Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Histórico do sistema eleitoral brasileiro. Alerta para a imagem negativa do Congresso Nacional.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. CONGRESSO NACIONAL.:
  • Histórico do sistema eleitoral brasileiro. Alerta para a imagem negativa do Congresso Nacional.
Aparteantes
Marco Maciel, Sibá Machado, Íris de Araújo.
Publicação
Publicação no DSF de 30/05/2003 - Página 13538
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. CONGRESSO NACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, BRASIL, EVOLUÇÃO, POLITICA, REPRESENTAÇÃO POLITICA, FUNÇÃO, VOTO, EXERCICIO, CIDADANIA, DEMOCRACIA, OPOSIÇÃO, DITADURA, AUTORITARISMO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, POVO, ELEITOR.
  • ANALISE, FALTA, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA, PODERES CONSTITUCIONAIS, PARTIDO POLITICO, CLASSE POLITICA, PREJUIZO, DEMOCRACIA, REGISTRO, DADOS, PESQUISA, CONFIRMAÇÃO, INFERIORIDADE, REPUTAÇÃO, AVALIAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, NECESSIDADE, ATENÇÃO, CONGRESSISTA, MELHORIA, ATENDIMENTO, INTERESSE NACIONAL.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta Casa é uma antiga, veneranda e ilustre instituição. Antes mesmo de integrá-la, sempre tive, como cidadão, respeito, admiração e apreço por seu papel histórico, por suas tradições e por sua dedicação à causa da nacionalidade. Exatamente por isso, pretendo iniciar, desta tribuna, uma breve reflexão sobre o significado da representação e o papel do voto em nossa evolução política.

No Brasil, Sr. Presidente, vota-se quase ininterruptamente desde 1821, quando elegemos nossos Constituintes às Cortes de Lisboa. Votamos na escolha da representação nacional durante os 65 anos do Império. Elegemos os presidentes da República, os dos Estados, como então se chamavam, e nossos representantes nas duas Casas do Congresso durante os 40 anos de República Velha. Só aí temos mais de um século de tradição no exercício do direito de voto e de vida parlamentar. Fomos impedidos de sufragar nossos mandatários pela primeira vez com a Revolução de 30, feita ironicamente em nome da legitimidade do voto e da verdade das urnas.

A partir daí, padecemos de alguns dos piores momentos de nossa história política. Vivemos sob o regime discricionário do governo provisório durante quatro anos. A própria Assembléia de 1934 se reuniu para votar o novo texto constitucional, sem liberdade de imprensa e sem as garantias do estado de direito, sendo quase diárias as reclamações contra a apreensão de jornais. Como testemunho de desapreço à representação nacional, elas podem ser lidas nos anais da Constituinte.

O papel do Congresso, nos três anos que separam a Constituição de 34 do Estado Novo, foi, para dizer o mínimo, dramático e lamentável. Dramático porque, colocado ante a insurreição armada que atingiu a capital da República e os Estados do Rio Grande do Norte e de Pernambuco em 1935, cedeu, ainda no rescaldo dos acontecimentos, às exigências que permitiram ao Executivo governar sob regime de exceção pior do que aquele de que tínhamos acabado de sair. O estado de "comoção intestina grave, com finalidades subversivas das instituições políticas e sociais, equiparada ao Estado de guerra, em qualquer parte do território nacional", instituído pelo Decreto Legislativo nº 6, de 18 de dezembro de 1935, era, até então, instituto jurídico desconhecido no País. A medida excepcional, autorizada pela Emenda nº 1, das três então promulgadas pelo Congresso Nacional, foi adotada quando já vencido o movimento militar, presos os implicados e restituído o País à normalidade. Por isso, foi dramático. E foi lamentável porque cedeu, em pleno recesso parlamentar de 1937, ao pedido de prisão de parlamentares sem qualquer acusação formal, como implicados no movimento militar de 1935. Todos, sem exceção, foram mais tarde absolvidos, uns pelo Tribunal de Segurança Nacional e outros, pela própria Justiça Militar.

