Discurso durante a 80ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Balanço da gestão do Governo Fernando Henrique Cardoso. Divisão da bancada do PT no apoio às reformas.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Balanço da gestão do Governo Fernando Henrique Cardoso. Divisão da bancada do PT no apoio às reformas.
Aparteantes
José Agripino.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2003 - Página 15866
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • RESPOSTA, DISCURSO, ALOIZIO MERCADANTE, SENADOR, LIDER, GOVERNO, ESCLARECIMENTOS, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, SALDO, BALANÇA COMERCIAL, TAXAS, JUROS, COMPARAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, PARALISAÇÃO, GOVERNO, DEMORA, PROVIDENCIA, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS.
  • CRITICA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DIVERGENCIA, GOVERNO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, FALTA, APOIO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFORMULAÇÃO, SERVIÇO PUBLICO.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Creio que prevaleceu o tempo inteiro a boa-fé, e o importante é que aqui prossigamos com o debate e toquemos os trabalhos do Senado às vésperas desse feriado.

Nobre Líder Aloizio Mercadante, V. Exª traz os dados da balança comercial. Em uma coincidência muito feliz, e teríamos que ter a sessão do Senado só para nós dois, durante vários meses, para podermos discutir isso mais aprofundadamente. Em 1993, o Ministro da Fazenda se chamava Fernando Henrique Cardoso e houve um saldo da balança comercial de US$13 bilhões. Em 2002, o último ano do Presidente Fernando Henrique, o saldo da balança comercial foi de US$13,144 bilhões. Hoje, o saldo é de US$8 bilhões, que se deve, tanto quanto o anterior do Presidente Fernando Henrique - quero manter aqui a minha integridade intelectual - a dois fatores: o primeiro, o fator positivo, o fato de que houve ganhos de produtividade na economia, ganhos de competitividade; e o segundo, o fato de que, tanto naquela época quanto agora, a economia está em desaceleração e, portanto, temos um saldo a mais em função de um consumidor interno que está comprando a menos. Essa é uma verdade com a qual V. Exª haverá de concordar.

Digo ao Líder que uma coisa ficou bem patente aqui. V. Exª afirmou que o Presidente Fernando Henrique Cardoso está exilado. Não foi justo. S. Exª é um conferencista de renome, V. Exª haverá de reconhecer isso. Se há algo que prezo em V. Exª é a honestidade intelectual, a sua retidão de caráter. S. Exª é um conferencista de renome internacional, muito requisitado e optou morar em Paris por razões pessoais. V. Exª não precisa me pedir licença para fazer a sua entrevista coletiva, apenas estranho que, levando em conta a nossa relação, quando se tem a tribuna, pareceu-me algo mais de guerrilha do que de guerra oficial. Entendi. Não perca mais tempo com isso. V. Exª tem um crédito comigo que, se fosse transformado em dólar, não haveria mais déficit no Brasil, do ponto de vista do nosso balanço de transações correntes.

Agora, está na hora de o Governo assumir. O Presidente Lula “paz e amor” diz, está aqui em O Globo, primeira página: “Lula reage a críticas e ataca FH, professores, juízes e servidores”. Sua Excelência estava com a boca seca, quase sem saliva, denotando um estado emocional alterado.

Os problemas são enormes. É o governo que não é tocado, as decisões administrativas que são postergadas, aliados que estão cada dia mais inquietos. Roberto Freire afirma: “PT foi contraditório ao rejeitar reforma de Alckmin”. Pareceu-me, perdoe-me Líder, uma manifestação oportunista do PT do seu Estado ao preconizar aqui medidas para as quais pede o nosso apoio, ao mesmo tempo em que tenta fazer média com os servidores públicos de São Paulo, tentando negar ao Governador Geraldo Alckmin as medidas supostamente saneadoras para São Paulo, que são vistas como saneadoras para a economia brasileira. E, mais ainda, estou falando de desgoverno, de descontrole. Estou falando de falta de articulação. Estou falando de desgoverno mesmo: “Bancada do PT racha sobre apoio à reforma”.

