Discurso durante a 58ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de artigos publicados nos jornais O Globo e Correio Braziliense, no último final de semana, com críticas à incoerência entre o discurso do PT como Oposição e o discurso como Governo. (Como Líder)

Autor
Leonel Pavan (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Leonel Arcangelo Pavan
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Registro de artigos publicados nos jornais O Globo e Correio Braziliense, no último final de semana, com críticas à incoerência entre o discurso do PT como Oposição e o discurso como Governo. (Como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 20/05/2003 - Página 11814
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, IMPOSTOS, CONTRADIÇÃO, EPOCA, OPOSIÇÃO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANALISE, DIVERGENCIA, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ESPECIFICAÇÃO, HELOISA HELENA, SENADOR, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, DESCUMPRIMENTO, COMPROMISSO, CAMPANHA ELEITORAL, FRUSTRAÇÃO, ELEITOR, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESPECIFICAÇÃO, RODOVIA, AUSENCIA, PRIVATIZAÇÃO, BANCO DO ESTADO DE SANTA CATARINA S/A (BESC).

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderia deixar passar em branco o registro de alguns artigos escritos e publicados em jornais do nosso País, como O Globo e Correio Braziliense.

Não lerei todo o artigo do Senador Jorge Bornhausen, mas gostaria que ele ficasse registrado nos Anais da Casa. Mas antes, tecerei alguns comentários do que disse S. Exª, ao afirmar que é impressionante a onda de aumento de impostos que o Governo do PT está promovendo, numa fúria arrecadatória que bate todos os recordes da história do País. Nunca um Presidente, em tão curto espaço de tempo, aumentou tanto os impostos. Depois há mais quarenta ou cinqüenta linhas que falam sobre a forma vergonhosa com que o Governo aumenta os impostos, principalmente os que incidem sobre as classes mais necessitadas. Diz, inclusive, que os banqueiros não se mexem, não gritam, porque quem está pagando é justamente o contribuinte.

Quero registrar também nesta Casa um outro artigo, do Correio Braziliense, que se intitula “Heloísa e as Nuvens”, escrito por Eustáquio Gomes, jornalista, escritor e autor do romance “A Febre Amorosa”, entre outros. Ele cita, em inúmeras frases, as incoerências de homens que, hoje, estão no Governo, de Ministros, que, quando na oposição, proferiam outro discurso, ao falar para a população sobre a reforma tributária e a Previdenciária, em reuniões de partido, em Municípios, nos Estados, na Imprensa e no Senado. Pior ainda: mostra que os que hoje estão no Poder dizem que mudar não é vergonha.

Gostaria de me referir à matéria divulgada no jornal O Globo de ontem, que diz: “Mudaram de tom”. No Governo petista, defendem o que antes condenavam e condenam o que defendiam quando estavam na oposição. Inconstitucional, confiscatória e perversa. Era assim que num passado recente os dirigentes do Partido dos Trabalhadores referiam-se à taxação dos inativos, hoje considerada um “imperativo de responsabilidade e justiça social” pelo Presidente do PT, José Genoíno.

Eu não era senador e nem deputado federal quando se discutia a reforma da Previdência. Aliás, até 1997, pertencia, quando deputado federal, ao PDT, e fazíamos oposição juntamente com o PT. E conhecíamos muito bem a forma como era feita a oposição. O PSDB defendia isso no passado. Estou me referindo ao que ouvi nas campanhas eleitorais do ano passado. E agora, ao percorrer meu Estado, Santa Catarina, as pessoas me perguntam como fica a reforma da Previdência se o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizia uma coisa e hoje faz outra. Na verdade, quero estar ao lado de tantos milhões de eleitores que votaram num discurso. Vou defender o discurso. Mas hoje a prática é totalmente diferente.