As vítimas foram algumas das grandes personalidades da vida pública, e cito, como reverência às suas memórias, os nomes de Francisco e Octávio Mangabeira. O primeiro, a mais expressiva figura do socialismo democrático em nosso País; e o segundo, seu irmão, conservador sem dúvida, mas acima de tudo autêntico democrata, como reconheceram até mesmo os seus mais acérrimos adversários. Ao de ambos acrescento o nome dessa outra extraordinária figura exponencial do Partido Socialista, o Deputado e mais tarde Senador Domingos Velasco e o do então Senador Abel Chermont, este último, além de preso, bárbara e cruelmente torturado pela polícia política. O nome de nenhum deles, Sr. Presidente, consta das dezenas de placas, alas, corredores e instalações que constituem o conjunto de edifícios do Senado. Mas os de seus algozes estão aqui perpetuados sem qualquer razão plausível, para escárnio da memória de suas vítimas e afronta aos sentimentos libertários do povo brasileiro.

O resultado dessa amarga experiência para o País foi a efêmera Constituição de 34, vigente por um curto e inexpressivo período que separa os quatro anos do governo provisório de 30 da malsinada fase do Estado Novo, fonte e inspiração do arbítrio político, sempre que exercido no País. O Congresso, pela segunda vez, cedeu à chantagem de uma grosseira falsificação material do documento apócrifo que serviu de pretexto à longa noite da ditadura. À dissolução do Congresso seguiram-se a prisão de vários dos seus integrantes, a suspensão de seus direitos políticos, a extinção dos partidos, a instauração da censura e a instituição de Estado policial, a mesma receita totalitária de que mais tarde se serviram os militares.

São evidencias de que, a despeito da longa tradição de nossa vida parlamentar, nem o velho Parlamento do Império, nem o Congresso republicano jamais tiveram a transcendência do Parlamento inglês, nem a preponderância do Congresso americano, que levou o presidente Wilson, em sua tese de doutorado, a chamar o Congresso de seu país de "Governo congressual".

Retomamos em 1945 a tradição eleitoral do País, mantendo-a ininterrupta até hoje, apenas em relação ao Legislativo, em face das eleições indiretas estabelecidas durante o regime militar para cargos do Executivo. Até o início do processo de transição, em 1985, foram quatro décadas de sobressaltos, ameaças, insurreições, golpes e quarteladas, coroadas pelo suicídio de um presidente (Getúlio Vargas), a renúncia de outro (Fernando Collor) e a deposição de mais dois (Café Filho, em 1955, e João Goulart, em 1964). Uma sucessão de tragédias que não nos distinguem muito da turbulenta trajetória política de alguns de nossos vizinhos.

É forçoso reconhecer que o Congresso mutilado sobreviveu aos 13 anos de vigência dos atos institucionais e aos 21 do regime militar, menos por sua utilidade do que por sua inação. Tornado um cômodo e conveniente apêndice do Executivo, viu-se submetido a três humilhantes fechamentos: o primeiro, no Governo Castello Branco, de 20 de outubro a 22 de novembro de 1966; o segundo, de 13 de dezembro de 1968 a 22 de outubro de 1969, no Governo Costa e Silva; e o último, de 1º a 14 de abril de 1977, no Governo Geisel.

Os únicos padrões dignos de referência de todos esses períodos são os veredictos das urnas, instrumentos com os quais o povo brasileiro nos deu sucessivas e edificantes lições de cidadania. Em contrapartida a essas lições, Sr. Presidente, temos dado pouca atenção, ostensivo desapreço e quase nenhuma importância. No entanto, ninguém ousará negar que foi esse o caminho de que os eleitores se utilizaram para manifestar, exemplarmente, seu repúdio, sua repulsa e sua aversão ao regime militar. A reação pelo voto começou com as eleições de 1965. Dos 11 governos estaduais em disputa, a oposição logrou a vitória nos dois centros populacionais mais importantes: o então Estado da Guanabara e o Estado de Minas Gerais. A reação veio com a dissolução dos partidos existentes e a instituição do bipartidarismo, medidas tomadas em vão, pois o episódio se repetiu nas eleições parlamentares de 1966, quando o então MDB logrou a maioria dos votos para a Câmara, na Guanabara, no Estado do Rio e no Estado do Rio Grande do Sul.

