Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Falta de investimentos federais em decorrência do comprometimento do Orçamento Geral da União. Defesa de transparência nos gastos públicos.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • Falta de investimentos federais em decorrência do comprometimento do Orçamento Geral da União. Defesa de transparência nos gastos públicos.
Publicação
Publicação no DSF de 21/05/2003 - Página 12076
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, ORÇAMENTO, DEBATE, POLITICA, EXECUÇÃO, INVESTIMENTO, SOCIEDADE, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, CONTENÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, DEFESA, NECESSIDADE, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, DESTINAÇÃO, FUNDOS PUBLICOS, ACESSO, POPULAÇÃO, GESTÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS.
  • ESCLARECIMENTOS, PROJETO, REALIZAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO AMAZONAS (AM), UTILIZAÇÃO, INTERNET, DIVULGAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, AMPLIAÇÃO, SIMPLIFICAÇÃO, SISTEMA INTEGRADO DE ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA (SIAFI), ACESSO, CONTRIBUINTE, INFORMAÇÕES, GESTÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, AMBITO ESTADUAL.
  • REGISTRO, PROJETO DE LEI, TRAMITAÇÃO, SENADO, POSSIBILIDADE, CIDADÃO, CONTRIBUINTE, ACOMPANHAMENTO, GESTÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, POLITICA NACIONAL.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, as discussões nesta Casa iniciam-se e terminam pelo Orçamento público. Todas as nossas discussões têm como fundamento o Orçamento. As reformas são ditadas por necessidades orçamentárias. É preciso reformar a Previdência, porque ela causa déficit no Orçamento público; é preciso fazer a reforma tributária para diminuir o déficit no Orçamento. Enfim, todas as nossas discussões, aqui, invariavelmente, ou começam ou terminam - ou as duas coisas - pelo Orçamento público.

O Orçamento público resulta da contribuição do orçamento familiar de cada família brasileira. E é exatamente esse Orçamento curto que provoca tantos debates e tantas discussões. Ora, se o Orçamento é o resultado da contribuição de cada homem, de cada mulher, de cada brasileiro, de cada brasileira, é preciso que saibamos em que o Governo o investe. Os investimentos na infra-estrutura do País encurtaram, e nas estradas, na melhoria das condições sociais, na educação, na saúde, e foram, aos poucos, concentrando-se no pagamento da dívida pública.

Ora, todos nós somos pagadores de impostos, e, é claro, a curiosidade é um dos mais preciosos dons da inteligência humana. Graças a ela a humanidade progrediu e inventou objetos tão úteis como os computadores, por exemplo. Nas sociedades democráticas, o cidadão tem o direito de ser curioso e de expressar livremente suas opiniões. Eu lhes pergunto: quem aqui já parou para pensar que somos mais de 170 milhões de brasileiros e que pagamos em impostos exatamente 36,5% do Produto Interno Bruto? Essa é a carga tributária de cada homem e de cada mulher neste País. É uma das maiores cargas tributárias do mundo. Se dividirmos a riqueza gerada, ou seja, o PIB, pelos 170 milhões de brasileiros que somos, a nossa renda per capita será de R$7.470,86 - é evidente que a renda per capita do nordestino e do nortista é a metade dessa.

Portanto, vejam a importância de gerir o Orçamento para equilibrar essa má distribuição da renda no País. Mais uma vez, o Orçamento é um instrumento para a elaboração de políticas para equilibrar essas distorções regionais. Isso significa que cada cidadão deste País trabalha durante quatro meses e treze dias, dos 12 meses que laboramos durante o ano, somente para pagar imposto. Ou seja, o imposto vai diretamente para o Orçamento público, o grande instrumento de política que devemos discutir com muita freqüência aqui.

Vivemos sob um regime democrático, elegemos nossos governantes nas Prefeituras, nos Governos estaduais, na União Federal, nas Assembléias Legislativas, nas Câmaras de Vereadores. Os agentes eleitos por cada um de nós recebem um mandato político, que também significa um cheque em branco, para gastar o dinheiro dos impostos em obras, serviços e ações de interesse coletivo. Justamente por isso é que falamos em orçamento público e em serviço público.

