Discurso durante a 69ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de manutenção do voto obrigatório. (como Lider)

Autor
Leonel Pavan (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Leonel Arcangelo Pavan
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Defesa de manutenção do voto obrigatório. (como Lider)
Aparteantes
Marco Maciel.
Publicação
Publicação no DSF de 04/06/2003 - Página 14204
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • REGISTRO, DEBATE, SENADO, VOTO FACULTATIVO, JUSTIFICAÇÃO, OPINIÃO, ORADOR, DEFESA, OBRIGATORIEDADE, VOTO, PARTE, DIREITOS, DEVERES, CIDADANIA, CONSOLIDAÇÃO, LEGITIMIDADE, DEMOCRACIA, HISTORIA, BRASIL, INSTRUMENTO, INCLUSÃO, POPULAÇÃO CARENTE.

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos discutido nos últimos dias - provavelmente ainda o faremos amanhã - o voto facultativo, e eu quero trazer a minha posição e deixá-la registrada nos Anais desta Casa.

O fim do voto obrigatório é uma das propostas para uma eventual reforma política. O tema, entretanto, tem sido tratado com bastante superficialidade. Muitos, apressadamente, concluíram que eliminar a obrigatoriedade do voto é essencial para a melhoria do sistema político brasileiro.

A verdade, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é outra. Se analisarmos o tema com mais calma e atenção, chegaremos à inevitável conclusão de que o voto obrigatório, mais do que importante, é essencial para a democracia brasileira.

Como observou muito corretamente o filósofo Renato Janine Ribeiro, “o voto, na democracia, não é apenas um direito, mas também uma obrigação”.

Viver em um Estado democrático não significa apenas um conjunto de direitos; viver em um Estado democrático significa que a pessoa, para ser cidadã, deve cumprir uma série de deveres, tais como pagar impostos, prestar o serviço militar e votar. O voto, pois, não é apenas um direito concedido ao cidadão; o voto é um dever que o cidadão deve obrigatoriamente cumprir, para garantir a existência e a continuidade da vida democrática. A democracia, portanto, para continuar a existir, depende fundamentalmente da participação de cada eleitor. Se isso não acontece, a democracia estará, cedo ou tarde, condenada a desaparecer ou a tornar-se farsa da pior espécie.

O voto, então, reflete o momento em que a pessoa é capaz de perceber-se como cidadã e participante ativa do processo democrático.

Tornar o voto facultativo significaria alijar o homem comum do processo eleitoral e, conseqüentemente, torná-lo cidadão de segunda categoria. Pesquisas mostram que, em todos os países em que o voto não é obrigatório - como por exemplo, nos Estados Unidos -, os votantes, em sua maioria, são os mais ricos e escolarizados, porque são aqueles que têm mais tempo para se ocupar da vida pública. Assim, o pobre, ao não enviar para o Legislativo e para o Executivo seus representantes, torna-se ainda mais excluído da vida pública. Cria-se um terrível e inevitável círculo vicioso.

Além disso, como pode haver um pequeno número de eleitores participando das eleições, o resultado dessas pode ser mais facilmente contestado. Exemplo disso foi o que ocorreu na última eleição presidencial francesa, quando um candidato radical foi para o 2º turno da eleição apenas e unicamente em razão da abstenção de milhões de eleitores. O exemplo, Sr. Presidente, não é de uma democracia incipiente, mas daquela que é considerada como uma das mais avançadas do planeta.

Muitos se esquecem, também, da função civilizatória do voto obrigatório em nosso País. Quando instituído, em 1934, colaborou decisivamente para diminuir o poder das máquinas eleitorais, em especial nas localidades mais isoladas do território nacional.

Decidir que o voto deva ser facultativo é reavivar essas máquinas eleitorais e ressuscitar o voto de cabresto. A tarefa de convencer o eleitor a votar levará, sem sombra de dúvida, ao encarecimento das campanhas eleitorais e ao uso das mais condenáveis práticas de aliciamento de eleitores. Apenas aqueles que forem amparados por grandes grupos econômicos e financeiros poderão participar, com chance de sucesso, das eleições.

