Pronunciamento de Demóstenes Torres em 05/06/2003
Discurso durante a 71ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Registro da reportagem "Eu sofri ameaças", concedida pelo Desembargador José Lenar de Melo Bandeira aos jornalistas Euler Belém e Patrícia Moraes, publicada no jornal Opção.
- Autor
- Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
- Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
JUDICIARIO.:
- Registro da reportagem "Eu sofri ameaças", concedida pelo Desembargador José Lenar de Melo Bandeira aos jornalistas Euler Belém e Patrícia Moraes, publicada no jornal Opção.
- Publicação
- Publicação no DSF de 06/06/2003 - Página 14457
- Assunto
- Outros > JUDICIARIO.
- Indexação
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- TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ENTREVISTA, JOSE LENAR DE MELO BANDEIRA, DESEMBARGADOR, REJEIÇÃO, POSSE, PRESIDENCIA, TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL (TRE), ESTADO DE GOIAS (GO), SUSPEIÇÃO, REPRESALIA, DECISÃO, COMBATE, NEPOTISMO, JUDICIARIO, CUMPRIMENTO, ORIENTAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU).
O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Sem registro taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passo a ler, para que conste dos Anais, a reportagem "EU SOFRI AMEAÇAS", dos jornalistas Euler Belém e Patrícia Morais, publicado na edição dos dias 1° a 7 de junho./2003, no Jornal Opção, que, por sua pertinência, merece registro nesta Casa do Congresso Nacional.
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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR DEMÓSTENES TORRES EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido na forma do disposto no art. 210 do Regimento Interno.)
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José Lenar de Melo Bandeira |
TRE faz duas eleições para legitimar novo presidente. Mesmo assim, a desconfiança gerada continuará para todos que ficam à margem das decisões internas da Justiça Euler Belém e Patrícia Moraes Na quinta-feira, 29, uma semana depois de ser preterido do cargo de presidente do Tribunal Regional Eleitoral, o desembargador José Lenar de Melo Bandeira concedeu entrevista exclusiva para o Jornal Opção em sua casa, no Setor Oeste. Minutos depois da conclusão da segunda reunião do tribunal em que ficou determinado como presidente o desembargador Paulo Maria Teles, José Lenar contou com tranqüilidade todos os detalhes da eleição mais atípica do TRE -- a única que não seguiu a tradição de nomear como presidente o desembargador mais antigo. Convites distribuídos e cerimonial definido -- tudo estava preparado para a festa de posse do desembargador José Lenar. Até que na noite anterior, quarta-feira, 21, depois de uma reunião secreta e “viciada”, desembargadores quebraram as regras nomeando o desembargador Paulo Teles presidente e José Lenar, vice-presidente e corregedor. Razão: leia a seguir o que nem mesmo o desembargador destituído conseguiu entender. Se a decisão de demitir todos os funcionários comissionados parentes de juízes é correta e uma decisão do Tribunal de Contas da União, por que então preteri-lo do cargo de presidente do TRE de Goiás? O que, detalhadamente, aconteceu na eleição do TRE, na qual o sr. foi preterido do cargo de presidente? O Tribunal de Justiça indica dois desembargadores para compor o Tribunal Regional Eleitoral. Um como presidente e o outro como vice-presidente e corregedor. Normalmente, o mais velho do Tribunal de Justiça é nomeado presidente e, o outro, vice. Esta é uma atitude histórica que sempre se respeitou, tanto que os convites para minha posse foram enviados. Tudo mudou quando resolvi enviar uma carta para todos os membros do TRE manifestando minha preocupação com a decisão do Tribunal de Contas da União em relação aos cargos comissionados envolvendo parentes de juízes. Na carta digo que pretendia cumprir a decisão do TCU. A partir disso, ocorreu o conhecido e dramático desencontro -- pelo menos para mim. Na noite anterior à minha posse, o Tribunal Eleitoral se reuniu e inverteu a ordem dos cargos, passei para vice e o desembargador Paulo Teles para presidente, quebrando-se, por conseguinte, uma tradição da casa. Quem estava nessa reunião? Estavam os dois desembargadores do Tribunal Eleitoral. O presidente, Roldão Oliveira, e o vice-presidente e corregedor, Arivaldo da Silva Chaves. Ambos votaram contra minha nomeação, por