Há quatro anos, o então presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República, dizia que o Brasil não podia se subordinar à especulação e à ganância de meia dúzia de banqueiros, num dos seus freqüentes ataques à alta de juros. No entanto, já no primeiro mês do atual Governo, o Ministro da Fazenda, Antonio Palocci, admitiu que nem sempre é possível fazer o que se quer e o que se promete na campanha eleitoral. Aliás, endosso apenas o que o Presidente disse recentemente, que quando se está na oposição se faz muita bravata, mas quando se está no poder a história é outra.

Recordo-me também da guerra que se travou quando se falava no projeto de lei que permitiria a reeleição do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Lula disse em ato público, em 1997 contra a reeleição: “subordina os interesses do País aos interesses do eu me amo”. Em maio de 2003, Tarso Genro disse o seguinte: “A minha opinião é que, se o governo vai fazer mudanças positivas como está fazendo, não é improvável que o Lula seja candidato de novo”. Para mim, essa não é nenhuma novidade em relação às contradições que estou vendo.

Lula dizia sobre a reforma da Previdência o seguinte, na campanha eleitoral em 2002: “Os servidores públicos de hoje têm razão de brigar, até porque tem uma decisão do Supremo Tribunal Federal garantindo a eles o atual sistema de aposentadoria, então você não pode mexer.”

“A instituição dessa contribuição (dos inativos), na esfera federal, foi rechaçada pelo STF, que não apenas considerou-a incompatível com o art. 40 da Constituição, como também considerou a exação confiscatória e eivada por desvio de finalidade, o que fere a cláusulas pétreas erigidas em favor do contribuinte pela Carta de 1988”. Esse é o voto do Deputado do PT na Comissão de Constituição e Justiça contra a taxação dos inativos, assinada por José Dirceu.

“A questão dos inativos é direito adquirido”, frase dita por Ricardo Berzoini, que não sabia que logo após seria Ministro da Previdência.

“Quando se fala em direito adquirido, o próprio tempo verbal denuncia. Adquirido é passado. Não é futuro. Se mudar a Constituição, direito novo não é adquirido”, diz Ricardo Berzoini, em janeiro de 2003.

Estou me referindo aqui a algumas dessas questões porque, quando percorremos o Brasil, cobram-nos coerência, e coerência que era cobrada pelo PT no passado.

Estou citando assuntos referentes às reformas. Mas isso tem ocorrido com assuntos do nosso Estado, como as Rodovias 282, 470 e a BR-101, que V. Exas já devem ter me visto aqui inúmeras vezes falando sobre o assunto. Nós que ouvimos claramente os compromissos, as promessas, dizendo que tão logo que assumisse o Governo iniciaria todas essas obras, agora as estamos vendo, uma a uma, canceladas. Aliás, estão tentando alocar recursos em alguns setores dizendo que são para recapear, para fazer uns remendos nas rodovias.

Ora, o atual Governo, quando na oposição, sempre usou os microfones dizendo que conhecia a forma, o meio de governar o País com os recursos que tinha. Até mostrava em gráficos quanto o Brasil arrecadava e quanto podia investir. E, nós, até mesmo pertencendo ao ex-governo, achávamos que se existisse realmente esse meio, o PT teria razão. Com certeza, com a sua vitória, as obras das rodovias executadas uma a uma.

Perguntaram-me sobre o nosso Besc, que estava sendo privatizado. O Presidente que foi a Florianópolis, com mais de 20 mil pessoas, ergueu um documento dizendo que o banco iria voltar para os catarinenses. E não se fala em outra coisa até agora a não ser vender o banco para beneficiar o FMI. Conheço, até, refrãos que diziam: “i, i, i, fora o FMI”. E agora só são lidos nos jornais os acordos com o FMI e os banqueiros.