O fim da obrigatoriedade do voto traria, inevitavelmente, efeitos nefastos para a democracia brasileira. Devemos deixar de lado o espírito colonizado e de achar que aquilo que existe em países estrangeiros é o melhor. Nós, brasileiros, temos que encontrar as nossas próprias soluções para os nossos problemas e não importar levianamente idéias estrangeiras.

Convido todos a olhar para nossa própria História. Essa nos diz que o voto obrigatório teve papel decisivo para a consolidação das nossas instituições democráticas. Além de tornar inquestionável a legitimidade dos eleitos, transformou milhões de pessoas em cidadãs. Essas, mesmo que não seja da maneira ideal, são levadas a se interessarem pelo processo eleitoral e a se informarem sobre os candidatos a um cargo público.

Sr. Presidente, se analisarmos com profundidade e atenção o voto obrigatório, chegaremos à inevitável conclusão de que tal instituto fez muito pela nossa vida política. Extingui-lo seria medida irresponsável para com milhões e milhões de brasileiros e significaria retirar um dos alicerces da nossa democracia.

Sr. Presidente, eu queria finalizar este meu pronunciamento, dizendo da minha preocupação. Vilas, bairros carentes, distantes, certamente seriam avaliados pelo Poder Público de acordo com o número de votantes. Se aprovarmos o voto facultativo, e de repente uma vila distante resolver não votar, fico imaginando o que alguns homens públicos fariam com tal vila, ao descobrirem que lá ninguém vota. Iriam relegá-la a um ostracismo ainda maior.

O Sr Marco Maciel (PFL - PE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC) - Concedo um aparte a V. Exª, nobre Senador Marco Maciel.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Meu caro Senador, gostaria de iniciar minhas palavras, cumprimentando-o pelo discurso que profere na tarde de hoje em favor da manutenção do voto obrigatório, isto é, no sentido de não acolhermos emendas tendentes a estabelecer no País o voto facultativo. Concordo com os argumentos que V. Exª está brandindo em seu discurso, mas faço uma observação que V. Exª salienta agora, com muita propriedade. Corremos o risco de, com o voto facultativo, aumentarmos a exclusão social. Isso ocorre não somente porque os eleitores residentes nas áreas periféricas serão menos atendidos. Além disso, os próprios candidatos não terão muito interesse em se inteirar dos problemas que lhes afetam, sobretudo daqueles das regiões mais problemáticas, num País muito grande e que se caracteriza por uma enorme diversidade de renda entre as diferentes regiões. Por isso congratulo-me com V. Exª. A sua contribuição é muito boa, posto que se trata de uma fala de alguém que, tendo sido prefeito de sua terra, conhece bem os problemas a partir da base política de cada comunidade. Sempre tenho presente que o município é a primeira célula da organização política, assim como a família é a primeira célula da organização social. Portanto, creio que quem foi prefeito, como foi o caso de V. Exª, de uma cidade importante do seu Estado, Santa Catarina, certamente pode bem avaliar os riscos e o retrocesso que representaria a aprovação de uma emenda desse porte. Muito obrigado a V. Exª. 

O SR. LEONEL PAVAN (PSDB - SC) - Agradeço o aparte, Senador Marco Maciel. As suas palavras mostram que certamente aquilo que aqui defendemos e diversos outros Senadores também irão defender, ajudará na manutenção do voto obrigatório.

Sr. Presidente, criar o voto facultativo seria alijar do processo democrático as pessoas mais humildes, seria fortalecer os grandes grupos econômicos, as grandes empresas, que passariam a dominar mais de perto o seu voto de cabresto. Talvez não houvesse mais campanha para que as pessoas votassem, mas, sim, campanha para não ir votar em determinados candidatos. Se o eleitor não votasse no candidato deles, forçariam a não votar no outro. Isso seria, talvez, o fim de um processo democrático que conseguimos com tanta luta no País.

Essas são minhas palavras em defesa daqueles que querem participar em igualdade -- pobre e rico -- das decisões e das melhorias do País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/2003 - Página 14204