razões que desconheço. Além deles, votaram mais três. No total foram cinco votos contra dois. A juíza federal Ionilda Maria Carneiro Pires e Alan Conceição, juiz estadual membro do Tribunal, foram os que votaram a meu favor. Depois que soube da decisão, disse que não iria à posse, porque me sentia constrangido, humilhado. Aconselhei-me com familiares, amigos e resolvi tomar posse para legitimar minha atuação, ou seja, eu iria contestar aquela eleição fraudada, viciada judicialmente. Antes de prestar o juramento, pedi para constar no termo de posse a minha decisão, assinei e me retirei. Quando deixei a reunião de posse, fui aplaudido por todos presentes. Quais providências o sr. pretendia tomar? Já estava arregimentando documentação para entrar com um mandado de segurança. O procurador da República entrou com recurso pedindo anulação da eleição que, a seu entender, era viciada, porque participaram dois desembargadores que estavam deixando o cargo e elegeram dois que nem haviam tomado posse como membros do Tribunal Regional Eleitoral. Além do golpe que aplicaram contra quem deveria ser o presidente: eu. Por que decidiram fazer uma segunda eleição? Hoje, quinta-feira, 29 de maio, o Tribunal Eleitoral, reconhecendo que a eleição era viciada, anulou-a e decidiu fazer uma nova, presidida pela juíza federal Ionilda Carneiro. Nessa segunda eleição, persistiu a decisão anterior, com a diferença de que contou com a minha presença e a do desembargador Paulo Maria Teles. O resultado foi 4 a 3. A meu favor votaram Ionilda Carneiro, Alan Conceição e eu. O questionamento sobre a eleição no TRE cessou porque se reconheceu a ilegalidade cometida. Em qual sentido a primeira eleição foi viciada? Foi viciada porque participaram dois membros que não podiam votar, os desembargadores Roldão Oliveira e Arivaldo da Silva Chaves. Eles não podiam eleger os novos dirigentes do Tribunal Regional Eleitoral. Além disso, o desembargador Paulo Maria Teles e eu ainda não éramos membros do Tribunal, não havíamos tomado posse. Mudaram os postos na calada da noite e em uma sessão secreta. E sem nenhuma motivação maior que se soubesse. O objetivo era diminuir minha pessoa, minha dignidade, já que o presidente do Tribunal Eleitoral já havia expedido convites e o cerimonial estava preparado para minha posse. Não havia nenhuma razão para que eu não fosse o presidente do TRE. Imagino que decorre da carta que enviei, por deferência aos meus colegas, informando que iria cumprir a decisão do Tribunal de Contas da União, que estava para ser cumprida desde dezembro. Uma decisão que determina a demissão, dos cargos de comissão, de todos os parentes de desembargadores e juízes. Inclusive minha filha. Não iria assumir o cargo de presidente do TRE desrespeitando a decisão de um órgão de controle externo administrativo. Logo que tomei essa decisão, começou uma aura negativa, pesada, de coação e com cartas apócrifas, deprimentes, ameaçadoras, que não fazem parte do decoro de convivência. Queriam impedir até que eu nomeasse o secretário-geral. Eu iria fazer uma administração voltada para a ética. Não tenho nada contra ninguém, nem mesmo sei os nomes dos funcionários comissionados. O que está escrito nessas cartas? As cartas diziam para eu ter cuidado, porque estava perseguindo pessoas que me ajudaram, estava sendo ingrato, estava colocando pessoas para trabalhar comigo que não mereciam. O sr. chegou a sofrer ameaça de morte? Sugestões. O sr. realmente iria afastar sua filha? Já tinha assinado o ato. O desembargador Paulo Teles estava em minha sala quando estava assinando todos os atos de demissão. Foi quando soubemos da jogada que estavam fazendo. Tribunais regionais de outros Estados também receberam a mesma decisão do Tribunal de Contas da União? Sim. Mato Grosso do Sul, Paraíba, Espírito Santo, Acre e, recentemente, Ceará. Apesar de o sr. não ser presidente, acabou saindo vitorioso, não? O que não aceitava era a impostura, a falta de ética, o desrespeito. Do ponto de vista moral e legal, saí vitorioso. Agora, a partir do momento em que os acontecimentos tomaram o caminho da ética, da sensatez, aceitei com toda tranqüilidade. A segunda reunião foi pacífica? Tranqüila. O sr. é inimigo de algum dos desembargadores? Não, são todos meus amigos. O sr. enviou a carta na quarta-feira, 21, e na quinta- feira, 22, foi destituído do cargo. Nesse período não houve nenhuma tentativa de negociação? Não, a