Discurso durante a 73ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a elevação dos índices de violência em Porto Velho.

Autor
Fátima Cleide (PT - Partido dos Trabalhadores/RO)
Nome completo: Fátima Cleide Rodrigues da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Preocupação com a elevação dos índices de violência em Porto Velho.
Aparteantes
Tião Viana, Valdir Raupp.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/2003 - Página 14895
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, DADOS, AUMENTO, VIOLENCIA, ZONA URBANA, APREENSÃO, SITUAÇÃO, MUNICIPIO, PORTO VELHO (RO), ESTADO DE RONDONIA (RO), INEFICACIA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SEGURANÇA PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, GESTÃO, PRESIDIO, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, POLICIA MILITAR, AGENTE PENITENCIARIO, DENUNCIA, ATUAÇÃO, OFICIAIS.
  • REGISTRO, MOBILIZAÇÃO, DEPUTADO ESTADUAL, DEBATE, SECRETARIO DE ESTADO, SEGURANÇA PUBLICA, ESTADO DE RONDONIA (RO).
  • DENUNCIA, HOMICIDIO, AMEAÇA, MORTE, VEREADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • EXPECTATIVA, POLITICA SOCIAL, REDUÇÃO, VIOLENCIA, PARCERIA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), GOVERNO FEDERAL.

A SRª FÁTIMA CLEIDE (Bloco/PT - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema que me traz a esta tribuna também é a violência, mas não a violência direta, aquela que leva o dinheiro antes que chegue ao seu verdadeiro destino.

A revista IstoÉ da semana passada trouxe, como matéria de capa, o mapeamento da violência no País, a partir de dados de 2002 da Secretaria Nacional de Segurança Pública, em uma constatação cruel e real do ambiente urbano brasileiro: a violência se espalhou em todos os Estados, traduzindo-se numa epidemia “sem freios”, conforme expressão do Secretário Luiz Eduardo Soares.

Essa epidemia sem freios, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, atinge muito dramaticamente Porto Velho, a Capital de Rondônia. Outrora cidade tranqüila de minha infância, Porto Velho figura ao lado de Vitória, Aracaju, Cuiabá e São Paulo como uma das capitais mais violentas do País.

No ranking de homicídios dolosos, Porto Velho está em segundo lugar, com taxa de 52,3 assassinatos por 100 mil habitantes. Isso é uma verdadeira guerra civil, uma guerra que se trava no cotidiano da miséria das periferias inchadas e desassistidas, onde o braço do Estado há muito está ausente.

As mulheres são particularmente as grandes vítimas no quadro de violência na capital. Para a infelicidade de todas nós, do Partido dos Trabalhadores, que sempre lutamos pela adoção de medidas de proteção à mulher, ocupamos o primeiro lugar na taxa de estupro, sendo 15,8 casos para cada 100 mil habitantes.

O roubo, que permeia a realidade urbana de capitais abastadas, está também entre nós, somente perdendo para São Paulo, paraíso dos gastos bilionários com segurança do patrimônio. Porto Velho registra 1.478,2 casos de roubo para cada 100 mil habitantes.

Essa triste realidade de uma cidade com menos de 400 mil habitantes traz um componente complicador, porque a estrutura de segurança pública oferecida pelo Estado é da pior qualidade.

A inércia do governo passado na condução da segurança pública foi total, absoluta. Diversos secretários passaram pelo posto, diversos oficiais assumiram a maior casa de detenção do Estado, localizada em Porto Velho, sem que nada, absolutamente nada, fosse feito para frear fugas e mortes no presídio, além de assassinatos ocorridos a toda hora e lugar em Porto Velho.

Não foram poucas vezes que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara esteve na cidade para verificar e pedir adoção de medidas urgentes no presídio. Este ano mesmo, a Comissão lá esteve. E o Ministério Público constatou a violação de direitos e fez alerta sobre o barril de pólvora que é o presídio Urso Branco, que na virada do ano de 2001 surpreendeu o País com trágica chacina, em que o requinte da violência mostrou sua face mais visível com a degola de um detento.

A formação profissional de nossos policiais militares e agentes penitenciários deixa muito a desejar. Os cursos são de meio expediente, de conteúdo limitado, como se limitada fosse a máquina da violência, como se a atuação da bandidagem fosse também apenas de meio expediente!

Mais grave ainda - e isso é uma denúncia que merece ser apurada - é a recusa dos oficiais que recebem cara formação fora do Estado, paga com o dinheiro do contribuinte, em repassar conhecimento e orientação a seus subordinados. Esse tipo de conduta, para a qual a sociedade está alerta e repudia totalmente, revela total descompromisso com o serviço público e ausência de ética.

Ainda mais grave, Sr. Presidente, Srs. Senadores, e que circula abertamente entre a própria corporação, é a informação de que, embora coloquem dificuldades para multiplicar conhecimento para a tropa, certos oficiais estão prestando assessorias e consultorias a empresas privadas de segurança, comportamento intolerável, pois oficiais são muito bem pagos, aliás com salários bem superiores aos de seus comandados.

