Discurso durante a 63ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Ações do Governo Luiz Inácio Lula da Silva contra a discriminação racial.

Autor
Eurípedes Camargo (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Eurípedes Pedro Camargo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Ações do Governo Luiz Inácio Lula da Silva contra a discriminação racial.
Publicação
Publicação no DSF de 27/05/2003 - Página 13109
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • REGISTRO, COMEMORAÇÃO, SEMANA, CONTINENTE, AFRICA, AMBITO INTERNACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, ESTUDANTE, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB).
  • REFERENCIA, INFORMAÇÕES, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), ESTATISTICA, MAIORIA, POPULAÇÃO, NEGRO, SITUAÇÃO, POBREZA, DESEMPREGO, ANALISE, IMPORTANCIA, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, BRASIL, AMPLIAÇÃO, ACESSO, EDUCAÇÃO, CONTENÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, EQUIPARAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, RESPEITO, DIFERENÇA, RAÇA, CIDADÃO.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, ENSINO, HISTORIA, CONTINENTE, AFRICA, CULTURA AFRO-BRASILEIRA, LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL, NOMEAÇÃO, POLITICO, NEGRO, PARTICIPAÇÃO, EXECUTIVO, JUDICIARIO, CRIAÇÃO, SECRETARIA ESPECIAL, PROMOÇÃO, IGUALDADE, RAÇA.
  • REGISTRO, MOBILIZAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CONTENÇÃO, EXCLUSÃO, CIDADÃO, DEFESA, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL.

O SR. EURÍPEDES CAMARGO (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, dia 25 de maio, iniciaram-se as comemorações da Semana da África em praticamente todos os continentes. Em Brasília, os estudantes da UnB também estão promovendo a Semana da África. Esse evento ilustra bem o tema que pretendo abordar hoje, que considero de extrema relevância e com o qual me sinto identificado pela minha trajetória pessoal, como membro da etnia negra e da classe trabalhadora.

Os brasileiros afrodescendentes constituem a segunda maior nação negra do mundo, atrás somente da Nigéria. São 76,4 milhões de pessoas, o que corresponde a 45% dos habitantes do Brasil, segundo dados do censo de 2000. No entanto, qualquer brasileiro com sensibilidade e reflexão crítica é capaz de enumerar experiências de discriminação e humilhação sofridas por negros em seu cotidiano, e até mesmo opinar sobre os preconceitos existentes em nossa sociedade.

O mito da igualdade racial brasileira está superado há muito, e, embora o quadro seja complexo, algumas ações já contam com o apoio necessário para sua implementação. Amplos segmentos aderiram ao discurso da “Política de Ação Afirmativa” como forma de promover a mobilidade social, para o fim das desigualdades sociorraciais, isto é, do racismo. Ainda que essa política, implementada a partir do mecanismo da reserva de vagas, ou seja, das cotas, provoque de imediato uma mudança muito mais quantitativa do que qualitativa, seus reflexos são positivos, uma vez que produzem grande impacto ao atacar a discriminação racial no campo educacional, especialmente no ensino superior, que representa para negros e pobres um verdadeiro funil.

A movimentação de amplos setores em defesa do direito de todos os excluídos é também um modo de educação para a cidadania. A escola é um elemento fundamental na construção de uma convivência de respeito às diferenças, pois, quando suas diretrizes básicas não estão voltadas para isso, facilmente se transforma em aparelho ideológico de transmissão da cultura da intolerância, agravando o quadro de violência no País.

Citando a coordenadora do Soweto Organização Negra, Professora Gevanilda Santos, é por meio da inferioridade atribuída ao outro, uma característica da discriminação, que o grupo social dominante se legitima para submetê-lo. A objetividade de qualquer tipo de discriminação é a dominação social e a sua decorrência é a exclusão social. Esse tipo de comportamento tem a função social de monopolizar a riqueza material ou simbólica para apenas um grupo dominante. Isso é o mais importante a ser dito e considerado para eliminar qualquer forma de racismo e promover a igualdade entre os diferentes grupos raciais de uma sociedade.

Dados do Ipea demonstram que, mesmo com a melhoria dos indicadores sociais no Brasil, a questão da classe combina com a raça, gerando desigualdades, sobretudo entre a população branca e negra. Os negros representavam, em 1999, 45% da população brasileira. Entre os 53 milhões de pobres, os negros correspondem a 64% do total e a 69% da população de indigentes. É ainda majoritariamente negra a massa de desempregados e subempregados em todo o País. Podemos concluir, então, que a construção da desigualdade social sobre o que é diferente gera o preconceito, a discriminação e o racismo.

Uma das grandes polêmicas sobre o sistema de cotas remete à questão da identidade racial brasileira, ou seja, ao critério para definir quem seria ou não negro e, portanto, quem deveria ser beneficiado. Em nossa opinião, o reconhecimento dessa identidade só poderá ocorrer por autoclasificação, mediante seu próprio julgamento.

Outras medidas são necessárias para fortalecer a identidade racial dos brasileiros, considerando sempre que raça é uma construção social e não biológica.

Uma das primeiras medidas do Governo Democrático Popular do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi sancionar a Lei 10.639, alterando a Lei de Diretrizes Básicas da Educação Nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afrobrasileira e da África.

Dessa mudança curricular espera-se o fortalecimento de uma nova simbologia do negro na sociedade brasileira.

O fim do racismo deve incorporar também a redistribuição dos recursos econômicos de que os negros têm sido o grupo social mais alijado.