negociação é possível até certo ponto. A partir do momento que praticaram um ato desse contra mim, não há negociação. Recebi telefonemas e cartas de solidariedade de todo o Brasil. Fui à feira no sábado, 23, e não consegui entrar, o povo estava feliz com meu gesto de dignidade. Qual foi a primeira reação do sr. quando soube que havia sido preterido do cargo? Minha pressão foi para 16 por 10. Fiquei mortificado, aborrecido, magoado. Tenho uma história. Não se pode fazer isso com as pessoas. O sr. poderia fazer um pequeno resumo de sua história profissional? Nasci na cidade de Porto Franco, Maranhão. Até os 18 anos morei em Tocantinópolis, hoje Estado do Tocantins. Cheguei a Goiânia no início de 1962. Trabalhei 10 anos na Loteria do Estado de Goiás, onde fui chefe de vários setores. Cursei história e me formei em direito. Fiz concurso para delegado de polícia e passei em primeiro lugar, em Anápolis. Fui para a assessoria do secretário de Segurança Pública. Fiz concurso para promotor de Justiça, passei em segundo lugar. Fui promotor-corregedor por oito anos no Ministério Público, chefe de gabinete do procurador-geral e procurador-geral substituto. Fiquei no Ministério Público por 22 anos, quando fui indicado para ser desembargador na vaga do quinto constitucional. Fui professor de direito civil e processo civil da Universidade Católica. Hoje, sou somente professor de processo civil. Há 22 anos, leciono na UCG. Fui professor na Academia de Polícia. E advoguei dois anos. Qual a diferença de idade entre o sr. e o desembargador Paulo Teles? Ele é mais novo, deve estar com 54 ou 58 anos. Eu estou com 60 anos. Entrei no Tribunal em junho de 1997 e o desembargador Paulo, depois. Como é o desembargador Paulo Teles? É um rapaz sério, humilde e, infelizmente, foi envolvido nessa situação. Mas é uma pessoa digna. Ele o procurou para conversar? Ele estava em minha sala quando soubemos da decisão. Depois me procurou e estivemos com o presidente para tentar contornar a situação. O ideal seria que nenhum de nós dois assumisse o cargo. Vamos trabalhar juntos, normalmente, porque não podemos colocar nossos interesses pessoais em desfavor do interesse maior, que é o da coletividade. Uma semana depois do ocorrido, qual análise o sr. faz? Só imagino que tudo ocorreu em função de meu comportamento franco, aberto. De não fazer nada às escondidas e ser leal. Com esse argumento, o sr. acaba concordando com o depoimento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que há uma caixa preta no Judiciário. O presidente foi infeliz e exagerado no depoimento em que afirma existir a caixa preta do Judiciário. Diria que há desencontros que precisam ser normalizados. O desembargador Paulo Teles exonerou nove funcionários comissionados que, por influência familiar, conseguiram emprego. Não foi uma atitude para desacreditar o sr.? Pelo contrário, foi para me fortalecer. Admitiu que eu estava certo. O sr. defende o controle externo do Judiciário? Não sou a favor do controle externo, porque basta aceitarmos as decisões dos órgãos. Não podemos aceitar que um estranho queira interferir na decisão de um juiz. Isso seria o maior absurdo que se cometeria nessa República. Um juiz precisa é ter competência para julgar bem, nunca ser controlado por quem quer que seja. Seria o caos. O meu caso é um exemplo do que deveria ser feito. Eu somente pretendia acatar a decisão de um órgão que controla externamente a administração financeira do Tribunal Eleitoral. O Poder Judiciário tem, sim, suas dificuldades e a pior delas é a morosidade, devido à desestruturação dos tribunais. Não o de Goiás, que é um dos melhores do Brasil. Por que várias decisões do Judiciário são tomadas em reuniões sigilosas, que nem mesmo o Ministério Público pode tomar conhecimento? Pela Constituição de 1988, as decisões são abertas, públicas. O que ocorre é que determinados processos exigem certo sigilo para não expor as pessoas envolvidas. Essa é uma atitude para proteger o indivíduo e não o Judiciário. É em função da natureza da causa. Por que o sr. tanto defende esse Judiciário que foi contra sua lealdade? O Tribunal de Justiça não foi contra mim, mas, sim, a maioria dos membros do Tribunal Regional Eleitoral. Há ilegalidade no Tribunal Regional Eleitoral de Goiás? Não, a ilegalidade ocorreu na última eleição, provocada pela minha decisão de cumprir uma ordem do Tribunal de Contas da União. Repito que pretendia exonerar todos