Eu lhe digo que temos, portanto, muito o que conversar, devendo-lhe passar ainda um último esclarecimento: a taxa Selic chegou a 45 pontos em 1999, no auge da crise cambial, e, sobre a parte dos equívocos do Governo, já tive ocasião de sobre elas me autocriticar perante V. Exª e perante a Casa, aliás, no mesmo dia em que V. Exª admitiu que o seu Partido errou redondamente ao não apoiar as reformas propostas pelo Presidente Lula e, portanto, assumiu uma responsabilidade fundamental nos desvãos da economia. Passei a apreciá-lo mais ainda. V. Exª, dentro em breve, tornar-se-á um credor meu mais avassalador do que uma nação poderosa diante de uma nação inerte, do ponto de vista das pessoas e da sua defesa.

A diferença essencial é que, logo após a crise e, às vezes, muito mais que uma vez por mês, as taxas foram caindo gradativamente e chegaram a 16,25%, em 19 de abril de 2001. Posteriormente, coincidindo com o avanço do seu candidato, perto das eleições, Lula mandou uma carta ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, dizendo que não se acovardaria e que mudaria a política econômica já no primeiro momento. E fez aquilo que, com a honestidade que faz com que todos nós o estimemos, chamava de bravata, no seu tempo de oposição. Eu não estou fazendo bravata, estou procurando apenas fazer oposição, pois bravata não seria uma atitude digna do comportamento construtivo que quero ter em relação ao Governo de V. Exª. A taxa começa a subir aos poucos.

Aqui faço uma homenagem à política econômica do seu Governo - que não é, nem de leve, aquela pregada durante a campanha -, pelo fato de todos os indicadores terem voltado à média dos tempos do Presidente Fernando Henrique, exceto a taxa de juros. Por isso é que peço licença para cometer o que pode parecer pecaminoso aos olhos de V. Exª: ousar falar sobre o assunto. Eu também estaria interditado no debate, porque, se o Presidente Fernando Henrique não pode falar sobre nada, eu, supostamente, também não poderia falar sobre juros. Queria pedir licença para poder continuar falando sobre tudo, de rinha de galo -- condenando -- até juros.

Vamos restabelecer a verdade: o Governo de transição pediu ao Presidente Fernando Henrique o aumento de três pontos percentuais. Volto à cantilena anterior: maus conselheiros disseram ao Presidente para aumentar em apenas um ponto e meio por cento a taxa Selic. O Presidente disse: “Não, não é esse o espírito da transição que eu estou fazendo”. Transição que foi tão elogiada por V. Exª, pelo grau de civilidade que a marcou e que mostrou ao mundo o amadurecimento de uma economia, no momento em que o Presidente, ainda em campanha -- e, quem sabe, prejudicando o seu candidato -- avalizava atos do futuro Presidente Lula. Teríamos hoje déficit em transações correntes, não fosse o empréstimo do FMI, negociado pelo Governo Fernando Henrique, que tem sido um grande guarda-chuva para o Presidente Lula.

O Governo tem acertado no aspecto macroeconômico, mas tem errado no micro e tem errado no administrativo -- mais no micro, onde tem trabalhado, do que no administrativo, onde, a meu ver, está praticamente paralisado. Isso autorizaria que, com um risco-país de quase 700 pontos, menos de 700 pontos, teoricamente, poderíamos pensar em taxas semelhantes àquelas do período Fernando Henrique, com risco semelhante -- algo em torno de 17 ou 16 pontos.

O que eu estranho -- e peço licença, até porque faço coro com V. Exª, que tem falado com muita lucidez sobre juros -- é que estamos há cinco meses com taxas de 25 e 26,5%. Primeiramente, vamos deixar bem claro, aumentou em três pontos percentuais porque havia necessidade técnica e porque o Governo de transição, detectando essa necessidade técnica, pediu e o então Presidente Fernando Henrique poupou o Presidente Lula do constrangimento de ter de aumentar juros na primeira semana do seu Governo. E teria de fazer. E faria. Não recorreu ao subterfúgio de aumentar um ponto e meio porcento, porque não era o espírito da transição e nem é esse o perfil do Presidente Fernando Henrique, que já teve em V. Exª um eleitor ilustre.

