Discurso durante a 58ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura de carta do Conselho de ex-governadores do Rio Grande do Sul ao Presidente da República, solicitando apoio do governo para a reestruturação da empresa aérea Varig.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Leitura de carta do Conselho de ex-governadores do Rio Grande do Sul ao Presidente da República, solicitando apoio do governo para a reestruturação da empresa aérea Varig.
Aparteantes
Paulo Paim, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 20/05/2003 - Página 11836
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, GOVERNADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROVIDENCIA, RECUPERAÇÃO, SITUAÇÃO FINANCEIRA, VIAÇÃO AEREA RIO GRANDENSE S/A (VARIG), MOTIVO, IMPORTANCIA, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, MANUTENÇÃO, EMPREGO, CRISE, AVIAÇÃO, MUNDO.
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, SENADO, AUDIENCIA PUBLICA, DEBATE, SUPERIORIDADE, TRIBUTAÇÃO, NECESSIDADE, REFORÇO, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, CONCORRENCIA, AMBITO INTERNACIONAL, POSSIBILIDADE, ACORDO, CREDOR, EXPECTATIVA, ORADOR, APOIO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na semana passada foi enviado o seguinte ofício ao Presidente da República Brasileira:

Carta do Conselho de Ex-Governadores ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Excelentíssimo Senhor Presidente:

Considerando que o Brasil não pode abrir mão de uma empresa com a história da Varig, que conquistou credibilidade no competitivo setor aéreo nacional e internacional ao longo dos seus 75 anos de inestimáveis serviços prestados à Nação;

Considerando que a Varig é uma empresa operacionalmente viável e a crise por que passa atinge a toda a aviação comercial mundial;

Considerando que a manutenção da empresa Varig é uma questão de soberania nacional, e que apoiá-la para que recupere o seu equilíbrio econômico e financeiro é medida de interesse público que se impõe, evitando a perda de milhares de empregos;

O povo gaúcho, seu governador e os ex-governadores que integram o Conselho de Ex-Governadores do Rio Grande do Sul conclamam as autoridades federais a empreenderem ações urgentes e necessárias que viabilizem não só a preservação, mas o fortalecimento da Varig.

Na expectativa de sua acolhida e de tomada de providências, subscrevemo-nos.

Germano Rigotto, Governador de Estado; Leonel Brizola; Amaral de Souza; Jair Soares; Pedro Simon e Alceu Collares.

            Solidarizam-se Olívio Dutra e o ex-Governador Antônio Brito, que, por razões de força maior, não puderam estar presentes.

            Essa foi uma reunião histórica. É a primeira vez que se tem notícia, na história do Rio Grande do Sul, de uma reunião de todos os ex-governadores em torno da figura do Governador Germano Rigotto para atender a uma questão que consideramos de interesse fundamental, que é a defesa da Varig.

A Varig é uma empresa que nasceu no Rio Grande do Sul e que, ao longo do tempo, se transformou na grande empresa nacional. Durante dezenas e dezenas de anos, a Varig foi aquela empresa que representou o Brasil nacional e internacionalmente no transporte aéreo. A Varig chegou a se transformar em uma das grandes empresas internacionais cujos vôos eram considerados entre os melhores do mundo.

Entretanto, surgiu uma série de percalços que nós, com toda a sinceridade, consideramos importante salientar. A Varig tem a sua sobrevivência hoje ameaçada por uma crise sem precedentes, tanto que os ex-governadores se reuniram para discutir o assunto. Nunca antes na história se fez uma reunião igual a essa na qual resultou em apelo ao Presidente da República. Sabemos que a Transbrasil já faliu, a Vasp pede socorro, a TAM e a Varig buscam um entendimento de união para se salvarem.

Na verdade, a crise atinge a aviação no mundo inteiro. Esse é o quadro em que se insere a Varig - empresa fundada há 75 anos no Rio Grande do Sul e considerada a embaixadora itinerante do Brasil em todo o mundo. Os escritórios da Varig no mundo têm essa característica. Para eles, quando se trata de assuntos comerciais, há um interesse maior por parte das empresa e de seus funcionários. A Varig, possui cerca de 15 mil empregados, 110 aviões, operações em 110 cidades do Brasil, mais 27 no exterior, chegou ao auge de uma crise sem precedentes.

