliação da balança comercial - é outra redução de carga tributária.

Então, vamos colocar no papel. O Ministro José Dirceu já desafiou o Líder do PFL, e volto a fazer desafio: vamos trazer os números e colocar na ponta do lápis para sabermos quem é que realmente aumentou a carga tributária. Se V. Exªs tiverem razão, volto a dizer, terei o maior prazer em assinar emendas, juntamente com o PFL, para taxar o Sistema Financeiro, como foi feito, ao longo do Governo de Fernando Henrique, de forma escandalosa. O capital foi absolutamente desonerado com a desculpa de repasse para o cliente - desculpa porque de qualquer jeito o repasse é feito. Assim, vamos colocar o preto no branco e debater o assunto.

Sr. Presidente, na Comissão de Fiscalização e Controle, houve uma audiência pública que reputo da maior importância. Os Procuradores, Dr. Luiz Francisco, Drª Raquel e Drª Valquíria, estiveram em Nova York e trouxeram todas as informações - obviamente, não as sigilosas, não os nomes, não as contas, não os valores, porque isso está sob sigilo fiscal - a respeito do esquema escandaloso de lavagem de dinheiro e de evasão de divisas. Também trouxeram o mecanismo para que, caso montemos uma estrutura rapidamente - o que já foi solicitado e será operado pela Comissão de Fiscalização e Controle -, esses recursos voltem aos cofres públicos. A planilha que apresentaram é estarrecedora: dos US$30 bilhões em divisas que se evadiram, entre os anos de 1996 e 1999, pela conta do Banestado, em Nova York, temos possibilidade de recuperar, por meio de notificações fiscais e autos de infração, algo em torno de US$27 bilhões.

No entanto, uma audiência como essa, da maior importância, que tratava do volume de recursos passível de ser trazido para os cofres públicos do Brasil, foi totalmente desvirtuada por um bate-boca lamentável.

Surpreendentemente, estava presente o Sr. Eduardo Jorge - que, segundo informação, há muito tempo não aparecia em atividades do Senado -, e, logo em seguida, chegou o Líder do PSDB, Senador Arthur Virgílio. A audiência terminou em um bate-boca com o Procurador Luiz Francisco, a respeito de outras questões, desviando-se a discussão da lavagem de dinheiro e da recuperação da quantia que foi desviada.

Sr. Presidente, lamento profundamente o ocorrido, pois o assunto de que tratávamos era de fundamental importância para os interesses do Brasil e não poderia ter sido desvirtuado pela ação de um Líder de Partido.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2003 - Página 11247