Em 1970, no período mais repressivo da ditadura, o Congresso viveu o seu pior momento. O número de Deputados foi reduzido de 404 para 293, e a campanha pelo voto em branco fez com que a Arena lograsse maioria em todas as unidades da Federação, na composição da Câmara dos Deputados. O número total de sufrágios obtidos pelo partido governista atingiu 10,8 milhões de votos, contra apenas 4,7 milhões dados ao MDB. Nunca, porém, foi tão claro o recado das urnas: os votos em brancos e nulos somaram 4,8 milhões de votos, mais, portanto, do que a soma de todos os sufrágios da oposição, mostrando o erro estratégico de se pregar a abstenção e o voto em branco. Com o fim do Governo Médici, Geisel assume o poder com a sua promessa de "distensão lenta, gradual e segura". Nas primeiras eleições realizadas em seu governo, as de novembro de 1974, a oposição conseguiu ocupar 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, as famosas "16 vitórias que abalaram o Brasil", como as batizou o jornalista Sebastião Nery. As seis vagas obtidas pela Arena nos Estados de Alagoas, Bahia, Maranhão, Mato Grosso, Pará e Piauí, na realidade se reduziram a cinco, pois entre os arenistas eleitos estava a figura extraordinária de Teotônio Vilela, pai do Senador Teotônio Vilela Filho, nosso companheiro, que terminou passando-se para as hostes oposicionistas, cansado de esperar uma abertura que tardava. Ao reunir os governadores por ele escolhidos, o General Geisel advertiu que seu projeto de distensão estaria em risco se a Arena voltasse a sofrer as contundentes derrotas que lhe tinham sido infringidas.

A lição das urnas não se deu apenas em relação ao Senado. Ocorreu também relativamente à Câmara. Enquanto os sufrágios da Arena baixaram de 48,44% dos votantes para 40,94%, entre 1970 e 1974, os da oposição subiram, no mesmo período, de 21,29% para 37,79%. Depois de tão evidentes demonstrações de maturidade cívica, restavam apenas ao regime os subterfúgios eleitorais incapazes de assegurar o predomínio da maioria governista no Congresso. A principal conseqüência política das derrotas de 1974 foi que a bancada situacionista perdeu o poder de aprovar reformas constitucionais, a não ser que pudesse contar com a participação oposicionista.

Geisel parece ter entendido que era o começo do fim, pois aí começava a se esvair a viabilidade institucional do regime militar. No pleito seguinte, quando estariam em jogo dois terços das vagas no Senado, o governo perderia fatalmente o controle da Casa, dando à oposição a possibilidade de paralisar o processo decisório no Congresso. Para evitá-lo, o Executivo ainda dispunha dos instrumentos totalitários do AI-5 e não hesitou em usá-los. Testou a disposição oposicionista, submetendo ao Congresso uma proposta de emenda constitucional de reforma do Judiciário que, rejeitada pelo MDB, deixou ao governo a alternativa de mais um casuísmo. Os poderes para reformar a Constituição só podiam ser exercidos pelo Executivo quando em recesso o Congresso. O Presidente enveredou por esse desvão institucional, decretando, pela terceira vez, depois de 1964, seu fechamento, e garantiu sobrevida ao regime, adiando seu inevitável colapso. Com o "pacote de abril" de 1977, editou a reforma do Judiciário rejeitada na Câmara, baixou o quorum para aprovação das reformas constitucionais, instituiu o colégio eleitoral para a escolha dos governadores e criou os Senadores "biônicos", assegurando ao governo a metade das vagas a serem disputadas no ano seguinte.

A despeito desse retrocesso, Geisel tirou proveito da lição das urnas e tratou, no ano seguinte, de institucionalizar o processo de abertura "lenta, gradual e segura" prometido no início de seu governo. Fez aprovar a Emenda Constitucional nº 11, de 13 de outubro de 1978, que revogou os Atos Institucionais, restabeleceu o pluripartidarismo e entregou a seu sucessor, o General Figueiredo, o encargo de liquidante da massa falida em que se transformara o regime.

Invoco todos esses fatos, Sr. Presidente, para avivar na memória coletiva o papel que teve em todo esse longo, doloroso e cáustico processo de nossa história política contemporânea o seu principal protagonista, o povo brasileiro. Valendo-se da única arma de que dispunha, o voto silencioso e solitário, foi capaz de inviabilizar o regime. A imperícia dos políticos e a imprudência dos militares haviam se juntado para liquidar a frágil democracia restaurada em 1945. O golpe de 1964 a tornou, como em 1934, mero interregno entre duas das mais longas e brutais ditaduras que o Brasil conheceu.