Muitas medidas vêm sendo tomadas para enfrentar essa crise, tanto que de 1993 até hoje o quadro de funcionários da Varig ficou reduzido a 12 mil trabalhadores.

Dadas as suas proporções, esse é um problema que já não está restrito ao mundo dos negócios pura e simplesmente.

Exige-se intermediação política. O Congresso Nacional interferiu por meio, principalmente, do Senado Federal. Esta Casa já realizou audiências públicas na Comissão de Assuntos Econômicos, de 19 a 26 de fevereiro, para debater a situação da Varig.

Representantes da empresa, funcionários e credores estiveram com os Senadores e analisaram a crise tendo em vista seu entendimento. Importantes depoimentos foram tomados.

Consideramos, no entanto, que é preciso pensar a questão da companhia aérea em termos mais amplos.

Os problemas do transporte aéreo nacional não se restringem às dificuldades eventuais da Varig e de outras companhias. É necessário repensar, em termos estratégicos, uma política definida para esse setor, baseada no fortalecimento das empresas distantes da concorrência internacional, preservando emprego e aumentando a competitividade.

Nesse aspecto, destaco a tributação. Enquanto na Europa, o setor da aviação paga cerca de 16% de tributos e nos Estados Unidos apenas 7%, no Brasil a tributação chega a 36%. Problemas dessa natureza afetam também a aviação agrícola, o táxi aéreo e o transporte executivo.

É preciso encontrar soluções que contemplem o setor de forma abrangente.

O Senado, reconheço, está fazendo a sua parte. Identificamos nos segmentos envolvidos a disposição de celebrar um acordo favorável a todos. Devemos saudar esse esforço e fazer o possível para encaminhar a rearticulação de todo o setor de transporte aéreo no País.

            Sr. Presidente, posso lembrar o início de toda essa crise. A Varig foi uma empresa que cresceu e se transformou num padrão de qualidade internacional. Todos que viajavam na Varig pelo mundo diziam: “Não há primeira classe melhor que a da Varig, não há melhor tratamento que o da Varig, não há melhor comida do que a da Varig, não há melhor serviço, educação dos funcionários, atendimento do que o da Varig.”

            A Varig era a única empresa brasileira...

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Nobre Senador, posso acrescentar um aparte o mais curto possível?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Com o maior prazer.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT) - Não há, no mundo inteiro, manutenção e cuidado das aeronaves melhores do que na Varig.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - A Varig estava nesta situação: respeito mundial. Aí vem o Sr. Collor. Não sei por que cargas d’água, o Sr. Collor na Presidência da República - não sei, dizem que era uma questão, não tenho a mínima idéia -, resolveu abrir o comércio internacional. Em primeiro lugar, permitiu que a Vasp e as outras empresas brasileiras tivessem vôos para o exterior. Abriu linhas. Por exemplo, a grande linha da Varig era São Paulo-Nova York. A Transbrasil passou a ter a linha São Paulo-Brasília-Washington-Nova York pela metade do preço. E aí surgiu o problema.

O interessante é que, a rigor, os países importantes têm uma empresa internacional. A Inglaterra tem uma, a França tem uma, a Itália tem uma, a Alemanha tem uma. O Brasil tinha uma, que era a Varig. Abriu-se a concorrência. E não só se abriu o mercado no sentido de as nacionais Transbrasil e Vasp poderem agir lá fora, como, a cada vôo internacional que se abria para uma nova empresa brasileira, era permitido que uma estrangeira entrasse aqui. Então, foram duas causas: a concorrência nacional e a internacional. A partir daí começou a crise, que vem aumentando a cada dia.

Pois não, Excelência?