O Presidente Fernando Henrique co-participou desse reajuste e depois, a meu ver, de maneira tímida, o Presidente Lula aumentou 0,5%, ainda naquela fase imatura de tentar explicar que estava aumentado juros contra a sua vontade, que ele não queria saber pelo jornal.

Coisas já foram ditas. V. Exª se referiu a falar pelos cotovelos. E o Presidente Lula tem dito coisas fantásticas. A mais genial de todas foi: “A civilização, graças a Deus, é construída por homens e mulheres covardes e corajosos.” O Presidente, ali, cassou a possibilidade de a coluna do meio ser corajosa ou covarde. Foi uma coisa terrível. Ele simplesmente radicalizou entre o sim e o não, numa frase em que eu, tentando fazer exegese, não sabia o que queria dizer, francamente. Em outra ocasião: “O Presidente Toledo e eu não nascemos deste tamanho, nascemos pequenos, crescemos depois.” Aliás, eu também, algo que me aproxima do Presidente Lula. Eu nasci pequenininho, fui crescendo aos poucos. Existem pessoas que cresceram mais, como o Oscar do basquete.

Falar pelos cotovelos alguém que durante cinco meses observa em silêncio?! Alguém que tem procurado avalizar!

Lá fora o Presidente Lula já se credenciou de tal maneira que é preciso que ele não exagere nos seus vislumbres para os mercados. Não precisa de aval, mas precisou muito e teve o aval do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Já que o Presidente Fernando Henrique pode falar e que já posso falar sobre tudo, eu insisto, até sobre juros, eu gostaria, Líder Mercadante, de dizer que, tocando o debate pela via clara dos argumentos, chegamos a algumas conclusões que serão partilhadas com a Nação.

Vamos ao tal aumento da dívida pública deste País: 60% do aumento da dívida pública federal, no período de Fernando Henrique Cardoso, deveram-se, por exemplo, ao resgate de esqueletos como o Fundo de Variações Salariais, que vinha do Governo Figueiredo, do Ministro Delfim Netto, e o refinanciamento da dívida dos Estados e Municípios. Há um presente que foi dado a este Governo e que deve ser repassado aos demais - e que, a meu ver, salvou o Governo Lula no seu primeiro momento de hesitação, de pressões de Governadores por renegociação de dívidas - que é a Lei de Responsabilidade Fiscal, contra a qual o seu Partido se insurgiu, contra a qual o seu Partido votou, até questionando na Justiça o seu valor e o seu mérito.

Insisto que é muito estranho. Só peço um pouco de coerência. E respeito muito quem diga: “Eu não iria pagar a dívida externa se chegasse lá.” Isso era dito e se discutia o plebiscito. É muito estranho alguém dizer que o Governo Fernando Henrique desfrutava de toda a confiança no mercado e, a partir de maio, passou a desfrutar de menos; em junho, menos ainda; em dezembro, nenhuma credibilidade diante dos mercados. É muito estranho alguém tentar me convencer de que isso não se deve à consolidação, primeiramente, do favoritismo e, depois, da vitória do candidato Lula. Volto a dizer: R$13 bilhões foi o prejuízo desse movimento e R$14 bilhões foi, logo em seguida, o preço que o Brasil teve que pagar de aumento do superávit primário para se tentar voltar à situação anterior, que não era brilhante e que é a situação de hoje.

V. Exª, Líder Aloízio Mercadante, fez menção elogiosa a Paris, que tem bons vinhos. V. Exª sabe que Paris tem bons vinhos e eu também sei. É uma coisa verdadeira. O vinho nacional na França é apreciado por todos. Eu não quero entrar pelo terreno do vinho, sinceramente. Prefiro que nós, aqui, não discutamos vinho. Depois, terminaremos discutindo esportes. E o tema é política, não é vinho, não é futebol, não é outro.

