Discurso durante a 78ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a trajetória dos juros na política econômica do governo Lula. (como Lider)

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Considerações sobre a trajetória dos juros na política econômica do governo Lula. (como Lider)
Publicação
Publicação no DSF de 17/06/2003 - Página 15668
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, AUMENTO, TAXAS, JUROS, VALOR, DIVIDA INTERNA, DIFICULDADE, EFETIVAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, ECONOMIA INTERNACIONAL, REGISTRO, ESFORÇO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MEMBROS, SOCIEDADE, DISCUSSÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, POLITICA MONETARIA, POLITICA FISCAL, PROMOÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, IMPRUDENCIA, GOVERNO FEDERAL, ADMINISTRAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, REGISTRO, IMPORTANCIA, CONTROLE, FINANÇAS PUBLICAS, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, ESTABILIDADE, POLITICA CAMBIAL.
  • COMENTARIO, PRIORIDADE, GOVERNO FEDERAL, PROMOÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, JUSTIÇA SOCIAL, COMBATE, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, DEFESA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, POPULAÇÃO, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, SOLICITAÇÃO, TOLERANCIA, POLITICA, CONTENÇÃO, AUTORITARISMO, MANUTENÇÃO, DEMOCRACIA.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há quase seis meses da inauguração do Governo Lula e às vésperas de mais uma reunião do Copom, voltam a se agitar as expectativas e reivindicações sobre a trajetória dos juros básicos de nossa economia. Aqui e acolá se ouvem legítimas e abalizadas opiniões sobre a necessidade de manutenção do rigor monetário ou, em sentido contrário, sobre a imperiosidade da indução do desenvolvimento econômico.

Vale registrar que nunca, no Brasil, tantos - e de forma tão franca - se dedicaram a discutir as políticas monetária, creditícia, fiscal e cambial: políticos, empresários, sindicalistas, acadêmicos e os cidadãos comuns, todos têm algo a dizer sobre as efemérides financeiras. Finalmente, a política brasileira parece afastar-se das páginas policiais e encontrar um local mais adequado para exposição em seções mais nobres dos jornais.

Nessa oportunidade, convém reafirmarmos os compromissos do Governo Lula com a retomada do crescimento econômico e com a geração de ocupações que permitam ao brasileiro melhorar sua renda e levar uma vida mais digna.

Mas é preciso consignar, também, que esse mote da campanha eleitoral será levado adiante de forma equilibrada: nem tão rápido que pareça imprudência ou afronta, nem tão devagar que pareça medo ou omissão.

Um país com baixos indicadores de poupança interna, que tem um passivo internacional da ordem de U$400 bilhões, uma dívida interna de cerca de R$622 bilhões e que não apresenta capacidade dissuasória expressiva, nem se destaca como pólo de formação de poder científico/ideológico, não pode ser arrogante. Não se cutucam onças com varas curtas, mormente quando os EUA, a Europa e o Japão, epicentros da economia mundial, demonstram dificuldades para levar a efeito um ciclo virtuoso sustentável que lhes permita arroubos de generosidade com os ditos países emergentes.

Em meados do ano passado, quando a cotação do dólar passou a ter uma escalada de progressão geométrica, em memorável debate travado, neste plenário, com o Senador Geraldo Melo, o Senador José Eduardo Dutra cunhou uma frase quase profética: não elegeríamos um Presidente da República, mas um “síndico de massa falida”.

Pois bem. Só não chegamos à bancarrota, porque sinalizamos para todos os agentes econômicos o respeito a compromissos, ainda que tivéssemos todas as restrições possíveis a eles, e que haveria uma transação civilizada.

Mas chegamos bem perto disso. Estivemos à beira de uma concordata, no que diz respeito ao estado das finanças públicas. E essa situação não está ainda de todo controlada. Fomos obrigados a retroceder alguns passos em nossas pretendidas iniciativas para rearrumar a casa.

Como médico, diria que o doente saiu de um quadro gravíssimo, às raias da irreversibilidade, para um diagnóstico ainda grave, preocupante, tendente a melhorar e que ainda inspira muitos cuidados. E mais: o remédio a ser ministrado pode continuar sendo amargo e as fortes doses mantidas, até que a medicação surta o efeito desejado.