Em números totais, as mulheres negras são as mais freqüentemente submetidas às ocupações precárias, seguidas das mulheres brancas e dos homens negros, o que sugere a delicada condição de quem sofre, a um só tempo, discriminação de gênero e de raça.

O compromisso de um Brasil sem racismo, que aponta o combate às desigualdades econômicas e sociais como condição necessária para que seja garantido a todos os brasileiros e brasileiras o status de cidadãos, indica também a urgência de um esforço político para que se afirme no País o princípio da igualdade entre homens e mulheres, entre negros e brancos, e reconhece como indispensável à superação da dívida social que, há mais de 500 anos, faz de uma grande parcela da população vítima estrutural da violência e da injustiça.

Esse é um enorme desafio para o Governo Lula, que foi assumido no processo eleitoral como compromisso de campanha e que está sendo implementado desde os primeiros dias de governo.

Temos alguns indicativos de que o Brasil começa a mudar e de que uma sociedade mais justa começa a ser construída, respeitando as diferenças e refletindo em suas representações as diversas especificidades que compõem nossa Nação.

Cito o aumento da participação do negro no cenário político federal, com integrantes no primeiro escalão do Governo, como Benedita da Silva, no Ministério da Assistência e Promoção Social; Gilberto Gil, no Ministério da Cultura; e Marina Silva, no Ministério do Meio Ambiente.

Criando um fato histórico de beleza singular, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, migrante e operário, nomeou para Ministro do Supremo Tribunal Federal o primeiro negro a ocupar esse cargo, o Ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes, também migrante e ex-faxineiro. O Ministro chegou ao topo de sua carreira após várias vitórias contra desigualdades sociais e raciais. Mineiro que migrou para Brasília em busca de estudo e trabalho, dividia o seu tempo entre a escola e o emprego de faxineiro no Tribunal Regional Eleitoral. Mais tarde, foi trabalhar na Gráfica do Senado, das 23h às 6h da manhã. Ao encerrar a jornada, seguia para a UnB, como único aluno negro no curso de Direito. Sua carreira seguiu de forma brilhante até chegar à atual indicação, um reconhecimento que muitas vezes os negros não encontram.

No Parlamento, lembramos a eleição do Senador Paulo Paim, em uma campanha que ressaltou o voto com classe e raça, e a eleição do Deputado Federal Vicentinho, um dos mais votados no Estado de São Paulo e que promoveu em sua gestão como presidente da CUT ações que elevaram o tema da discriminação racial à condição de prioridade na pauta das ações sindicais.

Ressaltamos ainda as indicações de Sueli Carneiro para o Conselho de Desenvolvimento Econômico e de Maria Aparecida Bento para o Conselho de Segurança Alimentar.

Esse processo que reflete o entendimento do novo Governo de que o combate à desigualdade passa por uma política nacional de combate ao racismo tem um ponto a ser destacado: o decreto presidencial que criou a Secretaria Especial da Promoção da Igualdade Racial no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, prontamente abraçado pelo Congresso, que se manifestou pela sua aprovação de forma ágil. Já aprovado pela Câmara e agora por esta Casa, vai agora à promulgação, revelando sintonia com as ações de promoção da igualdade de oportunidades e de combate à discriminação.

Para dirigir a Secretaria, foi indicada uma mulher negra, Matilde Ribeiro, com amplo respaldo dos movimentos e instituições. Sem contar que, no plano internacional, por meio do Ministério das Relações Exteriores, foi também desmembrado um departamento que correspondia à África e ao Oriente. Pela importância que tem o continente africano e pelos dados históricos que nos ligam há centenas de anos, era necessário que o Governo fizesse essa separação, ao desmembrar esse departamento. Criou-se também a Embaixada em São Tomé e Príncipe.

Portanto, trata-se de iniciativas em vários níveis que o nosso Governo, com essa preocupação, vem tomando nesses poucos meses de atuação, mas que já apresentam, nessa ordem, proposta concreta de encaminhamentos.

São muitas as ações já apontadas pelo novo Governo para dar continuidade a essa política, mas destaco a certeza de que esse é um compromisso prioritário do Partido dos Trabalhadores, que traz, no bojo da história de seus militantes, a indignação contra todas as formas de discriminação.

Ressalto que, na questão de gênero e raça, o Partido dos Trabalhadores tem dado, no cenário dos Legislativos, também a sua contribuição, ao eleger, dos quatorze Senadores, seis Parlamentares da raça negra. Na proporção de gênero, na Bancada dos oitenta e um Senadores da República, também o Partido dos Trabalhadores dá a sua grande contribuição: de dez Senadoras, seis foram eleitas pelo Partido dos Trabalhadores.

Portanto, o nosso Partido tem dado essa contribuição no que diz respeito à raça e ao gênero, diminuindo a exclusão e aumentando a inclusão nesse processo, de forma clara e concreta. Ainda está longe de o nosso Partido atingir o patamar da igualdade de raça e gênero. Mas, sem sombra de dúvida, identificamos claramente que esta conquista está sendo alcançada. Espero que essa igualdade seja ampliada a partir de ações do nosso Partido. E com certeza, há possibilidade de que ela se torne real, porque essa é uma forma de fazer justiça social aos brasileiros tidos como desiguais.

Seguiremos lutando para que todos sejam iguais em oportunidades, e diferentes em sua individualidade, irmanados pela solidariedade humana.

Obrigado a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/05/2003 - Página 13109