Faço esse discurso não apenas porque sou da oposição, mas porque o povo nos cobra para que aqui tomemos uma atitude. Para tal, estou usando o que tenho a minha frente, o microfone. Talvez o meu pronunciamento chegue aos Ministros, ao Presidente, e se alguém do PT não tem coragem de dizer isso a ele, porque será chamado à atenção, poderá ser expulso do partido, eu, do PSDB, estou avisando o Presidente Lula que assistimos aos seus compromissos com Santa Catarina, com as Rodovias 282, 470, 280 e com a 101, que são de grande importância para Santa Catarina e para o nosso País. Precisamos do BESC para Santa Catarina, precisamos dessas rodovias, precisamos de coerência, senão ficará tudo na mesma situação e o povo terá razão de reclamar. Hoje, quando eu chegava a Brasília, encontrei muitas pessoas gritando, pedindo para os Senadores se pronunciarem favoráveis a eles - traziam na lapela o Lula e o PT. A meu ver, eles têm que convencer é o PT, têm que gritar para o PT. Nós temos nossa posição; pelo menos eu tenho essa posição. E precisamos também ser coerentes nas reivindicações.

            Às vezes, tenho tido dificuldade de dar algumas explicações. Talvez por ser novato aqui no Senado, inexperiente, não consigo entender como é que um Partido que cresceu em cima da coerência, em tão pouco tempo, mostra incoerência, deixando-nos, os homens públicos, envergonhados. Usamos os microfones para falar do outro Partido como se estivéssemos aqui para ser contra por ser contra ou fazer oposição por fazer oposição. Nós queremos apenas alertar: seremos favoráveis e aplaudiremos o Governo se cumprir aquilo que assumiu em campanha eleitoral, porque esse foi o desejo da grande maioria dos brasileiros. Isso nós reconhecemos.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR LEONEL PAVAN EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Governar é aumentar impostos?

Jorge Bornhausen

Senador por Santa Catarina, é presidente nacional do PFL

É impressionante a onda de aumento de impostos que o governo do PT está promovendo, numa fúria arrecadatória que bate todos os recordes da história do país. Nunca um presidente, em tão curto espaço de tempo, aumentou tanto os impostos.

Na verdade, os aumentos de impostos começaram antes da posse, com o Imposto de Renda da Pessoa Física, que já havia sido reduzido graças a um movimento que o PT apoiou intensamente. Foi um escândalo, o PFL se opôs, mas as forças do antigo governo, num movimento de boa vontade para facilitar a transição do poder, juntaram-se aos petistas. A aprovação do aumento de Imposto de Renda da Pessoa Física foi uma cruel injustiça contra a classe média, que padece da falta de correção da tabela do IR.

O que, a princípio, pareceu uma solução de emergência em face da crise de confiança que o país sofreu devido aos antigos procedimentos do PT -- que hoje por meio de confissões do próprio presidente Lula, do presidente da Câmara e do líder Mercadante eram comportamentos insinceros, com objetivos eleitorais, e que podem ser classificados como aéticos -- aos poucos foi se definindo como doutrina do novo governo.

Praticamente o país está vivendo a maior guerra tributária que já se viu no Brasil. A seqüência de batalhas promovidas pelo governo do PT aproveita qualquer pretexto. Como foi o caso surrealista da votação pela Câmara de uma medida provisória sobre o Refis, programa de renegociação de dívidas com o Tesouro.

Inopinadamente, o governo utilizou-a para incluir emenda que aumenta em 167% a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) pago pelas empresas de serviço e que vai atingir diretamente, por um lado, centenas de milhares de profissionais que bancam as próprias atividades, como médicos, artistas de TV, jornalistas, advogados, dentistas, e, por seu lado, o público em geral, pelo encarecimento dos serviços que utilizam. Evidentemente, os 167% de aumento do tributo serão repassados aos consumidores.

Nessa mesma operação foi acrescentado o aumento do Cofins, de 3% para 4%, cobrado dos conglomerados financeiros. Surpreendentemente, bancos e instituições congêneres não reclamaram o absurdo, pois não terão que pagá-lo. Esse tributo é cobrado dos clientes e vai onerar as operações bancárias em geral e, naturalmente, pesará mais fortemente sobre os que menos podem pagar.