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - V. Exª toca no ponto fundamental. Só quero dizer isso. Não quero perturbar o seu pronunciamento, que está excelente, mas V. Exª colocou o dedo na ferida. Aí se originou toda a crise que atingiu a Varig lamentavelmente e temos obrigação de nos esforçar para que seja superada.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - A Varig, cujo padrão era a qualidade, teve de fazer concessões, teve de abrir sua cozinha a terceiros, porque já não tinha condições de manter aquele padrão. Teve de baixar a qualidade para manter um preço compatível com o das concorrentes. Então houve o problema da Vasp. Foi uma questão interessante que eu nunca tinha visto. Não conheço no mundo uma empresa de ônibus que tenha comprado uma empresa de aviação. Já vi empresa de aviação comprar empresa de ônibus, mas não o contrário. Esse foi o caso da Vasp. É claro que com concessões. Por exemplo, não sei a que preço a Petrobras fornecia o óleo, não sei quanto tempo a Vasp ficava sem pagar o óleo, foram concedidas mil vantagens, feitos mil favores, para que a crise na Vasp fosse adiada.

Em relação à Varig, sinto um pouco de má vontade.

A Varig era uma empresa que empolgava o Brasil. Era inédita, não tinha dono, não era estatal - o Governo do Rio Grande do Sul tinha apenas 3% das ações da empresa - e não era também privada. A Varig tinha a Fundação Varig, da qual participavam todos os funcionários e cada um deles tinha direito a voto, desde o Presidente Ruben Berta até o mecânico mais humilde. Essa fundação tinha o controle e o comando da Varig.

Discutiu-se muito esse modelo no Brasil e no mundo, como sendo um novo estilo na economia. Poderia ser empregado em empresas, indústrias e fábricas, que teriam um serviço diferente de forma econômica. Não seria o capitalismo em si e nem o capitalismo de estado ou o privado, mas uma sociedade organizada, na qual as pessoas trabalhariam pelo desenvolvimento.

E foram excepcionalmente bem a Varig e a Fundação Varig.Tornaram-se exemplo em livros, debates, discussões e propostas. Era um exemplo a ser seguido não apenas por empresas de aviação, mas por associações comerciais ou industriais. Os trabalhadores se reuniriam e participariam do capital.

Lembro-me que se discutiu este assunto quando foi vendida a Vale do Rio Doce. Perguntaram por que entregar de graça a Vale do Rio Doce com o dinheiro do BNDES.

Se o Governo não quer ficar com uma das maiores empresas de aviação do mundo, que vai muito bem, não tem nenhum tipo de problema e possui as melhores reservas do mundo, por que não cria uma grande empresa nacional da qual todos os seus trabalhadores façam parte? Basta lembrar o exemplo da Varig.

Evidentemente, quando a empresa começou a desmoronar, a própria Fundação passou a ter os seus problemas internos. Morreu o Sr. Ruben Berta e foi extinta a Fundação dos líderes que, com ele, comandaram a empresa. Hoje, há uma situação bem diferente daquela inicial.

Sr. Presidente, o nosso amigo Presidente Lula da Silva e o ilustre Presidente do BNDES - um homem extraordinário e de grande competência e capacidade - precisam estudar uma maneira de resolver essa questão. Não sei se deve haver a integração da Varig com a outra empresa, mas algo deve ser feito. Não podemos aceitar que, daqui a três meses, se publique no jornal a notícia de que a Varig parou e entregou seus aviões, deixando milhares de pessoas desempregadas e que o Governo pensa em criar empresas de terceiro quilate para suprir a sua falta.