Os subterfúgios, ardis e casuísmos de que se valeram os militares não foram capazes de vencer a obstinação, a lucidez e a serenidade com que os eleitores brasileiros disseram não à ditadura militar. O último pleito sob esse regime, o de 1982, marcou os estertores da manipulação eleitoral, ao instituir a obrigatoriedade do voto em todos os integrantes de cada legenda, sob o risco de nulidade. Pela primeira vez, mesmo sem lograr o maior número de cadeiras na Câmara, a oposição obteve a maior votação, somando 52,3% dos votos, contra 47,6% da situação. As eleições seguintes, de 1986, marcaram o fim do PDS, reduzido a 7,8% dos votos para a Câmara.

Ninguém desconhece o curso de nossa trajetória política posterior. Os líderes políticos que operaram a transição mostraram-se ainda mais insensíveis que os militares para lidar com o veredicto do voto em nosso País. O PMDB, herdeiro de 20 anos de oposição ao regime autocrático de 1964, logrou, em 1986, graças à contrafação do primeiro dos muitos desastrados planos de contenção inflacionária, eleger 21 dos 22 governadores, obter 48,1% dos votos e 53,4% das cadeiras da Câmara, além de 71% das vagas em disputa no Senado. Poderia ter aprovado o texto constitucional que quisesse, pois as decisões eram tomadas pela maioria absoluta, em uma assembléia em que o partido dispunha de quantidade de voto superior a esse quorum.

A Srª Iris de Araújo (PMDB - GO) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador?

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Com muito prazer, Senadora Iris de Araújo.

A Srª Iris de Araújo (PMDB - GO) - V. Exª faz um retrospecto das diversas ocasiões em que a nossa democracia foi duramente golpeada, ao longo desses anos todos, e tenho sentido, ao ouvi-lo, a oportunidade a que se refere V. Exª de maneira tão clara ao ocupar essa tribuna. A palavra de V. Exª talvez seja um alerta para que nós, que hoje vivemos uma democracia que não é a ideal, busquemos a democracia social, porque a verdadeira democracia não é só a liberdade de ir e vir e de processar os nossos credos políticos ou religiosos, mas significa também casa, comida e tudo o mais para a população. É importante que um Senador venha à tribuna relembrar tempos que não queremos que se repitam nunca mais. Tendo sido não apenas espectadora, mas protagonista, vítima do regime militar, no MDB, em 1964 e em 1966, gostaria que todos nós aproveitássemos essa lembrança que, neste momento, V. Exª nos traz como lição e lutássemos por este País, que precisa da nossa atuação, compreensão e ação, para que não tenhamos nunca mais de nos lembrar de tão tristes fatos, como este a que V. Exª se refere. Parabenizo V. Exª pela oportunidade da palavra.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Muito obrigado, Senadora Iris de Araújo. É sempre um prazer renovado ouvi-la.

Sr. Presidente, o resultado, porém, foi a mais conflitante de todas as Constituições do País, submetida a 39 emendas, antes de completar 15 anos de vigência.

A incapacidade de apreender o significado das lições das urnas deu como resultado o conúbio da insensibilidade com a ambição, consumado na disputa presidencial de 1989. O candidato do maior Partido do País, a quem o eleitorado...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Nobre Senador Geraldo Mesquita Júnior, a Presidência lamenta informar a V. Exª que o seu tempo está findo.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Sr. Presidente, espero a compreensão de V. Exª, pois se trata da primeira vez em que assomo à tribuna e gostaria de, com a compreensão e benevolência de V. Exª, concluir o meu discurso.

O candidato do maior Partido do País, a quem o eleitorado acabara de conceder 95,5% dos Governos estaduais, 53,4% das cadeiras da Câmara e 71% das vagas em disputa para o Senado, obteve desprezíveis 4,7% dos votos para a Presidência! E o da segunda maior legenda, ínfimos 0,9% da preferência dos eleitores. Collor, um forasteiro da política, tornou-se o escoadouro e o beneficiário da insatisfação dos cidadãos com os métodos paroquiais de governar, responsáveis pelos piores índices de confiabilidade dos poderes públicos até então atingidos no País.

A insatisfação dos eleitores, no entanto, não se manifestou só em relação aos titulares do Poder Executivo. Tem se refletido também no que se refere ao Legislativo, um sinal a que não temos dado a conveniente atenção.