Creio que a opção do Presidente Fernando Henrique de morar aqui ou lá, explicando as suas fontes de renda, fazendo suas conferências, laborando de maneira honrada, como é de seu feitio, independe se tem preferência por vinho francês ou chileno. E ficamos combinados assim: não se fala mais em vinho. Esse assunto passa a ser desprezado por V. Exª e por mim. Não se fala mais em esporte, nem em jogo de futebol. Vamos manter o alto nível.

Digo a V. Exª que temos convicção absoluta do trabalho que se fez neste País para criar a cultura da estabilidade. Temos absoluta convicção de que se criou um enorme empecilho à votação de reformas. O comparativo será mostrado e as emendas serão apresentadas, melhores do que estas. Prejuízos enormes, cerca de R$130 a R$150 bilhões, pela não-realização da reforma tributária a partir do primeiro momento em que se tentou votar contra a “patriótica” -- é difícil, Senadora Patrícia Saboya, aspear oralmente -- oposição da CUT, uma entidade sindical que, estranhamente, rosnava como um leão bravio e, hoje, ronrona como um gatinho doméstico da emergente Vera Loyola no colo do Presidente Lula.

Temos convicção absoluta dos empecilhos, do que falta fazer. Não nos negamos a cumprir com o nosso dever. Queremos que a Oposição seja tratada com respeito, queremos discutir com argumentos sérios. Estou curioso, por exemplo -- e V. Exª vai me dizer depois -- sobre que metodologia usou para comparar crescimento econômico de Washington Luís com o governo do Presidente Fernando Henrique, pois é algo que pode revolucionar o ensino de História no País. V. Exª ainda vai me explicar que metodologia usou para chegar a essa conclusão.

V. Exª foi cortês com o Presidente, porque meramente comparou, de maneira fria, dados de crescimento, embora com uma metodologia que parece falha.

O tempo inteiro preservei o Presidente Lula e não o compararia a ninguém. Se quisesse ser grosseiro, eu o compararia a Delfim Moreira. Seria um insulto, eu não o faria. Se eu quisesse ser leviano, eu o compararia - e V. Exª não o foi porque não comparou o Presidente Fernando Henrique ao ex-Presidente Menem, e me explicou isso muito bem - a algum ditador que não tivesse a honradez que, certamente, acompanhará o Presidente Lula por todos os minutos do seu mandato.

Reformamos a ordem econômica do País, criamos a cultura da estabilidade, ganhamos credibilidade internacional, conquistamos o respeito dos outros países e digo-lhe, até afortunadamente, que houve uma brutal demonstração de incoerência no seu Governo. No que vai bem, no pouco que vai bem, o Governo tem adotado sistematicamente - até porque sua credibilidade era menor e ele precisava aprofundar-se mais - as políticas macroeconômicas que herdou. As bravatas ficaram para trás, os acordos com o FMI foram sendo renovados e entendeu-se que não era de Direita, de Centro ou de Esquerda ter uma relação saudável com o Fundo Monetário Internacional.

V. Exª, Líder Mercadante, a meu ver, resgata o debate, mas, sobretudo, ajuda a consagrar o direito de liberdade de expressão plena.

É sobretudo por S. Exª que me debato neste momento, porque debate econômico vamos fazer a vida inteira. Há a Comissão de Assuntos Econômicos e há a tribuna da Casa. Porém, queremos questionar se há um método em ação, um método rude com os seus dissidentes, um método de não se permitir que um ex-Presidente da República se manifeste, um método que desqualifique - a história do vinho desqualifica; prometi que não se falaria aqui nem em vinho, nem em futebol - os seus interlocutores. Não é isso o que vem de V. Exª, que, para mim, é o lado correto, é o lado ético deste Governo, o lado doce e é o lado do cumprimento da palavra. Tenho por V. Exª muito apreço.