os parentes de magistrados com cargos comissionados. Por que os integrantes do Tribunal Regional Eleitoral foram a favor do desembargador Paulo Teles? Talvez por convicção dos dois desembargadores e dos três juízes. Mas essa convicção não posso avaliar, porque a desconheço. Se o nepotismo é ilegal, por que o sr. colocou uma filha para trabalhar no Tribunal Eleitoral? Porque desconhecia a decisão do Tribunal de Contas da União e porque não trabalhava no local. Minha filha recebeu o cargo em novembro de 2002, por meu pedido, e saiu agora. Dentro de alguns anos, o sr. será nomeado presidente do Tribunal de Justiça. Não teme mais uma vez ser destituído? Não. O Tribunal de Justiça é diferente. Lá a convivência é muito harmônica. O que aconteceu foi um episódio esporádico de outro tribunal, não do nosso, que tem tradição. Depois do ocorrido nesta eleição do TRE, o Tribunal Superior Eleitoral não deveria fiscalizá-lo melhor? Já fiscaliza. Mas o que ocorreu comigo foi só um fato de eleição que costumava seguir a tradição, não é uma lei que foi transgredida. A única estranheza é que os convites foram expedidos e que, na última hora, os nomes foram mudados. Não há nada de ilegal, só de mesquinho. O sr. poderia desistir do cargo de vice? Poderia, mas não sou homem de desistir de nada. Por isso cheguei onde estou, sem nunca contar com ajuda de nenhum partido político, somente com minha competência e dedicação. O sr. pretende fazer frente às atitudes do presidente Paulo Teles? Não, vou cuidar do meu trabalho com toda presteza, fiscalizando o que deve ser fiscalizado, sem nenhuma discussão estéril. Tem um escritor chamado Morris West que diz: “Somos aquilo que fazemos, está escrito em nosso rosto para que o mundo leia”. Sou assim, aberto, qualquer um pode ler na minha testa o que fui e sou nesses 40 anos de vida profissional. Não tenho medo de nada, tenho a mente arejada para conduzir meu trabalho como sempre fiz e continuarei fazendo. Não transijo com o crime, com o erro e com a desordem. Não tenho nenhuma mancha na minha vida. Nunca tirei uma licença prêmio na minha vida. Foi a primeira decepção profissional do sr.? Não. A vida tem suas nuances. Depois de uma pancada se sobrevive e acaba-se ficando mais forte, mais temperado para a vida. Mais corajoso e determinado. Hoje, quem não tiver determinação, preparo cultural, não vence na vida. E, também, quem não souber levantar não chega à frente. O sr. é um homem de posses? Minhas propriedades são esta casa que financiei, mas que, hoje, felizmente já está quitada. E uma propriedade que o pai de minha esposa, falecido, deixou para ela. O que fazer para coibir o nepotismo? Na Justiça estadual não existe lei proibindo o nepotismo, mas há na federal, que determina que quem trabalha no Tribunal Eleitoral Federal ou na Justiça Federal não pode ter parente. Essa lei virá com o tempo para todos os Estados. O sr. é a favor do voto facultativo? Sou. Erramos tanto na escolha de nossos líderes que não precisava ninguém votar em quem não quer. O que se precisa é criar consciência para votar. Como o sr. analisa as denúncias de envolvimento de integrantes do Judiciário com o narcotráfico? Sempre existiram denúncias contra o Judiciário, só que, agora, somos o bode expiatório de tudo errado que acontece no Brasil. O Poder Judiciário mexe com muita gente, é um poder que as pessoas somente acreditam quando precisam. Quer queira quer não, o Judiciário é a garantia do cidadão. No dia que o Poder Judiciário estiver desmoralizado, como estão tentando, fazer, a violência vai ficar pior. O Judiciário é a garantia do homem na democracia. Ninguém pode querer destruir o Poder Judiciário em vão, porque estará cometendo um grande erro. Temos que melhorá-lo e não destruí-lo, tornando-o bode expiatório de todos os problemas do país. A Justiça no Brasil é aristocrática, distante da sociedade. Por quê? É um ponto que precisa mudar. A Justiça deve discutir com o povo. Precisamos nos aproximar da sociedade. O juiz é fechado e não discute os problemas que a sociedade gostaria de ouvir. Neste sentido, ela é aristocrática. O desembargador Homero Sabino agiu corretamente ao fazer a Justiça Itinerante? Lógico, tudo o que vier para expandir o alcance da Justiça é bem-vindo. Por que a Asmego não interveio na eleição do TRE de Goiás? A Asmego é a entidade responsável por todos os juízes do Poder Judiciário. Então, deve ficar eqüidistante, neutra em casos como