No primeiro pleito depois do regime militar, em 1986, 18,4 milhões dos eleitores que compareceram às urnas deixaram de votar em qualquer dos candidatos a Deputado Federal. Em 1990, esse número aumentou para 31,4 milhões de eleitores. Em 1994, essa foi a opção de 31,9 milhões de eleitores, e, em 1998, assim procederam 16,6 milhões de votantes (Anexo I).

O fato de que o número de eleitores que escolhem seus candidatos aos cargos do Executivo seja sempre maior do que o daqueles que manifestam sua preferência pelos candidatos ao Legislativo está, no Brasil, como em outros países, relacionado com o julgamento dos cidadãos em relação às suas instituições.

Desprezamos sistematicamente o que dizem as sondagens de opinião pública sobre a credibilidade, a confiabilidade e a popularidade tanto das instituições políticas quanto dos Poderes do Estado. Executivo, Judiciário e Legislativo, nessa ordem, ocupam os últimos lugares em todas -- friso: em todas -- as pesquisas de credibilidade feitas no País nos últimos 25 anos. O grau de confiabilidade do Legislativo só é maior que o dos Partidos e o dos políticos, assim entendidos os detentores de mandatos eletivos. As repercussões dessas avaliações afetam de forma dramática a percepção que os brasileiros têm da democracia.

Desde 1996, uma organização não-governamental com sede em Santiago do Chile, o Latinobarômetro, vem realizando sondagens que abrangem 17 países da América Latina. Para evitar distorções de caráter regional, as perguntas são sempre as mesmas: a primeira, se os entrevistados concordam com a afirmação de que "a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo". De 1996 a 2001, os que concordavam com essa afirmação caíram no Brasil de 50% para 30%, o pior de todos os índices entre os 17 pesquisados, à exceção de El Salvador. Um resultado que contrasta com os 71% dos costarriquenhos, 79% dos uruguaios, 62% dos peruanos e 58% dos argentinos (Anexo II).

Quando se compara o grau de confiabilidade das instituições, o padrão brasileiro é o mesmo em relação à média de avaliação dos países latino-americanos, em que 85% dos entrevistados confiam na Igreja, enquanto só 22% acreditam no Judiciário, o mesmo índice dos que acreditam no Congresso (Anexo III). Em relação à aprovação, os resultados brasileiros são também semelhantes. Tomada aleatoriamente, a pesquisa do instituto Vox Populi de maio de 1996 mostrava que 72% aprovavam a Imprensa, contra 9% que a desaprovavam. Vinham em seguida as Forças Armadas, com 66% de aprovação e 14% de desaprovação, enquanto a CUT aparecia com índices positivos de 45% e negativos de 30%. Em 13 instituições avaliadas, as Câmaras de Vereadores conseguiram 33% de aprovação e 38% de desaprovação, aparecendo em 11º lugar, seguidas do Congresso Nacional com 27% de aprovação e 44% de desaprovação.

Assinale-se que somente as Câmaras de Vereadores, o Congresso Nacional e a instituição colocada em último lugar, três entre as doze avaliadas, eram as únicas com índice de desaprovação maior do que os de aprovação (Anexo IV).

Outra pesquisa da Propeg, de 1998, avaliou entidades e instituições que mais e que menos contribuíam para o País. Em primeiro lugar, apareciam os empresários, com 71% dos que mais contribuíam e com 18% entre os que menos contribuíam, com saldo de 53%. Em situação intermediária, estavam as Forças Armadas, com avaliação positiva de 42% e negativa de 36%. Abaixo vinham o Governo Federal, com 13% negativos e, em penúltimo lugar, os banqueiros com déficit de 32%. Depois deles, apareciam, por fim, Deputados e Senadores, com saldo negativo de 57% (Anexo V).

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Congresso Nacional, por quaisquer dos critérios pelos quais seja avaliado, à exceção da produtividade e do número de seus integrantes, é hoje a segunda maior instituição legislativa entre todas as existentes, abaixo apenas do Congresso dos Estados Unidos. Somos o único Parlamento do mundo que conta com duas emissoras de televisão, duas de rádio, dois jornais diários, pelo menos uma agência de notícias e duas gráficas. Segundo dados que têm como fonte as Secretarias da Câmara e do Senado, publicados no jornal Folha de S.Paulo , em sua edição de 19 de maio, estão a nosso serviço 20.320 funcionários, não incluídos aí os terceirizados e os estagiários. Tudo isso tem sido feito em nome da transparência que, além de elogiável, é um princípio essencial à democracia.

