Discurso durante a 73ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de combater os desvios dos recursos destinados a compra da merenda escolar.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Necessidade de combater os desvios dos recursos destinados a compra da merenda escolar.
Aparteantes
Eurípedes Camargo, Mão Santa, Tião Viana, Valdir Raupp.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/2003 - Página 14876
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O LIBERAL, ESTADO DO PARA (PA), JORNAL DE BRASILIA, DISTRITO FEDERAL (DF), A TARDE, ESTADO DA BAHIA (BA), DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PREFEITO, EMPRESA, DESVIO, RECURSOS, MERENDA ESCOLAR, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, JUDICIARIO, POPULAÇÃO, CONTROLE, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PREVENÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, DESCENTRALIZAÇÃO, MERENDA ESCOLAR, ENCAMINHAMENTO, VERBA, ESCOLA PUBLICA, VALOR, PROPORCIONALIDADE, MATRICULA, ALUNO, OBJETIVO, AQUISIÇÃO, ALIMENTOS, PROXIMIDADE, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, INCENTIVO, ATIVIDADE ECONOMICA, LOCAL, AUSENCIA, INTERMEDIARIO.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje eu gostaria de abordar um tema que preocupa o Brasil de norte a sul.

Ontem, no vôo de Belém para Brasília, li no O Liberal, um jornal do Estado do Pará, uma nota que dizia o seguinte sobre o tema merenda escolar:

Pequeno empresário diz que conhece bem os fatos denunciados no domingo passado por O Liberal sobre a corrupção que cria prefeitos ricos e Municípios pobres. Segundo ele, na maioria dos Municípios as licitações para a compra de merenda escolar não passam de arranjos contábeis. Diz ele que o dinheiro da merenda é depositado todo dia 27 e é muito comum que, nesse mesmo dia, ele seja sacado ou transferido para as empresas que vendem a merenda. Essas empresas atuam na verdade como fornecedores cativos.

Fiz, assim, uma pesquisa rápida sobre a situação da merenda escolar no País e sigo aqui com o Jornal de Brasília que diz:

O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a cobrar agilidade do Poder Judiciário no julgamento de processos envolvendo dinheiro público. Diz o Presidente “espero que o Poder Judiciário tenha agilidade para que esses processos não sejam engavetados, não demorem porque que o povo não pode continuar sendo roubado. A sociedade brasileira precisa compreender de uma vez por todas que só vamos combater a corrupção quando ela agir como fiscal”, acrescentou. Ele participou do sorteio, na Caixa Econômica Federal, dos Municípios que vão ser investigados por técnicos da Controladoria-Geral da União, sobre a destinação de recursos federais.

Num primeiro momento, foram fiscalizados cinco Municípios e em todos eles foram constatados desvios de recursos federais.

O assessor especial do Presidente da República, Oded Grajew, disse que o Governo vai lançar um programa de combate à corrupção nos Municípios. Segundo ele, o Governo não quer que programas como o Fome Zero e o do Primeiro Emprego sejam prejudicados por desvios de recursos nas Prefeituras. “Não queremos que se repitam casos como o de prefeituras que desviaram recursos da merenda escolar.

Sabemos do comprometimento do Presidente Lula em defesa dos trabalhadores, em defesa dos mais pobres da sociedade. E conhecemos a habilidade de Sua Excelência em estabelecer negociações a fim de garantir direitos à imensa população de brasileiros excluídos. É essa habilidade do Presidente que nos motiva a apresentar propostas, pois denúncias não faltam.