este. Como o sr. tem analisado o aumento da violência no país e em Goiás? Precisamos fazer uma releitura do nosso Código Penal, Processo Penal e Lei de Execução. Preocupar menos com o aumento do superávit fiscal e mais com a segurança, a garantia da população que vive na periferia e com o êxodo rural. A lei permite que advogados entrem com vários recursos em defesa de um criminoso, que acaba não indo para a cadeia. Mas isso não é culpa do Poder Judiciário e, sim, das leis mal elaboradas. Há uma lei de execução criminal que não deixa que a pena do Código Penal seja aplicada, o que acaba dando ao criminoso todas as regalias. A violência precisa, primeiro, ter um tratamento imediato de coação que se faz pelos órgãos de Estado. E, remotamente, combater a conseqüência, que é mais difícil. Nessa fase, é necessário o melhor aparelhamento do Estado. Outro problema é o nosso sistema carcerário, que acabou se tornando escritório dos bandidos. A violência tem muitas causas, mas a primeira é acabar com o excesso de tantos recursos. O direito penal é o código protetor dos bandidos. A culpa da violência não é do Judiciário, mas do Estado inoperante. O Estado precisa ser vigilante, pronto para agir, mas também inteligente, combatendo o crime antes de ele acontecer. O sr. é a favor de programas sociais como a Bolsa Universitária? Sou professor universitário há 20 e poucos anos e vejo a dificuldade dos pais em manter os filhos em uma faculdade particular. Esses programas são salutares e de muita importância. As escolas de direito estão formando mal os alunos? Tenho visto sentenças de juízes muito bem escritas, mas também tenho visto textos de advogados terrivelmente mal escritos. Qual é motivo de os juízes escreverem melhor que os advogados? É falta de informação cultural. Hoje, as pessoas fazem um primário ruim e não têm sedimentação cultural. Não lêem e, com isso, não sabem pensar. Com o computador [a internet] vai piorar ainda mais. Resumindo, falta lógica. As pessoas não têm eixo de argumentação. Hoje, a formação é mais imediata com a exclusiva finalidade de se passar em um concurso. O interesse maior é entrar no mercado. A OAB não deveria ser mais rigorosa com os advogados? Não sei se o caminho seria pela OAB. Mas a verdade é que deveria haver uma melhor seleção antes de jogar o advogado no mercado de trabalho. Os juízes e promotores não estão entrando muito cedo e sem experiência no Ministério Público e no Poder Judiciário? A falta de maturidade e experiência é real. São dois pontos primordiais para o perfeito trabalho de um juiz. O problema também está nas provas que são objetivas. Não existem mais as provas para o indivíduo redigir. O resultado disso é que pessoas com capacidade de decorar passam. Como promotor, qual foi o seu caso mais importante? Como promotor são vários, mas como advogado há um muito interessante. Advoguei para os irmãos Turquinhos, a primeira quadrilha de Goiás. Dos três que formavam a quadrinha, fui advogado só de um deles. Há uma frase de Tobias Barreto que diz: “O direito e a Justiça são necessários para todos e em cada instante. Assim como deve merecer respeito, deve inspirar confiança”. Nunca perdoei estuprador. Fui muito rígido como promotor e sou muito rígido como desembargador. O regime semi-aberto não é um perigo para a sociedade? O Brasil tem uma Lei de Execução Criminal que é uma lástima. Para isso não precisava alterar o Código Penal, bastava alterar a Lei de Execução Criminal, que acabou com a punição no país. Se a sentença determina que a pessoa deve ser punida, ela deve ser cumprida. É preciso acabar com os indultos, com regime semi-aberto e com a mudança da pena. Acaba que a lei não deixa o criminoso ir para a cadeia. O problema não é do juiz que não aplica a lei. O que o sr. mais gosta de ler? Hoje, tenho pouco tempo para minhas leituras, mas já li quase todos os clássicos. Só vim conhecer essas obras quando mudei para Goiânia e comecei a namorar minha esposa, Miriam Ferreira de Carvalho, que é poetisa e tem uma biblioteca com todos os clássicos. Ela me orientou no estudo desses clássicos. Devo muito da minha formação cultural a minha esposa, com quem estou casado há 36 anos. Quem ensina a escrever, a raciocinar é a leitura. O que emociona o sr.? Sou uma pessoa muito fácil de se emocionar. Um gesto de carinho, uma música, me emociona. Sou capaz de chorar. O sr. é uma pessoa feliz? Sou feliz. Apesar dos pesares, sou feliz. |