Nessas circunstâncias, falar em “controle de fluxo de capital” é uma discussão desfocada, se, na verdade, o que prevalece na conjuntura atual é o refluxo dos investimentos produtivos em todos os quadrantes. Seria como dar alta a um paciente que ainda tem que permanecer na UTI. O fato de o Brasil se colocar, em tal ambiência, como um hospedeiro de capital volátil, mercado atrativo por conta das altas taxas de juro, não é confortável, porque, de fato, tais remessas podem, da noite para o dia, inverter o sentido, provocando grave distúrbio cambial. Esse risco deve ser enfrentado, não com uma postura xenófoba, autárquica, mas com fundamentos que permitam, metaforicamente, o namoro converter-se em matrimônio.

Ensejam considerações as evidências de que, no período de transição do governo anterior para este, e mesmo nos primeiros dias da atual administração, nem mesmo esse hot money ousou transitar por estas plagas, fazendo o que já estava acostumado a fazer no Governo FHC: “cair na gandaia, entrar na festa”, como diriam “As Frenéticas”. Não sem antes ter o cuidado, como recomendava o Financial Times, de ficar perto da porta de saída.

Hoje, o mesmo Financial Times se curva ao senso de balanceamento e responsabilidade do Governo Lula, ainda que manifeste algum estranhamento com a nossa democrática tolerância para com o livre debate entre as hostes governistas. Mas, afinal, quem assistiu, recentemente, muito mais de perto, aos graves dilemas do partido trabalhista, frente à questão de ocupação militar do Iraque, não tem muitos motivos para perplexidades diante da “Aliança Arco-íris” (Rainbow Alliance) que dá sustentação ao Governo Lula.

É preciso deixar claro que o Brasil é, antes de mais nada, uma pujante democracia. Nossas demandas sociais só podem e só serão resolvidas nos marcos do Estado democrático de direito. Importar soluções asiáticas, ou mesmo de alguns de nossos vizinhos, sobre controle de capitais de “alta rotatividade” merece algumas observações, muitas vezes desprezadas pelos advogados desta tese: esse tipo de ação só se tornou possível onde governos de matizes autocráticos pavimentaram o terreno para tal empreitada.

Cumpriremos nossas tarefas com o objetivo de realizar mais justiça social, buscando domar as pressões sistêmicas do dinheiro em sua sanha por lucros e articulando essa obra com a liberdade de manifestação que conduza ao consenso ou ao entendimento.

Não seremos arrogantes, Sr. Presidente, mas também não seremos submissos.

Diz o adágio popular que “com paciência e jeito, tudo é bem feito”. Estamos mostrando ao mundo, com o “jeitinho brasileiro” e com a perseverança de um Presidente que não se cansa de alertar que “o apressado come quente e cru”, que há formas de integração internacionalizada mais eqüitativas e de resultados promissores.

A inédita e - por que não dizê-lo? - inusitada articulação dos jocosamente chamados “Estados-baleias”, isto é, Rússia, China, Índia e Brasil, com a adesão da África do Sul, seguramente será um fato intrigante para os centros hegemônicos da economia mundial. A interlocução entre o Pacto Andino e o Mercosul coloca novos desafios para o debate do livre comércio no Continente Americano.

Estamos no rumo certo. Colombo não se deixou abater pelas ameaças de motim em suas frágeis naus em direção ao desconhecido. Estava convencido da pertinência de suas análises: um novo continente o aguardava para além do alcance da vista. Estamos convictos de que a rota traçada por nosso timoneiro é correta. Ocorre apenas que, como o velho marinheiro, na canção de Paulinho da Viola, “durante o nevoeiro, leva o barco devagar”, mas nunca deixando de navegar.

Chegaremos, sim, Sr. Presidente, a um porto seguro, onde poderemos, mais que afirmar, constatar que um outro Brasil é possível.

Faço esse registro em atenção, entre outras coisas, à inquietação de alguns. Entendo que a inquietação é justa, porque todos queremos uma mudança muito acelerada do nosso País. Queremos novos indicadores, inclusão social, redução da taxa de juros; queremos a afirmação de um modelo econômico sustentável que permita a distribuição de renda e o fortalecimento das bases sólidas da economia. Mas entendo que é preciso tolerância. Nunca na história política do Brasil, Senador Osmar Dias, um Presidente esteve à altura de uma credibilidade popular, nesses meses de governabilidade, como o Presidente Lula está. A confiança do povo está consagrada, assim como a confiança do setor produtivo, segundo todas as pesquisas.

Entendo que uma pessoa com a autoridade política de V. Exª, que quer o bem deste País, que entende que o setor produtivo rural precisa dar uma resposta, porque tem potencialidade, à altura do Brasil, está coberto de razão na vontade de que as coisas aconteçam rápido. Só faço uma ponderação: um pouco mais de tolerância, e este País será um país de todos, um país de um amanhã à altura de seu povo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/06/2003 - Página 15668