Pesquisei rapidamente alguns jornais e encontrei algumas manchetes a respeito do tema. Jornal O Liberal: “Câmara de Conceição do Araguaia se reúne para cassar prefeito”. Ora, invariavelmente, as razões das investigações e das cassações ou são de desvio de recursos do Fundef ou de desvio de recursos da merenda escolar. E não apenas no Pará. Li jornais de vários Estados. Jornal A Tarde, de Salvador, do dia 23 de março de 2001, com a manchete: “Governistas lideram desvio da merenda”. Outra manchete: “Na volta às aulas, cerca de 1.500 Municípios ficam sem verba para merenda escolar”. “MEC pega dinheiro de volta. Relatório de auditores do MEC aponta irregularidades no uso de repasses federais destinados a merenda escolar na rede oficial de ensino em instituições filantrópicas.” “GDF é obrigado a devolver uma parte dos recursos recebidos.” “CPI ouve hoje envolvidos no caso de desvio de dinheiro da merenda escolar em Fortaleza”. “Dinheiro da merenda escolar pode ter sido desviado em Cajamar.” “MP investiga desvio de verba de merenda escolar em Cajamar” (24/04/2003). “TCU constata falhas no programa de merenda escolar no GDF”; “Detectada irregularidade na merenda escolar de São Paulo, no dia 13/12/01”; “Tribunal de Contas verifica irregularidade em compra de merenda escolar”; “Deputado é vinculado a denúncias da merenda escolar no Ceará”, e por aí vão denúncias de todo tipo.

Sr. Presidente, já sabemos que repetir denúncias não vai resolver a questão do desvio e da corrupção de dinheiro público neste País. O que nós precisamos é de instrumentos eficazes de controle social do uso dos recursos públicos. Sem um controle social eficiente, nós não vamos estancar essa hemorragia provocada pelos desvios da política porque esse não pode ser o comportamento político; esse é o desvio. Infelizmente, os desvios terminam sendo a regra e não a exceção. Então, quando o desvio de comportamento político chega a esses níveis, é necessário termos propostas para podermos ter instrumentos de controle social.

Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria exatamente de falar de algumas experiências de descentralização dos recursos espalhadas em todo o Brasil. Nós tínhamos no Amapá exatamente os mesmos problemas que em Porto Walter, no Acre, onde chegar com a merenda escolar é muito difícil em razão das condições de transporte. Não há estradas; tem que ir pelo rio.

Morei em Cruzeiro do Sul e vivi situações que representaram um grande aprendizado no início da minha vida pública, se posso dizer assim. Cruzeiro do Sul é o Município que mais produz farinha de mandioca, e essa tem uma característica: é uma farinha seca, de excelente qualidade. Lá trabalhei com os pequenos agricultores. Tentei vender farinha de mandioca produzida por Cruzeiro do Sul para a FAE, naquela época, em 1984. Visitei o representante da FAE e pude observar que os depósitos estavam abarrotados de farinha comprada no Maranhão; essa farinha tinha levado 35 dias para chegar lá e já havia chegado num estado em que não era possível o seu consumo.

Essa centralização foi diminuindo ao longo desses anos todos; no entanto, o dinheiro da merenda que vai para as prefeituras ainda não chega nas escolas. Se o dinheiro é para comprar merenda para as crianças que estudam - e sabemos quantas crianças estudam neste País porque elas possuem o registro escolar, estão matriculadas -, por que não ratear esse dinheiro pelo número de crianças nos diversos Estados da Federação e enviar esse dinheiro diretamente para a escola? Foi exatamente isso que fizemos, Senador Mão Santa. O dinheiro da merenda escolar enviado pelo Governo Federal era adicionado a uma parcela de recursos estaduais e esse total ia direto para a escola. O total, se não me engano, era R$0,33 per capita, que eram destinados ao que denominávamos de caixa ou conselho escolar, e era exatamente esse conselho escolar que provia as escolas dos alimentos que as crianças necessitavam.

Esses alimentos são comprados, até hoje, no entorno da escola, gerando atividade econômica, fazendo com que a escola se torne atraente pelo fato de dispor de recursos não apenas para comprar merenda, mas também para atender todas suas necessidades, como manutenção e recuperação, contratação de pessoal de apoio etc.

Vou apresentar um projeto de lei nesse sentido e gostaria de contar com o apoio de meus Pares. Esse projeto descentralizará o recurso, a fim de que todo ele vá direto para a escola, sem intermediação, praticamente da mão do contribuinte para a escola. Assim, será encurtado todo o passeio que o dinheiro público dá. Atualmente, no meio do caminho ele vai sendo picotado, vai sendo desviado aos poucos e deixa de cumprir a sua finalidade.