Ouço o Senador Agripino Maia.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Arthur Virgílio, quero cumprimentar V. Exª, como quero também cumprimentar o Líder Mercadante pelo debate civilizado com que V. Exªs estão encaminhando os pontos de vista dos dois governos que V. Exªs representaram ou representam. V. Exª foi brilhante Líder do Governo Fernando Henrique Cardoso, e o Senador Mercadante é um brilhante Líder do Governo de Sua Excelência o Presidente Lula. Um debate educado, no mesmo nível em que se processou a transição democrática - que o Brasil e o mundo inteiro aplaudiram -, em que o Presidente Fernando Henrique passou o Governo ao Presidente Lula. Chegaram a gestos de delicadeza, como a própria negociação em torno da indicação dos embaixadores; a pactuação de entendimento em torno do Orçamento de 2003, que foi feito em comum acordo. Em relação aos juros, o governo anterior concordou em elevá-los, para livrar o Governo que entrava desse ônus; tomou a iniciativa de indicar ao Senado o novo Presidente do Banco Central. Houve muitos gestos de delicadeza, civilidade e maturidade política, que o mundo inteiro aplaudiu. Porém, peço a V. Exª permissão porque preciso fazer o sublinhamento de alguns pontos que assemelham os dois Presidentes e de outros dois que os afastam ou que os diferem. Não tenho nenhuma dúvida - e, aqui, lidero um partido de Oposição - de que tanto Fernando Henrique Cardoso como Luiz Inácio Lula da Silva são homens inteligentes, muito inteligentes; são homens que carregam, cada qual com a sua personalidade, características de líderes; são agregadores, e não dispersores; são pessoas politicamente muito hábeis. No entanto, por tudo o que foi dito aqui, preciso dar ênfase e sublinhar fatos que estão ficando cada vez mais claros: o Presidente Fernando Henrique Cardoso, por duas vezes, foi eleito Presidente da República. Todo o Brasil sabe que, quando ele ganhou a primeira eleição - era Ministro da Fazenda do governo Itamar Franco -, idealizou um plano econômico que deu certo e que o elegeu Presidente da República. S. Exª foi eleito pregando um plano econômico. Durante o seu primeiro mandato, ministrou curso, com absoluta coerência, em relação àquilo que pregou durante a campanha eleitoral. Foi candidato à reeleição pregando as privatizações e o prosseguimento do Plano Real. Foi eleito pelo voto livre do povo, que, coerentemente, votou no cidadão que havia governado em torno de uma proposta de campanha e que merecia a renovação do voto por causa de um plano que o povo entendia que estava dando certo. S. Exª enfrentou mil dificuldades, produto de conjuntura internacional difícil, de problemas de economia doméstica, de variações na Rússia, na Ásia, no Mercosul...

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Uma Oposição interna implacável!