Mas nunca nos preocupamos em acompanhar como o povo brasileiro nos avalia ao longo de cada Legislatura. Isso não quer dizer que os brasileiros têm uma visão distorcida do Congresso Nacional. Pesquisas como as do Datafolha relativas ao período de 93 a 95 mostram ter variado de 62% para 56% a proporção dos que julgam o Congresso uma instituição necessária ao País, enquanto os que o entendem desnecessário evoluiu, no mesmo período, de 29% para 38%. Em compensação, em apenas um ano, entre dezembro de 94 e igual mês de 95, o índice dos que tiveram de nós avaliação positiva (ótimo e bom) caiu de 48% para 18%.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - V. Exª me permite um aparte, nobre Deputado..., nobre Senador Geraldo Mesquita?

O SR. GERALDO MESQUISTA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Com muito prazer, Senador Marco Maciel.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - As palavras de V.Exª refletem a crise de representação que vive o mundo - e, por que não dizer, diante desse quadro, o próprio Brasil - e, de outra forma, também mostra, cada vez mais, a importância de discutirmos as questões institucionais brasileiras. Assim fazendo, certamente estaremos concorrendo não só para aperfeiçoar o sistema político, mas, de modo particular, estaremos concorrendo, sobretudo, para melhorar o conceito não somente dos partidos políticos, mas da chamada classe política. V. Exª inclusive citou estatísticas que se repetem ao longo dos anos e que bem retratam esse quadro. Acredito que o País avançou muito nesses últimos anos, em vários campos, inclusive no campo da estabilidade política e no plano da fruição democrática. Avançou também no campo econômico, com sua estabilidade econômica, robusteceu suas instituições sociais. Avançamos muito no plano da integração internacional, em que o Mercosul, a meu ver, pode ser considerado um paradigma. Mas ainda há muito o que fazer, principalmente nesse campo pouco tangível, pouco visível, mas indispensável para o aperfeiçoamento institucional do País, porque isso, de alguma forma, afeta - tenho insistido muito nisso, quase que monotematicamente - nossa imagem no exterior. Não vejo, portanto, outro caminho a não ser fazermos as chamadas reformas políticas. Alguém poderá dizer, como já se disse no passado e tem-se repetido atualmente também, que há muitas reformas que precisam ser feitas e que reclamam de deliberação do Congresso.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Senador Marco Maciel, peço a V. Exª para avançarmos na obediência do Regimento. O orador já ultrapassou 11 minutos e 30 segundos do seu tempo. Há 26 Senadores inscritos e mais três, cujas palavras já foram cassadas, porque dois já utilizaram a palavra para fazerem uma comunicação inadiável.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Pois não, Sr. Presidente. Concluo o que estava dizendo, chamando a atenção para que, independentemente dessas reformas, tão reclamadas e que podem e devem ser feitas, discutamos e avancemos também no campo das reformas políticas, porque muitas das quais podem ser resolvidas por lei complementar ou lei ordinária, prescindindo, portanto, de quorum qualificado. Cumprimento o discurso de V. Exª, que guarda, perdoe o neologismo, completeza e transmite, a meu ver, uma observação sobre a qual devemos meditar, justamente porque nos diz respeito mais diretamente, que é o problema político brasileiro.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Senador Marco Maciel, eu gostaria de agradecer a sua participação na discussão e análise desse tema tão importante e que diz respeito a todos nós.

Concluindo, Sr. Presidente, eu diria ainda que, em compensação...

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Senador, quando me dirigi a V. Exª, chamei-o de Deputado porque fui colega de seu pai, quando Deputado Federal. Hoje, tenho a satisfação de ser colega seu no Senado Federal.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Fique à vontade, Senador.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Geraldo, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Pois não, Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Em que pese a preocupação da Mesa com o tempo...