Enquanto essa série de aumentos de impostos, já aprovada pela Câmara contra o voto dos deputados do PFL, não é votada pelo Senado, surge nova onda. Já foi oficializado o anúncio de outra má intenção do governo do PT: o Imposto de Renda passará a ter uma alíquota de 35%. Mais aumento de impostos.

Tudo indica que se trata, apenas, de um aperitivo para a Reforma Tributária, já que a moeda de troca de apoio político usada pelo governo para o apoio dos governadores é o compromisso de possibilitar aos estados também promoverem suas ondas de aumentos de impostos.

O PFL ainda está pagando o preço do pioneirismo, estreando seu estilo oposicionista responsável e civilizado, e a sociedade ainda não despertou para o grande dique que o aumento da carga tributária representa para qualquer expectativa de retomada do desenvolvimento. Logo, porém, haverá consciência do grande erro de estratégia fiscal representada por esses aumentos, feitos sem critério, descoordenados, na base do ‘‘vê onde encaixa algum aumento de receita’’.

Não tardará muito e essa onda de indignação obrigará o governo a encarar firmemente a questão. Por ora, limita-se a desdenhar a cruzada que o PFL deflagrou. O ministro da Casa Civil, José Dirceu, um dos três hierarcas da regência trina do governo petista, junto com os ministros Palocci e Gushiken, chamou-me de Dom Quixote e de estar combatendo moinhos de vento.

Não consegui avaliar aonde o poderoso ministro chefe da Casa Civil quis chegar com esse apelido, tão honroso para mim, mas certamente, por seu estilo objetivo, ele não dispensaria gratuitamente tal galardão ao presidente de um partido da oposição. No essencial, porém, o ministro José Dirceu evitou me responder: não disse por que, nem até quando, o governo continuará aumentado impostos.

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Heloisa e as nuvens

Eustáquio Gomes

Sendo a política como as nuvens, segundo dizia aquele velho cacique, pois uma hora estão de um jeito e no momento seguinte estão de outro, não é de descartar que Heloísa Helena, essa Joana D’Arc dos trópicos, triunfe sobre a inquisição que pretende levá-la à fogueira. Para o Torquemada dos novos tempos, isto é, o antes insuspeito Genoíno, Heloísa é apenas o puxa-fila de um bando de desequilibrados. Não chegará a lugar algum e seu fado é bater contra a blindagem do sistema. A prova da loucura: manter opiniões que seus algozes sustentavam até há pouco, mas que abandonaram tão logo subiram a rampa do palácio, já que dali o ponto de vista nunca é o mesmo.

Precisaríamos de um Freud, de um Otto Rank ou de um Lacan para elucidar essa questão da loucura de Heloísa Helena. Estamos diante de um silogismo: se Heloisa Helena é louca, seus acusadores devem ser sãos; logo, Genoíno, Zé Dirceu, o ministro da Saúde, o ministro dos Esportes, o presidente da Petrobras luzem de normalidade política, humana e ética. E o presidente da República, mais que todos, transpira normalidade por todos os poros.

Dezembro de 1998. Num auditório de sindicato, ferve um debate sobre (isto é, contra) a tentativa do governo de taxar os inativos. A mesa se manifesta. ‘‘É um confisco’’, diz Humberto Costa, sem saber que cinco anos depois estaria ministro da Saúde. ‘‘É um confisco, pois os servidores públicos, os aposentados e os pensionistas vão ser obrigados a contribuir. Some-se a isso o aspecto perverso de obrigar os inativos a contribuírem.’’