Ouço o Senador Tião Viana que está solicitando o aparte.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senadora Fátima Cleide, desejo cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento em defesa do Estado de Rondônia. V. Exª, que defende o seu Estado e sua gente, entende que é possível uma Rondônia diferente, à altura dos tempos atuais, com menos violência, com inclusão social e com desenvolvimento humano. Sem confrontar a violência, não é possível pensar uma Rondônia diferente. Essa é a razão do pronunciamento que faz. O Brasil todo sofreu e ficou chocado com o famoso escândalo do presídio Urso Branco, quando a violência policial extrapolou os limites. Ainda hoje, Rondônia continua fragilizada e na iminência de violências que ultrapassem o Estado de Direito e os preceitos constitucionais. No Acre, Estado vizinho ao seu, tivemos uma forte experiência de combate à violência, a favor de um novo modelo de segurança pública. E o caminho encontrado foi o de uma ação multiinstitucional. Entendemos que sem uma parceria entre Governo Federal, Estado, Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Polícia Federal, Assembléia Legislativa, Tribunal de Justiça, juízes de primeira e segunda instâncias, Ministério da Justiça e Controladoria da União, não podemos avançar muito. Essa ação envolve uma responsabilidade política muito mais ampla. E V. Exª aponta um caminho que deve ser entendido pelo Governador de Rondônia, porque S. Exª deverá ser o mediador, o articulador de um amplo entendimento nacional que permita uma ação de resultado efetivo para a população rondoniense. Não é possível imaginar que a violência ocorrida em Rondônia não atinja o Mato Grosso, o Amazonas e o Acre. Como este assunto é regional, no que depender da representação política dos nossos Estados amazônicos, debateremos a questão ao lado de V. Exª. Penso até que o Conselho de Segurança, Conselho maior dos Estados amazônicos, deveria estar envolvido, pois se trata de instância constitucional, reunindo os Governadores da Amazônia, para discutir pontualmente a falta de segurança vivida por Rondônia. Parabéns, Senadora e minha solidariedade!

A SRª FÁTIMA CLEIDE (Bloco/PT - RO) - Muito obrigada, Senador Tião Viana, pelo seu aparte. V. Exª adianta dois pontos de meu discurso.

Sr. Presidente, não há razão para recorrerem a esse expediente os oficiais da Polícia Militar do Estado de Rondônia. Com isso, perdem o povo e os policiais militares que verdadeiramente querem servir ao cidadão e que tanto precisam reciclar conhecimentos.

Mas essa é uma denúncia que a Bancada Estadual de Parlamentares do Partido dos Trabalhadores em Rondônia quer ver apurada. E é para tratar do assunto e indagar as autoridades sobre que providências estão sendo tomadas no Estado para conter a escalada de violência que uma audiência pública com o Secretário de Segurança está sendo convocada pelos Parlamentares.

            Nosso desejo sincero é o de que as ações concretas de fato estejam sendo tomadas, como diz o companheiro Tião Viana - permita-me assim chamá-lo. Também entendemos que o problema só será solucionado com vontade política e ação conjunta. Pois a violência está explodindo não apenas em Porto Velho, mas em todo o Estado, com tentáculos na indústria de grilagem, nas invasões de terras indígenas e em situações em que se confronta o combate à corrupção. Somente até abril, três vereadores foram assassinados em Rondônia. E o PT enfrenta a fúria dos que entendem ser o patrimônio público extensão do patrimônio privado. Por não darem trégua à corrupção, há hoje quatro de nossos vereadores ameaçados.

Quero firmemente acreditar que o Governo de meu Estado passe a considerar prioridade o combate à violência. Uma luz ainda pálida surge agora, com a presença de delegados no Estado do Acre a fim de conhecer a experiência que o Senador Tião Viana acaba de nos relatar.