Portanto, deverá chegar a esta Casa projeto no sentido de descentralizar os recursos destinados à merenda escolar, de forma que o dinheiro chegue à escola, cessando os absurdos que estamos presenciando de denúncias de desvio, o que significa tirar dinheiro da boca de crianças, pois, em muitos casos, essa é a única alimentação que têm ao longo do dia. Desgraçadamente, o Brasil é o País da exclusão social e existem milhões de crianças que, repito, têm como única alimentação a merenda escolar, e esse dinheiro ainda assim é desviado.

Concedo o aparte ao Senador Eurípedes Camargo e, em seguida, ao Senador Mão Santa.

O Sr. Eurípedes Camargo (Bloco/PT - DF) - Senador João Capiberibe, V. Exª levanta a questão da merenda escolar, que é preocupante em todo o território nacional, como mostram os recortes de jornais, os quais noticiam o que ocorre, dia a dia, nos municípios. Eu gostaria de parabenizar V. Exª por trazer a esta Casa tema tão importante, o qual diz respeito diretamente às famílias pobres que vivem nas comunidades longínquas de nosso País, e também por apresentar a citada proposta. Concordamos com ela e estaremos à disposição de V. Exª para, na medida do possível, com o voto, fazer com que essa proposta, que diz respeito ao dia-a-dia da população, se transforme em lei. Com certeza, toda a sociedade a abraçará e fará dela uma lei de fato, uma lei que pegue, e não uma lei que apenas fica engavetada. Se ela estivesse acoplada à gestão democrática, quer dizer, à escolha da direção da escola, daria o sentido de participar e de pertencer. À medida que o pai, o aluno e a comunidade escolar, como um todo, participam da escolha da diretora, irão gerir bem os recursos, pois sabem de onde vêm. O projeto descentraliza os recursos e cria conselhos que vão geri-los junto com a diretoria. A fiscalização será no tempo real, porque a pessoa percebe que, ao escolher a direção da escola, se torna parte dessa comunidade. Esse sentimento de participação a leva a fiscalizar com mais responsabilidade o processo. Ela sabe quanto dinheiro chega, quanto tem para ser distribuído e zela pelo bom aproveitamento dos recursos. Com certeza, esse é um projeto que garante a democracia interna e a utilização dos recursos da melhor maneira possível. Mais uma vez, quero parabenizar V. Exª por trazer esse tema tão importante para a esfera do Senado. Que possamos, então, transformar em lei essa proposta que trará resultados significativos para a população brasileira.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Eurípedes Camargo. Eu gostaria de dizer que há o pressuposto de que a comunidade escolar esteja organizada para receber e gerir os recursos descentralizados. A descentralização dos recursos na escola tem efeito econômico, social, cultural e pedagógico.

Agora, elimina completamente a corrupção? Não, não a elimina, mas a corrupção deixa de ser institucional, como acabamos de ver aqui, e passa a ser pontual. E por que digo que ela passa a ser pontual? Porque é um caso ou outro, já que não podemos, evidentemente, controlar comportamentos humanos de forma generalizada, pois sempre haverá a exceção de um ou outro dirigente escolar que desviará os recursos. É o caso do Amapá, onde existem casos pontuais, investigados com eficiência maior. Um prefeito, quando é investigado, goza de certa imunidade política, porque ele tem laços e tentáculos bem amarrados com os Deputados Estaduais e Federais. Portanto, ele também é protegido pela impunidade que reina em nosso País. Mas o diretor da escola - nem sempre é o diretor da escola -, ou o presidente do conselho, que gerencia aquele recurso, e que comete uma irregularidade com esse dinheiro, ele responde pelos seus atos, pois não goza da mesma proteção que tem o prefeito, não tem a blindagem da impunidade. É por isso que a descentralização é muito mais eficiente tendo em vista a aplicação correta do recurso público.