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Uma Oposição interna inclemente, mas, com coerência, tocou o governo para frente e chegou ao final. Portanto, Fernando Henrique Cardoso foi - e não se pode negar - um Presidente, por duas vezes, eleito com uma bandeira que cumpriu, quando foi Presidente. A sua marca é a coerência. O Presidente Lula, que é um homem inteligente, hábil, com características de líder, tem-se preocupado - isto o difere de Fernando Henrique e, às vezes, Sua Excelência até perde um pouco eu não diria o equilíbrio, mas fica fora do normal - em explicar que foi eleito por uma história que não é a de uma campanha, mas a história de 20 anos de luta ao lado dos servidores públicos, a quem prometia reajuste de salários, que os servidores esperavam; com uma bandeira de luta de dobrar, triplicar ou quadruplicar o salário mínimo - e ganhou a eleição, prometendo dobrar, em quatro anos, o salário mínimo -, e com uma bandeira de luta que prometia o rompimento com o FMI e a retomada do crescimento econômico. Fatos estes que não estão ocorrendo na prática do Governo e que constrangem o Presidente. Não quero aqui culpá-lo e dizer que o Presidente está agindo de forma certa ou errada, mas Sua Excelência não agiu como o Fernando Henrique. Não foi com as bandeiras de campanha que Sua Excelência governou ou que está governando, e isso o incomoda profundamente. Isso difere profundamente Fernando Henrique Cardoso de Luiz Inácio Lula da Silva. Ontem, assisti ao discurso de Sua Excelência, em Pelotas, até com uma boa dose de irritação. Para se justificar, o Presidente até criticava aqueles que o elegeram, os servidores públicos, e que fizeram com que ganhasse a eleição. O Presidente condenou a pressão que estavam fazendo. Senador Arthur Virgílio, para concluir, desejo fazer aqui o registro da minha decepção. Admiro a competência, a inteligência e a habilidade política do Presidente Lula. Exerço a Oposição cobrando coerência e as atitudes de campanha como prática de Governo. Porém, é preciso que se reconheça que o Presidente Lula exagerou ontem. Na hora em que saiu do plano das idéias - que é perfeitamente razoável discutir, debater, ser até forte, como V. Exª e o Líder Aloizio Mercadante também o são - e entrou no plano pessoal, Sua Excelência resvalou para a demagogia, quando se referiu, em um dado momento - até o desculpo por isso, foi num momento de excitação maior -, ao ex- Presidente Fernando Henrique Cardoso como um exilado na França. Sua Excelência disse que, ao deixar o Governo, iria morar em São Bernardo do Campo. O Presidente Lula já foi inúmeras vezes à Europa, aos Estados Unidos, à Ásia. Conhece o mundo inteiro muito mais do que eu. E o Presidente sabe que o Presidente Fernando Henrique Cardoso foi para a França não para se exilar. S. Exª é um cidadão do mundo. Já esteve lá muitas vezes. Isso não é nenhum demérito. Não precisava Sua Excelência o Presidente Lula fazer aquela colocação, que, na minha opinião, tinha o claro objetivo de desmerecer o Presidente Fernando Henrique Cardoso, colocando-o como um elitista, fazendo o contraponto de que ficaria em São Bernardo do Campo. Isso não fica bem para um Presidente da República, porque cheira a demagogia, que não é aceita pelo povo brasileiro, que quer do seu Presidente fundamentalmente coerência. Isso difere Fernando Henrique de Luiz Inácio Lula da Silva. Lula está querendo - e tenho confiança absoluta no que digo - o melhor para o Brasil, mas coerente ele não está sendo.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Agradeço, Senador José Agripino, pelo brilhante aparte.

Tenho, ainda, duas atitudes a tomar. A primeira delas é descer da tribuna e cumprimentar, de maneira fraterna, o prezado amigo e Líder, Aloizio Mercadante. Esse é o clima que prevalecerá entre nós e haverá de prevalecer no Senado.

A segunda é dizer que todo o desdobramento da vida do Presidente Lula depois do combate ao regime militar, quando chegou ao entendimento político, foi corajoso e brilhante, mas por coincidência, e apenas por isso, quando o ex-Presidente Fernando Henrique foi realmente exilado, a Esquerda - e eu, equivocadamente, com ela - votou em Lula, nas eleições de 1970. A Esquerda recomendou o voto em Lula e S. Exª votou na Arena, no ano em que saia para as agruras do exílio.

A SRª PRESIDENTE (Iris de Araújo) - Por favor, Senador.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Encerro meu pronunciamento cumprimentando o Líder e o Senado. Agradeço a Presidência da Casa e, de maneira penhorada, o Senador Magno Malta, pela generosidade de sempre e pela correção com que se porta em relação a este seu modesto colega.

Entendo que ficamos combinados em dois pontos: que a democracia continua valendo no País e que o debate só faz bem ao conceito desta Casa e à cabeça política de todos nós.

Muito obrigado, Srª Presidente.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2003 - Página 15866