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Com licença, V. Exª está fora do tempo. Vamos encerrar aqui, assim eu passo a palavra ao orador seguinte.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Senador, só mais um minuto.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Não. Já foram concedidos 13 minutos e 40 segundos.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Senador, esta Casa é sempre complacente com os pronunciamentos.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Estamos querendo ser complacentes e respeitar os outros. Há 26 oradores inscritos. Três oradores que fariam uma comunicação inadiável já tiveram cassadas as palavras pelos Líderes. Também vou exigir que os Líderes só utilizem a palavra para comunicação de interesse partidário; caso contrário, seus pronunciamentos também serão cassados.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Senador Sibá, V. Exª tem o aparte.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Geraldo Mesquita Júnior, neste pouco tempo, quero, em primeiro lugar, dizer que V. Exª se reporta aqui a uma parte da História do Brasil sobre a qual não podemos nunca ter vergonha de comentar, para que possamos tirar as lições devidas e nos assegurar de que aquilo jamais se deve repetir e reproduzir no futuro do nosso País. Quero aqui parabenizá-lo por esse brilhante pronunciamento. Gostaria que o seu discurso fosse reproduzido para que pudéssemos distribuí-lo, na íntegra, nas escolas de primeiro e segundo graus de todo o Brasil. Parabéns, Senador!

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (Bloco/PSB - AC) - Obrigado, companheiro Sibá Machado.

Sr. Presidente, concluindo, eu diria ainda que, em compensação, em apenas um ano, entre dezembro de 94 e igual mês de 95, o índice dos que nos avaliaram positivamente caiu de 48 para 18%, enquanto a avaliação negativa (ruim e péssimo) subiu de 12 para 27,5%. (Anexo VII)

Este é apenas um breve diagnóstico. Meu propósito não é o de apontar defeitos ou deficiências da instituição a que pertencemos, mas, ao contrário, mostrar sinais e indícios que devem merecer nossa atenção e alertar-nos quanto ao nosso próprio desempenho. Nós, que nos habituamos à crítica sistemática, metódica e continuada, temos o dever de ocupar-nos também da autocrítica, como fizeram as gerações que nos antecederam, deixando o testemunho de nossa preocupação em aprimorarmos nosso trabalho e aperfeiçoarmos nosso desempenho.

Encerro, Sr. Presidente, comprometendo-me a voltar ao assunto em dois discursos que pretendo proferir brevemente, para analisar a produção legislativa do Congresso, a sistemática do nosso trabalho e as estruturas que, em minha opinião, podem ser postas a serviço da causa nacional, que deve ser a razão de nossa própria existência.

Muito obrigado.

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR GERALDO MESQUITA JÚNIOR EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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     ANEXO I

     PARTICIPAÇÃO DOS ELEITORES NAS VOTAÇÕES PARA A CÃMARA DOS DEPUTADOS

     1945-1998

     
Eleições

Anos

Comparecimento

(A)

Votos nos candidatos

(B)

Não votaram nos candidatos (C)
Absoluto % Absoluto % (B/A) Absoluto %
1945 6.168.695 100% 5.971.334 96,80 197.361 3,19
1950 8.234.538 100% 7.655.978 92,97 578.560 7,02
1954 9.979.818 100% 9.225.519 92,44 754.299 7,56
1958 12.673.370 100% 11.513.532 90,85 1.159.838 9,15
1962 14.742.565 100% 12.127.617 82,26 2.614.948 17,74
1966 17.285.555 100% 13.647.108 78,95 3.638.447 21,05
1970 22.435.521 100% 15.645.741 69,74 6.789.780 30,26
1974 28.981.015 100% 22.820.958 78,74 6.160.057 21,25
1978 37.627.823 100% 29.853.967 79,34 7.773.856 20,66
1982 48.481.170 100% 41.136.027 84,85 7.345.143 15,15
1986 65.823.511 100% 47.310.099 71,87 18.513.412 28,12
1990 71.934.739 100% 40.837.502 56,77 31.097.237 43,23
1994 77.660.795 100% 45.694.172 58,84 31.966.623 41,16
1998 83.282.476 100% 66.000.077 79,25 17.282.399 20,75

Fonte: TSE e Monitor Público, Rio de Janeiro, Conjunto Universitário Cândido Mendes, N° 8, Jan/Mar, 1996, Encarte 1. Participação eleitoral no Brasil - 1945/1994 (Câmara dos Deputados e Assembléias Legislativas)

 

ANEXO II

CRENÇA NA DEMOCRACIA

1995-2001

A democracia é preferível a qualquer outra forma de governo Em determinadas circunstâncias, um governo autoritário é preferível à democracia