Mas realmente sabemos como esse dinheiro é gasto? Se o Orçamento é resultado da contribuição do cidadão, há de se perguntar: como é gasto esse dinheiro? É claro que existem instituições para fiscalizar os gastos. As regras do controle do gasto público existem, bem como penalidades, Tribunais de Contas, etc. Mas será que não podemos melhorar o sistema atual de controle social do gasto público? Afinal, partimos do princípio de que o dinheiro é gasto conforme o orçamento preparado por especialistas e governantes decentes. Se o Orçamento é discutido e votado pelos Parlamentares, sancionado pelos Chefes dos Executivos e realizado por funcionários públicos honestos, qual o problema se cada de um de nós quisermos acompanhar esse meritório trabalho? Não há problema se cada contribuinte decidir que quer acompanhar como é gasto esse dinheiro.

É possível um cidadão comum saber como é gasto dia a dia, mês a mês e ano a ano o dinheiro que ele paga de impostos em nosso País? É possível, sim.

O Estado do Amapá, que governei por dois mandatos, é pioneiro nesse exercício de cidadania. Até onde sei, é o único ente público do Brasil - Governos dos Estados, Prefeituras e Governo Federal - que não esconde seus gastos.

Na verdade, aqui foi citado o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal, que reflete todos os gastos da União. Ocorre que o Siafi é um instrumento importante, fundamental, mas só permite acesso aos especialistas, aos que dominam os códigos dos gastos públicos, que têm profundo conhecimento em Contabilidade e na gestão de orçamento. Não é para o cidadão comum. Estou falando aqui de acesso de forma fácil por parte do cidadão.

O que fizemos foi apresentar, de forma compreensível, na homepage do Governo do Amapá, todas essas informações, incluindo os empenhos públicos, ou seja, o valor dos gastos, o beneficiário do gasto. E qualquer cidadão pode acessar esses dados. Basta que se entre na Internet, no endereço www.amapá.gov.br, para tomar conhecimento da vida orçamentária e financeira completa do Estado do Amapá.

Isso é fundamental. Como cidadão, contribuinte, pagador de imposto, quero saber e seguir para onde vai e em que é gasta a minha contribuição.

Uma vez aberta a página, vamos localizar à direita da tela uma janela chamada Gestão do Dinheiro Público. Clicamos nessa janela, e será aberta, então, a página do Siafem, o Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios, que foi decodificado, simplificado e disponibilizado para qualquer cidadão, podendo este compreender como são feitos esses gastos.

Por curiosidade, vou recomendar aos que estão nos assistindo pela TV Senado, aos que estão na galeria, aos nobres Senadores e Senadoras, que abram, na homepage, por exemplo, um gasto feito pela Fundação Estadual de Cultura do Amapá. Ali estará lançado o empenho que remunerou um cidadão, no valor de R$1.095,00. Constará também o histórico, a explicação, o porquê de esse cidadão ter recebido do Estado esse valor. É que esse cidadão é autor e ator de uma peça chamada Noite das Máscaras, apresentada no aniversário da cidade de Macapá e presenciada pelo público. Nesse caso, não houve problema algum, visto que o dinheiro foi bem gasto, pois produziu um serviço, um espetáculo.

            Continuando a pesquisa, encontramos também, por mera curiosidade nossa, um novo empenho, o de nº 243, que nos informa que o dinheiro do contribuinte, no valor de R$6 mil, foi pago a Marcos Franciney Alves Rabelo, para ele adestrar cães física e mentalmente, em um projeto esportivo chamado Agility. Nesse caso, começa uma complicação, porque o contribuinte viu os seus R$6 mil serem gastos para adestramento de cães em uma Fundação de Cultura.

