Discurso durante a 67ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Situação das crianças e dos adolescentes. Lançamento, ontem, do livro "Esmeralda - Por que não dancei", que retrata a história de Esmeralda Ortiz. Trabalho a ser desenvolvido pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do abuso e da exploração sexual. Limitação do poder das agências reguladoras.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Situação das crianças e dos adolescentes. Lançamento, ontem, do livro "Esmeralda - Por que não dancei", que retrata a história de Esmeralda Ortiz. Trabalho a ser desenvolvido pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do abuso e da exploração sexual. Limitação do poder das agências reguladoras.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2003 - Página 13854
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, ESPECIFICAÇÃO, VICIADO EM DROGAS, VITIMA, MAUS-TRATOS, VIOLENCIA, ABANDONO, EXPLORAÇÃO SEXUAL.
  • REGISTRO, LANÇAMENTO, LIVRO, REFERENCIA, MAUS-TRATOS, CRIANÇA, ADOLESCENTE, AUTORIA, ESMERALDA ORTIZ, ESCRITOR, RECOMENDAÇÃO, ORADOR, LEITURA, SENADOR.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, AUTORIA, MEDICO, SOLICITAÇÃO, GARANTIA, QUALIDADE, ASSISTENCIA MEDICA, CRIANÇA, ADOLESCENTE.
  • LEITURA, DEPOIMENTO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, VITIMA, ESTUPRO, EXPLORAÇÃO SEXUAL.
  • REGISTRO, PROXIMIDADE, INICIO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, ANALISE, SITUAÇÃO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, INFANCIA, ADOLESCENCIA.
  • QUESTIONAMENTO, LEGITIMIDADE, ATUAÇÃO, AGENCIA, ORGÃO REGULADOR, EXCESSO, AUTONOMIA ADMINISTRATIVA, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, DEBATE, SENADO, ATUAÇÃO, ORGÃO REGULADOR, SERVIÇOS PUBLICOS.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vamos tratar de dois assuntos. Um é sobre as agências reguladoras, uma questão que nos preocupa muito. O outro é sobre a criança e o adolescente, aproveitando o lançamento do livro Esmeralda - Por que não Dancei, de autoria de Esmeralda Ortiz, leitura obrigatória para todos os brasileiros que têm consciência do problema da criança e do adolescente.

Hoje, grande parcela das nossas crianças e dos nossos adolescentes vivem problemas gravíssimos, como abandono, drogas, desajustes.

Esmeralda retrata a realidade desta situação com uma seriedade muito grande. Ontem, no lançamento do livro, vi e ouvi o depoimento de Esmeralda. Em determinado momento, ela disse que a situação da criança e do adolescente que vive nas ruas de nosso País não é difícil de ser resolvida, mas também não pode ser resolvida num passe de mágica. É preciso muitas determinações políticas, ações convergentes para que o problema seja superado, mesmo que seja um processo moroso.

Ontem, pela manhã, na Comissão de Assuntos Econômicos, sob a Presidência da Senadora Lúcia Vânia, foi realizada uma audiência pública com a presença do Ministro Jaques Wagner e do jornalista Gilberto Dimenstein. O Ministro defendeu, com muita competência e compromisso político, o programa Primeiro Emprego, mas também ficou evidenciado que precisamos de políticas sérias para superarmos o problema. O jornalista Gilberto Dimenstein afirmou que, em muitos casos, crianças e jovens vão morar nas ruas não pela pobreza, mas por desajustes dentro da família, por ataques que sofrem dentro de casa.

Ainda com referência a essa questão, quero lembrar que começou ontem e continua hoje um grande encontro nacional de entidades organizadas da área médica no País, em Brasília, com a presença de cerca de 800 profissionais. Gostaria de registrar que recebi um documento do Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Dr. Lincoln Freire, que solicita a garantia de um atendimento de qualidade a crianças e adolescentes. Como é um texto razoavelmente longo e não terei tempo para lê-lo, peço o seu registro nos Anais do Senado Federal.

Há uma série de problemas que temos que resolver com relação a nossas crianças e adolescentes - saúde, falta de condições econômicas, abandono, questões que envolvem a família.

Tenho aqui oito depoimentos, mas lerei apenas quatro, que demonstram que a dignidade das nossas crianças e dos nossos adolescentes é criminosamente atacada dentro de suas próprias casas. “O mais silencioso dos crimes acontece dentro de casa, condena as vítimas a uma dor sem descanso, destrói laços afetivos, desrespeita a dignidade da criança e mantém o criminoso protegido pelos que sempre calam. A mais despudorada das violências costuma ser mantida em segredo e é disso que ela sobrevive por muito tempo, às vezes para sempre”.

Pelos depoimentos que temos ouvido, eu atribuo a maior relevância à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI da exploração sexual, que deverá ser instalada nos próximos dias. Sua criação foi solicitada pela Senadora Patrícia Gomes, por mim, pela Deputada Maria do Socorro, e já temos o número necessário de assinaturas para instalá-la, uma vez que ela já foi aprovada pelo Congresso. Essa CPMI terá condições de analisar o material de inúmeras entidades que, através dos tempos, vêm pesquisando a exploração sexual da criança e adolescente, como também de ouvir depoimentos, como alguns que lerei posteriormente. Assim, uma série de ações deverão ser estudadas e discutidas para que esta situação se modifique, Senador Paulo Paim.

É muito grave, é muito grave mesmo, e eu dizia no começo da minha fala que todo o Brasil que conhece a realidade grave das crianças e dos adolescentes abandonados ou semi-abandonados, por um motivo ou outro, que são inúmeros no Brasil, em especial, nós, políticos, temos a obrigação de ler Esmeralda - por que não dancei, que foi o livro lançado ontem.