Por essa razão, Governadores, inclusive divergentes, de pensamentos variados, de Partidos diferentes, se reuniram num mesmo pensamento. Estava lá o Dr. Brizola, que participou da fundação, do desenvolvimento da Varig, colaborando muito com as linhas internacionais da Varig, e prestou um testemunho histórico emocionante do que viu, de como se formou a Varig. Lá estavam os Governadores Alceu Collares, Amaral de Sousa, Jair Soares, Germano Rigotto. Eu estava lá. E havia a solidariedade do Governador Antônio Britto e do Governador Olívio Dutra que, lamentavelmente, por uma reunião governamental com o Presidente, não pôde estar presente.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Pedro Simon, quero juntar a minha voz à de V. Exª, que tem outra dimensão, outra densidade, na medida em que foi Governador desse Estado e participou de reunião tão importante e significativa. Enfim, ao empenho de V. Exª, que se manifesta da tribuna, quero associar o meu. É preciso salvar a Varig, evidentemente, impondo certas condições para que não se repita nenhum desfazimento da solução que for aventada, mas que a Varig sobreviva com o seu prestígio, o seu nome, as suas equipes tão competentes, a sua manutenção, que é exemplar, e todas as características que essa empresa tem e pelas quais mereceu o respeito que todos nós a ela devotamos. De forma que quero cumprimentar V. Exª uma vez mais pelo pronunciamento e juntar minha voz a sua voz densa e sábia.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço com muito carinho a V. Exª, Senador Roberto Saturnino, do Rio de Janeiro, onde a Varig tem um dos seus esteios, pelas campanhas que fez pelo mundo em divulgar o Brasil. Por muito e muito tempo, foram exatamente as belezas do Rio que mais divulgou pelo mundo inteiro.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Pedro Simon, V. Exª me concede um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não, Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Pedro Simon, ex-Governador do nosso Estado, o Rio Grande do Sul, quero somar-me a seu discurso, que vai na linha de defesa da Varig, que é um patrimônio não do Rio Grande, mas sim deste País e com a devida repercussão internacional, como V. Exª aborda muito bem. V. Exª, em seu pronunciamento, além da preocupação com a qualidade, com o patrimônio e com tudo o que a Varig representa, cita - recebi um documento nesse sentido - a preocupação dos funcionários da Varig e dos próprios aposentados da Fundação. Pelo documento que recebi, e V. Exª é feliz na hora em que enfatiza também esse lado, infelizmente a impressão que me passa é a de que os trabalhadores da Varig foram os últimos a serem consultados - muitos deles fazem parte da associação que mantém essa empresa - e que a grande beneficiada, da forma como se está encaminhando a fusão, é a TAM, com um certo prejuízo para a empresa que seria a matriz e que tem até um patrimônio, perto da outra companhia, muito maior. A preocupação - e aí me baseio em seu pronunciamento - é de que não venham, amanhã ou depois, uma vez que quem tem o patrimônio maior ficará na verdade como acionista minoritário nesse processo e, assim, venha a demissão em massa, além de um prejuízo enorme para a companhia aérea e para aqueles que usam efetivamente o avião e para os funcionários. Por isso, somo-me a seu pronunciamento em uma linha de também querer contribuir em um momento tão importante quanto este, para que haja a sensibilidade do nosso Governo a fim de colaborar para um grande entendimento. Sempre digo, em minha vida particular - e tomo a liberdade pois sou amigo pessoal de V. Ex.ª -, que um negócio é bom quando é bom para as duas partes e não quando uma das partes diz que se saiu melhor que a outra. Nesse sentido, endosso o seu pronunciamento. Tenho certeza de que o nosso Governo vai colaborar para o bom negócio, para o bom entendimento e quem vai ganhar com isso é o povo brasileiro. Parabéns a V. Exª.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito feliz e muito oportuno o aparte de V. Exª, Senador Paulo Paim.

É interessante esclarecer que, durante dezenas de anos, os funcionários da Varig não eram funcionários e, sim, os filhos da Varig. Ali havia um sentimento de paz, de amor, de carinho, de afeto e de paixão e era difícil encontrar algo semelhante. E foi assim que eles avançaram, que desenvolveram. Por outro lado, nego-me a acreditar nas notícias de jornais de que a outra empresa terminará majoritária - parece até uma piada. Eu não acredito. Acredito que o Presidente Lula e o BNDES terão capacidade suficiente de entender o que está em jogo e a maneira como deve isso ser respondido.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/05/2003 - Página 11836