Eu gostaria de passar a palavra ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador João Capiberibe, quero cumprimentar V. Exª por trazer a esta Casa, a meu ver, o mais importante programa de alimentação, de combate à fome: a merenda escolar. Eu tinha pedido a palavra antes, mas coincidem as nossas ações. No Piauí, tive a oportunidade de “escolarizar” a merenda. Cada diretora recebia uma determinada quantia destinada à merenda escolar, com a orientação e a exigência de comprar os alimentos no comércio local, aproveitando as riquezas locais. A minha cidade, Parnaíba, por exemplo, é uma bacia leiteira. Lá, todas as diretoras tinham a obrigação de comprar leite, porque assim estariam estimulando essa bacia leiteira e ajudando a fixar no campo o homem que tem sua vaquinha e produz leite. “Escolarizamos” a merenda em todo o Piauí. Mais ainda, a feliz idéia foi do Governo passado, cujo Ministro da Educação, talvez o melhor de todos os Ministros, concedeu recursos para que a própria diretora administrasse a escola. Aproveitei e implantei o programa também nas escolas do Estado. Todas recebiam uma verba para administrar as necessidades urgentes e básicas da escola. Com isso, o Governo é que ganha, porque incorpora milhares e milhares de professoras na administração, com a responsabilidade dos princípios administrativos de planejar, designar, orientar, coordenar e controlar. Não há equipe melhor do que a formada por professoras, já que o magistério é um verdadeiro sacerdócio, ideal; bastaria dizer que é a única profissão - não somos nós políticos, empresários, ninguém -, cujo profissional é chamado de mestre, igual a Cristo. Essas foram nossas ações que muito coincidiram com as do Senador João Capiberibe, quando governou o Amapá. É muito válida a preocupação de V. Exª. Tenho certeza de que as maiores corrupções ocorrem nas grandes compras, na aquisição de mercadorias de empresas, muitas das vezes de fora, que levam nosso dinheiro, nossos recursos, empobrecendo nossas comunidades, nossos Estados. 

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Muito obrigado, ex-governador e Senador Mão Santa. A contribuição federal para a merenda escolar, se não me engano, hoje deve ser de R$0,13. Daqui a pouco, passarei a palavra a um outro ex-governador, que conhece do assunto. Acredito que esse tema deve ser abordado por nós, que temos uma longa experiência em busca de soluções para os problemas que afligem a sociedade brasileira. Hoje, estamos participando do Governo Federal, mas muitos de nós passamos pelos governos estaduais e sabemos das dificuldades para se controlar o uso de recursos públicos. Essas idéias foram aplicadas no Amapá e no Piauí.

Senador Mão Santa, não tenho aqui nenhuma matéria referente ao seu Estado. As que tenho aqui dizem respeito a São Paulo e a vários outros Estados, mas nada sobre o Piauí, o que mostra que a descentralização estabelece um controle social realmente eficaz. A organização da comunidade escolar é tão forte que, quando uma criança volta para casa sem comer - e normalmente as escolas públicas estão localizadas nas áreas mais pobres dos municípios -, o pai sabe e no dia seguinte vai até a escola para perguntar por que o filho não comeu. Então, há um controle eficiente quando o dinheiro chega na escola, para que a comunidade escolar o administre.