A platéia aplaude fervorosamente. Agnelo Queiroz, deputado baiano, justifica seu voto com dramaticidade: ‘‘O mundo está olhando para as crianças brasileiras famintas, para a prostituição infantil, para a miséria. É isso que envergonha a nossa pátria, e não a forma como o FMI quer mandar aqui’’. José Eduardo Dutra, bravo defensor dos direitos trabalhistas, indigna-se com a desfaçatez do governo: ‘‘Por que votar contra? Em primeiro lugar, porque é absolutamente inconstitucional... É como se estivéssemos tratando de milionários. Na prática, é um confisco sobre os proventos dos aposentados’’.

José Dirceu, que nessa época ainda conservava uma expressão moderadamente simpática, qualifica em termos jurídicos a cachorrada palaciana: ‘‘É confisco no duro, é uma coisa eivada por desvio de finalidade, o que fere cláusulas pétreas erigidas em favor do contribuinte pela Constituição de 1998’’. E Genoíno? Alarga a cara de babuíno num sorriso que é como um generoso abraço em todos os trabalhadores do país e seus direitos vilipendiados: ‘‘É a medida provisória da perversidade, da maldade, da insensibilidade, da falta de consciência cívica de um Congresso. Estamos tirando da parcela pobre, porque ela não pode gritar’’.

Maio de 2003. Os personagens são os mesmos mas o cenário é outro, muito mais iluminado e festivo. É como se uma peça de Guarnieri (Eles não usam black-tie, lembram-se?) tivesse cedido lugar a uma novela da Globo. Um repórter pergunta a Humberto Costa por que ele mudou de idéia e defende agora a cobrança dos inativos. ‘‘Queremos equilibrar a Previdência para financiar o desenvolvimento, fazer políticas sociais e eliminar as desigualdades’’, explica.

O repórter faz a mesma pergunta a Agnelo Queiroz. Resposta: ‘‘Sou do governo e minha opinião é esta: a que está nas propostas enviadas pelo presidente Lula ao Congresso. Não me manifesto publicamente sobre o assunto’’. Ah, é? Pois vamos ver o que diz o nosso bravo Dutra: ‘‘Votamos contra a contribuição dos inativos porque o governo não tinha uma proposta global para a reforma da Previdência. Na época nós não concordamos em transformar os inativos em vilões’’.

Hum, isso significa que de lá para cá todos os vilões se transformaram em inativos. Horrível fenômeno de mutação coletiva. Realmente há que fazer alguma coisa, talvez o extermínio da vilania geral. Genoíno, sem qualquer sinal de perturbação, explica sua nova postura política, moral e saneadora: ‘‘Nossa proposta está direcionada para atender às populações carentes. A contribuição dos inativos faz parte de uma proposta que tem outra visão’’.

E o ex-simpático Zé, que alegava a inconstitucionalidade da medida? O que dirá agora? Simples: ‘‘Vamos fundamentar a constitucionalidade da proposta’’. E em seguida, incomodado com a pergunta inconveniente do repórter: ‘‘Se eu mudei de opinião? Mudei, e daí?’’

Sim, Heloísa Helena deve ser louca. Não bastasse isso, está traindo o partido, o governo, o país. Tem a petulância de não mudar de opinião. As nuvens passam, o céu muda de roupa, mas Heloísa Helena quer continuar com a mesma calça jeans, o mesmo rabo-de-cavalo. E fala pelos cotovelos, arrasta atrás de si os Babás da vida e arregimenta estudantes, essa perigosa massa de manobra.

Hoje, amanhã, há o risco de que saiam por aí de cara pintada, em defesa de Heloisa Helena e de seu ideário. E quando isso acontece, outros vão atrás e as nuvens mudam de novo, a paisagem começa a envelhecer como folhinha na parede e o que era novo principia a ficar velho, a vanguarda vira retaguarda e cai em desuso sob a força da nova novidade. Assim é a política. É preciso, pois, tacar fogo em Heloísa Helena antes que as nuvens mudem outra vez e apareça, no horizonte, a cavalaria dos cossacos.

Jornalista e escritor, é autor do romance A febre amorosa, entre outros


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/05/2003 - Página 11814