Discurso durante a 78ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de efetiva atuação do Estado no controle do processo de fabricação de medicamentos.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Necessidade de efetiva atuação do Estado no controle do processo de fabricação de medicamentos.
Publicação
Publicação no DSF de 17/06/2003 - Página 15656
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, EMPENHO, GOVERNO FEDERAL, CONTROLE, FISCALIZAÇÃO, PROCESSO, FABRICAÇÃO, MEDICAMENTOS, IMPEDIMENTO, FRAUDE, PRODUÇÃO, MORTE, USUARIO, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL, ROMPIMENTO, PACTO SOCIAL.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, coincidentemente, a minha comunicação inadiável, para a qual cheguei afobada, diz respeito à questão da saúde. Fiquei muito gratificada ao ouvir as palavras dos Senadores Papaléo Paes e Mão Santa, mas é importante que tenhamos consciência, além de todos esses dados mencionados pelos nobres Senadores, de fatos que hoje ocorrem e que têm nos causado - acredito que não só a nós do Senado Federal, mas a toda a população de uma maneira geral, porque a mídia tem veiculado isso e é obrigação dela fazê-lo - estarrecimento. Narrarei alguns desses fatos.

A violência social tem sido um dos temas mais presentes neste plenário. Inúmeras são as causas dessa doença, que tem resistido aos esforços que se fazem, em todos os níveis, para combatê-la.

Enquanto isso, o brasileiro é vítima de episódios trágicos que já se tornaram rotina. Ainda na semana passada, aqui nesta tribuna, eu clamava contra o caso Celobar, que todo mundo está acompanhando no Brasil. E, para meu espanto, enquanto a polícia investiga a causa que levou 21 pessoas à morte em conseqüência do uso do Celobar, eis que 260 mil cidadãos ficam sem abastecimento de água, após o acidente ferroviário que provocou o derramamento de substâncias tóxicas em um afluente do rio Uberaba. E, como se isso já não fosse o bastante, um grupo de pelo menos sete pacientes de cirurgia de catarata perde a visão, após o uso de um colírio, na cidade do Rio de Janeiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou convencida de que esse tipo de “acidente”, triste tradição da vida brasileira, também é uma das causas fundamentais da violência nas nossas ruas. Isso porque a obediência às leis, tanto quanto um dever, é também a concordância de cada um com um pacto social que independe da lei escrita e que se afirma na confiança coletiva de que a lei é para todos.

Nos anos da ditadura, cavou-se uma distância profunda entre Estado e Nação. E a democracia brasileira ainda não conseguiu acabar com essa separação. Porque o Governo, em todas as suas instâncias, não conseguiu se impor como a representação de todos. Diante dos milhões de excluídos, da enormidade de nossas injustiças sociais, é compreensível que um grande número seja tentado à desobediência, estimulado pela impunidade.

Há uma cadeia de irresponsabilidades, que vai desde o funcionário da fábrica que se cala ao testemunhar o comportamento delituoso do patrão, que adultera a fórmula de um medicamento para torná-lo mais barato, até a autoridade negligente, que permite a venda de um produto medicinal quatro meses depois de esse produto ter sido interditado pela Vigilância Sanitária. É assim que o Estado se enfraquece, se desmoraliza diante do cidadão. E o pacto social é rompido; é cada um por si, um salve-se quem puder.

De nada adiantam leis contra a lavagem de dinheiro, por exemplo, se, no Banco Central, há carência de funcionários para controlar o fluxo de capitais. No papel, estamos protegidos. Na realidade, essa proteção não existe, porque inexistem condições práticas de se realizar o controle. E assim por diante, seja na saúde, na educação, no transporte, no cálculo que o sistema bancário faz para estabelecer os juros.

O povo brasileiro votou por mudanças e tem sido paciente com o novo Governo, que não pode ser responsabilizado ainda por uma herança histórica. Mas é preciso que os ventos da mudança comecem a soprar logo. Tanto quanto punição é preciso prevenção. É evidente que a punição desestimula a criminalidade. Mas, para quem ficou cego porque confiou o cuidado dos seus olhos a uma equipe médica que o salvaria da catarata, ou para quem perdeu a vida vítima de uma substância usada num exame de saúde, a punição dos culpados é incapaz de reparar as perdas.

A sistemática ineficiência do poder controlador do Estado, em todas as instâncias, leva o cidadão a acreditar que esta ineficiência é planejada para servir a interesses de alguns. Por isso repito o que disse na semana passada: leis e conhecimento não nos faltam, temos muitos; o que nos falta é controle, fiscalização prévia, para impedir que estes fatos se repitam, provocando mortes, sofrimentos, perdas materiais e indignação de toda população.

            O Brasil tem uma multidão de jovens desempregados. São os nossos jovens, mesmo os que conquistaram uma boa formação, a faixa que mais sofre com a falta de emprego. É hora de o Governo, em todas as suas esferas, atentar para a necessidade de fiscalizar e controlar os alimentos, os medicamentos, a qualidade da água que bebemos e do ar que respiramos. É hora de concursos públicos para contratar mais fiscais, para aumentar a capacidade de controle do Estado. Já foram muitos os prejuízos. E, entre grandes prejuízos, está certamente a descrença. Sr. Presidente, considero esse o maior prejuízo: a descrença dos cidadãos no Estado que o representa. Basta de acidentes, catástrofes, calamidades. Já fomos muito longe neste desamparo. Mas, como diz a sabedoria mineira, antes tarde do que mais tarde.

A hora é agora, ou estaremos cavando a falência do Estado brasileiro.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/06/2003 - Página 15656