Tenho em mãos e gostaria de ler pelo menos quatro pequenos depoimentos sobre o mais silencioso dos crimes, que é o que acontece dentro de casa:

Fernanda, aos 12 anos, começou a ser violentada pelo padrasto. A mãe, depois de um tempo, também participava do abuso. A única coisa que Fernanda tem hoje são os pesadelos do passado e a vontade de dar certo na vida.

Rodrigo foi estuprado pelo tio-bisavô, aos 10 anos. Aos 20 anos, questiona se é homossexual por causa do abuso sofrido.

Estou lendo apenas pequenos trechos desses depoimentos.

Dos 2 aos 9 anos, Andréia foi abusada pelo pai. Aos 15 anos, adora filmes infantis e só brinca de bonecas. Gosta de estudar e sonha ser cientista. Sabe que, para o seu sucesso, terá que guardar a violência sofrida como segredo.

Henrique foi violentado quando tinha 6 anos. Aos 28 anos, abusou sexualmente da enteada de 6 anos. Teve a chance de se tratar.

E, aqui, há outros depoimentos, talvez de maior gravidade ainda.

A situação é grave, é séria, e nós, da Frente Parlamentar de Defesa da Criança e do Adolescente, e membros da CPMI do Abuso e da Exploração Sexual, Senadores e Senadoras, precisamos realmente encarar esse problema. Acredito que a instalação desta CPMI irá fazer com que nós, políticos, do Congresso Nacional, e o nosso Governo, do Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, tenhamos condições de ter um retrato mais claro da situação e, com certeza, a possibilidade de delinear ações mais concretas e dentro da realidade para a superação desse problema tão grave.

Deixo mais uma vez a recomendação de que leiam o livro Esmeralda - Por que não dancei, um retrato dessa realidade brasileira.

Passo agora a outro assunto, que, aliás, já foi abordado por um dos Senadores que nos antecedeu hoje: as agências reguladoras em nosso País. Tenho aqui um discurso entremeado de citações do Dr. Luís Roberto Barroso, Professor Titular de Direito Constitucional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Mestre pela Universidade Yale, membro do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em que faz observações muito claras a respeito dos limites do poder das agências reguladoras.

Infelizmente, o tempo urge, tenho apenas sete minutos. Mas vou tentar fazer alguns comentários a respeito das agências reguladoras.

As agências reguladoras são autarquias especiais, que desempenham funções administrativas, normativas e decisórias, dentro de um espaço de competências que lhes é atribuído por lei. No exercício de suas atribuições, cabem às agências encargos de grande relevância, como zelar pelo cumprimento dos contratos de concessão, fomentar a competitividade no setor, induzir à universalização dos serviços, definir tarifas e arbitrar conflitos entre o poder concedente, os concessionários e os usuários. O desempenho de tarefas dessa natureza e alcance exige que as agências sejam dotadas de autonomia político-administrativa - seus dirigentes são nomeados pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, por um mandato de prazo certo - e de autonomia econômico-financeira, materializada na arrecadação de recursos próprios suficientes, sem dependência do orçamento geral.

Chega-se aqui à questão central que vinha sendo negligenciada: o surgimento de centros de poder como o das agências reguladoras - cujas características são a não-eletividade de seus dirigentes, a natureza técnica das funções desempenhadas e sua autonomia em relação aos Poderes tradicionais - exige uma discussão acerca da legitimidade política com que desempenham aquelas competências. Curiosamente, esse déficit democrático das agências, conquanto lembrado por muitos autores, teve pouco destaque no debate que envolveu a sua introdução no Direito brasileiro, encoberto pelo entusiasmo do pensamento único que se impôs na matéria. A queixa do Presidente da República acerca do que considerou excesso de poder das agências traz de volta a discussão que ficara inconclusa. A questão é séria, porém simples.

As agências não podem e não devem exercer atribuições fora ou acima dos poderes constitucionais da República. De fato, ao Poder Legislativo cabe elaborar a lei que as institui, definir as competências que irão desempenhar e aprovar os servidores que vão exercer os cargos de direção. Ao Poder Executivo, através do presidente da República, que está investido de mandato popular e é o chefe da Administração Pública, cabe a formulação, juntamente com seus ministros, das políticas públicas a serem implementadas por intermédio das agências. E, por fim, cabe ao Judiciário submeter as decisões das agências aos testes de constitucionalidade e legalidade, notadamente para verificar a observância de princípios fundamentais, como os da moralidade, razoabilidade, isonomia e dignidade da pessoa humana.

Se alguma lei retirar qualquer das competências constitucionais dos poderes do Estado, será inválida e não deverá ser aplicada. Em suma: as agências podem menos do que supõem elas próprias ou do que se supõe sobre elas. Nessa matéria, como em tantas outras, a solução que liberta é o cumprimento da Constituição.

Em um outro momento, voltaremos, com certeza, a discutir essa questão das agências reguladoras.

Acredito que o nosso Presidente da República, quando considerou o excesso de poder das agências, trouxe de volta realmente essa discussão, que, do meu ponto de vista, está inconclusa. Como eu já disse, trata-se de uma questão séria, porém simples. Não estão essas agências acima dos poderes estabelecidos.

Gostaríamos de retomar, Sr. Presidente, Senador Valdir Raupp, esse assunto em um outro momento, em que realmente pudéssemos entabular a discussão sobre a questão das agências reguladoras com os Srs. Senadores, de um modo geral, em uma audiência pública ou mesmo durante uma sessão ordinária. Mas essa discussão precisa ser aprofundada, pois o limite das agências reguladoras é um problema sério e que deve ser tratado e cuidado pelo Senado da República.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE A SRª SENADORA SERYS SLHESSARENKO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2003 - Página 13854