Gostaria de conceder um aparte ao nobre Senador Valdir Raupp.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Gostaria de cumprimentá-la pelo pronunciamento brilhante pronunciamento em defesa do Estado de Rondônia. Realmente a segurança no nosso Estado é uma calamidade pública. É lamentável que Rondônia, um estado novo, ainda com a população de 1,5 milhão de habitantes, tenha uma escalada tão forte na violência. Mas há um dado que nos chama a atenção. O 1º Secretário da Casa, que preside neste momento a sessão, Senador Romeu Tuma, conhece muito bem essa situação. Se analisarmos os presos que estão em Rondônia hoje, na sua maioria não são rondonienses. Nada contra os outros Estados, mas a maior parte dos presos que lá estão, que promovem as fugas periodicamente nos nossos presídios, são pessoas que vieram de outros Estados. Então, essa é uma situação que deve ser revista. É claro que a Polícia de Rondônia tem que ser mais rigorosa, porque, há dias, em Ji-Paraná, o juiz da vara criminal chamou o delegado da cidade e o comandante da Polícia Militar e disse: “Ou vocês contêm a violência na cidade e diminuem os crimes que estão ocorrendo, ou não vão ficar na cidade.” Essa medida diminuiu em mais de 70% a criminalidade, então o que está faltando é uma mão firme, uma mão-de-ferro na segurança de Rondônia.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma) - Com licença, Senador Valdir Raupp. Gostaria de prorrogar a sessão por cinco minutos, para que V. Exª conclua o seu aparte e permita o término do discurso, por favor.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Muito obrigado, Sr. Presidente. É justo, porque o pronunciamento que a Senadora Fátima Cleide está fazendo é de grande importância para o nosso Estado e para o País. Senadora Fátima Cleide, como eu falava, outra experiência errada foi a tentativa de fusão das duas Polícias, que o governador anterior, José Bianco, tentou fazer nomeando um secretário da defesa. Essa medida não funcionou. Alias, piorou a situação das polícias de Rondônia. Porque nem a Polícia Civil obedecia e obedece o comando do secretário da Defesa e nem a Polícia Militar. Então, na verdade, hoje não há comando na Polícia Militar e na Polícia Civil do Estado de Rondônia. Muito obrigado.

A SRª FÁTIMA CLEIDE (Bloco/PT - RO) - Muito obrigada, Senador Vaudir Raupp.

Quero ainda enfatizar a urgência para o aparelhamento das instituições de segurança, a ação eliminadora das forças corruptivas na estrutura policial e o estabelecimento de parceria com o Governo Federal.

E colaborar com tudo isso o Governo do Presidente Lula se propõe, tenho certeza. As portas estão abertas, tanto que já foram firmados acordos com nove Estados para a adoção do Sistema Unificado de Segurança Pública - Susp.

O secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares, absolutamente firme e convicto da necessidade de priorizar o combate ao crime, a mim reafirmou o compromisso de colaborar com o Governo de Rondônia para deslanchar ações que promovam uma nova ordem institucional nas estruturas policiais do Estado, assim como tem sido feito no Espírito Santo.

É meu desejo e certamente da população de Rondônia, que há muito se sente desprotegida diante da inexistência de políticas de segurança pública e assiste a toda ordem de desmandos no aparelhamento policial, que as nossas autoridades locais não fechem a porta e ajam em sintonia com os interesses maiores do sofrido povo de meu Estado. Afinal, não se pode mais admitir o que aconteceu em passado recente, com a devolução sistemática de recursos por falta de clareza política e metas para a segurança pública. Isso não é simples negligência, é crime! É crime a inapetência do comando da segurança, que deve ter condução firme, sem tréguas para a marginalidade, mas também alicerçada nos direitos humanos.

Por isso, muito nos preocupa a declaração de nosso Governador na revista IstoÉ a respeito de sua solução para a violência.

O Governo de Rondônia não pode se esquecer de que o aprofundamento da miséria e o elevado índice de desemprego causado pela política neoliberal tucana são combustível para o recrudescimento da violência.

Desse modo, além de procurar dotar o Estado de excelência policial com equipamentos e rede de informações que possam suprir as carências hoje verificadas, é preciso dar enfoque para o social. E isso é verdadeiramente feito por governos que se engajem na construção de políticas públicas dirigidas aos pobres. São os pobres os que mais precisam da proteção e políticas públicas em meu Estado. E no capítulo da segurança pública, nossa elite, inclusive a elite que se instala em postos-chaves na máquina pública, cada vez mais constrói muralhas particulares de proteção, tornando ainda mais excluídos os pobres que vivem à sua volta.

Quero, neste momento, fazer um veemente apelo a Bancada de Rondônia: vamos enfrentar a violência, vamos combatê-la em nosso Estado, com todos os instrumentos e meios de que dispusermos. Sabemos que o crime organizado também mora em Rondônia, que a violência urbana “está sem freios”, que a grilagem de terras patrocina mortes diárias e que a corrupção manda calar os que se atrevem a desmontá-la.

Srs. Parlamentares, o Acre, o Amapá, com a CPI do Narcotráfico, sangraram sua alma, mas extirparam da sociedade gente nefasta, corrupta, que tanto prejudicou o seu povo. Ainda há muito a ser feito, mas um grande e corajoso passo já foi dado. Rondônia precisa desse tratamento de choque, precisa seguir os exemplos de nossos amigos da Região Norte. Precisa ter coragem e determinação.

Parlamentares honestos e autoridades sérias e cônscias do seu papel precisam se aliar ao Governo Federal na cruzada contra a violência, contra o crime organizado. Não é tarefa fácil, certamente não é. Admiti-la também não é. Mas é preciso começar já, sob pena de continuarmos a assistir nossos jovens e nossas mulheres rondonienses serem assassinados a todo instante, nessa onda de violência insana que afeta a juventude, bem mais que a todos, banalizando a vida, soterrando a esperança.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/2003 - Página 14895