V. Exªs sabem que está na moda usar nomes em língua inglesa, como projeto Agility, por exemplo, para significar “modernidade”, bem melhores do que os que inventamos no nosso mundo subdesenvolvido, que só fala o português dos nossos bisavós.

            Mas, afinal, o que será o projeto cultural Agility? Será para adestrar seres humanos? Mas a expressão adestrar só é usada para animais. Então, é um projeto para adestrar cães, conforme a antiga filosofia grega “mente sã em corpo são”. Será que é um projeto para treinar cães para servirem de guias para cegos, ou para treinar cães salva-vidas nas praias? Ou será para treinar cães para a polícia militar? Ou para treinar cães para policiar nossas casas e o nosso patrimônio? Enfim, tanto você como eu ficamos extremamente curiosos. E se não for nada disso? E se for uma explicação pouco inteligente para disfarçar uma despesa fantasma ou absurda? E se os gastos não estivessem na Internet? Se não tivéssemos acesso a essa informação pela Internet? Se não tivéssemos acesso à emissão do empenho do Governo, que determina o pagamento de R$6 mil correspondentes a esse tal Projeto Agility? Como ficaríamos sabendo dessa informação? Então, teríamos de entrar com requerimento de informação e o Governo levaria meses para dar a resposta. Entraríamos com uma ação civil pública, haveria uma investigação, e por aí afora. Na Internet, temos, imediatamente, a informação do empenho: o gasto ali consignado e para que foi feito esse gasto.

Agora imaginem se todos nós, 170 milhões de brasileiros, pudéssemos acompanhar os gastos dos nossos impostos nos Governos de todos os Estados, nos três Poderes - Judiciário, Legislativo e Executivo -, em todas as Prefeituras e até na Presidência da República. Não concordam que temos esse direito? Temos ou não o direito de acompanhar o que nos pertence, ou seja, a nossa contribuição no Orçamento público?

Não há dúvida de que, se o dinheiro é público, o acompanhamento deve, obrigatoriamente, necessariamente, ser público e acessível a cada homem e a cada mulher de nossa sociedade. E exatamente para que possamos conquistar o direito de acompanhar todos os gastos públicos, isso só depende da decisão política desta Casa e da Câmara Federal. Para isso, há um projeto em tramitação, cujo Relator é o Senador Demóstenes Torres. O projeto prevê a possibilidade de cada cidadão e cada cidadã deste País controlar o Orçamento público. Daqui a algum tempo, o cidadão, de sua casa, poderá acompanhar todas as nossas discussões sobre déficit orçamentário ou superávit primário - e a razão pela qual o Governo não gasta é exatamente para acumular superávit primário - acessando diretamente o Orçamento de cada Ministério e dos três Poderes. O cidadão entenderá muito melhor o que estamos discutindo e quais são as nossas dificuldades na construção política de nossa sociedade. Há de se perguntar, nos confrontos, nos embates políticos que temos nesta Casa - que são muitos e serão ainda em maior número no futuro - quem foi que geriu este País à revelia daqueles que alimentam o Orçamento público. A sociedade brasileira não tem conhecimento de como o Governo investe seus recursos, em que são gastos. O cidadão, mesmo o de classe média, mesmo o que tem acesso a um computador pessoal conectado à Internet, não tem a informação disponível. E é uma obrigação desta Casa, para contribuir no processo cada vez mais avançado de construção democrática, que disponibilizemos todas essas informações na Internet, que é o instrumento tecnológico que nos ajudará, com certeza, nos avanços democráticos e, sobretudo, naquilo que é fundamental numa democracia: o controle social do Orçamento público. O Orçamento público é o resumo da energia produzida em nossa sociedade; portanto, temos que saber para onde vai essa dinheirama, que não é pouca.

Assim, apelo aos nobres Senadores e Senadoras que discutamos o Orçamento público e disponibilizemos essas informações para todos os brasileiros, facilitando-lhes o acesso, tornando-as simples para cada um deles.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/05/2003 - Página 12076