Passo a palavra ao Senador Tião Viana e, logo em seguida, ao Senador Valdir Raupp.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senador João Capiberibe, desejo elogiar o pronunciamento que V. Exª faz. Muitos poderiam dizer que esse assunto é pertinente às câmaras municipais, mas muitos se esquecem, quando pensam assim, de que V. Exª está prestando solidariedade a milhões de crianças brasileiras, quando aborda um tema de enorme relevância. Acredito que um dos temas mais importantes da história da República seja o tratamento da merenda escolar, o acesso da criança brasileira, especialmente das escolas públicas, à alimentação básica dentro da escola; a conciliação do aprendizado, da construção do saber, com a possibilidade de não estar com fome naquele momento. Tenho a mais absoluta tranqüilidade de expressar isso como um gesto de conquista da sociedade brasileira, conduzido, inclusive, por governos anteriores; não é um mérito do Governo atual. Temos o dever e a responsabilidade de preservar esse programa. Sei que seu governo deu um belíssimo exemplo de controle e de descentralização dos recursos públicos e buscou alternativas. Entendemos que não basta hoje a tese democrática da descentralização ou da divisão de responsabilidades, mas a tese efetiva de permitir que a sociedade controle seu próprio recurso. O grande exemplo dado pelo Amapá nos indica o caminho que temos a seguir. Podemos, perfeitamente, confiar num conselho da comunidade, envolvido com o setor público, que permita a administração específica do produto. As escolas têm ao seu lado o produto, basta que tenham o direito de negociar e discutir o preço, porque elas farão o melhor por sua comunidade. Penso que a democracia direta é sinônimo desse tipo de atitude. Nada será mais favorável em se afirmar que há um novo Brasil, no Governo do Presidente Lula, do que a condução por esse caminho democrático e correto a favor da sociedade. Fico muito feliz que seu governo tenha demonstrado a intenção e o resultado de uma medida que, sem dúvida, protegeu o dinheiro público e respeitou a dignidade das crianças brasileiras.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Obrigado, Senador Tião Viana, pelo seu aparte.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Peço tempo ao Sr. Presidente para ouvir o Senador Valdir Raupp.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Serei breve, Sr. Presidente e Senador João Capiberibe. V. Exª está falando com profundo conhecimento de causa, pois já foi duas vezes Governador do Estado do Amapá. Já fui duas vezes Prefeito e Governador e senti, também, na pele esse problema quando estava na Prefeitura. Quando a merenda estava centralizada no Estado, muitas vezes demorava três meses para chegar aos municípios. Imaginem que os municípios mais distantes, no período das chuvas em nossa região amazônica, ficavam até um ano sem merenda! Quando cheguei ao Governo de Rondônia, deparei-me com esse problema da centralização da merenda escolar. No primeiro ano foi um caos, até um Secretário de Estado da Educação caiu, porque os fornecedores vendiam e não entregavam. Vendiam uma remessa de carne, de frango, de alimentos, entregavam 50% e, muitas vezes, não queriam nem entregar. Estava implantado um vício no poder central do Estado. Não encontrei outra saída, Senador João Capiberibe, a não ser fazer o que fizeram V. Exª e o Senador Mão Santa, Governador do Piauí: descentralizar a distribuição, escolarizando a merenda escolar. Não tive outra saída. A partir do momento em que se criou essa confusão na Secretaria de Educação, decidi que os convênios iriam diretamente para as escolas e as diretorias das escolas comprariam a merenda. Senador, acredito que o caminho mais sensato e mais vantajoso seja escolarizar a merenda no País inteiro. O aproveitamento é maior, o diretor da escola tem muito mais medo de praticar um ato ilícito do que as pessoas mais graduadas. Creio que o caminho seja realmente a escolarização. V. Exª está de parabéns ao abordar essa questão tão importante para o nosso País. Muito obrigado.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Obrigado, Senador Valdir Raupp, pelo seu aparte. Vivemos, talvez, a maior crise da democracia representativa de toda a história. Costumo visitar os bairros periféricos e conversar com os moradores, para saber que canais de participação política possuem esses moradores dos bairros mais distantes, mais afastados do centro. Em geral, não recebem nem a visita do vereador em seu bairro. Eles repetem, com muita freqüência, que o político somente vai ali na época de campanha. Isso é verdadeiro. Não há, digamos, uma participação política. Se não fosse a imprensa, não teríamos conhecimento desses casos de desvio.

Portanto, é fundamental que revejamos, com decisão e clareza, que aqueles que compõem ainda a maioria da sociedade brasileira - dos excluídos política e economicamente - tenham direito à participação. A comunidade escolar controlando a sua escola, tenho a convicção de que é um grande aprendizado político que pode nos permitir não só controlar melhor o uso do recurso público, mas construir a democracia em nosso País.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/2003 - Página 14876