Paises

1995 1996 1997 1998 2000 2001 1995 1996 1997 1998 2000 2001
Argentina 76 71 75 73 71 58 11 15 15 16 16 21
Bolívia Nc 64 66 55 62 54 Nc 17 16 22 13 17
Brasil 41 50 50 48 39 30 21 24 19 18 24 18
Chile 52 54 61 53 57 45 Nc 19 16 16 19 19
Colômbia Nc 60 69 55 50 36 Nc 20 13 17 23 16
Costa Rica Nc 80 83 69 83 71 Nc 7 9 21 6 8
Equador Nc 52 41 57 54 40 Nc 18 23 19 17 23

El Salvador

Nc 56 66 79 63 25 Nc 12 15 10 10 10
Guatemala Nc 51 48 54 45 33 Nc 21 26 29 21 21
Honduras Nc 42 63 57 64 57 Nc 14 17 9 15 8
México 49 53 52 51 45 46 15 23 31 28 34 35
Nicarágua Nc 59 68 72 64 43 Nc 14 19 9 6 22
Panamá Nc 75 71 71 62 34 Nc 10 10 8 18 23
Paraguai 52 59 44 51 48 35 20 26 42 36 39 43
Peru 52 63 60 63 64 62 23 13 16 12 13 12
Uruguai 80 80 86 80 84 79 8 9 2 9 9 10
Venezuela 60 62 64 60 61 57 21 19 17 25 24 20

Fonte: The Economist, 26/7/2001

ANEXO III

CONFIANÇA NAS INSTITUIÇÕES NA AMÉRICA LATINA

INSTITUIÇÕES % DOS QUE CONFIAM
IGREJA 85%
TELEVISÃO 44%
FORÇAS ARMADAS 29%
PRESIDENTE 23%
POLÍCIA 23%
JUDICIÁRIO 22%
CONGRESSO 22%
PARTIDOS 20%

Fonte: The Economist, 26/7/2001

ANEXO IV

Avaliação do desempenho de algumas instituições no Brasil

Maio de 1996

Posição Instituição Aprovam Desaprovam
1o Imprensa 72% 9%
2o Igreja católica 72% 12%
3o Forças Armadas 66% 24%
4o Universidade Pública 62% 15%
5o MST 59% 24%
6o Polícia Federal 56% 23%
7o Polícia Militar 49% 30%
8o Polícia Civil 47% 30%
9o CUT 45% 30%
10o Fed. Indústrias 37% 24%
11o Câmara Municipal 33% 38%
12o Congresso Nacional 27% 44%
13o Igreja Universal 17% 69%

Fonte: Vox Populi. Jornal do Brasil, 26/5/96

 

ANEXO V

Avaliação sobre contribuição ao país

Quem contribui para o país?
Instituições Mais contribuem Menos contribuem Saldo
Pequenos empresários 71% 18% 53%
Publicidade/Propaganda 60% 20% 40%
Rádio/TV/Jornal/Revista 58% 20% 38%
Igreja Católica 45% 34% 14%
Forças Armadas 42% 36% 6%
Empresários 38% 43% -5%
Prefeituras 36% 42% -6%
Governo Federal 33% 46% -13%
Governos Estaduais 33% 47% -14%
Igrejas Evangélicas 32% 48% -16%
MST 27% 55% -28%
Banqueiros 25% 57% -32%
Deputados e Senadores 14% 71% -57%

Fonte: Propeg. Jornal do Brasil, 29/3/98

ANEXO VI

Opinião sobre a necessidade do Congresso Nacional

Mar/93 a Set/95

Afirmação Mar/93 Dez/93 Set/94 Set/95
O país precisa do Congresso 62% 50% 57% 56%
Poderíamos bem passar sem ele 29% 43% 32% 38%
Não sabe 8% 6% 7% 5%
Outras respostas - 1% 4% 1%

Fonte: Datafolha. Folha de São Paulo, 8/10/95

ANEXO VII

Avaliação sobre o desempenho do Congresso

Período Ótimo/bom Regular Ruim/péssimo Não sabe
12 a 14/12/94 42 34 12 12
26 e 27/01/95 34 38 15 13
21 a 23/03/95 31 36 23 9
18/09/95 22 40 28 11
12 a 15/12/95 19 42 28 11
11 a 13/12/96 21 45 26 8
5 e 6/05/97 17 44 31 8
18 a 20/06/97 18 43 30 9
15 a 17/12/97 16 43 32 9

Fonte: Datfolha. Entrevista com 13.437 pessoas em todos os Estados e no DF. Folha de São Paulo, 4/1/98


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/05/2003 - Página 13538